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quarta-feira, novembro 27, 2013

Banco de Portugal?

Público, Foto: Nelson Garrido

A banca é a melhor aliada da dívida pública!

Banco de Portugal afirma que a carga fiscal conjugada com cortes nos salários e pensões vai afetar rendimento disponível em 2014. E avisa que a consolidação orçamental não é amiga do crescimento do emprego e constitui uma ameaça à própria estabilidade financeira do sistema bancário. Diário de Notícias, 27/11/2013.

O Banco de Portugal foi um banco privado até 1974. E depois desta data, apesar de ter sido nacionalizado pelo PREC, e de ser um banco central público, ao contrário, por exemplo, da Reserva Federal americana, que continua a ser um cartel privado de banqueiros, o BdP é, na realidade, uma entidade que vela, em primeiro lugar, pelos interesses do cartel bancário nacional. É tendo bem presente esta ideia que devemos ler o aviso de Carlos Costa (ex-BCP, ex-CGD, ex-BEI) sobre o recessivo Orçamento de Estado ontem aprovado no parlamento.

Em vez de exercer uma ação punitiva clara e determinada junto da banca privada que desgraçou o país ao proteger e alimentar-se da corrupção que galopou desde meados da década de 1990, financiando, com endividamento público e externo, de forma especulativa, investimentos sem retorno e uma partidocracia voraz, ignara e irresponsável, o Banco de Portugal vem dizer agora que quer continuar a ter uma Administração Pública sobre-endividada. Porquê? Eu digo: porque é a principal mama financeira da banca comercial que temos. Ou seja, uma vez que a banca comercial não coloca um cêntimo na economia, apesar da propaganda vigarista que vemos por aí, a sua principal fonte de estabilidade indolente é o endividamento público!

O mecanismo é basicamente este: o Estado emite dívida pública, os bancos indígenas compram essa dívida com dinheiro emprestado pelo BCE, que fica com os títulos como garantia. Os bancos indígenas cobram ao Estado português juros muito superiores aos juros que pagam ao BCE, e este, por sua vez, cobrando um juro mínimo à cabeça, contorna os tratados da União e aumenta assim a massa monetária no SME. Ao que parece, esta é a única maneira que Mario Draghi conhece para forçar os países a pagar as suas dívidas, nomeadamente, aos grandes especuladores globais: JP Morgan, Goldman Sachs, Bank of America, Citi, HSBC, Deutsche Bank, Barcleys, etc.

Por sua vez, o dinheiro da Troika chamada a intervir nos países à beira da bancarrota, cobra juros bem mais elevados do que os juros que o BCE cobra aos bancos comerciais, e serve, no essencial, para obrigar os estados a devolverem aos investidores que apostaram de forma aventureira ou especulativa no endividamento público de vários países, os seus capitais e os juros na sua totalidade, retirando, assim, todo o risco às operações realizadas, como se o risco não fosse a essência do jogo capitalista e da especulação financeira!

Pior: os bancos comerciais portugueses, como não emprestam um cêntimo à economia real (continuam, no entanto, a ‘viabilizar’ operações financeiras puramente especulativas, como se viu ontem na aquisição parcial da Soares da Costa e da Controlinveste Media pelo senhor Mosquito), colocam o excesso de reservas (1) no próprio BCE, cobrando um juro exíguo mas seguro, em vez de arriscar o tal cêntimo que não investem na economia real.

Como se diz na gíria do economês, os mecanismos de transmissão do sistema financeiro para a economia deixaram de funcionar. O aumento da massa monetária nos EUA, como na Europa e no Japão, é um circuito fechado que retira rendimento aos salários, pensões e subsídios, que bloqueia financeiramente a economia, destrói centenas de milhar de empresas em todo o mundo, provoca centenas de milhões de desempregos, e que tem por único fim forçar os contribuintes a pagar o que devem e o que não devem, em nome da estabilidade dos bancos e dos governos que estes controlam.

Este embuste está, porém, a destruir as sociedades e ameaça perigosamente a estabilidade dos regimes democráticos americanos e europeus. É por isso que, tanto nos Estados Unidos, como na Europa, se buscam soluções de compromisso que, nomeadamente, garantam o financiamento da economia real. O banco central americano anunciou recentemente a sua intenção de fazer duas coisas: deixar de pagar juros pelos excessos de reservas bancárias depositadas no Fed, assim como diminuir a quantidade de dinheiro colocado à disposição dos mercados finaneiros para comprarem e especularem com a dívida americana. A ideia destas medidas é estimular, finalmente, a transmissão de liquidez à economia. Na Europa, o BCE espera pela Grande Coligação alemã para saber o que vai fazer. E em Portugal, há tempos, falou-se muito da criação de um Banco de Fomento, destinado a financiar a economia real, em vez de continuarmos a criar apenas mais dívida em nome do monstro estatal e das clientelas que dele vivem. Os bancos privados opuseram-se, claro, pois tal ameaçaria o seu bem estar indolente. E o senhor Costa do BdP, que eu saiba, assobiou para o ar.

Em vez de atacar o problema da asfixia económica do país agarrando o touro pelos cornos, o governo cobarde de Passos Coelho preferiu a falácia de colocar o quadro comunitário de apoio de 2014-2020 ao serviço da economia, chamando o seu controlo ao Terreiro do Paço, na pessoa dum jovem maduro que começa a cair de podre e fala cada vez mais como os disléxicos procuradores da república que temos. Na realidade, não vejo como é que a Comissão Europeia irá autorizar um governo nos bolsos da banca e das tríades indígenas a desviar verbas, com destinos previamente desenhados, para pequenas e médias empresas que normalmente fazem parte dos grandes grupos de sempre e são escolhidas a dedo.

A menos que a posse da Grande Coligação da Alemanha ilumine Mario Draghi, e algo parecido com um Banco de Reconstrução Europeia surja no horizonte para financiar de modo meticuloso (diria mesmo, marcial) a economia europeia, a situação tenderá a piorar. No caso português, a coisa poderá agravar-se ao ponto de ficarmos sem outra solução que não seja um Quantitative Easing à chinesa, isto é, a introdução no país, por um longo período, de medidas expressas e apertadas de controlo de capitais, as quais forçarão imediatamente os bancos a deixarem de brincar ao Monopólio, começando, por fim, a emprestar dinheiro à economia real — isto é, à economia produtiva, de bens materiais e serviços com valor acrescentado.


