Mostrar mensagens com a etiqueta Pequim. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Pequim. Mostrar todas as mensagens

terça-feira, junho 07, 2016

A China no Montijo?

Não é preciso nenhum luxo para ganhar dinheiro

Querem crescimento? Precisam de investimento? Basta um neurónio para lá chegar!


O DDT insistiu enquanto pôde num buraco negro chamado NAL de Alcochete. Esta insistência, que gozou do beneplácito desmiolado ou corrupto dos nossos queridos partidos políticos, do PCP ao CDS, passando pelo PS (claro!) e PSD, custou a falência da TAP.

Talvez fosse bom agora, no país falido que somos, propor a Xangai um negócio chamado aeroporto low cost e de mercadorias do Montijo, articulado com a prevista (pela União Europeia, por quem haveria de ser?) nova ligação ferroviária de mercadorias e alta velocidade Poceirão-Caia. A Ryanair agradeceria, a China ficaria contente, e Portugal teria menos angústias sempre que fala de crescimento e investimento externo.

Vendo bem, a ampliação/requalificação do aeroporto do Montijo, sobretudo se houver uma nova ligação ferroviária (UIC—vulgo, bitola europeia) entre o Pinhal Novo (Lisboa+Setúbal+Sines) e Espanha/resto da Europa, é capaz de ser um daqueles lombinhos que Pequim adoraria licitar ;)
Chineses compram aeroporto regional de Frankfurt-Hahn na Alemanha
A Shanghai Yiqian Trading vai comprar o aeroporto regional Frankfurt-Hahn, na Alemanha. Um negócio que permite à empresa assegurar uma base para a exportação de alimentos, mas também uma plataforma para passageiros vindos ou a caminho da Ásia.
A empresa chinesa vai adquirir uma participação de 82.5% por algumas dezenas de milhões de euros, sendo que a quantia ainda não foi precisada.
Este aeroporto, situado a 100 quilómetros de Frankfurt, tem tido dificuldades em atingir lucro, mas os novos donos querem impulsionar o negócio com o transporte aéreo de passageiros e mercadorias para a Ásia.
Euronews, 06/06 17:18 CET

quarta-feira, abril 09, 2014

O ministro das ventoinhas serve Mexia e Pequim, mas penaliza portugueses!

Está tudo dito, mas a inércia da corrupção é enorme


As eólicas e a biomassa - Luís Mira Amaral, Expresso dia 5 de Abril.
Segundo a ERSE, em 2013, Portugal consumiu a mesma eletricidade que em 2006, enquanto que nesse ano os famosos Custos de Interesse Económico Geral (CIEG) eram apenas de 500 milhões de euros e em 2013 foram de 2500 milhões de euros! Eis o monstro elétrico em todo o seu esplendor! Contra factos não há argumentos!
EDP emite dívida no valor de 650 milhões de euros - Público, 08/04/2014 - 16:56.

...No início de Janeiro, a empresa liderada por António Mexia já tinha anunciado a emissão de valores mobiliários representativos de dívida no montante de 750 milhões de dólares (547 milhões de euros, ao câmbio actual), com vencimento em Janeiro de 2021 e cupão 5,25%.

EDP já encaixou 3900 milhões com venda de défice tarifário (desde 2009)Público, 26/03/2014 - 21:18.

EDP adia em quatro anos barragem de 300 milhões no rio Tâmega - Jornal de Negócios, 08 Abril 2014, 00:01.

O embuste das barragens - O António Maria, 30/01/2014.

A burguesia rendeira nacional continua agarrada à lógica dos monopólios, suga sem parar a poupança e o trabalho dos portugueses, captura e corrompe continuamente o sistema partidário instalado, e espera, no fundo, o colapso da Europa e o regresso à ditadura. Não o diz, claro. Mas lá que espera, espera!

A EDP é um caso paradigmático desta lógica rentista e deste desprezo arrogante pelos contribuintes e clientes. Acontece que a pesporrência do cabotino Mexia poderá ter os dias contados. Basta ver a incapacidade estrutural da EDP para baixar a sua descomunal dívida, quase toda impingida ao grupo de idiotas que a dirige pelos piratas da Goldman Sachs sob a forma de parques eólicos americanos vendidos quando o especulador-mor da América soube que os estímulos à bolha verde, criada a partir de Wall Street, iriam terminar. Escrevemos já abundantemente sobre esta manobra financeira que atou a EDP e o governo de Sócrates a uma verdadeira transferência de dívida americana para os contribuintes portugueses. Só há uma maneira de resolver este problema: denunciar e anular a 100% e de uma só vez tudo o que na fatura elétrica paga mensalmente não corresponde a custos de energia consumida e que, por isso, são rendas inaceitáveis, sejam elas a favor da EDP, dos municípios, das regiões autónomas ou da execrável RTP.

