terça-feira, agosto 08, 2006

Cuba 1

Fidel Castro e Joao Paulo II, Cuba, 1998
Papa João Paulo II, de visita a Cuba, em 1998, condena o Embargo dos EUA

A manobra cubana de Condolezza Rice


Filho ilegítimo de um imigrante galego, instruído por jesuitas, advogado e doutorado em Direito, Fidel Castro não poderia ter combinado melhor o gene paternalista e autoritário do Noroeste ibérico com o peso da bastardia — arrastada até aos 17 anos de idade —, a sabedoria perversa da congregação de Jesus e a manha político-diplomática aprendida no estudo das leis. Como se isto não bastasse para formar um político de gema, Fidel Castro aprendeu tudo o que havia a aprender no manejo de armas de fogo e nas tácticas de guerrilha — e leu ainda as funestas teorias leninistas e trotskystas sobre a ‘violência revolucionária’ e o ‘humanismo burguês’. Das 20 mil vítimas da sua longa revolução (1959-2006), 16 a 18 mil foram executadas na sequência da ofensiva de 1958, sendo as restantes alvos de assassínios extra-judiciais, desaparecimentos e mortes em cativeiro — a cargo de guardas prisionais ou da falta de cuidados médicos apropriados.

Esta contabilidade sinistra fica, todavia, muito aquém da monumentalidade das carnificinas e do inominável sadismo que caracterizou a selvajaria civilizacional do século 20: revolução mexicana, revolução russa, guerra sino-japonesa, duas guerras mundiais, nazismo, estalinismo, revolução chinesa, guerra civil espanhola, guerra da Coreia, guerra do Vietnam, regime de terror de Pol Pot, ditadura de Suharto, guerras israelo-árabes, guerra Irão-Iraque, fragmentação da Jugoslávia, as duas guerras contra o Afeganistão, Chechnya, Ruanda, Congo, Angola, Libéria, Etiópia-Eritreia, Sudão, Tailândia, guerras do Iraque 1 e 2,...

Comparado com o que ocidentais e orientais, árabes, judeus, cristãos e indus, democratas, comunistas e fascistas foram capazes de fazer, em número e barbaridade, ao longo de todo o século 20, é preciso dizer que o regime de Fidel Castro, apesar do mal que fez, merece indubitavelmente a consideração de algumas atenuantes.

Ninguém sabe ao certo se a rigidez do regime teria acabado mais cedo, não fora a proverbial falta de jeito e mão dura da América de John Foster Dulles, Henry Kissinger, Robert McNamara, Caspar Weinberger, George Shultz, Dick Cheney e Donald Rumsfeld.

Se o Embargo imposto pela super-potência a Cuba, a partir de 1958, não tivesse ocorrido, talvez não se tivesse seguido a célebre crise dos mísseis de 1962, e o posterior agravamento do embargo, que dura, é bom lembrar, até aos dias de hoje. Os americanos deixaram de comprar açucar, charutos e serviços aos cubanos. Mas não só. Também tentaram impedir o resto do ‘mundo livre’ de negociar com este pequeno país de 11 milhões habitantes! A brutalidade da medida é tão humilhante quanto ridícula vinda de quem vem: uma super-potência com mais de 250 milhões de habitantes, conhecida por alimentar ditaduras de conveniência em todo o planeta, assassinar líderes nacionais inconvenientes — Enrico Mattei em Itália, Allende no Chile, Jaime Roldós em El Salvador, Omar Torrijos no Panamá, etc. —, desenhar golpes de Estado e movimentos insurreccionais, provocar e fazer guerras um pouco por todo o planeta.

A condenação do embargo estado-unidense pelo Papa João Paulo II, na sequência de uma viagem estatégica a Cuba, mostrou ao mundo que aquele regime marxista foi, com grande probabilidade, um dos mais suaves da Guerra Fria, e que há algo bem mais profundo do que aquele verniz ideológico conjuntural: o catolicismo do povo cubano. O mundo deveria saber que Cuba foi e é desde sempre um país católico tradicional, que Roma não gostaria de ver subjugado pelo fundamentalismo evangélico, protestante e milenarista, que inspira a deriva imperial dos Estados Unidos, sob a batuta alucinada do falanstério que tomou de assalto a Casa Branca.

A pequena ilha fez frente ao grande vizinho e este, com um inqualificável mau perder, montou uma ‘Cuba livre!’ em Miami e prepara-se, no momento em que o velho timoneiro cede à doença e ao tempo, para desencadear uma ampla e desestabilizadora manobra diplomático-militar pelo controlo do petróleo e demais matérias primas de todo o continente americano (sim, do Canadá ao Chile!) A hipócrita, gananciosa e desumana América quer abrir uma nova e decisiva frente de batalha pelo domínio da América. Espero sinceramente que o tiro lhe saia pela culatra.

Aos neo-atlantistas falidos do meu país pergunto: e quando esta manobra ocorrer, de que lado estarão, e pretenderão que esteja Portugal?



NOTAS
Cuba sustentável. Com o fim a União Soviética, Cuba perdeu em apenas um ano 50% das suas disponibilidades petrolíferas! A sua adaptação a esta emergência energética está a ser um dos mais interessantes case studies sobre o destino das sociedades pós-petrolíferas. Vale a pena ler o Power Point Cuba — a Peak Oil Country (6.1Mb), elaborado por The Community Solution: The Solution to Peak Oil
Neoturismo em Cuba. Tomei uma decisão: a próxima viagem fora da Europa será a Cuba: Havana, Pinar del Rio, etc., tendo o cuidado de eleger o pacote mais favorável à economia local. Os agentes turísticos internacionais há muito que anteciparam este cenário (com especial destaque para espanhois e ingleses). No imediato, pode ser um importante canal de entrada de divisas num país que delas precisa desesperadamente. O turismo convencional é pura imbecilidade consumista, mas podemos escapar a este tipo de fatalidade e fazer das nossas explorações urbanas e campestres (locais, nacionais e internacionais) verdadeiras aventuras psicogeográficas, com um sentido preciso das nossas responsabilidades éticas e exigências estéticas. Eu quero conhecer as vegas onde se cultivam o tabaco e produzem os inesquecíveis puros cubanos, percorrer as ruas de La Habana, conduzir um daqueles milagrosamente conservados Buicks dos anos 50, pisar uma praia de areia branca e mar cálido e dançar por uma noite tropical adentro.

