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sexta-feira, dezembro 24, 2010

Ao Pai Natal

Uma das muitas campanhas da Coca Cola que universalizaram Pai Natal

Querido amigalhaço,

Em vez do incenso e mirra que os Reis Magos sempre trazem no dia 6 de Janeiro de cada ano (o ouro, pelo contrário, tem desaparecido a olhos vistos!), o povo desgovernado da Lusitânia preferia outros presentes neste Natal. Aponta então:
  1. a privatização da RTP, pois, como sabes, esta televisão de propaganda governamental nada faz que as televisões privadas não façam melhor e mais barato para todos os contribuintes;
  2. a privatização da TAP, pois, como sabes, além de estar tecnicamente falida, e há muito não passar de um centro de custos do regime pago pelos contribuintes, nada faz que as companhias privadas de aviação não façam melhor e mais barato;
  3. a conservação do Aeroporto da Portela por muitos e bons anos, pois, como sabes, esta infraestrutura goza de qualidades ímpares, está muito longe da saturação (se é que alguma vez chegará a semelhante estado), e tem vindo a ser beneficiado com centenas de milhões de euros de investimentos ao longo da última década, dos quais destaco as novas 25 mangas para encosto de aeronaves, e a abertura no próximo ano da estação de Metro do Aeroporto;
  4. a privatização da CP (que não da REFER), em regime de concessão, por concurso público internacional, com cláusulas de serviço público asseguradas, e por períodos nunca superiores a 35 anos, dos regimes de exploração do transporte ferroviário de pessoas e mercadorias, pois, como sabes, a CP está falida e será por isso incapaz de responder aos novos desafios criados pelas redes europeias de mobilidade ferroviária;
  5. a privatização dos transportes urbanos, em regime de concessão de exploração, por concurso público internacional, com cláusula de serviço público asseguradas, e por períodos nunca superiores a 35 anos, pois, como sabes, o Metro de Lisboa, Porto e Margem Sul do Tejo, Carris, e os STCP estão falidos, e são coutadas partidárias incontroláveis;
  6. a privatização dos portos e aeroportos, em regime de concessão de exploração, por concurso público internacional, com cláusulas de serviço público asseguradas, por períodos nunca superiores a 35 anos, pois, como sabes, a competitividade destas infraestruturas é nula ou mesmo negativa, na exacta medida em que não prestam contas da sua rentabilidade ao país, e são, na verdade, mais umas tantas coutadas do regime partidocrata e clientelar que temos;
  7. a privatização das florestas de domínio público, em regime de concessão de exploração, por concurso público internacional, com cláusulas de serviço público asseguradas, por períodos nunca superiores a 35 anos, pois, como sabes, milhares de hectares de floresta ardem todos os anos, boa parte dela por incúria manifesta do nosso Estado;
  8. a privatização da recuperação e exploração dos patrimónios imobiliários municipais, por concurso público internacional, com cláusulas de serviço público asseguradas, por períodos nunca superiores a 35 anos, pois, como sabes, boa parte das casas em ruína nas cidades de Lisboa e Porto, para não mencionar outras cidades mais pequenas, é propriedade municipal ou de grandes instituições e bancos, imunes, por definição, ao bom senso e às leis;
  9. a privatização integral das áreas de ensino, nomeadamente universitário, que não tenham relevância estratégica para o país;
  10. o encerramento de todas as secretarias de estado, direcções-gerais, repartições, institutos, e empresas públicas sem razão de existência e provas de vida efectivas à luz de uma necessária e urgente redefinição das funções do Estado numa sociedade, a nossa, que caminha inexoravelmente para o empobrecimento;
  11. a diminuição do número de deputados, câmaras municipais e freguesias urbanas para patamares de razoabilidade democrática e de eficiência;
  12. criação de um corredor de convergência fiscal e orçamental na União Europeia, por forma a impedir a propagação das desigualdades sociais em curso, a perpetuação de elites e nomenclaturas burocráticas no poder, e a captura das nações pelas máfias financeiras que proliferam por essa Europa fora.
Se puseres tudo isto logo à meia-noite no meu sapatinho, não precisaremos, nem do FMI, nem de roubar os abonos de família aos casais que ganham 800 euros por mês, nem de assassinar as classes médias do meu país. Se puseres tudo isto logo à meia-noite no meu sapatinho, quando te reformares poderás vir para o meu país, que será então um jardim à beira-mar plantado, cheio de surfistas divertidos, peixe fresco, produtos biológicos pelo país inteiro, nada de nevões como os que te empurram para Sul, muito Sol até, e um povo pacífico, discreto e que não gasta mais do que tem.

O teu amigo, Portugal.

POST SCRIPUM

25 dez 2010 — Sabiam que o Pai Natal que nós hoje celebramos alegremente é um dos grandes ícones do consumismo imaginado e disseminado mundialmente pela Coca Cola? Pois é, antes da Coca Cola pedíamos prendas ao Menino Jesus e aos Reis Magos!
26 dez 2010 — Quando se escreve privatização, privatizar, privado/a quer-se sobretudo sublinhar a necessidade de libertar o bem público da sua apropriação, definhamento e mesmo destruição burocráticos, libertação essa que poderá tomar a forma de iniciativa privada (empresarial ou cooperativa) subordinada ao respeito e promoção do bem comum, de gestão temporária privada (empresarial ou cooperativa) de serviços públicos, ou mesmo de parcerias público-privadas, sempre que estas sigam regras de transparência e prudência contratual indiscutíveis.