Ainda a propósito das rendas excessivas da EDP e do alto preço que pagamos pela energia, que foi recentemente denunciado pelo novo patrão da PSA (Peugeot), Carlos Tavaraes, vale a pena ler o último e sintético artigo de Luís Mira Amaral publicado pelo Expresso, onde se resumem os argumentos que há anos vimos publicando. A energia em Portugal tem um preço excessivo, que compromete a economia, e que já teve como consequência uma escandalosa diminuição do consumo elétrico, quer das famílias, quer das empresas.

AS EÓLICAS E A BIOMASSA
Luís Mira Amaral - Professor Catedrático Convidado de Economia e Gestão — IST
Expresso dia 5 de Abril

As novas barragens não vão produzir energia, vão apenas servir de muleta às eólicas para acumular o excesso de produção da noite!

Sempre que escrevo sobre energia, o lóbi eólico, a EDP e ajudantes multiplicam-se imediatamente em artigos e entrevistas!

Agora disseram que o preço das eólicas era €70/Mwh, mas a ERSE diz-nos que era em 2013 de €102/Mwh!

Também escamoteiam sempre a intermitência do vento que leva a que as novas centrais tenham que ter sempre duas muletas, a bombagem de noite e as térmicas de reserva de dia. Obviamente que tais muletas têm de ser imputadas às eólicas e por isso temos que somar ao seu preço nominal os €62/Mwh calcula­dos no IST pelo prof. Clemente Nunes e chegamos aos €164/Mwh!

As novas barragens não vão produzir energia, vão apenas servir de muleta às eólicas para acumular o excesso de produção da noite! E a CIP veio agora chamar a atenção para os investimentos de 150 milhões de euros, pagos por nós, que têm que ser feitos na rede de transporte para a ligação de tais barragens à rede!

Segundo a ERSE, em 2013, Portugal consumiu a mesma eletricidade que em 2006, enquanto que nesse ano os famosos Custos de Interesse Económico Geral (CIEG) eram apenas de 500 milhões de euros e em 2013 foram de 2500 milhões de euros! Eis o monstro elétrico em todo o seu esplendor! Contra factos não há argumentos!

Também recentemente Mexia, para desviar as atenções sobre o alto preço da eletricidade, veio dizer que o mais importante não é o preço mas sim a segurança de abastecimento, problema que não se põe em Portugal pois temos excesso de capacidade instalada e temos excelentes interligações com Espanha. Portugal é o campeão mundial da potência eólica instalada por unidade do PIB e o terceiro em termos de eólica por habitante!

Temos infelizmente esquecido em Portugal a biomassa. A biomassa só se mete na central quando é preciso e por isso não tem as externalidades negativas das eólicas. Por isso, o preço de ven­da à rede (€120/Mwh) é aparentemente superior ao nominal nas eólicas mas inferior ao seu preço real (€164/Mwh). Assim, a eletricidade produzida pela biomassa conta para o défice tarifário com um valor inferior a 1%!

Por outro lado, cria postos de trabalho, ao contrário das eólicas em que não dominamos a tecnologia e criamos poucos empregos. Uma máquina de 15Mw cria direta e indiretamente 350 empregos. Estas centrais têm externalidades positivas dando vazão aos resíduos florestais, pagando-os a quem os entrega nas centrais, apoiando assim a limpeza das florestas e contribuindo pois para o combate aos incêndios.

Nos fogos florestais, o Governo devia atuar mais na prevenção com a limpeza das florestas, para a qual o apoio às centrais de biomassa seria muito útil, do que no combate aos fogos em que em 2013 morreram 9 pessoas, arderam 150.000 hectares e se gastaram cerca de €130M.

Infelizmente apenas temos um ministro do CO2 e das ventoinhas, quando devíamos ter um ministro para o nosso Ambiente e um verdadeiro ministro da Energia...

domingo, julho 27, 2008

China 7

Pequim. Estádio Olímpico. Junho, 2008.
Foto@OAM
O Novo Século Chinês

A China duplicará o PIB dos EUA em 2050 (Albert Keidel)

09-07-2008. China's economy will surpass that of the United States by 2035 and be twice its size by midcentury, a new report by Albert Keidel concludes. China's rapid growth is driven by domestic demand--not exports--and will sustain high single-digit growth rates well into this century.