OAM #133 08 AGO 2006

sábado, agosto 05, 2006

Portugal 1

Os sete pecados mortais de um país

Segundo os valores estimados para 2005, dos 214 países considerados, mais de metade (110) crescia a valores do PIB entre 4% e 26,4%. Cresciam a 8% ao ano, ou mais, 24 destes países. A generalidade dos chamados países desenvolvidos crescia abaixo dos 4%. A União Europeia, por sua vez, crescia a uma média de 1,7% ao ano. Portugal, ocupando a posição 202 entre 214 países, crescia tão só a 0,30% ao ano...
Dizer que este país cresce abaixo da média da União Europeia é, como se vê, uma verdade piedosa sobre a crise que efectivamente atravessa. Piores que os lusitanos apenas há 12 países: Itália, Tanzânia, Niue, Dominica, Monserrate, Saint Kitts and Nevis, Guiana, Iraque, Malawi, Seychelles, Maldivas, Zimbabwe.

Não fora pertencer à União Europeia, Portugal estaria hoje à beira de convulsões sociais muito sérias. A prosperidade aparente de que goza deve-se, basicamente, a cinco causas principais: as remessas dos emigrantes portugueses residentes na União Europeia (que deixaram de ser contabilizadas como receitas de emigração...), os fundos comunitários, a economia informal e clandestina, o turismo e o endividamento imparável do Estado. A balança comercial tenderá, porém, a deteriorar-se no médio e longo prazo, por causas mais ou menos óbvias: valorização do Euro contra praticamente todas as outras moedas, deslocalização crescente dos investimentos dentro e fora da zona Euro, destruição interna das actividades alimentadas por trabalho intensivo, barato e de baixa produtividade e falta de competitividade dos custos de contexto: carga fiscal, preço da energia, excentricidade geográfica, falta de transparência estratégica do país e falta de qualidade do sistema judicial.

Deixando de lado o optimismo inconsciente de alguns governantes, conviria, antes de mais, identificar quais são efectivamente as causas principais do declínio relativo do país. O diagnóstico é mais ou menos conhecido:

  1. Um Estado obeso, tentacular, autoritário, ineficaz e com profundos veios de corrupção instalada

  2. Um bi-partidarismo efectivo, que foi sendo paulatinamente transformado num regime político de base endogâmica e clientelar, protegido por um tecto parlamentar aburguesado e retórico (de cujo atrofiamento político nem os pequenos partidos escapam)

  3. Um país dependente e ineficiente do ponto de vista energético, fruto de uma desorganização territorial escandalosa, a qual preside a um modelo de desenvolvimento local e regional basicamente assente na especulação imobiliária e na privatização da propriedade pública (baldios, espaço público urbano, etc.)

  4. Fragilidade extrema dos sectores primários da economia, sobretudo nas áreas da agricultura, aquacultura, silvicultura e pescas

  5. Manutenção de um sistema de ensino estatista, retórico, elitista, improdutivo, burocrático e sem objectivos

  6. Um sistema de Justiça incapaz, socialmente injusto e espartilhado entre corporações formadas no anterior regime

  7. Um sistema de saúde e segurança social todavia longe da eficiência esperada num Estado europeu competitivo


Embora não possa ser considerado um pecado capital, deve ainda assinalar-se como factor de entropia a falta de qualidade informativa e cognitiva dos meios de comunicação de massas. Esta fragilidade deriva em grande parte do modelos económicos das respectivas empresas e conglomerados, actualmente incapazes de manter-se sem recorrer a sucessivas engenharias financeiras que, na maioria dos casos, têm vindo a tecer uma crescente dependência dos principais média nacionais dos interesses económicos e políticos instalados. Em vez de um efectivo quarto poder, os média lusitanos transformaram-se, ao longo da década de 90, em meras agências de contra-informação dos lobbies dominantes. A omnipresença do futebol no imaginário quotidiano dos média portugueses, os frequentes assassínios de carácter promovidos pelas televisões e jornais, os chamados sound bites, as campanhas promocionais de projectos inviáveis ou injustificados pelas verdadeiras frentes de projecto público-privados (F3P), de que o caso da Ota é, de momento, o mais preocupante e revelador, ou ainda a difusão acéfala de produtos mediáticos destinados à pura anestesia social, revelam até que ponto o quarto poder deixou de contar como um desejável factor de desenvolvimento, cidadania e civilização.

Tudo isto é triste e vai tornar-se trágico à medida que a União Europeia for perdendo a sua unidade programática, seja pela manifesta incapacidade de redigir uma carta constitucional consensual, ou de alinhar uma estratégia defensiva comum.

Ou Sócrates percebe isto a tempo, ou Cavaco Silva acabará por ter a sua oportunidade presidencial.

Listagem de países por PIB (in CIA - The World Factbook)

OAM #132 05 AGO 2006

terça-feira, agosto 01, 2006

Israel-Libano 3

Caixoes Libano
O seguidismo europeu face ao trio Bush-Olmert-Blair só pode conduzir a Europa ao desastre.

Europa sem vergonha


Se todos sabíamos que Israel é há muito o cavalo de Tróia dos EUA no Médio Oriente (1), na realidade uma verdadeira extensão armada até aos dentes da América, ficámos agora a saber que o Reino Unido é o cavalo de Tróia dos EUA na União Europeia. A inacção desoladora da ONU, que nenhum dos grandes países e respectivos afilhados respeita, foi escandalosamente secundada pela mais humilhante derrota sofrida pela União Europeia naquela que teria sido a sua grande oportunidade para: 1) afirmar uma política externa comum — pelo menos no que se refere à assunção das leis humanitárias da guerra —, e 2) dar um passo de gigante na contenção do egoísmo expansionista dos EUA nas próprias fronteiras geo-estratégicas da Europa. Um Solana patético balbuciando coisas sem nexo foi tudo o que os Europeus obtiveram de uma cimeira uma vez mais obstaculizada pelo veto britânico do Sr Blair — a verdadeira besta actual da política externa europeia.