NOTAS

  1. Os depósitos bancários e os empréstimos do BCE são ambos dinheiro emprestado ao banco, o qual vence, de uma forma ou doutra, juros. Logo o banco não pode ter estas reservas paradas. Tem que as por a circular, isto é a render, ou seja, tem que aplicar o dinheiro que recebe, sob pena de o banco negar o próprio negócio e começar a ter prejuízos. Aliás, é emprestando um certo número de euros por cada euro que é depositado, que os bancos criam literalmente dinheiro do nada, na expectativa de que os investimentos tragam retornos que farão do nada criado dinheiro a sério! Se este mecanismo se rompe, como se rompeu desde 2008, e não mais retomou a normalidade, os bancos ficam à mercê dos bancos centrais, vivendo numa espécie de indigência para ricos. Claro que alguns deles acabarão mesmo na falência, e até na miséria. Em Portugal, pelo menos um destes banqueiros já sucumbiu à pressão dos acontecimentos. É por esta razão que o pseudo Banco de Portugal fez hoje este alerta ao Tribunal Constitucional sobre as pensões e sobre os cortes salariais nos dependentes diretos do Orçamento de Estado. Os bancos comerciais e os especuladores vivem hoje, essencialmente, da explosão especulativa das dívidas soberanas. E o PCP não vê isto? Ou será que, como Lenine um dia defendeu, aposta na hiperinflação monetária?

sexta-feira, outubro 10, 2008

Crise Global 37

Nada parece resultar!

O Plano Paulson fracassou
A descida concertada dos juros nos EUA, Europa e Japão fracassou
Wall Street continua em queda livre:
  • DOW (09-10-2008): -678,91
  • GM:-31%
  • Ford:-22%
  • XL Capital Ltd.: -53%
  • Exxon Mobil: -11,688%
  • Morgan Stanley: -26%
Ásia e Europa vão pelo mesmo caminho:
  • Tóquio (9-10-2008): -9,62%
  • Xangai (10-10-2008): -3,57%
  • NIKKEI (10-10-2008; 15:00): -881,06
  • Dj STOXX 50 (10-10-2008; 12:18): -183,77
  • PSI20 (10-10-2008 14:23): -8,45%

O G20 reúne extraordinariamente este Sábado depois de Bush ter telefonado anteontem mesmo a Lula da Silva (será que o famoso AMERO vem aí?) Entretanto, Washington declara-se disponível a negociar com os Talibãs do Afeganistão. É o desespero que a pouco e pouco toma conta do império. Nunca o mundo experimentou tamanho colapso financeiro. E o pior é que estamos ainda na fase preliminar do grande estouro.

A reunião do G20 é o primeiro sintoma sério de que uma nova globalização desponta no horizonte. Os Estados Unidos e a Europa parecem estar a perceber finalmente que não podem salvar-se do tsunami financeiro em curso sem reconhecer de uma vez por todas o Outro da globalização, i.e 4/5 da humanidade!

No imediato, e no que à crise financeira se refere, a contínua desvalorização das taxas de juro de referência dos bancos centrais não passa duma armadilha fatal, na medida em que leva à destruição pandémica das poupanças, sem por outro lado gerar a tão almejada liquidez que a economia e os Estados precisam desesperadamente para sobreviver. Enquanto não houver confiança, enquanto não se souber com clareza o que levou o mundo à actual parálise, enquanto não for lançado um bloqueio aos paraísos fiscais, persistirá a actual e escandalosa discrepância entre o preço nominal do dinheiro (3,75% na Zona Euro) e o seu preço real (13% e mais, dependendo se estamos a pagar empréstimos pessoais de emergência ou certos atrasos no pagamento dos cartões de crédito!)

No caso português, temo que os problemas de tesouraria das empresas e do Estado comecem a deteriorar-se muito rapidamente e que acabemos por ter um Natal desolador. A solidez das garantias bancárias que o governo Sócrates confirma de modo persistentemente ambíguo e demagógico, não sossega ninguém, sobretudo sabendo-se que o nível máximo de garantias dos nossos bancos estão 50% abaixo do valor prometido pelos bancos espanhóis, já sob protecção oficial de Zapatero e do Banco de Espanha. O fundo de garantia de depósitos do Banco de Portugal não foi estendido, ao contrário do que sucede noutros países europeus, a outro tipo de poupanças, como os PPRs e os seguros de saúde.

Em tais circunstâncias, não vejo como irá o governo impedir que dentro de semanas milhares de aforradores retirem o dinheiro dos bancos portugueses, seja por transferência para bancos alemães ou espanhóis sediados no nosso país, seja para aplicações em ouro e outras "commodities" de refúgio. O ouro fino está neste momento subavaliado por pressão dos governos e bancos centrais euro-americanos, mas a percepção crescente de que a economia virtual dos casinos cambiais caminha para um buraco negro (o buraco dos Derivados) levará inevitavelmente à sua reavaliação nos dias, semanas e meses mais próximos.

A boa notícia é que Portugal, onde a bolsa (PSI20) perdeu metade do seu valor ao longo dos últimos seis meses (1), tem reservas de ouro significativas (12,3 milhões de onças Troy, i.e. 382,572.764.64 toneladas), com um valor estimado de $10.505.430.000 (14-10-2008). Ocupa aliás a 11ª posição entre as reservas nacionais deste metal precioso. A má notícia é que o ouro português representa 85% das reservas externas (sendo os restantes 15% compostos por Direitos Especiais de Saque e moeda estrangeira), ou seja, desde os tempos de Salazar pouco ou nada fomos capazes de acumular. Portugal tem uma enorme dívida pública, patente no desequilíbrio da balança de pagamentos e no pesado défice comercial com o exterior. Para fazer face às dividas, a única contrapartida sólida para a obtenção de empréstimos é precisamente o ouro disponível que ainda temos. Resta saber que parte das 382,5 toneladas não foi ainda comprometida com empréstimos anteriores. O senhor Constâncio tem obrigação de esclarecer o país sobre este ponto crucial da nossa real situação financeira.

Uma última observação sobre o ouro: é muito provável que a pesquisa e produção deste metal volte a ter alguma importância nas actividades extractivas do país.