In China's Economic Rise--Fact and Fiction, Keidel examines China's likely economic trajectory and its implications for global commercial, institutional, and military leadership.

Key Conclusions:
  • Potential stumbling blocks to sustained Chinese growth--export concerns, domestic economic instability, inequality and poverty, pollution, social unrest, or even corruption and slow political reform--are unlikely to undermine China's long-term success.
  • China's financial system, rather than a shortcoming that compromises growth potential, is one of the strengths of what the report calls "China's money-making machine," in part because of its ability to support the financing of infrastructure and other public investments necessary for sustained rapid growth.
  • A Chinese economy that eclipses the U.S. by midcentury has both commercial and potential military implications. China will be the preeminent world commercial influence. China's military capabilities are a small fraction of the United States' today, so there is time to prepare for a very different world in fifty years, says the report.
  • American policy makers should take this opportunity to enact wide-ranging domestic reforms and rethink their concepts of global order.

"China's economic performance clearly is no flash in the pan. Its growth this decade has averaged more than 10 percent a year and is still going strong in the first half of 2008. Because its success in recent decades has not been export-led but driven by domestic demand, its rapid growth can continue well into the twenty-first century, unfettered by world market limitation. China's likely continued success will eventually bring an end to America's global economic preeminence, requiring strategic reassessment by all major economies--especially the United States, the European Union, Japan, and even China itself."

-- Carnegie Endowment for International Peace, Washington DC -- FORA.tv .


Cabo Verde será sede de la Zona Económica Especial de China en África


22-07-2008. El primer ministro de Cabo Verde, José Maria Neves, anunció, en una reunión con empresarios locales, la existencia de negociaciones con el Gobierno de China para convertir la isla caboverdiana de São Vicente en sede de la Zona Económica Especial de China en África.

Según José Maria Neves, los dos gobiernos están discutiendo la reestructuración de los astilleros de la empresa privada Cabnave para que sirvan de base para apoyar la enorme flota marítima de China en sus actuaciones con África. -- Afrol News.

O relatório do economista e alto funcionário com larga experiência asiática, Albert Keidel, apresentado pelo próprio e discutido num seminário organizado pelo Carnegie Endowment for International Peace, parece-me de uma extrema importância para se perceber como a política imperial norte-americana irá começar a mudar de forma muito significativa após a eleição de Barak Obama.

Em vésperas da abertura dos Jogos Olímpicos de Pequim, com um candidato presidencial que promete salvar o país da bancarrota, do medo paranóico artificialmente estimulado e do isolacionismo sem precedentes em que caiu, os Estados Unidos (e a Europa), estão finalmente a perceber três coisas fundamentais:
  1. que a actual crise financeira mundial atinge e atingirá ainda mais profundamente, até 2010-2012, os Estados Unidos, o Japão, a Europa e os países especialmente dependentes de recursos energéticos, alimentares e financeiros;
  2. que o estouro das bolhas imobiliárias e o buraco negro do endividamento infinito criado pela especulação dos mercados financeiros virtuais (Derivatives, Forex, LBO, etc.) afectarão menos substancialmente a China do que os seus concorrentes; pelo que a China manterá o seu PIB a crescer na casa dos 9%, enquanto a Europa e os Estados Unidos dificilmente voltarão, ao longo de presente década, aos 3-3,5% a que se habituaram;
  3. que o corolário desta conjuntura catastrófica será a ultrapassagem dos Estados Unidos e da União Europeia pela China, mais cedo do que se previa.
Entre as advertências da comunicação de Albert Keidel, disponibilizada online pela FORA.tv, e que vale a pena ouvir com atenção (assim como a discussão que se lhe segue), traduzo alguns pontos acima citados.
  • Os factores potencialmente impeditivos de um crescimento sustentado da China -- quebra do volume de exportações, instabilidade económica interna, desigualdade e pobreza, poluição, agitação social, ou até a corrupção e a lentidão das reformas políticas do sistema -- dificilmente porão em causa o sucesso chinês a longo prazo.
  • O sistema financeiro chinês é, segundo Albert Keidel, uma verdadeira "máquina de fazer dinheiro", em parte devido à sua capacidade de financiar as infraestruturas e outros investimentos públicos necessários a um crescimento rápido e sustentado do país.
  • Uma economia capaz de eclipsar os E.U.A. em meados deste século terá implicações nos planos comercial e militar. A China passará a ter uma influência decisiva no comércio mundial, e embora a sua capacidade militar seja hoje uma pequena fracção do potencial bélico dos E.U.A., haverá tempo e recursos de sobra para alterar uma tal desvantagem nos próximos 50 anos (1).
  • Os responsáveis pela política americana deveriam aproveitar esta oportunidade para desencadear profundas reformas internas e repensar os seus conceitos de 'ordem global'.
A insegurança resultante das guerras e tensões que atingem o Médio Oriente, se não for encontrada rapidamente uma forma de transformar aquela zona do globo numa espécie de Suiça do petróleo, neutral, politicamente autónoma e em paz, transformará o Atlântico numa nova zona de disputa global. É por isso que a corrida económica, política e militar em direcção a este novo Mare Nostrum já começou, e com paradas muito fortes. Dois sinais evidentes: a criação em 2007 do novo United States African Command (AFRICOM), e o anúncio este mês da criação pela China da sua Zona Económica Especial de África, com provável sede na cidade do Mindelo, ilha de São Vicente, Cabo Verde.