Como no Afeganistão e no Iraque, os burros do Atlântico (que se vêm pedantemente como estrategos atlantistas), temerosos de perder os despojos da vitória criminosa de Israel (que só terminará, nos planos estado-unidense e sionista, depois de um confronto militar com a Síria e com o Irão), e por outro lado em pânico com as possíveis interrupções dos fornecimenos do petróeo iraniano e do gás russo, já decidiram juntar-se todos na anunciada zona tampão entre o Norte de Israel e o Sul do Líbano. Vai ser um desastre para a Europa e um passo certo na direcção de uma prolongada guerra terrorista mundial entre o Eixo da Corrupção e o chamado Eixo do Mal.

Ou muito me engano, ou os democratas de todo o mundo passarão, mais cedo ou mais tarde, à clandestinidade, como única possibilidade de organizar um levantamento mundial contra o rapto das democracias — não pelo dito Eixo do Mal, mas pela Máfia Global que tomou conta dos governos ocidentais e dos principais canais de comunicação de massas.
Não será em meu nome que a barbárie montada pelo triunvirato da corrupção formado pelos EUA, Israel e Reino Unido continuará a assassinar centenas, milhares, milhões de mulheres e crianças por esse mundo fora!



NOTAS

1 — Esta hipótese, a que Noam Chomsky poderia facilmente aderir, foi recentemente contrariada num polémico, para não dizer incendiário, paper universitário de dois importantes académicos norte-americanos, John J. Mearsheimer e Stephen M. Walt, e cujo argumento principal é a perda de autonomia estratégica da política externa dos Estados Unidos por efeito da influência que sobre ela exerce o lobby judeu liderado pelo American Israel Public Affairs Committee (AIPAC). A ser demonstrada esta tese, a América estaria confrontada com uma incerteza preocupante sobre o que tem determinado nas últimas décadas a prossecução dos seus interesses: se a sua democracia, ou se os interesses insinuados de outro país: Israel. Apesar das críticas sofridas a propósito de algumas inconsistências factuais, The Israel Lobby and U.S. Foreign Policy é um documento de leitura obrigatória para quem quiser perceber o poder da direita judia americana na política dos Estados Unidos no Médio Oriente. A publicação da versão inicial deste estudo (10 Mar 2006) foi rejeitada pela revista que inicialmente o encomendou. Uma versão sem notas seria posteriormente publicada (23 Mar 2006) pelo London Review of Books, com o título The Israel Lobby

REFERÊNCIAS

14 AGO 2006 — Huge Buffer Zone Protects Us From Islamohordes, by Ted Rall.

NEW YORK--Whether by military occupation or political cooption, powerful nations create buffer zones to protect their core homelands. In 1823 the Monroe Doctrine declared the Western Hemisphere, including all of Latin America, off limits to interference by other nations--a policy enforced, for example, during the 1962 Cuban missile crisis. Pointing to the carnage they suffered during World War II, leaders of the Soviet Union said they required a "sphere of influence" in Eastern Europe in order to protect themselves from another German attack.
Currently Israel, a regional mini-superpower with nukes, is fighting to reoccupy its 15-mile-wide "security zone" in southern Lebanon to shield its population from Hezbollah rocket attacks. "We have no other option," said Israeli Defense Minister Amir Peretz.
Can invading or exerting political influence over another country ever be morally justifiable? If it can, how big a buffer zone is reasonable? The Bush Administration answered the latter question during an August 3rd hearing of the Senate Armed Services Committee. His answer was: 3,000 miles.


13 AGO 2006 — Triple Alliance: The US, Turkey, Israel and the War on Lebanon, by Michel Chossudovsky.

Those Western heads of State and heads of government who overtly support Israel's air raids and illegal occupation of Lebanon, are complicit in "war crimes" and "crimes against humanity." This pertains specifically to those Western political leaders who, at the outset of the war, turned down the "cease fire" proposal, which would have led to a halt to the Israeli aerial bombardments, largely directed against the civilian population.

06 AGO 2006 — Sempre é o petróleo! Embora inaugurado no passado dia 13 de Julho, o oleoduto que liga Baku (no Azerbeijão) a Ceyhan (na Turquia), passando por Tblisi (na Geórgia), só estará pronto, quer dizer, a debitar 1 milhão de barris de petróleo por dia, em 2009. Este oleoduto, conhecido por BTC, é uma operação liderada pela BP (British Petroleum), a qual detém 30,1% do negócio, contra 25% da AzBTC Co. (empresa petrolífera privada do Azerbeijão, na qual o Estado detem uma participação de 80%). Os restantes 45% repartem-se por algumas empresas bem conhecidas: Chevron (EUA, 2ª do respectivo ranking petrolífero), a cujo conselho de administração pertenceu Condolezza Rice, STATOIL (Noruega), TP (Turkiye Petrolleri), Eni (Itália), Total (França), ITOCHU e INPEX (Japão), ConocoPhillips (EUA, 3ª do respectivo ranking petrolífero) e Amerada Hess (EUA, 7ª do respectivo ranking petrolífero), dominada pela importante Hess Corporation, cujas relações com a Arábia Saudita e a própria família Bin Laden, nomeadamente na formação do consórcio Delta-Hess, foi objecto de conjecturas várias depois do 11 de Setembro. Percebe-se, agora, o afã do Sr. Blair em toda a conjuntura bélica do Médio Oriente. É a BP burro! E percebemos também a aliança guerreira entre os EUA e Israel, sobretudo se tivermos em conta que o novo pipeline (e o futuro gasoduto que corrererá paralelamente ao oleoduto) servirá sobretudo os mercados petrolíferos ocidentais: a Europa, os Estados Unidos e Israel! O Azerbeijão e a Geórgia, repúblicas ex-soviéticas do Mar Cáspio, autoritárias e corruptas, estão hoje sob protectorado dos EUA, e é pelos respectivos territórios que o oleoduto passa, antes de entrar na Turquia, país onde igualmente não existem quaisquer garantias democráticas, sendo conhecidas as perseguições desencadeadas contra os opositores turcos à iniciativa da BP.
Sobre esta vertente, até agora passada em claro, da guerra contra o Hezbollah e da destruição parcial do Líbano, vale a pena estudar esta passagem do oportuno artigo de Michel Chossudovsky, The War on Lebanon and the Battle for Oil:
“The bombing of Lebanon is part of a carefully planned and coordinated military road map. The extension of the war into Syria and Iran has already been contemplated by US and Israeli military planners. This broader military agenda is intimately related to strategic oil and oil pipelines. It is supported by the Western oil giants which control the pipeline corridors. In the context of the war on Lebanon, it seeks Israeli territorial control over the East Mediterranean coastline. In this context, the BTC pipeline dominated by British Petroleum, has dramatically changed the geopolitics of the Eastern Mediterranean, which is now linked , through an energy corridor, to the Caspian sea basin:

