sexta-feira, fevereiro 11, 2011

Censura e populismo parlamentar

Mostrem os sapatos a Sócrates — o Mubarak das Beiras!

Sócrates furioso com anúncio de moção censura do Bloco de Esquerda

É do interesse vital do PSD provocar a queda do governo da tríade de Macau ainda este ano e ganhar as subsequentes eleições legislativas antecipadas. De contrário, alguns dossiers, como o do aeroporto da Ota em Alcochete, onde o lóbi cavaquista da ex-SLN meteu o pescoço, cairão irremediavelmente. Mas poderá fazê-lo, pergunto, depois de ter viabilizado até agora a agonia de Sócrates em nome do "interesse nacional"?

O grande dilema de Passos de Coelho é, pois, este: ou segurar Sócrates até ver consumado o colapso financeiro do país, provavelmente antes do verão, e quando este ocorrer (sob a forma de um pedido de ajuda desesperado ao BCE), exigir a demissão do governo, anunciando que votará contra o próximo orçamento de Estado seja ele qual for; ou precipitar a sua queda imediatamente após a tomada de posse de Cavaco Silva, votando nas moções de censura do Bloco e do PCP, ou anunciando mesmo, em alternativa, uma moção de censura de iniciativa laranja. A perspectiva de três moções de censura consecutivas ao governo moribundo em funções —depois das quais, independentemente de virem a ser aprovadas ou não, este ficaria ferido de morte— chegaria previsivelmente para que Sócrates se demitisse, em vez de desafiar uma demissão humilhante pelo presidente da república. Esperar pela palavra de Cavaco é, no entanto, um grande risco para o actual líder do PSD!

No primeiro cenário —o cenário da hiena que espera pelo animal ferido de morte— o PSD corre o risco de receber um país em cacos, pois até ao outono haverá tempo suficiente para que uma fuga de capitais, de empresas e de massa cinzenta, sem precedentes, tenha lugar, ao mesmo tempo que a instabilidade e mesmo a revolta social poderão tonar-se explosivas de um momento para o outro, ao menor e mais inesperado incidente com estudantes e pais desesperados, doentes e reformados, ou camionistas (outra vez!) Foi isto que o PCP, primeiro, e o quadrado Louçã, depois, perceberam finalmente. Estão aliás ambos aterrados com a perspectiva de serem confundidos e engolidos com o PS pela ira que cresce entre os portugueses. Jerónimo de Sousa tem razão: para o povo (leia-se, para o eleitorado que vota à esquerda) já nada pode piorar a governação dos piratas que tomaram de assalto o PS e o país. Sócrates tornou-se uma espécie de Mubarak das Beiras. Só sairá de empurrão!

A alternativa a este cenário é Passos de Coelho aproveitar a boleia das moções de censura do Bloco e do PCP, votando-as favoravelmente, em nome, não das respectivas ideologias e verborreia populista, mas da necessidade inadiável de acorrer ao país verificada a incapacidade irreversível de o actual governo lidar com a situação económica, financeira, social e política que se degrada dia a dia. A aventura criminosa da tríade de Macau, servida pelo mitómano José Sócrates, levou o país à mais completa ruína, desde a bancarrota de 1892. É preciso correr com esta gente do Governo e do PS. E é preciso sentar alguns dos seus principais protagonistas no banco dos réus!

Mas Passos de Coelho tem ainda outra alternativa para encurtar a agonia de Sócrates: anunciar uma moção de censura do próprio PSD, ideologicamente neutra e pragmática, se verificar que as fundamentações das moções do Bloco e do PCP são, como se prevê, uma espécie de insecticida doutrinário destinado a matar no ovo a eficácia das próprias moções. Ou seja, se as moções de censura da "esquerda" não passarem de uma farsa para povo distraído ver, o PSD inviabilizará de vez o governo com a sua própria moção de censura, na medida em que, a partir da sua apresentação, o PS deixará de contar com qualquer apoio parlamentar do PSD e do CDS, ficando a sua sobrevivência ao colo do senhor Louçã, já que a posição lúcida de Jerónimo de Sousa acabará por ganhar apoio pleno no interior do PCP.