Como é evidente, o papel de países como o Brasil, Venezuela, Angola e Portugal (na qualidade de país especialista da área e membro da União Europeia), será crucial nas disputas que se avizinham. Se olharmos para aquela região marítima, percebemos imediatamente que há dois grandes porta-aviões naturais ali residentes, de uma importância estratégica decisiva: um é o arquipélago dos Açores, o outro é o arquipélago de Cabo Verde. Igualmente importantes, mas não decisivos, são ainda os arquipélagos das Canárias e da Madeira (de que fazem parte as famosas Ilhas Selvagens.) A Europa perdeu demasiado tempo relativamente a Cabo Verde, atrasando-se na sua natural inclusão na União Europeia -- como tem vindo a propor insistentemente Adriano Moreira, por razões obviamente históricas. No que toca aos Açores, temos que explicar aos cronistas ao serviço de Washington que os Açores se tornaram demasiado importantes para continuarem livremente ao dispor do Pentágono e da CIA.

O lógico é que os aeroportos e portos dos Açores possam servir os interesses da aliança atlântica, mas primeiro esta terá que ser reequilibrada à luz da nova repartição do mundo em curso. A China poderá cumprir o seu sonho, mesmo vendo ir por água abaixo o valor dos biliões de dólares acumulados (que por sinal chegam para comprar a General Motors e centenas de outras empresas americanas); poderá continuar a crescer apesar de uma quebra das suas exportações para os Estados Unidos e para a Europa; só não poderá superar o Ocidente se lhe forem cortados os acessos marítimos ao Golfo Pérsico e ao Atlântico: Estreito de Malaca, Estreito de Ormuz, Porto de Aden, Cabo da Boa Esperança, Canal do Panamá, Estreito de Magalhães ou a prometida Passagem do Noroeste. Se estes pontos de passagem obrigatória algum dia forem bloqueados, a China deixará de ter petróleo e muitas outras matérias primas essenciais ao seu crescimento, como deixará também de ter acesso aos produtos alimentares que hoje adquire sob contrato a países africanos e americanos e de que tanto necessitará para responder ao seu previsto crescimento demográfico. O cenário é improvável, mas adivinham-se as tensões.

As cartas estão pois lançadas, e Portugal vai ter outra vez muito que fazer!



NOTAS
  1. Este relatório --China's Economic Rise--Fact and Fiction--, em linha aliás com outras previsões, aponta para a possibilidade efectiva de a China ultrapassar o potencial militar dos Estados Unidos entre 2023 e 2024. Não se consegue, porém, prever qual será o padrão dessa superioridade. Sabe-se apenas que os recursos financeiros, tecnológicos e humanos existem e continuarão a crescer mais depressa do que em qualquer outra parte do planeta. Na China formam-se anualmente 4 vezes mais licenciados do que nos EUA. Por outro lado, os sérios problemas ambientais e de recursos naturais da China, parecem estar a fazer germinar uma verdadeira "economia do conhecimento" naquele país. Uma denominação alternativa, mas igualmente sugestiva para esta mutação genética da ideologia do crescimento e do progresso, é "scientific development".


