segunda-feira, agosto 04, 2014

Novo Banco, primeira cobaia do SRM

Mario Draghi (Dragão).
Foto: Associated Press

 

Carlos Costa esteve à espera da aprovação do Regulamento do SRM. O governo também. Cavaco também. E o resto são tretas!


Governo e Cavaco trabalharam em segredo para salvar o BES

Apesar de o Governo dar a entender que não tem nada a ver com a intervenção no BES, ontem houve conselho de ministros extraordinário para aprovar um decreto lei crucial no salvamento do banco. Paulo Portas e Maria Luís Albuquerque aprovaram, em segredo, um diploma que regulamenta a gestão do banco novo ou "banco de transição". O Presidente da República promulgou o decreto quase de imediato. Nenhum dos intervenientes publicitou facto tão relevante. O governador do Banco de Portugal também não tocou no assunto.

De acordo com a informação publicada hoje no Diário da República, o diploma altera o regime aplicável aos bancos de transição (neste caso, o Novo Banco, que emergiu do BES), à luz das novas regras europeias aprovadas a 15 de maio de 2014. O Novo Banco ficou com as partes saudáveis do balanço; o BES passou a ser o banco mau, como todo o lixo financeiro, as cobranças duvidosas, etc.

04/08/2014 | 14:09 |  Dinheiro Vivo

Quem salvou, por agora, o BES, e o transformou num banco mau cheio de lixo e de perdas para acionistas, especuladores e piratas (bail-in), e num banco bom, o Novo Banco, com proteção dos depositantes e detentores de dívida garantida e sénior, foi o BCE e a CE através de uma coisa chamada SRM—Single Resolutiom Mechanism. O Novo Banco é, assim, sem mais rodriguinhos nem bicos de pé, a primeira experiência de resgate combinado (bail-in/bail-out) de um banco na Eurolândia, depois do desastre de Chipre. A expectativa não pode deixar de ser grande.

As hesitações de Carlos Costa e o timming das "suas" decisões foram completamente cronometradas por Bruxelas e Frankfurt e estiveram dependentes da aprovação pelo Parlamento Europeu, em 15 de julho último, do Regulamento do dito SRM. Este regulamento foi precedido de uma Diretiva sobre o mesmo assunto publicada em 15 de maio deste ano.

Foi no dia 15 de julho que a Goldman Sachs, a Desco e a Baupost fizeram grandes compras de ações do BES, adquirindo até participações de referência (mais de 2%). Terá a GS previsto que o mecanismo iria ser usado no BES? Apostou na continuidade de um BES resgatado? Não imaginou que se pudesse criar um Banco Novo, e que o BES fosse parar ao lixo? Talvez Carlos Moedas nos possa esclarecer. Em todo o caso, a GS vendeu parte substancial destas ações no dia 23 de julho... coisa que só ficámos a saber no dia 1 de agosto. No mínimo, intrigante.

Cavaco e Governo não pregaram prego, nem estopa, na operação mãos limpas do BES. E o professor Marcelo, depois de ter andado anos, meses, semanas, dias a vender o BES e a excelência do sistema bancário aos indígenas veio agoraa, com aquele ar fresco do costume, esclarecer a sua audiência que Portugal é, afinal, a primeira cobaia do SRM. Que tal deixar de brincar as candidatos presidenciais mascarado de analista, e pedir desculpa pelo seu otimismo exagerado em matéria tão sensível quanto é o dinheiro dos contribuintes e dos depositantes? Tal como o Marques Mendes, Marcelo não passa, afinal, de um coscuvilheiro de São Bento e de Belém.

António José Seguro sabia o que se estava a passar e agiu em conformidade. Marcando território, mas assumindo também uma posição ponderada e correta sobre o desenrolar dos acontecimentos.

Pelo contrário, as ossadas do leninismo-estalinista e as beatas do fantasma trotsquista andam literalmente perdidas nestas andanças nada neoliberais e muito hiper-keynesianas de um capitalismo uraniano capaz de devorar os seus filhos mais diletos.

Ou muito me engano, ou vem aí um entendimento novo entre o PS e o PSD, pois não vejo como a famosa 'esquerda' possa alguma vez sair da sopa de letras azeda onde há muito caíu e de onde não há meio de sair.


