domingo, fevereiro 04, 2007

Aeroportos 17

Cantarell
Cantarell, campo petrolífero. Foto: Víctor R. Caivano/AP

Ota: e se o petróleo mudar todas as previsões
nos próximos dois anos?

A notícia recente e inesperada da rápida exaustão do petróleo mexicano conhecido (1), com o colapso anunciado do grande campo petrolífero de Cantarell, veio relançar a discussão sobre o Pico Petrolífero, a qual, na opinião de Matthew Simmons (2), irá ofuscar dentro um ou dois anos a própria discussão sobre as alterações climáticas, devido ao impacto que terá sobre a economia mundial e sobretudo nos modelos do chamado "business as usual". Observadores de reconhecida competência, como Jim Rogers (3) e Matthew Simmons, prevêm que a subida do preço do crude irá ser retomada muito em breve, podendo atingir os 150 USD entre 2009 e 2013, e mesmo os 300 USD se nenhuma boa notícia entretanto surgir do lado da oferta e a procura continuar a crescer ao ritmo actual.

Alimentar a teimosia do novo aeroporto da Ota e do TGV Lisboa-Porto nestas circunstâncias, soma a cada vez mais evidente imprestabilidade da ideia ao perigo de um fracasso económico de proporções monumentais, de que poderá resultar, ou uma duradoura hipoteca de Portugal às empresas financeiras, industriais e de construção envolvidas no negócio, ou mesmo a dolorosa abdução da autonomia de decisão do país pelos credores que entretanto se forem perfilando no horizonte de um dívida externa incontrolável.

Portugal sofre de uma dependência energética e alimentar preocupante. A crise climática, nomeadamente por via das secas que se anunciam, porá de pantanas os nossos frágeis sistemas de prevenção e intervenção, ao mesmo tempo que empurrará boa parte das seguradoras para a defensiva mais extrema. A sangria demográfica, por via da emigração, que regressou para nossa vergonha, não poderia testemunhar mais cruamente a leviandade política que nos trouxe até aqui.

Neste contexto, para além da necessidade de tomar decisões de uma racionalidade drástica nos domínios da eficiência energética, da produção de energias renováveis, da limitação abrupta dos excessos de emissões de gases e de substâncias aceleradoras das alterações climáticas, o país vai ter que atacar muito rapidamente e com grandes doses de investimento financeiro o actual caos territorial e a completa irracionalidade das nossas principais áreas metropolitanas e cidades. Um dos elementos desta revolução, pois é disso que se trata, é a revisão completa da actual política de transportes e mobilidade. Nada se poderá fazer se não se compreender que há uma simbiose verdadeira entre a cidade e as suas redes de transportes e mobilidade, que por isso exigem uma atenção muito grande, meticulosa e democraticamente assumida. O principal entrave a esta inadiável revolução é a actual tentativa de prosseguir e mesmo acelerar de forma atabalhoada, ilegítima e prepotente com as prioridades da Ota e do TGV Lisboa-Porto, totalmente desactualizadas face aos mais imediatos e gigantescos desafios civilizacionais.

Os desafios que aí vêm não podem ser liderados com a arrogância do "posso, quero e mando" a que os políticos deste país se habituaram. Nem muito menos por primeiros ministros que da ciência política parecem conhecer apenas o voluntarismo e o contorcionismo mediático.

Ou muito me engano, ou este Sócrates terá que engolir a Ota e o TGV Lisboa-Porto de uma assentada. Tal poderá suceder quando, de um dia para o outro, talvez em 2008, passarmos da percepção da emergência climática global, finalmente em processo de mediatização acelerada, para a percepção da emergência energética aguda para que nos precipitamos a uma velocidade castastrófica.

Se então estivermos atolados em dívidas estúpidas e gigantescas, tudo será mais difícil e mais dramático.

Na suposição conservadora de que o barril de petróleo só custará 150 USD em 2017, calculámos por baixo (ver quadro) as implicações económicas e de tempo de uma deslocalização do principal aeroporto do país, de Lisboa para a Ota. Olhando para o quadro, percebe-se que as ligações aéreas entre as duas principais cidades do país desaparecerão; que o TGV não tem nenhuma justificação quando comparado com o Alfa Pendular em pleno uso das suas faculdades (a não ser servir o novo aeroporto), e que um aeroporto na Ota, criminosamente caro na concepção-construção e caríssimo para todos os que dele se servirem (pessoas e aviões), jamais será interessante do ponto de vista do novo paradigma do transporte aéreo de passageiros.





Notas

1 - Mexico's Oil Output Cools. By David Luhnow, Dow Jones Newswires 29/01/07

Daily output at Mexico's biggest oil field tumbled by half a million barrels last year, according to figures released Friday by the Mexican government. The ongoing decline at the Cantarell field could pressure prices on the global oil market, complicate U.S. efforts to diversify its oil imports away from the Middle East, and threaten Mexico's financial stability.

The virtual collapse at Cantarell -- the world's second-biggest oil field in terms of output at the start of last year -- is unfolding much faster than projections from Mexico's state-run oil giant Petroleos Mexicanos, or Pemex. Cantarell's daily output fell to 1.5 million barrels in December compared to 1.99 million barrels in January, according to figures from the Mexican Energy Ministry. Link


2 - Simmons says global oil supply has peaked. By Rhonda Schaffler, Bloomberg, 01/02/07



Matthew Simmons, chairman of Simmons & Co. International in Houston, talked yesterday with Bloomberg's Rhonda Schaffler about the need to address energy use, his view that global supply has peaked and the likelihood oil prices could reach as much as $300 a barrel. (Source: Bloomberg)

[Transcription of the first few minutes of the interview]

Q: Tell me how you draw your conclusion that at this point we've hit Peak Oil.

A: If you look at the numbers and you follow what's going on starting with Mexico's giant Cantarell field which is now in a very serious state of decline and then you look at the North Sea and you see just the UK and Norway, it's pretty obvious to me that those three areas alone could actually decline by between 800,000 and 1 million barrels a day in 2007.

That pretty well wipes out almost all the production gains coming onstream and in implicit in that it assumes that everyone else is flat.

So I think basically too many of our oil fields are too old. Too many now are in decline. The Middle East is basically out of capacity. they're some projects that are being worked upon, but most don't hit the market until 2008, 2009 and we're running out of time.

... I am firmly of the belief that over the course of the next year or two, this issue of peak oil will replace global warming as an issue that we're all worrying, debating and talking about.


3 - Rogers Says Oil Will Rise to $100 After 'Correction'. By Wendy Pugh and Yasumasa Song, Bloomberg.com 18/01/07

Oil will resume its march toward $100 a barrel after a 'correction', said Jim Rogers, who predicted the start of the commodities rally in 1999.

I'm just not smart enough to know how far down it will go and how long it will stay, but I do know that within the context of the bull market, oil will go over $100; It will go over $150. Whether that is in 2009 or 2013, I don't have a clue, but I know it's going to happen. Link

OAM #170 04 FEV 2007

1 comentário:

Diogo disse...

Não é necessário que o petróleo suba de preço. Os TGVs e a OTA são duas aberrações inconcebíveis. Nos combóios deve-se apostar na VE - velocidade elevada - pendulares. Quanto à OTA, os voos «low cost» tornam-no completamente inútil.