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quinta-feira, julho 19, 2007

Aeroportos 31

Lóbi da Ota especula com desastre de Congonhas

Uma nova tragédia aérea esteve iminente ontem de manhã (19-07-2007) no Aeroporto de Congonhas, na zona sul da cidade de São Paulo, onde no dia anterior um Airbus 320 da empresa brasileira TAM derrapou ao aterrar e colidiu com um prédio da própria empresa no outro lado da avenida, matando cerca de 200 pessoas. Um avião também da TAM, desta feita um Fokker 100 cheio de passageiros, abortou a aterragem no último instante, quase quando tocava a pista, indo aterrar, 15 minutos depois, no Aeroporto Internacional de Cumbica, em Guarulhos, na área metropolitana. - Correio da Manhã, 20-07-2007.

A Ana Lourenço, cuja performance jornalística tem vindo a subir a pique desde que começou a operar a solo, não esteve bem nos telejornais de quarta-feria à noite (18-07-2007) da SIC Notícias. Não esteve, de facto, nada bem na entrevista a Marques Mendes. Parecia ausente e quase disléxica. Percebi depois o que se teria passado: foi forçada a fazer um frete ao director daquele canal de televisão, Ricardo Costa, a propósito da tragédia aérea de São Paulo. Pior ainda, tal frete terá sido uma encomenda da agência de comunicação João Líbano Monteiro, contratada pela NAER para propagandear o NAO (novo aeroporto da Ota), e resumiu-se ao seguinte: entrevistar uma das muitas ratas de sacristia do lóbi da Ota, neste caso a que dá pelo nome de Comandante Sousa Monteiro, para conseguir provocar um paralelismo alarmista entre o desastre aéreo de Congonas, que vitimou até agora 184 pessoas, com os supostos perigos de manutenção do aeroporto da Portela onde está.

Sousa Monteiro é um desses morcegos mediáticos que, como outros opinocratas do estilo, costumam levantar voo ao fim da tarde para zunirem litanias sobre assuntos de que são supostamente especialistas, mas que servem invariavelmente interesses poderosamente alavancados por finanças sem fundo. Têm quase sempre um ar decadente e sedento de sangue fresco. São, na realidade, Nosferatus de pacotilha. O grave é que os MCS que temos e as agências de comunicação que operam a intermediação dos tráficos de influências, actuem impunemente e sobretudo revelem uma ausência completa de ética institucional e de vergonha profissional. Em vez de ouvirem representantes oficiais das profissões envolvidas, no caso do desastre aéreo brasileiro, pilotos, construtores de aeroportos e gestores, preferiram consultar um cadáver. O cadáver salivou uns hieróglifos venenosos sobre as semelhanças (inexistentes!) entre o aeroporto de São Paulo e o aeroporto de Lisboa, curiosamente depois da "deixa" de Ana Lourenço, e o efeito pretendido pela Líbano Monteiro foi, em suma, conseguido. O cheque da NAER (pago por todos nós!) chegará seguramente a horas.

Sobre aquele que é considerado o mais mortífero acidente aéreo da América Latina, falta saber ainda o essencial: que sequência de erros provocou o acidente? Só depois de aberta e analisadas as gravações da "caixa negra" do avião é que haverá dados seguros para uma avaliação do sucedido. Até lá, compreensivelmente, as instituições e as pessoas responsáveis escusam-se a tecer comentários, que serão sempre levianos. Só mesmo a SIC de Ricardo Costa teria a falta de tino e bom gosto para se adiantar numa comparação disparatada entre a tragédia de São Paulo e os perigos da Portela, onde, como se sabe, em 65 anos de operação ininterrupta, apenas houve um acidente mortífero, e mesmo esse foi, como toda a gente sabe, uma sabotagem destinada a assassinar o primeiro ministro e o ministro da defesa de Portugal.