OAM 399 27-07-2008 20:20

sexta-feira, junho 13, 2008

China 2008

Pequim - Jaguar estacionado no famoso distrito das artes, Factory 798. Foto©OAM

O melhor e o pior de dois mundos

By around 2011 the lower middle class [in China] will number some 290 million people, representing the largest segment in urban China and accounting for about 44 percent of the urban population, according to our model. Growth in this group should peak around 2015, with a total spending power of 4.8 trillion renminbi [480 mil milhões de euros]. A second transition is projected to occur in the following decade, when hundreds of millions will join the upper middle class. By 2025 this segment will comprise a staggering 520 million people --more than half of the expected urban population of China-- with a combined total disposable income of 13.3 trillion renminbi [1,3 biliões de euros]. -- in "The value of China's emerging middle class", The McKinseyQuartely.

Acabo de chegar de uma viagem de trabalho e observação a Pequim. Foram nove dias e a primeira coisa que me apetece escrever é: esqueçamos Tiananmen! Da Cidade Proibida à Grande Muralha da China, passando pelo Palácio de Verão e pela múmia de Mao Tse-tung, tudo são agora ícones turísticos massivamente frequentados por passeantes como eu e sobretudo por milhões de chineses e outros asiáticos bem alimentados, elegantes e com cada vez mais tempo disponível para consumir. A China tem hoje mais milionários do que os Estados Unidos, cerca de 200 milhões de criaturas sofrendo de obesidade (Guardian), e nas ruas de Pequim circulam lentamente (pois a ninguém ocorre ultrapassar o limite de velocidade de 50Km/h) milhões de automóveis, com predominância para as marcas alemãs Audi (6 e 8...) e Volkswagen (Phaeton, Sagitar, Touareg), e uma presença crescente de veículos japoneses (Honda e Toyota) e coreanos (Hyundai e Kia). A maioria dos novos táxis são agora Hyundai Elantra em vez dos velhos Volkswagen Jetta e Santana que ainda há menos de uma década dominavam o mercado automóvel chinês.

O município de Beijing tem 16,8 mil quilómetros quadrados (seis vezes a área da Região de Lisboa e 1,4 vezes a da antiga Região de Lisboa e Vale do Tejo.) Nele vivem mais de 17 milhões de almas. A sua principal malha urbana e suburbana, delimitada por cinco anéis concêntricos, tem uma superfície de 1378 Km2 (muito próxima da área da Grande Lisboa), e 8 milhões e meio de urbanitas (6 mil hab./Km2). Para comparar esta zona central do grande município com Lisboa, teremos que imaginar uma malha urbana densa com um raio de 28 Km a partir do Terreiro do Paço, chegando até Cascais, Sintra, Mafra, Vila Franca, Alcochete, Setúbal e Sesimbra, apontando para uma densidade populacional 4 vezes e meia superior à da Grande Lisboa (Amadora, Cascais, Lisboa, Loures, Mafra, Odivelas, Oeiras, Sintra, Vila Franca de Xira), e 5 vezes e meia superior à da Região de Lisboa (Grande Lisboa e Península de Setúbal.)

Pequim é uma cidade-região, como Lisboa e Porto há muito deveriam ser, sobre a qual paira quase sempre um tecto de nuvens e poluição. O clima continental húmido é afectado pelas monções e pelas tempestades de areia vindas do deserto. É uma cidade dura (fazendo por vezes lembrar Madrid numa escala ampliada), cheia de automóveis, com grandes assimetrias sociais e uma patente multiplicidade étnica, atravessada por obras públicas e privadas em todas as direcções, mas segura e surpreendentemente limpa, sobretudo se a compararmos com Lisboa e arredores! Não falta gente para trabalhar, nem sobretudo mão-de-obra barata vinda dos arredores, bem como das províncias longínquas. Há, para surpresa de quem assimilou os estereótipos vendidos pelos média ocidentais, civismo, simpatia e alegria nas ruas. Não há pedintes por necessidade, nem muitos menos pedintes profissionais. Entre os hotéis de cinco estrelas que proliferam como cogumelos depois de um dia de chuva outonal, a presença ostensiva das grandes marcas do consumismo ocidental, os centros comerciais e o fast-food chinês, os multifacetados Hutongs -- fazendo lembrar, os mais pobres, as já quase inexistentes ilhas do Porto --, os sítios turísticos e a excitação da nova arquitectura assinada por europeus, americanos e chineses (1), predomina sobretudo a sensação de estarmos no meio dum turbilhão económico, social, tecnológico e cultural sem precedentes.