ÚLTIMA HORA
  • Banco Espírito Santo ajuda a empurrar Ibex-35 para perdas históricas

    Madrid, 10 Out (Lusa) -- O Banco Espírito Santo está a ser hoje decisivo no comportamento dos principais stocks no Ibex-35, que continua em quedas acentuadas, e em duas horas e meia de negociação vendeu já títulos no valor de 170 milhões de euros.

    Comentário: Rui MVS, com a mordacidade habitual, adiantou: "Lá vai ter a CGD de vender na próxima 2ª Feira mais uns anéis."
    A Angela Merckel mandou os pequeninos à fava. Sempre quero ver agora quem irá salvar a banca portuguesa quando passar da propaganda à realidade. Nem o Edu de Luanda tem cabedais para tanto!

  • S&P alerta para falências da General Motors, da Ford e da Chrysler
    Publicado a: 11:37, 10-outubro-2008 (Diário Económico)

    A agência de notação internacional Standard & Poor's (S&P) alertou hoje para o facto das fabricantes automóveis norte-americanas General Motors, Ford e Chrysler poderem ser forçadas a declarar falência devido ao abrandamento económico global e à quebra das suas vendas nos Estados Unidos.

  • Japão: Seguradora Yamato entregou hoje o seu pedido de falência

    2008-10-10 11:00 (Diário Económico) A Yamato Life Insurance, uma das maiores instituições financeiras do Japão, pediu hoje aos tribunais a protecção dos seus credores, pois enfrenta sérios problemas de solvência, acumulando uma dívida de mais de 269,5 mil milhões de ienes (dois mil milhões de euros).

NOTAS
  1. Bolsa nacional perde perto de 20% em cinco dias na pior semana de sempre
    Nuno Carregueiro e Sara Antunes

    10-010-2008 11:58 (Jornal de Negócios) A bolsa portuguesa está hoje a descer mais de 6%, elevando a perda semanal para perto de 20% e o prejuízo no ano para mais de 50%. Esta está a ser a pior semana de sempre para o PSI-20, que acompanha o descalabro nas bolsas mundiais devido aos receios de uma recessão económica mundial e mais falências empresariais.


OAM 457 10-10-2008 03:15 (última actualização: 14-10-2008 11:30)

quarta-feira, maio 28, 2008

Petroleo 17

Reservas de Petróleo da Arábia Saudita
"Uma interpretação curiosa deste gráfico é que de alguma forma a crise dos anos 70 era inevitável. O consumo e a produção saudita estavam a crescer a um ritmo de tirar a respiração, mas insustentável. As crises de 1973 e 1979 serviram para cortar drasticamente o consumo, e só quando a procura chinesa e mundial voltou a disparar 25 anos depois é que a Arábia Saudita se deparou de novo com os seus próprios limites de recursos e capacidade de produção. Se conseguirem retomar os níveis mais elevados da sua capacidade produtiva potencial, isso apenas assegurará que os futuros declínios ocorrerão a taxas superiores a 2%." - Phil Hart.

Re-nacionalizar os recursos estratégicos, já!
"As proclamadas reservas petrolíferas da OPEC estão sobre-avaliadas em cerca 340 mil milhões de barris (Gb). Encontram-se com elevada probabilidade mais perto dos 570 mil milhões de barris, do que dos anunciados 904 Gb. Combinando este valor com as estimativas do Oil and Gas Journal sobre as reservas fora da OPEC, na ordem dos 280 Gb, chegamos a uma base global das reservas comprovadas e provavelmente existentes na ordem dos 846 mil milhões de barris, bem abaixo dos 1140 mil milhões que foram sendo assumidos como dados pela economia nos últimos anos." - Oil Reserves: Where Ghawar goes, the rest of OPEC follows, Phil Hart, 27 Maio 2008.

Isto significa que, se não houver em breve uma quebra acentuada do consumo petrolífero mundial, que vai na ordem dos 85,7 milhões de barris por dia / 31.280,5 milhões por ano (dados confirmados relativos a 2007), e por conseguinte o mundo continuar a consumir esta quantidade astronómica de petróleo, o mesmo esgotar-se-à por volta de 2035. Mas muito antes desta data fatídica ocorrer, a economia do petróleo chegará ao fim se entretanto não houver uma sucessão de crises cujos resultados sejam uma dramática redução dos consumos deste ouro negro. O ano 2020 tem sido apontado como o da grande ruptura, e o ano da graça em que estamos ficará para a História como o da percepção planetária do Pico Petrolífero, bem como do início da queda irremediável dum paradigma energético. Até lá veremos de tudo um pouco: crises económicas assimétricas de proporções gigantescas, fome extrema, destruição das classes médias nos Estados Unidos e na Europa, conflitos bélicos em cascata, guerras civis e, finalmente, se não travarmos os falcões deste mundo, a III Guerra Mundial... nuclear!

Este é o meu décimo sétimo artigo sobre o assunto. No primeiro deles - OAM, 16 de Outubro de 2004 -, pode ler-se:
A produção de petróleo per capita começou a declinar de forma consistente em 1979, e o início da queda absoluta da produção a nível global começará, segundo Richard C. Duncan, em 2006 (a uma taxa de 2.45% ao ano, durante 34 anos!). Quer dizer, daqui a um ano e meio, poderemos estar já a lidar com preços de crude na ordem dos 100 dll/barril. Em 2008, ainda segundo as previsões de Duncan, as reservas de países como os EUA, México, Noruega, Angola, Rússia, Afeganistão, Urzebequistão, Azerbeijão, etc., começarão a decair mais depressa que as reservas da OPEC (Venezuela, Nigéria, Líbia, Argélia, Arábia Saudita, Emiratos Árabes Unidos, Qatar, Kwait, Irão, Iraque e Indonésia), colocando estes países numa clara posição de supremacia energética, mas também no centro de gigantescas disputas estratégicas.

Já depois de o petróleo ter ultrapassado a barreira psicológica dos 60 USD, - OAM, 01 de Novembro de 2005 -, escrevia:
A profecia da Ota | 22 de Novembro de 2009: Primeira Ministra anuncia abandono definitivo do aeroporto da Ota depois de o barril de crude ultrapassar esta semana a barreira psicológica dos 150 Euros.

