quarta-feira, janeiro 21, 2015

O próximo presidente

Marcelo, Guterres ou Vitorino, Rio, ou uma singularidade inesperada?


As sondagens, que valem o que valem, apontam claramente Marcelo Rebelo de Sousa como virtual candidato do PSD e do CDS/PP às próximas eleições presidenciais. E destacam António Guterres e António Vitorino como potenciais candidatos capazes de congregar o eleitorado de esquerda, extrema-esquerda e centro-esquerda.

O problema desta primeira sondagem e estudo eleitoral é que Marcelo perde, quer contra Guterres, quer contra Vitorino. Ou seja, não é melhor candidato que Santana, na medida em que perde, salvo se o concorrente apoiado pelas esquerdas for uma enteléquia sem espessura, nem verbo, como Sampaio da Nóvoa, ou Carvalho da Silva.

Postas as coisas nestes termos, o mais provável mesmo é que Santana Lopes anuncie a sua candidatura na qualidade de lebre, com a missão de roer a corda a Marcelo. Se o fizer, Marcelo verá as sondagens a seu favor cairem aos trambolhões, sem que Santana Lopes consiga, por sua vez, mais do que um mísero resultado, de nove ou dez por cento. Seja como for, num cenário destes, a percentagem de Marcelo recuará para menos de 40%, sendo então improvável que se candidate.

A candidatura de Pedro Santana Lopes —que ganhará mais força se ocorrer lá para abril ou maio, aumentando com a gestão do tempo a pressão sobre a indecisão de Marcelo— ajudará certamente António Guterres a decidir-se, pelo sim, ou pelo não. Se for sim, ganhará as eleições, se for não, o candidato do PS será António Vitorino, que poderá, ou não, ganhar as presidenciais. Tudo dependerá de quem tiver ganho as Legislativas, que terão lugar este ano, e com que percentagem, e ainda de quem for indigitado por Cavaco Silva para formar o próximo governo.

O futuro primeiro ministro poderá ser uma personalidade do PS, ou uma personalidade do PSD, ou até um independente apoiado por ambos os partidos, caso nenhum deles assegure uma maioria estável no parlamento. Em nenhum dos casos é de supor que Rui Rio preencha as condições para o cargo. Mas, por outro lado, parece razoável supor que este barão do norte do PSD possa in extremis candidatar-se às presidenciais, uma vez cumprida a tarefa que Santana Lopes se propôs levar a cabo, isto é, desfazer o sonho secreto, mas mal disfarçado, de Marcelo Rebelo de Sousa.

Claro que tanto António Costa, como Rui Rio, tencionam compensar com sinecura apropriada o esforço do atual Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.

O namoro tórrido entre António Costa e Rui Rio provam que, sob os auspícios de Cavaco Silva, existe uma pressão enorme para reconstruir o desfeito Bloco Central de interesses, e que tal reconstrução exige uma reconciliação político-partidária ao centro, que não sofra da esquizofrenia patenteada pela atual coligação entre Paulo Portas e o PSD.

A combinação entre Costa, Cavaco e Rio é evidente. Só não percebo o que andam os paspalhos da restante esquerda a fazer. O seu silêncio é, no mínimo, igualmente oportunista e situacionista!

As coisas poderão, apesar de todo o calculismo taticista, descarrilar.

Basta, para tal, que a diarreia monetarista do BCE não tenha os efeitos esperados; basta, para tal, que as vitórias do Siryza, na Grécia, e do Podemos, em Espanha, façam aumentar exponencialmente as tensões entre o norte e o sul da União Europeia; basta, para tal, que a extrema direita, o terrorismo e a repressão continuem a galgar patamares, como tem vindo a suceder em França e na Bélgica; basta, para tal, que as guerras civis na Ucrânia e na Síria alastrem em extensão e intensidade; basta, para tal, que no nosso país o desespero social e o desemprego voltem a agravar-se, apesar dos sinais tímidos de estabilização da crise.

O sofrimento e a ansiedade que atingem mais de um milhão de portugueses não vão dissipar-se de um dia para o outro.

Boa parte dos eleitores vê com enorme desconfiança o situacionismo partidário vigente e as suas teias de interesses egoístas. A simples ideia de reconstituição do Bloco Central e em geral das pandilhas que DERAM CABO DISTO TUDO levará muitos de nós a esperar por um sinal diferente, e a desejar contribuir para o fim efetivo das más práticas que arruinaram o país, económica, social e moralmente.

O fartar vilanagem começou no tempo de António Guterres, se bem nos lembramos. O mesmo António Guterres que, quando viu como crescia o buraco negro da corrupção à sua volta, tomou a decisão de se despedir do governo, do partido e do país. O seu regresso parece, pois, improvável.

António Vitorino, por sua vez, também já se escaldou um par de vezes, e não creio que queira queimar-se de vez na presidência de um país cada vez mais dilacerado entre rendeiros falidos e devoristas desempregados que insistem em rapar o tacho vazio do Orçamento. O país precisa de caras lavadas, para acreditar.

Mas se Guterres e Vitorino acabarem por frustar, como provavelmente farão, as expectativas dos aparelhos partidários da esquerda, então Rui Rio candidatar-se-à podendo ganhar as eleições. O casamento de interesses com António Costa seria então consumado.

Mas volto à pergunta: quem quer uma reedição requentada do Bloco Central? Quem poderá desejar a reedição, em versão pelintra, de um bloco de interesses unidos apenas pelo desejo de partilhar o saque orçamental?

É neste ponto que uma singularidade política inesperada poderá ocorrer. Já pensaram nisso?

A fragmentação partidária está em curso, e a deserção eleitoral dos portugueses está longe de ter terminado. Enquanto não aparecerem vozes não contaminadas anunciando um tempo e um modo novos de fazer política e servir o país, permanecerá e crescerá um grande vazio nas urnas eleitorais à espera de ser preenchido.

POST SCRIPTUM — um leitor atento confidenciou-me que a aludida singularidade poderia chamar-se Artur Santos Silva. É um bom palpite. Mas há outros ;)

Atualização: 22 jan 2015, 14:02 WET

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