"[The BTC pipeline] considerably changes the status of the region's countries and cements a new pro-West alliance. Having taken the pipeline to the Mediterranean, Washington has practically set up a new bloc with Azerbaijan, Georgia, Turkey and Israel, " (Komerzant, Moscow, 14 July 2006)

Israel is now part of the Anglo-American military axis, which serves the interests of the Western oil giants in the Middle East and Central Asia
.”

Ver também o mapa do oleoduto, para perceber a verdadeira origem da actual guerra e do comportamento lamentavelmente hipócrita e oportunista da maioria dos países europeus.

03 AGO 2006 — Líbano: A Batalha da Percepção. Enquanto Israel (com o apoio activo de Bush e de Blair) prossegue a sua campanha terrorista no Líbano, um antigo negociador israelita e actual director do Reut Institute — Gidi Grinstein — fala do ’paradoxo 90-10’, segundo o qual, mesmo que Israel destrua 90% da capacidade militar do Hezbollah, os 10% restantes surgirão aos olhos da opinião pública mundial, e em particular dos mil milhões de muçulmanos que a formam, como uma vitória da resistência palestiniana ao sub-imperialismo israelita. Sem caças bombardeiros, nem helicópteros, nem navios, nem tanques, o Hezbollah surgirá aos olhos dos seguidores de Alá e de Maomé, sobretudo depois desta guerra, como o David que anuncia o fim de um intolerável Golias. O mundo cristão e o mundo ateu, tal como qualquer democrata civilizado onde exista, estão chocados com a destruição ilegal de um país por parte de uma potência nuclear impune, estão chocados com a extrema fragilidade da ONU, estão indignados com a arrogância dos EUA e do boneco inglês, estão horrorizados com as bombas de fragmentação e as bombas químicas lançadas por Israel contra os civis (sobretudo velhos, mulheres e crianças) do Líbano. Mais do que um conflito de civilizações (onde os corruptos de todo o mundo gostariam de meter cristãos e judeus de um lado, e muçulmanos do outro) o que realmente alastra nas consciências humanistas deste planeta é a rejeição da insustentável e criminosa geo-estratégia dos EUA e dos seus cavalos de Tróia: Israel e Reino Unido. Israel tem direito ao seu Estado, na condição de respeitar o território e o direito do anunciado, mas sempre boicotado, Estado da Palestina. Para acompanhar com independência de espírito a tragédia libanesa vale a pena seguir o artigo, em permanente actualização, que o Wikipedia vem publicando em vários idiomas sobre este tema. Ref.: NYT 03AGO2006

02 AGO 2006 — Quem atira a primeira pedra? Num comentário amigo a este post, cujo autor pretendeu manter o anonimato, pergunta-se: “Será que vamos arrastar esta guerra cruel das bombas e do entulho a todo o mundo antes de haver uma clarificação das alternativas? E quais são? Quem atira a primeira pedra?
Gostaria de dizer, em primeiro lugar, que a primeira condição para actuar justamente é ver claro. Para ver claro, temos que procurar a informação e deixar de lado a guerra psicológica que actualmente controla a maioria dos grandes meios de comunicação de massas, entre os quais, a maioria dos miseráveis jornais e canais de televisão portugueses (que papagueiam toda a contra-informação que as ‘agências de comunicação’ e as chamadas fontes bem informadas lhes metem pelas goelas falidas abaixo). A outra condição é abandonarmos o complexo de culpa relativamente ao Holocausto, que fomos absorvendo acriticamente, ao ponto de temermos criticar o Sionismo criminoso que domina os destinos do Estado de Israel. Os holocaustos existiram e continuam a existir. Os judeus, mas também os arménios, os sérvios, os ciganos, os homossexuais, os mendigos e os declarados doentes mentais, entre outros, foram vítimas dos programas eugénicos de apuramento da raça humana praticados na Alemanha, mas também nos Estados Unidos, onde mais de 60 mil pessoas foram involuntariamente esterilizadas ao abrigo de uma cientologia racista e economicista, entre 1907 e meados da década de 70! A história da barbárie humana é um conto de terror sem fim. Os judeus não foram as únicas vítimas. E mesmo que tivessem sido, nada justificaria que alguns deles, hoje, autoproclamassem o direito de exterminar todos os vizinhos muçulmanos e árabes que atrapalhem a sede de espaço vital de um estado chamado Israel. Basta ler Noam Chomsky para perceber que denunciar o terrorismo de estado praticado fria e arrogantemente por Israel não pode ser confundido com anti-semitismo. Faz parte da propaganda Sionista de Israel confundir qualquer crítica ao seu comportamento criminoso com anti-semitismo. Mas a nossa obrigação é, como disse, ver claro...