Como se vê errei por pouco! Se Manuela Ferreira Leite for primeira ministra em 2009, provavelmente anunciará o fim do novo aeroporto de Alcochete, o fim da Terceira Travessia, o adiamento sine die da linha de Alta Velocidade entre Lisboa e o Porto, e mesmo, se houver alguma grande complicação no interior da União Europeia, por exemplo, em volta duma agressão americana-israelita ao Irão, a interrupção de todo o projecto de Alta Velocidade.

A actual discussão em volta da carga fiscal que pesa sobre os produtos petrolíferos ganhou novo e dramático fôlego com a possibilidade real de uma sincronização dos protestos e boicotes à escala europeia, anunciada pelas frotas pesqueiras do Sul da Europa, mas que se estenderá muito provavelmente ao sector do transporte rodoviário de mercadorias, e depois aos automobilistas de toda a Europa. Foi isso que pôs Sarkozy em pânico e o levou a propor in extremis à Comissão Europeia a suspensão temporária do IVA e ISP sobre as gasolinas e os gasóleos. Se a medida vai ou não para a frente dependerá sobretudo desta novidade democrática chamada sincronização europeia das lutas sociais. Bastará que os barcos de pesca fiquem nas praias portuguesas, espanholas, francesas, gregas e italianas para que a desejada sincronização seja alcançada e o movimento alastre a outros sectores. O efeito de contágio e sincronização daqui resultantes mergulhará a União Europeia na sua primeira crise global!

Se este cenário ocorrer, a Europa sofrerá um crise instantânea de proporções difíceis de prever neste momento. Só vejo uma saída para tamanho aperto: reverter os processos de privatização de alguns sectores estratégicos da economia: energia, transportes, segurança social e mesmo parte do sistema bancário (caixas de aforro urbano, caixas agrícolas.) Seria a resposta da Europa ao repto lançado por países como o Japão, a China, a Rússia, os Países Árabes, Angola e a Venezuela, onde predominam as economias Estado e centralismos políticos não-democráticos. Seria o regresso claro ao proteccionismo. Seria o regresso a uma acelerada corrida aos armamentos. E seria, sobretudo, aproveitar de forma expedita e determinada o que resta da supremacia europeia no actual desconcerto das nações. Nem quero pensar na trapalhada que vai ser!

Mário Soares fez um diagnóstico que está feito há muito. Basicamente para ver se salva o PS do afundamento eleitoral mais do que certo em 2009. No entanto a insolência do dromedário da Ota, Mário Lino, emendada pelo rastejar cínico do pirata porta-voz da tríade de Macau, Vitalino Canas, e do alter ego sibilino de José Sócrates, Pedro da Silva Pereira, mais as advertências patéticas do des-governador do Banco de Portugal, deram um bom espectáculo da desorientação completa que se apoderou do governo. Então ninguém sabia de nada? Não lêem os meus posts?! Ora bolas!!

Não deixa de ser surpreendente verificar que não foi apenas toda a nossa desgraçada classe política que andou a dormir na forma. No World Energy Outlook 2005 da International Energy Agency (IEA) pode ler-se esta previsão inacreditável e bem reveladora da política de avestruz que tem caracterizado a generalidade das instâncias oficiais do poder mundial:
"Assumptions about international energy prices have been revised significantly upwards in WEO-2005, as a result of changed market expectations after years of underinvestment in oil production and the refinery sector. The average IEA crude oil import price, a proxy for international prices, averaged $36.33 per barrel in 2004 and peaked at around $65 (in year-2004 dollars) in September 2005. In the Reference Scenario, the price is assumed to ease to around $35 in 2010 (in year-2004 dollars) as new crude oil production and refining capacity comes on stream. It is then assumed to rise slowly, to near $39 in 2030. In the Deferred Investment Scenario the oil price reaches $52 in 2030." -- IEA.

Referências

* A IEA deixou escapar há dias para o Wall Street Journal uma revisão dramática das suas erradas previsões, na base das quais, sublinhe-se, a malta do business as usual tece as suas decisões especulativas, e a maioria dos governos e muitos políticos distraídos compõem os seus sound bite.
Energy Watchdog Warns Of Oil-Production Crunch

May 22, 2008. The world's premier energy monitor is preparing a sharp downward revision of its oil-supply forecast, a shift that reflects deepening pessimism over whether oil companies can keep abreast of booming demand.

The Paris-based International Energy Agency is in the middle of its first attempt to comprehensively assess the condition of the world's top 400 oil fields. Its findings won't be released until November, but the bottom line is already clear: Future crude supplies could be far tighter than previously thought. -- IEA Official Says Supplies May Plateau Below Expected Demand. By NEIL KING JR. and PETER FRITSCH.

* Entretanto, um leitor atento enviou-me uma entrevista, de leitura obrigatória, ao economista-chefe da Agência Internacional de energia, reveladora da profunda mudança de perspectiva desta importante instituição. É algo longa, mas fundamental!

Entrevista a Fatih Birol : "Deixemos o petróleo antes que ele nos deixe"
Por Astrid Schneider (cortesia e tradução: José M. Sousa)

"SOAM AS SIRENES"

A Agência Internacional de Energia (AIE) dá o alarme : O mundo poderá esgotar o petróleo muito mais depressa do que era esperado -- o perigo de ruptura na oferta é crescente.

A fome por energia vs. a insuficiência de energia: ao passo que a procura de energia aumenta, a produção está em queda – oferta insuficiente, a escalada dos preços e a inflação estão no horizonte... Numa conversa com Astrid Schneider, Fatih Birol, economista-chefe da AIE, exige/pede uma alteração nas políticas dos países membros.

O seu "motto": deixem o petróleo antes que ele vos deixe.

ASTRID SCHNEIDER:
Sr. Birol, no seu "World Energy Outlook" [Perspectiva Mundial sobre Energia] publicado em Novembro de 2007, a AIE avisou pela primeira vez que poderia haver um queda brusca na produção de petróleo e uma escalada dos preços daqui até 2015. A razão que apontou é que tem havido pouco investimento na produção.

FATIH BIROL:
De facto. Há três razões para isso. A primeira é a crescente procura, sobretudo pela China, Índia e pelos próprios países produtores do Médio Oriente. Estes países são a principal razão para o crescente consumo de petróleo. Mesmo que haja uma recessão nos EUA, isso não abrandaria significativamente o consumo destes países, porque a Índia e a China têm um procura interna muita forte, ao passo que os altos preços do petróleo estimularão o crescimento económico no Médio Oriente. Assim, a procura por petróleo continuará forte.