Talvez por persistirem índices elevados de analfabetismo, abunda uma espécie divertida de iconografia informativa, de que o uso do estilo Anime para dar face aos polícias e suas recomendações é talvez a mais contrastante negação da imagem autoritária fabricada, entre nós, do império do meio. Ao contrário da pose xenófoba e fascista de alguns polícias do aeroporto de Newark, os polícias do aeroporto de Beijing sorriem e pedem-nos para avaliar electronicamente a qualidade do seu desempenho. Nas ruas da capital chinesa, a presença da autoridade do Estado é praticamente residual. Se exceptuarmos o dispositivo discreto mas permanente da Praça de Tiananmen, os cidadãos parecem conseguir resolver sozinhos os problemas e conflitos do dia a dia.

Os avôs e as avós fazem Tai Chi Chuan entre as 5 e as 8 da manhã, nos jardins e alamedas da cidade, antes de receberem os netos que cuidarão ao longo da jornada de trabalho dos seus ambiciosos filhos. Reformados sem outras responsabilidades familiares prementes entretêm-se em grupo desenhando ideogramas de água no chão, jogando o YoYo, ou montando barbearias ao ar livre num qualquer jardim público às portas de um museu nacional! Outros passeiam orgulhosos os seus adorados pequineses. Automóveis, Trolleys (quanta faltam nos fazem!) e bicicletas percorrem a cidade disputando cada cruzamento como se de uma dança marcial se tratasse. Traços contínuos e passadeiras são ainda decorações urbanas a que se dão pouca importância. Mas vai mudar. Os semáforos fazem já a sua função e em menos de uma década os cidadãos de Pequim respeitarão o resto da sinalética com muito maior zelo que nós. Numa Food Republic situada no piso -2 de um centro comercial fiquei a conhecer a profusão de estilos da ruidosa fast-food chinesa, e a saber onde boa parte dos trabalhadores do sector de serviços de Pequim almoça informalmente.

Na última noite da estadia fui recebido por um grupo de artistas noruegueses na residência que alugaram num Hutong perto da Cidade Proibida. Trata-se de um pátio recuperado com estilo, por um jovem profissional chinês, francamente acolhedor, rodeado por 4 quartos, uma sala comum, uma pequena cozinha e um quarto de banho elementar. Renda mensal antes das Olimpíadas, para estrangeiros: 163 euros (2). Quem quer ir para o Allgarve?!

Aperitivos picantes e melancia acompanhados de cerveja, vinho branco e vodka precederam um jantar servido por um restaurante de bairro especializado na famosa culinária da província de Sichuan, tristemente conhecida em todo o mundo desde 12 de Maio último por causa do terramoto que ceifou mais de 100 mil vidas. Esta cozinha é sobretudo caracterizada pelo uso abundante de malaguetas picantes e da chamada pimenta de Sichuan, misturadas com alho e gengibre, acompanhando as carnes de porco temperadas com molho de peixe, o pato lacado e o frango alourado, os peixes de rio (carpas), as corvinas e os mariscos. Nesta culinária, considerada há muito pelas elites burocráticas chinesas como sendo própria de intelectuais, abunda o arroz branco, couves fermentadas, molhos de feijão doce e talos de bambu. Os elementos crus ou pré-cozidos salteados em óleo bem quente e os estufados de beringela são outras tantas notas que aqui deixo dum memorável banquete de artistas, regado com muita cerveja Tsingtao e Yanjing, aguardente branca de arroz e vinho tinto (um mercado virtualmente inesgotável para os produtores de vinho de todo o mundo, incluindo os chineses, de que o famoso Chateau de Changyu é o principal estandarte.)

Em 1415, quando Portugal conquistou Ceuta, estabelecendo aí a testa de ponte que levaria a Europa a dominar o mundo durante quinhentos anos (3), a Marinha da Dinastia Ming (1368-1664 dC) possuía qualquer coisa como 1350 navios de guerra, dos quais 400 eram fortalezas marinhas e 250, navios de longo curso. Esta formidável armada tinha, entre 1405 e 1433, sob o comando do almirante Cheng Ho, sulcado os mares da Coreia, do Japão, do Sudeste Asiático e atravessado o Índico até à costa oriental de África. Como escreve ironicamente Paul Kennedy no seu fundamental The Rise and Fall of the Great Powers, os chineses poderiam ter contornado a costa africana e "descoberto" Portugal algumas décadas antes de o Infante D. Henrique iniciar a sua extraordinária aventura, lançando marinheiros e comerciantes à descoberta e marcação da costa africana, em direcção ao Índico, até chegar à India. A viagem de circum-navegação realizada por Fernão Magalhães, ao serviço de Carlos V, provaria de vez a esfericidade do planeta, levando os primeiros europeus a descobrir o novo mar a que chamaram Pacífico. O saber de experiência feito e uma excelente cartografia levariam ainda Portugal a descobrir as Filipinas e o acesso marítimo à China, ao Japão e à Austrália. Mas então, porque ficaram os chineses para trás e foram os europeus que avançaram?