“A primeira pedra” — 1) impôr o fim imediato das hostilidades no Líbano; 2) julgar e condenar o Estado de Israel pela sua conduta ilegal, reincidente, desproporcionada e terrorista durante a invasão e destruição do estado do Líbano; 3) julgar e condenar os Estados Unidos pela sua colaboração efectiva nesta operação brutal; 4) censurar o Reino Unido pela sua conivência com a política unilateralista e belicista dos Estados Unidos e de Israel; 5) restabelecer as fronteiras da Palestina e de Israel desenhadas pela ONU em 1948; 6) permitir a imediata constituição do Estado da Palestina no âmbito das definições essenciais de 1948; 7) envolver uma força militar e humanitária internacional independente na consolidação do novo Estado da Palestina. Qualquer solução passiva de compromisso, ou pior do que isso, diplomaticamente cobarde, não levará nenhuma solução estável e duradoura à Palestina israelo-árabe. Mas poderá fazer explodir o que resta dos barris de petróleo do Médio Oriente.

PS: A Espanha regressou a uma posição geo-estratégica inteligente, ao adoptar um distanciamento crítico perante a aliança corrupta entre Bush, Blair e Olmert. Esperemos que o recauchutado atlantismo lusitano não se venha a revelar como um imprudente baixar dos calções e como um oportunismo injustificável face à influência anglo-saxónica e texana sobre as nossas elites mais ignorantes. Olhem para o Brasil!


OAM #131 01 AGO 2006

domingo, julho 30, 2006

Israel-Libano 2

Lebanon destruction

Líbano: a oportunidade europeia


Much of the United States policy in the Middle East and Central Asia is guided by acquiring strategic depths before Russia, China and Iran acquire strength. Iran wants to build nuclear weapons before the US and Russia are able to dominate the region. China is quietly making inroads in much of Asia and Africa before the US firmly establishes its global dominance. It's not just the United States that is following a doctrine of pre-emption. China and Iran are playing the same game. Can some calculations go wrong when investors are most confident of global economic growth and political stability as they were in the years leading to the First World War?” In Strategic Foresight Group; The Big Questions of Our Time, Part 8: Ferguson's Fears


O território da Palestina, também conhecido ao longo da história como Filastïn ou Falastïn (da desaparecida etnia Filistina), ou ainda como Eretz Israel (Terra de Israel), foi secretamente negociado em 1916 como um Condomínio Aliado decorrente dos arranjos geo-estratégicos posteriores à Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Em 1917, Lorde Balfour enviou a célebre carta a Lorde Rothschild (líder da Comunidade Judia Inglesa e membro influente da Federação Sionista), na qual declarava a intenção da Inglaterra apoiar o desejo sionista de estabelecer uma pátria Judia (‘national home’) na Palestina. Em 1920 o Supremo Comando Aliado (Reino Unido, EUA, França, Itália e Japão) conferiu ao Reino Unido um mandato sobre toda a Palestina, embora sem definir os limites deste terriório. O Reino Unido, confrontado com a pressão da sua opinião pública (farta de pagar os elevados encargos do mandato), a desconfiança dos seus próprios aliados, que temiam pelas ambições coloniais inglesas na zona, o coro de protestos internacionais pela obstrução levantada pelos britânicos à deslocação dos refugiados judeus da Segunda Guerra Mundial para os territórios da Palestina, e o desgaste e humilhação impostos às suas tropas pelas acções terroristas dos grupos sionistas armados Irgun e Lehi, acabaria por anunciar o seu desejo de terminar o mandato na Palestina. Em 29 de Novembro de 1947 a Assembleia Geral das Nações Unidas aprova a resolução 181, com base na qual o território da Palestina é dividido em dois estados (israelita e árabe), mantendo-se a zona de Jerusalém (incluindo a cidade de Belém) sob administração das Nações Unidas. Os sionistas agarram obviamente a oportunidade, enquanto os países árabes rejeitam o inacreditável mapa traçado em Nova Iorque (basta olhar para o que sucedeu entretanto a este mapa para perceber quais os desígnios últimos de Israel). O novo Estado de Israel é proclamado a 14 de Maio de 1948, um dia antes de o Reino Unidos terminar o seu mandato na Palestina. A guerra israelo-árabe seguir-se-ia de imediato, continuando até aos dias de hoje, sem solução à vista. Israel foi alargando agressivamente as suas fronteiras, tendo obviamente como objectivo estratégico expandir a jurisdição do Estado de Israel a todo o (difuso...) território da Palestina, incluindo as cidades santas de Jerusalém e Belém. É por isto mesmo, que o Hamas, o Hezbollah, a Síria e o Irão não vêem outra solução para zona que não passe pelo fim de um Estado artificial, só possível graças ao grande jogo das principais potências militares do Ocidente: a França, o Reino Unido e os Estados Unidos. O prémio deste grande jogo de estratégia é, para além de todas as outras considerações imagináveis (passagem do Suez, direitos humanos, democracia) a imensa riqueza petrolífera de toda a região do Médio Oriente, a qual se estende pela Arábia Saudita e Emiratos Árabes, Irão, Iraque, Afeganistão e zona do Mar Cáspio. Todo o século 20 esteve dominado pelo controlo desta matéria prima e fonte energética de primeira grandeza.

mapa


A agenda de Israel é clara: destruir a possibilidade de existência de um Estado Palestino e expandir o seu território por forma a ocupar não apenas todo o mapa da Palestina desenhado pela ONU, mas também, logo que houver oportunidade, estender o seu Lebensraum à Jordânia.
Perante estes desígnios, a agenda dos árabes da Palestina não pode deixar de contemplar a destruição do Estado de Israel como uma opção racional.
Este cenário de irredutibilidade recíproca é muito perigoso para o futuro da humanidade. Na realidade, a situação actual é muito diferente daquela que existia nos finais do século 19, no primeiro quartel do século 20, e mesmo durante todo o período compreendido entre a derrota nazi e a queda do muro de Berlim.