ASTRID SCHNEIDER:
A segunda razão...?

FATIH BIROL:
...é que assistimos a uma quebra acentuada da produção nos campos petrolíferos em exploração, sobretudo no Mar do Norte, EUA e muitos países extra-OPEP. Mesmo aqui é necessário investir para abrandar o declínio. A terceira razão porque esperamos um risco para a produção global é que estudámos todos os projectos de exploração petrolífera pelo mundo fora: 230 ao todo, na Arábia Saudita, Venezuela, Mar do Norte, por todo o lado. Mesmo que todos esses projectos, que já têm financiamento, sejam implementados, o seu contributo para a capacidade total de produção é demasiado pequeno.

ASTRID SCHNEIDER:
Quanto falta?

FATIH BIROL:
Exactamente 12.5 milhões barris/dia (b/d) estão em falta, cerca de 15% da procura global de petróleo [ Nota do editor do Energy Bulletin: o consumo global corrente é de 84 milhões b/d]. Este hiato significa que poderemos enfrentar insuficiências na oferta e preços muito altos durante os próximos anos.

ASTRID SCHNEIDER:
Há algum meio de isto poder ser evitado?

FATIH BIROL:
Há apenas três meios de sairmos deste dilema:
Primeiro que tudo temos que aumentar drasticamente a eficiência energética, temos que construir automóveis, camiões e aviões mais económicos, para reduzir [...] o consumo de petróleo. Em segundo lugar, temos que usar mais combustíveis alternativos no sector dos transportes. No entanto, se olharmos para o tão pouco que está a ser feito pelos governos para aumentar a eficiência energética, tenho pouca esperança que haja tal mudança de política. A terceira é que precisamos de muito mais projectos de produção petrolífera, sobretudo nos países chave da OPEP.

ASTRID SCHNEIDER:
Diz que são necessários 5.4 biliões [10^12, ou seja milhões de milhões] de dólares para investir de modo a satisfazer a procura global de petróleo. Em que países deve este dinheiro ser investido?

FATIH BIROL:
Nos países do Médio Oriente com uma grande oferta petrolífera -- mas não estou seguro de que aqueles países e as suas companhias petrolíferas investirão o suficiente. Poderão pensar que não é do seu interesse aumentar assim tanto a produção, para manter os preços altos. Outra parte dos investimentos deve ir para a OPEP, os EUA e o para o Mar do Norte, para evitar o declínio na produção nessas regiões.


ASTRID SCHNEIDER:
No WEO 2007 é referido que o rápido declínio da produção de petróleo será entre 3,7% e 4,2% por ano. É mesmo assim?

FATIH BIROL:
Exactamente

ASTRID SCHNEIDER:
Este declínio é ainda maior do que o previsto pelo Energy Watch Group!

FATIH BIROL:
Posso desde já dizer-lhe que no nosso WEO 2008, que será publicado em Novembro, trataremos em profundidade com as perspectivas da produção de petróleo e gás. Analisaremos os 350 mais importantes campos de petróleo e gás e determinaremos qual a quebra nas suas taxas de produção e o que isso significa.

ASTRID SCHNEIDER:
O que quer dizer com isso?

FATIH BIROL:
Tanto quanto sei, será o primeiro estudo público aprofundado em que verificamos e revemos o nosso conhecimento acerca de quanto petróleo e gás está a ser fornecido aos mercados. Muita gente chegará a novas conclusões sobre isto.

ASTRID SCHNEIDER:
Uma das afirmações do WEO 2007 é que toda a produção adicional de petróleo terá que vir dos países da OPEP, nomeadamente do Médio Oriente. Salem el-Badri, o secretário-geral da OPEP, anunciou numa conferência sobre segurança energética em Londres, em Fevereiro último, que a OPEP pretende investir 200 mil milhões de dólares até 2012 para criar novas capacidades de produção de 5 milhões de b/d. Isto está em acentuado contraste com o WEO 2007 onde afirma que até 2020 precisaremos 24 mb/d de nova capacidade de produção para responder à procura crescente por petróleo. Então, de facto, Salem el-Badri afirma que a OPEP não será capaz de atender às expectativas. Isso não quererá dizer que caminhamos em direcção a sérios problemas?

FATIH BIROL:
É verdade, essa é a razão por que anunciamos pela primeira vez este ano uma situação de aperto da oferta. Há um hiato entre a procura global de petróleo e a quantidade que vem, ou poderá vir, para o mercado a partir daquela região. Pensamos que os produtores de petróleo têm que aumentar a sua produção de modo significativo, mas não estamos certos de que o farão ou mesmo se o poderão fazer.

ASTRID SCHNEIDER:
Porque não querem?

FATIH BIROL:
Olhemos para os números: até 2015 haverá uma diferença entre o que esperamos/queremos e o que os produtores estão dispostos ou aptos a fazer para aumentar a sua capacidade. Esta diferença revela o real e sério cenário do mercado do petróleo. Poderá significar um colapso da oferta e uma escalada dos preços.

ASTRID SCHNEIDER:
Então o que vejo no WEO é mais -- se me permite -- uma lista de intenções?

FATIH BIROL:
Pode pô-lo dessa forma. Penso que estamos a entrar numa nova ordem mundial do petróleo. Os novos actores, que decidem quanto petróleo vai para o mercado, são sobretudo companhias petrolíferas públicas. Por várias razões, as coisas não serão tão fáceis como eram antes.

ASTRID SCHNEIDER:
O Energy Watch Group apontou nos seus estudos que as reservas de petróleo no Médio Oriente estão provavelmente inflacionadas em 50%. Quando pedem hoje aos países do Médio Oriente para aumentarem as suas capacidades de produção, quão bom é o vosso conhecimento sobre as suas reservas de petróleo e sobre o volume que esses países poderiam produzir se assim o entendessem?

FATIH BIROL:
Estamos a falar de um ponto muito importante aqui e o maior resultado que espero do WEO 2008 é uma maior transparência no que respeita às reservas de petróleo das companhias nacionais, bem como multinacionais.

ASTRID SCHNEIDER:
A que se está a referir?