O aeroporto de Congonhas, sendo o principal aeroporto doméstico brasileiro e aquele que movimenta mais passageiros por ano (15 milhões), encontra-se no meio de um dos mais populosos bairros da cidade de São Paulo, a ponto de o seu endereço ser a Avenida Washington Luís! As pistas estão à mesma cota da cidade que o rodeia, parecendo mais uma das suas alamedas (ver mapa), o que não sucede obviamente na Portela (1). Congonhas tem duas pistas: a 17R/35L, com 1939 metros (aquela onde se deu o despiste fatal), e a pista 17L/35R, com 1436 metros. A Portela, por sua vez, também tem duas pistas, só que bem maiores e com escapatórias mais extensas: a 03/31, com 3805 metros, e a 17/35, com 2400 metros. O aeroporto doméstico de São Paulo, onde outro desastre fatal, em 1996, vitimou 99 pessoas, tem sido palco de numerosos incidentes e pequenos acidentes, ao contrário do aeroporto da Portela, onde felizmente, até hoje, não houve nenhum problema de segurança digno de referência. Um acidente aéreo é sempre possível, mas pouco provável. Quando ocorre, o número de vítimas é imprevisível, e dado que a maioria dos aeroportos estão nas imediações das cidades, as quais, por sua vez, tendem sempre a crescer na direcção daqueles, por mais distantes que tenham sido inicialmente localizados, não faz qualquer sentido, e é mesmo escandaloso, provocar o alarme social, usando os poderosos meios de comunicação de massas, a este respeito. Se ainda por cima, tais "actos noticiosos" se revelarem como puras operações de contra-informação, destinadas a vender um dado produto com a chancela de um organismo público, então estamos perante um óbvio delito de abuso de poder, o qual deve ser averiguado e punido exemplarmente se se comprovar ter havido intenção de manipular a natural credulidade dos cidadãos.

A tentativa de aproveitar a tragédia de Congonhas para prosseguir um marketing desonesto a favor da construção de um novo aeroporto na Ota deve ser condenado como um acto macabro e como uma inadmissível demonstração do abuso de poder que começa a campear na nossa democracia. Se a agência de comunicação contratada pela NAER para vender o embuste da Ota foi efectivamente responsável por induzir a esquálida criatura chamada Comandante Sousa Monteiro a dizer os disparates que disse a pedido de Ana Lourenço, creio que alguma instituição deste país terá a obrigação de investigar o caso e esclarecê-lo cabalmente.

Post scriptum - Parece difícil de crer, mas é verdade: a TAM é uma companhia de aviação sem os mínimos requisitos de segurança! Muito mais mortífera do que a TAAG angolana... por exemplo! Que pensam os eurocratas de Bruxelas desta comparação inevitável?
Para além dos óbvios problemas de segurança decorrentes da péssima manutenção dos aeroportos brasileiros, a cargo da Infraero, uma empresa pública irresponsável, provavelmente sub-financiada e com dívidas monumentais (tudo suposições razoáveis que não tenho tempo de verificar, mas que os jornalistas portugueses fariam bem investigar --em vez promoverem as operações de contra-informação do lóbi da Ota), a TAM é uma empresa inqualificável. Para quando a sua interdição, Senhor Lula da Silva?

Portugueses que viajam para o Brasil, cuidado com os voos internos!!
Ver este incrível Power Point sobre os sucessivos desastres da TAM, um dos quais vitimou o próprio dono desta companhia aérea!!!



Notas
1 - "A pista mais pequena do aeroporto da Portela, em Lisboa, a 17/35, tem 2400 metros e a do Funchal, na Madeira, 2631 metros. 'O aeroporto de Congonhas é doméstico, realiza apenas voos de ligação das companhias brasileiras, e a pista tem 1940 metros, ou seja, a pista mais pequena da Portela, que é um aeroporto internacional, tem mais 500 metros que a de Congonhas', explicou ao CM o comandante Cruz dos Santos, da Associação Portuguesa de Pilotos de Linha Aérea." in O Correio da Manhã, 20-07-2007.

Actualizações

20-07-2007, 22-07-2007


OAM #225 19 JUL 2007