Por um lado, o fim da União Soviética lançou o Capitalismo na sua derradeira fase expansiva (globalização), libertando a lógica do valor usurário dos constrangimentos estratégicos e políticos que os estados nacionais lhe impuseram ao longo dos tempos. Por outro, deixou os Estados Unidos numa posição estratégica cada vez mais insustentável à escala planetária, na medida em que o fim da bipolarização Democracia vs Totalitarismo abriu uma verdadeira caixa de Pandora no tabuleiro planetário dos jogos de estratégia. De repente, dezenas de países do Terceiro Mundo começaram a sair das suas prisões de sub-desenvolvimento, caminhando para incrementos nos respectivos PIB muitíssimo superiores aos dos países do 1º Mundo (estamos a falar de taxas de 9, 13, 21 e 26 por cento, por comparação com as variações de 0,1 a 3,5 por cento dos chamados países desenvolvidos!) Finalmente, tudo isto ocorre à medida que a principal fonte energética do milagre económico do século 20 entra na sua fase declinante. As grandes reservas petrolíferas mundiais têm vindo a aproximar-se do topo da sua capacidade produtiva desde 1970! O peak of oil production que atingiu as reservas dos EUA, desencadeando a primeira grande crise petrolífera, em 1973, foi um aviso a que muitos não deram a importância devida. O problema agora é que o pico da produção mundial foi atingido no ano 2000!

Se tivermos presente, por exemplo, que em 2020 a produção petrolífera mundial andará pelos níveis da produção de 1980, que o petróleo barato acabou para sempre (sendo muito improvável que volte a descer abaixo dos 70 dólares...), e que, ao mesmo tempo, teremos que colocar nesta equação o crescimento da população mundial e os crescimentos económicos acelerados de países como a China e a India, mas também os dos 84 países que actualmente vêm os seus PIB crescerem a mais de 5% ao ano (ver CIA-The World Fact Book), poderemos facilmente perceber o nervosismo estratégico que percorre os centros de decisão da maioria dos países do planeta. O controlo das reservas mundiais de petróleo, gás natural, ouro, cobre, urânio, etc., já para não falar das florestas, solos agrícolas disponíveis, bancos de pesca e reservas de água potável, deixou de ser apenas um problema de acesso e gestão das garantias do crescimento (ou pelo menos de manutenção de um determinado status quo económico e cultural), mas também, e muito mais dramaticamente, um problema de sobrevivência dos próprios países. Se para crescermos, fizemos o que fizemos ao longo do século 20, imagine-se o que os países não poderão fazer para assegurar a sua própria sobrevivência.
Uma das soluções seria parar abruptamente, mas de forma assimétrica, o crescimento mundial! Quantos países poderão estar agora mesmo a pensar numa solução deste tipo? Eu diria que são muitos: o sr. Bush (e os chamados endtimers, que pelos vistos abundam na Casa Branca), o sr. Putin, o sr. Blair, o sr. Chirac, o sr. Hu Jintao, o sr. Ahmadinejade, o sr. Mujaraf e o sr. Ehud Olmert, entre outros possuidores de armamento nuclear e bioquímico de ponta.

É neste contexto que a guerra desencadeada por Israel contra o Líbano tem que ser estudada. Os EUA e o Reino Unido já demonstraram à saciedade a sua incapacidade para avaliar e gerir o presente curso da História. Multiplicaram estupidamente os teatros de operações anti-islâmicos, sem conseguirem ganhar nenhuma das guerras em que se meteram. Decepcionaram os seus aliados ocidentais. Afastaram da sua óbitra de simpatia a esmagadora maioria dos países do mundo. À medida que o caudal de erros estratégicos e tácticos aumenta, cresce, em resposta, a solidariedade muçulmana mundial, e mais países de outras órbitras estratégicas se aproximam do influente Crescente Islâmico. Quer dizer, para quem gostar de falar no choque de civilizações, é bom perceber que o poder de atracção do Islão tem vindo a aumentar rapidamente, ao passo que o bloco Cristão parece incapaz de demarcar-se do vanguardismo terrorista de Israel, deixando que o seu modo de estar no mundo e os seus objectivos estratégicos pareçam igualmente irreconciliáveis com a nova importância do Islão. Ora isto pode ser um erro trágico para a Europa!

Qana. Carolyn Cole / LAT
Qana: mulher e criança mortas por mísseis israelitas. 30 Jul 2006


A invasão da Faixa de Gaza, e depois do Líbano, sob pretextos absolutamente ridículos (o rapto do soldado israelita pelo Hamas sucedeu-se ao rapto de um civil palestiniano pelas tropas israelitas; e a acção do Hezbollah deu-se em território libanês ocupado por Israel) obedece a um plano de guerra preemptiva já conhecido e bem teorizado pelos think tanks que servem a perigosa administração Bush. Não sabemos, e só a história o dirá mais tarde, se foram os israelitas que adivinharam a vontade do Pentágono, ou se foi mesmo Condolezza Rice que instigou o plano de acção israelita. O resultado está, porém, à vista de todos: uma guerra ilegal, desproporcionada e terrorista, dirigida contra um Estado soberano, com o objectivo claro de desestabilizar toda a região do Médio Oriente, forçando a própria Europa a cair naquela que poderá ser uma das mais bem preparadas ciladas de sempre dos serviços secretos israelitas e norte-americanos. É bom que a Europa dos 25 se reuna, sim senhor. Mas atenção aos resultados da cimeira! A Europa não deverá aceitar, em caso algum, envolver-se em forças de interposição no Sul do Líbano, e muito menos aceitar como termo negocial a derrota do Hezbollah. O que a Europa deverá fazer é exigir o fim da agressão israelita e o regresso de Israel às fronteiras fixadas pela resolução 181 da ONU, em 1948, permitindo deste modo a efectiva criação de dois estados na Palestina: o Estado de Israel e o Estado da Palestina. Jerusalém, neste contexto, deveria transformar-se numa cidade-Estado independente, à semelhança de outros pequenos estados existentes no planeta. Aqui a Europa poderia comprometer a sua vontade e a sua honra, suportando inclusivamente parte dos importantes custos que uma tal decisão acarretaria. A missão da Europa, neste delicado caso, não será nunca a de fazer o trabalho sujo dos EUA e do seu sobrinho inglês. Mas antes a de garantir uma solução equilibrada na região, afirmando-se ao mesmo tempo como um vizinho cooperante do mundo árabe e muçulmano.