FATIH BIROL:
Lembre-se de que uma bem conhecida multinacional petrolífera teve problemas recentemente porque não teve transparência suficiente. Portanto a AIE gostaria de ver maior abertura no que diz respeito aos dados sobre reservas -- pode ser um bem nacional de estados isolados, mas o resto do mundo, as outras economias, o bem-estar comum de todos depende disso. De momento, estamos a pairar praticamente cegos e precisamos desesperadamente de maior capacidade de análise sobre este assunto.

ASTRID SCHNEIDER:
A transparência por si só ajuda?

FATIH BIROL:
Mesmo que as reservas da Arábia Saudita estejam estimadas erradamente em 50%, eles poderiam aumentar a sua produção de 12 mb/d para 18 mb/d. Mas creio que não aumentarão tanto a produção nos próximos 25 anos. Há assim sobretudo três problemas diferentes: geologia; investimento; e política dos principais produtores.
Estes três aspectos tomados em conjunto tornam o futuro do petróleo muito difícil.

ASTRID SCHNEIDER:
Se eu olhar para todos esses países, há grandes problemas com a Rússia e a sua política restritiva contra as multinacionais e petrolíferas orientadas para o mercado, como a Yukos; o Irão e o Iraque são pontos de alta tensão na cena internacional; a Arábia Saudita tem uma política muito relutante e parece ser difícil a abordagem para as companhias ocidentais.

FATIH BIROL:
Certamente, mas isso é totalmente legítimo.

ASTRID SCHNEIDER:
...e por último, mas não menos importante, a Venezuela, que deixou de fornecer a Exxon Mobil. Estes países em conjunto detêm cerca de 60% das reservas mundiais de petróleo. Mas é facto que não temos acesso a eles, nem politicamente, nem economicamente.

FATIH BIROL:
Isso causa grande pressão/strain sobre todos e sobre os nossos sistemas económicos. Quando olho para o futuro, vejo três desafios estratégicos no sector energético: o primeiro é a segurança do petróleo e gás. Recentemente, a Rússia reduziu as suas entregas de gás para a Ucrânia em 25%. O segundo são as alterações climáticas. E o terceiro, e temos que admitir que não falamos muito acerca disto, é a ligação entre energia e pobreza, por exemplo em África. Hoje 1,6 mil milhões de pessoas, isto é 40% da população mundial, não tem acesso a electricidade.

ASTRID SCHNEIDER:
Seremos capazes de responder a esses três desafios?

FATIH BIROL:
Se olharmos às suas dimensões, penso que os mercados por si sós não poderão resolver aqueles problemas. Não podemos deixar tudo aos mercados. Os governos nacionais bem como as instituições internacionais têm de ajudar à definição de regras e ao seu cumprimento. O assunto é demasiado importante.

ASTRID SCHNEIDER:
Não está sózinho nos seus avisos acerca de rupturas na oferta -- na cimeira económica mundial de Davos, Jeroen von der Veer, presidente da Shell, admitiu pela primeira vez que o petróleo e gás convencional não serão suficientes para cobrir a procura mundial a partir do ano 2015 em diante. Isto não levará a uma queda adicional da produção?

FATIH BIROL:
Várias pessoas acreditam agora que a produção global de petróleo e gás entrará brevemente em águas agitadas, mas isto não tem apenas que ver com o esgotamento do recurso. A falta de investimento é outro problema, bem como o facto de alguns países não quererem aumentar a produção.

ASTRID SCHNEIDER:
Não podemos criticá-los por isso, pois não?

FATIH BIROL:
Não. Antes de me juntar à AIE, trabalhei para a OPEP em Viena. E toda a gente ligada ao petróleo tinha os mesmos pensamentos: não utilizar todo o petróleo que tenho hoje, mas deixar algum para os filhos e netos, de modo a garantir-lhes rendimento. E compreendo isso. Em muitos países produtores de petróleo, este é a única ou, pelo menos, a mais importante fonte de rendimento.

ASTRID SCHNEIDER:
Então, qual é a sua conclusão?

FATIH BIROL:
Ficaria muito surpreendido se a produção aumentasse sem esforço durante os próximos 20 a 25 anos para satisfazer, digamos, 120 mb/d sem quaisquer problemas.
Mesmo que o potencial exista, não seremos capazes de fornecer esse petróleo ao mercado. A conclusão é que temos que estar preparados para assistir a mercados muito turbulentos, apertados e com preços elevados -- isto não será bom para a economia.

ASTRID SCHNEIDER:
Vamos assumir que há uma escalada dos preços -- quem será atingido primeiro?

FATIH BIROL:
Tudo se resumirá a quem será capaz de pagar x dólares por barril. Alguns serão capazes, outros não. Os países da OCDE estarão entre os felizardos, mas os países em desenvolvimento serão.....

ASTRID SCHNEIDER:
...os perdedores...

FATIH BIROL:
Exactamente!

ASTRID SCHNEIDER:
Se o entendo correctamente, diz que a procura de petróleo pode aumentar 3% ao ano, ao passo que devemos esperar uma descida de 4% na produção de petróleo de agora até 2015. Isso significa uma diferença de 7% ao ano que estaria em falta.

FATIH BIROL:
A procura poderá aumentar um pouco mais devagar. Mas poderá haver uma grande diferença entre o que deveria lá estar e o que vai lá estar de facto, sobretudo se não fizermos esforços intensos para melhorar a eficiência energética dos automóveis ou mudarmos para outros sistemas de transportes. Se não tomarmos medidas do lado do consumidor, o consumo continuará a aumentar. E se não tivermos investido o suficiente na produção, então experimentaremos grandes dificuldades.

ASTRID SCHNEIDER:
Mas quando se considera o ciclo de vida dos produtos, os ciclos longos de investimento em máquinas, centrais eléctricas e sistemas de ar condicionado, pensa que um ajustamento do lado do consumidor face à tendência de redução da oferta poderá realizar-se tão rapidamente?

FATIH BIROL:
Não, mas não penso que os preços subirão assim tão rapidamente. Poderemos ver uma subida gradual e isso dará às pessoas algum tempo para se adaptarem. Mas, no longo prazo, tem que ser claro: se o petróleo irá acabar em 2030, ou em 2040 ou 2050, não fará grande diferença.

ASTRID SCHNEIDER:
Reafirma mesmo isso?