REFERÊNCIAS DE UM BAIL-IN/BAIL-OUT

  • Draghi Says EU Bank Resolution Fund Needed With Power to Borrow
    Bloomberg
    . By Rebecca Christie and Ian Wishart Sep 23, 2013 4:59 PM GMT+0100
  • REGULAMENTO (UE) N.o 806/2014 DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO
    de 15 de julho de 2014
    que estabelece regras e um procedimento uniformes para a resolução de instituições de crédito e de certas empresas de investimento no quadro de um Mecanismo Único de Resolução e de um Fundo Único de Resolução bancária e que altera o Regulamento (UE) n.o 1093/2010
    [LINK-PT] [LINK-EN 
  • DIRETIVA 2014/59/UE DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO
    de 15 de maio de 2014
    que estabelece um enquadramento para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento e que altera a Diretiva 82/891/CEE do Conselho, e as Diretivas 2001/24/CE, 2002/47/CE, 2004/25/CE, 2005/56/CE, 2007/36/CE, 2011/35/CE, 2012/30/UE e 2013/36/UE e os Regulamentos (UE) n.o 1093/2010 e (UE) n.o 648/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho
    (Texto relevante para efeitos do EEE)
    [PDF-PT] 
  • EU Bank Recovery and Resolution Directive (BRRD): Frequently Asked Questions [LINK]

3 comentários:

Anónimo disse...

Insiste nas suas teorias coloridas da Goldman Sachs apesar desta pelo menos nisto tudo se ter entalado à grande com o BES, algo em torno das 100 milhões acções, com percas potenciais de muitos milhões.
Eles não compraram os 2% no dia 15 Julho, já tinham muitas acções há bastante tempo, e também se fartaram de perder dinheiro ao longo destes meses. Eles ou os clientes deles.

Não deixe que a verdade estrague uma boa história, afinal é o seu estilo pessoal, misturar coisas verdadeiras com pitadas de ficção para escrever uns posts mais interessantes, mas infelizmente muita vez incorrectos e enganadores. Todos temos as nossas pancas.

António Maria disse...

Alguém prestou más informações à Goldman... e o Crédit Agricole confiou demais no DDT. A GS soube, imagino, que o SRM vinha a caminho, e que tal instrumento seria favorável ao aumento de capital promovido 'in extremis' pelo Ricardo Salgado para arrebanhar umas massas valentes à custa da ingenuidade, falta de informação e cupidez de muitos. Todos apostaram, pelos vistos, no bail-out, mas esqueceram-se do bail-in!

Até gestores de conta do BES perderam dezenas de milhar de euros no que aqui há muito havíamos dito ser um buraco negro em expansão.

Eu recomendaria à Goldman que mudasse a rapaziada que tem por cá a dar-lhe más informações.

António Maria disse...

De um email recebido hoje:

QUAL A INTERPRETAÇÃO DE TODA ESTA SITUAÇÃO

Vamos aos factos:

1. A grande conclusão que podemos tirar é que o Governo português e o Governador de Portugal já não mandam nada. Quem está a decidir tudo é o BCE e a Comissão Europeia através do Single Resolutiom Mechanism (SRM), o resto é conversa.

2. No dia 14 de Julho, o Governador do Banco de Portugal, assegurava a todo o país que o BES era um Banco sólido. Logo que Vitor Bento tomou posse contratou uma empresa estrangeira de consultoria para realizar uma auditoria ao Banco. Todos os observadores ficaram perplexos com esta contradição.

3. Evidentemente que o Governador do Banco de Portugal já sabia da verdadeira situação do BES. O Governo, também sabia de tudo. Estiveram a aguardar pelo dia 15 de Julho, ou seja, o dia da aprovação no Parlamento Europeu, do Regulamento do Single Resolutiom Mechanism SRM.

4. Se o que ocorreu no BES tivesse acontecido há alguns meses atrás, as consequências teriam sido muito mais graves.

5. O Governador do Banco de Portugal andou sempre a obedecer ao Governo português e este fingiu que nada tinha a ver com o grave problema do BES.

6. Mais uma vez teve que ser o BCE e a Comissão Europeia a "apagarem" um fogo que os nossos governantes já não podiam controlar.

O Governo português apresenta-se como "herói" daquilo que já nada podia fazer e o Governador do Banco de Portugal como "justiceiro".

Alguma Imprensa portuguesa é o "elo de ligação" de toda esta falsa imagem.