LINK 1 — Una historia de dos guerras, Loretta Napoleon, El País, 27 Jul 2006
LINK 2 — A história de Qana repete-se...
LINK 3 — Qana The Village of the Israeli Massacre
LINK 4 — Israel-Lebanon conflict - Wikipedia
LINK 5 — End-Timers & Neo-Cons; The End of Conservatives, Paul Craig Roberts, ZNet, 19 Jan 2005.

OAM #130 30 JUL 2006

quarta-feira, julho 19, 2006

Israel-Libano 1

Aeroporto de Beirute sob fogo israelita

Estado e Terrorismo


[21 Jul 2006] “Would you not agree that Muslim clerics in the Middle East (Sunnis and Shi`ites alike) expressed more outrage over Danish cartoons than over the destruction of Lebanon?” — As'ad AbuKhalil in The Angry Arab News Service

[25 Jul 2006] “[A] soldier is abducted from the army of a state that frequently abducts civilians from their homes and locks them up for years with or without a trial—but only we're allowed to do that. And only we're allowed to bomb civilian population centers . . . The concept that we have totally forgotten is proportionality. While we're in no hurry to get to the negotiating table, we're eager to get to the battlefield and the killing without delay.” — in Operation Peace for IDF, by Gideon Levy, HAARETZ.com


Apesar da antiguidade milenar do povo judeu, o moderno Estado de Israel é uma estranha novidade histórica. Na verdade, pode dizer-se que foi um invento recente da Federação Sionista, estrategicamente estimulada pelos súbditos bem avisados de sua magestade britânica (que não queriam judeus russos em Londres, mas queriam assegurar o controlo de uma zona rica em petróleo), com um primeiro grande impulso em 1917 e outro decisivo em 1948. A sua proto-história tem por conseguinte menos de um século, e a sua história uns escassos 54 anos de vida agitada e violenta. Percebe-se, pois, o remoque do senhor de Teerão quando diz aos ingleses e americanos, principais responsáveis do problema chamado Israel, que o resolvam.

Israel mostrou-se uma realidade difícil de digerir desde o primeiro minuto que pôs o pé nas areias áridas e pouco produtivas da Palestina. Os árabes começaram por lhe fazer a guerra assim que o novo Estado foi declarado. Diga-se, em abono da verdade, que Israel não contou nem com o apoio norte-americano, nem com os ingleses (que apoiaram tacitamente a frente árabe) para ganhar esta primeira guerra. As que se lhe sucederam, que também ganhou, fortalecendo sucessivamente a sua capacidade militar ofensiva e defensiva, foram contando progressivamente com o apoio cada vez mais explícito e prático do lobby judeu estado-unidense. Hoje é uma respeitável potência nuclear (com mais de 200 ogivas prontas a disparar!) O resultado destas vitórias foi, porém, um calvário para os povos árabes da Palestina. Divididos, desapoiados e humilhados, acabariam por enveredar pelas acções terroristas como principal táctica de oposição bélica ao novo país legalmente constituído. Israel decidiu responder com a táctica "olho por olho, dente por dente"... até que, mais recentemente, resolveu considerar que um judeu vale mais do que um árabe... e que dois soldados israelitas valem dez ministros do Hamas, a invasão e destruição de um país estrangeiro, centenas de vítimas civis e o terror de milhões de pessoas!

Israel deixou arrogantemente de respeitar a ONU, tal como o fazem todas as grandes potências quando lhes convém. Humilha sistematicamente as populações árabes da Palestina e os seus desgraçados e corruptos dirigentes. Invade os territórios e Estados vizinhos como se fossem casa sua. Por fim, perante a ameaça iraniana (estabelecer uma paridade nuclear naquela zona geo-estratégica), decidiu que chegara a hora de esclarecer militarmente um abcesso que ameaça, supostamente, a sua sobrevivência. A verdade é que a supremacia militar convencional, termo-nuclear, biológica e química de Israel e do seu principal patrocinador (os EUA) conduziu à expoliação e humilhação permanentes dos povos da Palestina, Irão e Iraque, não só ao longo de todo o século 20, mas sobretudo agora, quando a luta pelo controlo do petróleo e gás natural ameaça lançar o planeta numa tragédia inimaginável.

Esta é a primeira grande guerra entre judeus e muçulmanos no século 21. Devemos contudo olhar para ela como um episódio sangrento da guerra sem quartel que aí vem.

Não sabemos ainda se foram os Estados Unidos que envolveram Israel numa manobra de provocação contra o Irão. Se foi Israel quem programou subtilmente o envolvimento dos Estados Unidos numa confrontação próxima com o Irão. Ou se foi este último, como afirma o actual governo israelita, que preparou toda esta diversão e carnificina, com o objectivo de prosseguir a sua equiparação nuclear ao Estado de Israel, promovendo pelo caminho um afastamento mais decidido da China e da Rússia, dos Estados Unidos e da Europa.

Uma coisa é certa: a escassez anunciada do petróleo comandará os jogos de guerra mais próximos, tendo por teatro de operações privilegiado toda a zona compreendia entre o Irão, o Mar Cáspio e o Golfo Pérsico. Uma zona irresistível para os grandes especuladores, aventureiros, traficantes e assassinos.