Este é o momento ideal para uma mudança radical no seio do PS. Se tal não ocorrer, podemos dizer adeus ao Partido Socialista, e pedir outro. Está na altura de António José Seguro, Francisco Assis e Sérgio Sousa Pinto perceberem que o melhor que têm a fazer é unir-se, e unirem-se a Manuel Maria Carrilho para salvar o PS e a alternância de esquerda em Portugal. Esta terá que ser repensada de uma ponta à outra, naturalmente. Por uma nova República? Por um novo PS? Não vejo como possa ser doutro modo!

Portugal não tem nenhuma possibilidade de pagar um QREN por ano pelo serviço da sua dívida pública. É este o estado de falência do regime a que chegámos. Para sairmos de tamanho buraco negro é preciso, de facto, uma nova República!

REFERÊNCIAS
  • Dívida pública portuguesa (2010): 83,2% do PIB (CIA)
    Dívida externa bruta portuguesa (2010): 201,5% do PIB
  • Os aforradores e os especuladores de dívida pública portuguesa
    (...) O Estado português, em 2011, pretende pedir emprestado 46 mil milhões de euros, cerca de 32% do total da dívida e 28% do PIB português. Quase 25% da dívida total, 35 mil milhões, para renovar dívida vencida e 11 mil milhões para colmatar o diferencial negativo entre as receitas e as despesas do Estado. A grande fatia das emissões, cerca de 25 mil milhões, está prevista até finais de Abril.
    (…) Caso se assista a uma escalada das taxas para perto dos 10% nas OT a 10 anos no mercado secundário, e das taxas de prazo mais curto – no início da curva de rendimentos, como já estamos a assistir nas de 2 a 6 anos – poderemos ter uma taxa média 6 pontos percentuais acima do normal e um acréscimo dos juros em mais 1500 milhões de euros (quase 1% do PIB) passando o serviço da dívida dos actuais 8% do total da despesa pública para quase 11% — in Paulo Rosa, Os aforradores e os especuladores de dívida pública portuguesa, Público, 16.11.2010 - 14:50.
  • Portugal de novo ameaçado pela dívida, diz Guardian
    O The Guardian salienta que, pela primeira vez em três semanas, o BCE foi obrigado a intervir no mercado e a comprar títulos da dívida soberana portugueses, pois os juros exigidos chegaram aos 7,63%, níveis que a Grécia e a Irlanda não conseguiram suportar. Portugal terá de se refinanciar em 10 mil milhões já nesta primavera e os investidores estão preocupados depois da pouca confiança demonstrada pela emissão de dívida sindicada de 3,5 mil milhões de euros, realizada esta semana, e cujas taxas elevadas (6,24%) vão obrigar o país a pagar 226 milhões de euros de juros por ano — DN.
  • Taxa a dez anos iguala pior sequência de Portugal desde a entrada na zona euro
    Até ao dia 14 de Janeiro, nunca a sequência de dias a fechar acima dos sete por cento havia sido superior a dois dias consecutivos, mas a partir de 14 de Janeiro a taxa genérica da Bloomberg ficou acima dessa barreira durante quatro dias consecutivos. Hoje, esta taxa continua acima dos 7 por cento, pelo quinto dia consecutivo, igualando nesta altura a pior sequência de dias registada desde a entrada no euro, registada na última semana de Janeiro, sendo que esta semana os juros têm sido mais altos que em Janeiro  — DN Economia.
  • Para una análise comparativa internacional: “The Future of Public Debt: Prospects and Implications,” by Stephen G. Cecchetti, M. S. Mohanty, and Fabrizio Zampolli, published by the Bank of International Settlements (BIS). PDF.

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