FATIH BIROL:
Sim, um dia acabará mesmo. E eu penso que o deveríamos deixar antes que ele nos deixe. Esse deveria ser o nosso lema. Então devemos preparar-nos para esse dia -- através de I&D em alternativas ao petróleo, sobre que padrões de vida queremos preservar e que formas alternativas podemos encontrar.

ASTRID SCHNEIDER:
Como reagirá a economia global a uma nova crise do petróleo?

FATIH BIROL:
Se houver uma grande diferença entre a oferta e a procura, as economias serão duramente atingidas -- embora de forma diferenciada pelo mundo fora. A economia alemã sofrerá menos do que as dos países da Zona do Sahel. Contudo, esperamos menos crescimento económico, maior inflação e mais desemprego para os países da OCDE também.

ASTRID SCHNEIDER:
E os países pobres?

FATIH BIROL:
Nos países pobres, a maioria dos quais na África Negra, Índia e outros, os efeitos serão bem mais devastadores. Por exemplo, calculámos que os países da África Negra importadores de petróleo perderam 3% do seu crescimento económico devido ao aumento dos preços do petróleo. Não devemos esquecer que metade das pessoas nesses países vive abaixo da linha de pobreza de 1 dólar por dia.

ASTRID SCHNEIDER:
Vê o perigo de conflitos militares entre países com elevados e fracos recursos, causados pela tensão no mercado internacional?

FATIH BIROL:
No meu mandato enquanto funcionário não costumo falar sobre guerras e coisas do género. Mas o que lhe posso dizer é que as questões energéticas e geopolíticas estão demasiado interligadas. A oferta de energia está a tornar-se cada vez menos um empreendimento económico, mas em vez disso um empreendimento económico e geopolítico. Isso são más notícias, e não gosto nada disso. Precisamos de um diálogo entre produtores e consumidores.

ASTRID SCHNEIDER:
Referiu que estamos na véspera/limiar de uma nova era mundial da energia. Quem são os novos actores?

FATIH BIROL:
Do lado consumidor, claramente a China e a Índia. Costumavam ser participantes muito pequenos no mercado e ainda não vimos muito em relação a eles no jogo da energia até agora. Têm sido meros jogadores de rua, mas agora estão a crescer mais e mais, tornando-se plenos protagonistas.

ASTRID SCHNEIDER:
E do lado produtor?

FATIH BIROL:
Aí estão os maiores países produtores: a Arábia Saudita, Irão, Iraque, Kuwait, os EAU e a Rússia. Todos estes países têm uma coisa em comum: a produção de petróleo é regulada por companhias petrolíferas públicas em lugar do mercado livre. Isso altera as condições do jogo. São não apenas novos jogadores, mas é uma situação completamente nova. Os países ricos da OCDE tornam-se cada vez menos relevantes. São ainda importantes, mas desempenharão um papel menos importante quando olhamos para o futuro.

ASTRID SCHNEIDER:
Então toda a economia mundial depende de um punhado de países produtores -- e esses países que referiu não são lá muito democráticos.

FATIH BIROL:
Cada país tem o seu sistema político que instituiu para si próprio. O que gostaríamos de ver, no entanto, era a abertura dos mercados desses países. A livre circulação de capitais será muito importante, de modo que toda a gente possa investir no que entender. Mas no fim de contas estes países são livres. Podem decidir que política energética e que sistema político desejam.

ASTRID SCHNEIDER:
Que significa isso para nós?

FATIH BIROL:
Pelo menos temos que entender que o nosso petróleo e gás virá de países onde são as empresas públicas que decidem sobre a produção para o futuro. Isso é diferente do passado, quando o nosso abastecimento era feito por empresas mais orientadas para o mercado. Essa é uma alteração importante.

ASTRID SCHNEIDER:
A Agência Internacional de Energia tem o mandato de manter uma vigilância sobre o mercado petrolífero e de alertar os países da OCDE quando possam existir problemas ou insuficiências no mercado global de petróleo. A que nível estão a soar os alarmes neste momento?

FATIH BIROL:
Estamos aqui a falar de duas funções diferentes. A primeira é que podemos lançar reservas no mercado quando não há petróleo suficiente para atender à procura. Fizemo-lo, por exemplo, em 2005 quando o furacão Katrina atingiu os EUA. A segunda tarefa é, como mencionou, fazer "soar o alarme". Isso foi o que fizemos o ano passado.

ASTRID SCHNEIDER:
Já tinham feito tocar o sino? Quando?

FATIH BIROL:
Com o WEO 2007. Foi um sinal claro aos governos de todos os países membros. Consideram a segurança energética e do petróleo de uma forma bem mais importante agora do que antes. E quando apresentarmos o WEO 2008 em Novembro, penso que é possível que as sirenes venham a soar ainda mais alto.

ASTRID SCHNEIDER:
Mas não têm uma forma de reunir os chefes de Estado ou os ministros da economia para lhes falar sobre uma crise no fornecimento de petróleo?

FATIH BIROL:
Temos processos desse género para uma crise no abastecimento. Chamamos isso uma situação de emergência e podemos trocar informação com os governos de todos os países membros em apenas algumas horas se isso acontecer. Fizemo-lo aquando do Katrina.

ASTRID SCHNEIDER:
Não vê aí uma diferença? Por um lado, uma crise que é provocada por uma catástrofe natural que destrói algumas plataformas petrolíferas; e, por outro lado, algo como uma "emergência duradoura"?

FATIH BIROL:
Sim -- e essa é a razão porque pedimos aos nossos países membros para mudarem as suas políticas. Recentemente, os EUA e o Japão aprovaram novos padrões para os automóveis para reduzir o consumo de energia. Precisamos desesperadamente de novas regras e "standards". A Europa está neste momento a tentar atingir os mesmos padrões, mas sei que alguns países terão as suas dificuldades em aceitá-los.

ASTRID SCHNEIDER:
Como por exemplo a Alemanha.

FATIH BIROL:
Ainda continuam relutantes em pô-los em prática. Mas penso que lhes damos uma mensagem clara para o fazer. Tudo isto são exemplos de como temos feito tocar os sinos de alarme, e estamos a fazê-lo ruidosamente. Posso dizer-lhe que estou muito satisfeito ao ver muitos ministros a caminhar agora na direcção certa -- mas não é ainda suficiente. Especialmente se colocarmos em perspectiva as novas medidas com a dimensão dos problemas que estamos a enfrentar.