Ao longo da Dinastia Sung (960-1279 dC), e até ao ano 1436 da Dinastia Ming (1368-1664 dC), a China era de facto o maior e mais populoso país do mundo, tinha as maiores cidades e era tecnologicamente o mais avançado de quantos existiam. O seu exército e a sua marinha somavam mais de um milhão de efectivos, constituindo certamente a mais poderosa força bélica então existente à face da Terra. A China tinha inventado e usava o papel-moeda, tinha inventado e usava relógios astronómicos, tinha inventado e usava a imprensa de tipos móveis muito antes de Gutenberg, inventara a pólvora ainda antes da Dinastia Sung (960-1279 dC), produzia mais ferro do que a Inglaterra no início da Revolução Industrial (sete séculos depois!) Data também desta época a reconstrução da Grande Muralha (com tijolos de barro cozido) e a construção do sistema de canais fluviais que permitem ainda hoje fazer circular grande parte dos bens agrícolas e industriais pelo seu vasto território. O que provocou então a viragem e a decadência subsequente de tão formidável civilização?

Segundo Paul Kennedy, foi a ordem dada ao general Cheng Ho (ou Zheng He) para desactivar e depois desmantelar a marinha chinesa, em nome da concentração de forças a que teria sido necessário proceder para fazer frente à pressão crescente dos Mongóis. Enquanto a Europa sabia do Oriente e ambicionava as suas sedas, marfins, madeiras nobres e especiarias, a China desconhecia praticamente o Ocidente, bastava-se com o seu imenso território, a cuja unidade dava total prioridade, e como país desenvolvido não detectara nas incursões marítimas pelos mares vizinhos e pela costa africana oriental razão económica suficiente para manter uma tão dispendiosa armada quando a ameaça vinha uma vez mais do Norte.

Esta decisão conduziria a China paulatinamente ao proteccionismo e ao isolamento internacional, ao mesmo tempo que o poder da burocracia acabaria por hegemonizar a sociedade, fazendo murchar progressivamente os pressupostos ideológicos, materiais e jurídicos de uma sociedade economicamente ágil, intelectualmente criativa e espiritualmente livre.

O que veio depois é sabido: no século 19 a balança comercial entre a China e o Ocidente (para onde vende muito e de onde compra pouco) torna-se insustentável, nomeadamente para a Inglaterra. Esta começa então a exportar, primeiro legal, depois ilegalmente, ópio oriundo do Império Britânico da Índia (sobretudo da Birmânia) para a China. Seguiram-se como consequência as guerras do ópio, que a China perderia a favor dos ingleses, daí decorrendo um longo período de humilhações que levaria ao fim das dinastias, à proclamação da república, à guerra civil e à revolução. Depois da morte de Mao, Deng Xiaoping estabelece para a China uma rota de abertura progressiva ao mundo, baseada na permanência de um Estado burocrático centralizado e autocrático, na tradição não apenas da revolução comunista de Mao, mas sobretudo da longa história dinástica do país, e na adopção de uma dita economia socialista de mercado.

"Um país, dois sistemas", foi a proclamada fórmula mágica para o rápido progresso da República Popular da China. O melhor e o pior de dois mundos: por um lado, a agilidade de uma economia politicamente subordinada e com largos sectores sob comando único do Estado, por outro, a energia injectada nessa mesma economia pela regras típicas da emulação capitalista e pela armadilha do consumismo. Como pano de fundo, um inesgotável exército de mão de obra barata, que noutros tempos servira já para construir caminhos de ferro e estradas na América e em África, e hoje alavanca a custos imbatíveis a entrada da China na era da globalização. O seu crescimento anual, revisto em baixa de 10,8% para 9,6% (Sino Daily), ou mais recentemente, de 11,9% para 9,8% (EFE/Folha de São Paulo), começa entretanto a ser ameaçado por uma inflação (China Daily) que em Abril deste ano chegou aos 8,5% relativamente ao mesmo mês de 2007, e que só não é maior porque em Pequim e no resto da China os automobilistas e os transportadores ainda não ouviram falar do aumento dos preços da gasolina e do gasóleo! Na realidade, não fora a máscara estatística, ter-se-ia que situar a inflação actual como uma das mais sérias ameaças ao tão anunciado, mas improvável, século chinês.

O consumismo do século 21 poderá vir a ser para a nova China um perigo tão grande ou maior do que o ópio com que os ingleses procuraram no século 19 reequilibrar a sua balança comercial, e sobretudo escavacar a unidade daquele imenso país. Talvez por isso, a marinha de guerra e a marinha mercante chinesas estejam hoje a crescer mais depressa do que quaisquer outras armadas conhecidas. É que boa parte da energia e matérias primas necessárias à nova economia e às legítimas expectativas sociais da China de Hu Jintao encontra-se longe das suas fronteiras. O acesso a tão preciosos e cada vez mais escassos bens dependerá sobretudo de uma formidável marinha mercante... e de uma convincente marinha de guerra que a defenda.



REFERÊNCIAS
  1. China no World Resources Institute

NOTAS

  1. National Centre for the Performing Arts, de Paul Andreu; Estádio Nacional de Beijing, da dupla Herzog & De Meuron; nova sede e estúdios da principal cadeia de televisão chinesa; CCTV, do OMA (Rem Koolhaas e Ole Scheeren); Torre 3 do World Trade Centre, concebido por Skidmore, Owings & Merrill (SOM), hoteis Mandarin Oriental, do OMA e Kapok, do Studio Pei Zhu; Linked Hybrid, de Steven Holl.
  2. Este é certamente um preço excepcional, mas ainda assim é possível alugar um apartamento dentro dos dois primeiros anéis da cidade, com 60-80mq, por 250 euros mensais; ou alugar pela Net um pátio com 300mq, 3 quartos e um living, num Hutong situado no centro histórico, por 800 euros mensais; ou finalmente alugar diariamente uma Suite de luxo num Hutong a 3Km da Cidade Proibida, para 2 pessoas (+ 2 crianças pequenas) por 54 euros/dia. Uma noite no Wangfujing Grand Hotel, de 5 estrelas, a dois passos da Cidade Proibida, custa 55 euros, com pequeno almoço (buffet chinês e ocidental) incluídos.
    Embora possamos considerar que os preços são em geral baratos quando comparados com as economias do euro, não são assim tão baratos quando comparados com outras moedas menos fortes. Por outro lado, há uma enorme disparidade preços, podendo-se ir facilmente do razoavelmente barato ao inesperadamente caro. Eis uma lista que compilei rapidamente a partir de algumas facturas que consegui conservar:

    1 noite no Wangfujing Grand Hotel (5 estrelas) c/ pequeno almoço, junto à Cidade Proibida = 55 euros
    1 jantar no Wangfujing Grand Hotel, buffet italiano, japonês e chinês, acompanhado de chá verde = 13 euros
    1 jantar a la carte no centro da cidade: 17,4 euros
    1 almoço no Food Republic (c/ caneca de cerveja) = 4 euros
    1 café no lobby do Wangfujing Grand Hotel = 3,9 euros
    1 café expresso no Starbucks = 1 euro
    1 garrafa de chá verde (1/2 litro) numa loja de bairro = 28 cêntimos de euro
    1 garrafa de chá verde (1/2 litro) num restaurante junto à Grande Muralha (Simatai) = 1,8 euros
    1 cerveja Tsingtao numa loja de bairro = 64 cêntimos
    1 caneca de cerveja Tsingtao no lobby do Wangfujing Grand Hotel = 4,7 euros
    Bandeirada de táxi = 94 cêntimos; cada Km = 0,19 cêntimos; em espera = 0,09 cêntimos/min.

    Para mais informações consultar esta página de referência sobre Pequim: The Beijinger.
  3. A partir de 1915 os EUA emergem na cena mundial, virando rapidamente a seu favor o render da guarda do imperialismo europeu. Por junto, o imperialismo ocidental, de raíz judaico-cristã, durará cerca ou pouco mais de 600 anos.
OAM 376 14-06-2008, 20:03 (última actualização: 19-06-2008 09:36)