ASTRID SCHNEIDER:
Mas não é tempo de dar um sinal claro? Especialmente quando muito dinheiro é erradamente investido nos países da OCDE -- por exemplo na construção de novos aeroportos, muito embora não venha a existir petróleo suficiente para aumentar constantemente as viagens aéreas?

FATIH BIROL:
Não só dizemos isso aos nossos países membros, mas também a Pequim ou Nova Deli. Explicámos aos nossos colegas chineses e indianos como uma maior eficiência energética pode ajudá-los, como o transporte público pode mudar a sua vida e onde deveriam ser feitos os investimentos em infraestrutura. Mas, ao fim e ao cabo, é aos governos que cabe avaliar quão seriamente tomam as nossas declarações e avisos.

ASTRID SCHNEIDER:
Perante a crise de abastecimento que surge no horizonte, não seria a altura certa para convocar uma conferência intergovernamental sobre assuntos energéticos?

FATIH BIROL:
Estamos a discutir e a avaliar a situação com regularidade. O próximo passo importante será o WEO 2008. Em 2009 convocaremos uma reunião de ministros e espero que a segurança energética venha a ser um dos mais importantes temas a par das alterações climáticas. Mas volto a dizer: cabe aos governos tomarem medidas desde já. Avisámo-los.

ASTRID SCHNEIDER:
Até agora só falámos de petróleo porque detém a maior fatia no "mix" energético global. O Energy Watch Group afirma que não podemos simplesmente duplicar a quantidade de carvão ou urânio quando o petróleo começar a esgotar-se. À parte os problemas com as alterações climáticas, aquela fontes energéticas também não são ilimitadas. O que diz a AIE sobre isto?

FATIH BIROL:
Há uma diferença entre o carvão e o urânio. O carvão é um recurso global, pode ser encontrado em quase toda a parte e temos grandes quantidades. Mas o problema é -- se excluirmos as alterações climáticas por um momento -- que está a tornar-se cada vez mais difícil transportar o carvão a partir das minas para os centros de consumo. Depois de já termos falado sobre os preços do petróleo, deixe-me dizer-lhe que o preço do carvão mais do que duplicou desde princípios de 2006. Os preços do carvão estão também a subir porque a China se tornou um importante importador ao passo que não vemos importantes aumentos da produção em lado nenhum.

ASTRID SCHNEIDER:
Como avalia a situação para o urânio? Hoje só 60% da oferta provém das minas, o resto vem de reservas armazenadas que serão esgotadas brevemente.

FATIH BIROL:
Para as reservas de urânio não vemos problemas a partir de 2015 ou 2020, desde que haja esforços na exploração em regiões chave como o Cazaquistão, Austrália, África do Sul e outras regiões. Não creio que a oferta de urânio seja o principal problema para a economia nuclear, é mais uma questão de aceitação pública.

ASTRID SCHNEIDER:
À luz da insuficiência da oferta e outros problemas relacionados com o petróleo, carvão e gás, a OCDE, a AIE e as Nações Unidas recomendaram a construção de mais centrais nucleares para combater as alterações climáticas. Contudo, precisaríamos de três a quatro vezes mais centrais nucleares para podermos produzir electricidade suficiente para ter algum significado.

FATIH BIROL:
Para limitar o aquecimento global a 2º C temos que alterar o nosso sistema de produção de energia. Há quatro formas de o fazer de maneira neutra do ponto de vista climático: através da eficiência energética, energias renováveis, captura e sequestração de CO2 e energia nuclear. Se distribuirmos a redução do CO2 de forma equitativa por estas quatro alternativas, teríamos que construir todos os anos 30 novas centrais nucleares em todo o mundo. Isso é praticamente impossível. Presentemente estamos a construir 1,5 novas centrais por ano.

ASTRID SCHNEIDER:
Então um renascimento da energia nuclear está também fora de questão?

FATIH BIROL:
A energia nuclear deverá pelo menos manter a fatia actual de 15% do "mix" energético. Quando as pessoas do meu próprio país me perguntam se deveriam construir uma central nuclear, falo-lhes das vantagens e desvantagens. Mas também lhes digo que um reactor nuclear não deve ser construído contra a vontade do povo que vai ter que viver em torno da sua envolvente. Poderá ser bom para a economia global, bom para a segurança energética e bom para a protecção do clima, mas quando a população local tem um problema com isso, temos que levá-lo em consideração no planeamento.

Comentário de contribuidor do Energy Bulletin:

No que diz respeito à produção global de petróleo, a AIE não viu no passado grande problema imediato. Esta entrevista revela uma mudança de perspectiva extraordinária.

PUBLICAÇÃO ORIGINAL DA TRADUÇÃO EM: Parte I; Parte II.

PUBLICAÇÂO ORIGINAL EM ENERGY BULLETIN
Fatih Birol interview: 'Leave oil before it leaves us' by Astrid Schneider. Update May 2008.


* Uma carta divertida de George Monbiot a Sua Majestade o Rei Abdallah da Arábia Saudita, sobre a aflição petrolífera europeia, e em particular do desgraçado Gordon Brown.
Your Majesty,

In common with the leaders of most western nations, our prime minister (Gordon Brown) is urging you to increase your production of oil. I am writing to ask you to ignore him. Like the other leaders he is delusional, and is no longer competent to make his own decisions.

... The (UK) government's central forecast for the long-term price of oil is just $70 a barrel.

Over the past few months I have been trying to discover how the government derives this optimistic view. In response to a parliamentary question, it reveals that its projection is based on "the assessment made by the International Energy Agency (IEA) in its 2007 World Energy Outlook." Well last week the Wall Street Journal revealed that the IEA "is preparing a sharp downward revision of its oil-supply forecast". Its final report won’t be released until November, but it has already concluded that “future crude supplies could be far tighter than previously thought." Its previous estimates of global production were wrong for one simple and shocking reason: it had based them on anticipated demand, rather than anticipated supply. It resolved the question of supply by assuming that it would automatically rise to meet demand, as if it were subject to no inherent restraints. -- By George Monbiot. Published in the Guardian 26th May 2008.

OAM 370 28-05-2008, 02:18 (última actualização 29-05-2008 12:33)