Actualizações
[25 Ago 2006] Amnistia Internacional acusa Israel de cometer crimes de guerra e de terrorismo de Estado. In BBC online e Global Research.
[25 Jul 2006] É agora evidente para todos, depois das recentes declarações de Shimon Peres sobre o aniquilamento da Palestina (‘ou eles ou nós!’), da destruição sistemática das principais infra-estruturas do Líbano, dos bombardeamentos sucessivos contra alvos civis e do assassínio premeditado de quatro observadores das Nações Unidas (da China, Áustria, Canadá e Finlândia) estacionados no Sul do Líbano, que Israel se tornou, de facto, num Estado fora-da-lei. A situação é muitíssimo perigosa! A reacção da China perante a provocação assassina de Israel e dos Estados Unidos (que financia, arma e apoia descaradamente a fúria desesperada do estado Sionista) pode muito bem acelerar toda a actual conjuntura de pré-guerra global para o seu desencadear a curto prazo. Será que é mesmo isto que os Estados Unidos querem: antecipar uma guerra global, antes de a China poder chegar à paridade económica com a militarizada mas falida potência yankee? Vale a pena ler, entre outras referências, a entrevista a Noam Chomsky por Amy Goodman & Juan Gonzalez, no Democracy Now, bem como o artigo de Ken Silverstein no Harper's Magazine, We Fight Why? Israel's raid on common sense.

LINK 1 — A III GUERRA MUNDIAL JÁ COMEÇOU? — [13 Jul 2006] “Did World War III start yesterday morning? The great thing about predicting human events is that you are so often wrong. In this case, nothing would make me happier than to be in error. But, G-d help us all, I think the odds aren't that bad that I' m right. It is possible that yesterday morning, we started World War III.” In Sharon Astyk, Casaubon's Book.

LINK 2 — “The bombings of Lebanon are part of a carefully planned military agenda. They are not spontaneous acts of reprisal by Israel. They are acts of provocation.” In Global Research, Israeli Bombings could lead to Escalation of Middle East War, by Michel Chossudovsky.

LINK 3 — “Much of the United States policy in the Middle East and Central Asia is guided by acquiring strategic depths before Russia, China and Iran acquire strength. Iran wants to build nuclear weapons before the US and Russia are able to dominate the region. China is quietly making inroads in much of Asia and Africa before the US firmly establishes its global dominance. It's not just the United States that is following a doctrine of pre-emption. China and Iran are playing the same game. Can some calculations go wrong when investors are most confident of global economic growth and political stability as they were in the years leading to the First World War?” In Strategic Foresight Group; The Big Questions of Our Time, Part 8: Ferguson's Fears

LINK 4 — “NOAM CHOMSKY: Well, of course, I have no inside information, other than what's available to you and listeners. What's happening in Gaza, to start with that -- well, basically the current stage of what's going on -- there's a lot more -- begins with the Hamas election, back the end of January. Israel and the United States at once announced that they were going to punish the people of Palestine for voting the wrong way in a free election. And the punishment has been severe.

At the same time, it's partly in Gaza, and sort of hidden in a way, but even more extreme in the West Bank, where Olmert announced his annexation program, what's euphemistically called ‘convergence’ and described here often as a ‘withdrawal,’ but in fact it's a formalization of the program of annexing the valuable lands, most of the resources, including water, of the West Bank and cantonizing the rest and imprisoning it, since he also announced that Israel would take over the Jordan Valley. Well, that proceeds without extreme violence or nothing much said about it.

Gaza, itself, the latest phase, began on June 24. It was when Israel abducted two Gaza civilians, a doctor and his brother. We don't know their names. You don't know the names of victims. They were taken to Israel, presumably, and nobody knows their fate. The next day, something happened, which we do know about, a lot. Militants in Gaza, probably Islamic Jihad, abducted an Israeli soldier across the border. That's Corporal Gilad Shalit. And that's well known; first abduction is not. Then followed the escalation of Israeli attacks on Gaza, which I don't have to repeat. It's reported on adequately.
” In Noam Chomsky Website [U.S.- Backed Israeli Policies Pursuing ‘End of Palestine’; Noam Chomsky interviewed by Amy Goodman & Juan Gonzalez, in Democracy Now, July 14, 2006]

LINK 5 — “We can never allow an (alien) nation to live in the land (of Israel) as he will always make a claim to the land. The concept of transfer is the only future for the State of Israel. Transfer provides the solution for survival.” In Israel's Demographic and Security Challenge, Is Transfer the Only Rational Answer? By Bernard J. Shapiro

LINK 6 — “All of those people — millions in Ecuador, billions around the planet — are potential terrorists. Not because they believe in communism or anarchism or are intrisincally evil, but simply because they are desperate. Looking at this dam [Pastaza River, Ecuador], I wondered — as I have so often in so many places around the world — when these people would take action, like the Americans against England in the 1770s or Latin Americans against Spain in the early 1800s.” In John Perkins, ‘Confessions of an Economic Hit Man’

LINK 7 — “The wargame started with a crisis involving Iran which quickly escalated when the Tehran regime attacked shipping in the Persian Gulf; this in turn provoked a massive US naval response. As this conflict was developing, China attacked Taiwan, leading the US to split its forces in order to be able to respond to this additional challenge”. In Paul Rogers, The United States vs China: the war for oil, Open Democracy, 15 Jun 2006.

LINK 8 — “Is there a relationship between the bombing of Lebanon and the inauguration of the World's largest strategic pipeline, which will channel more than a million barrels of oil a day to Western markets?
Virtually unnoticed, the inauguration of the Ceyhan-Tblisi-Baku (BTC) oil pipeline, which links the Caspian sea to the Eastern Mediterranean, took place on the 13th of July, at the very outset of the Israeli sponsored bombings of Lebanon.
” In Michel Chossudovsky, The War on Lebanon and the Battle for Oil, Global Research, 26 Jul 2006.

LINK 9 — “The failure of the Rome summit on 26 July 2006 and the unwillingness of the United States to press for anything more than a minor pause in Israel's air offensive after the Qana tragedy on 30 July has not stilled the view in many western circles that the George W Bush administration will soon ensure a ceasefire in the Lebanon war. This ignores a key fact: Washington sees the war as a central part of the evolving global war on terror, with Israel as an absolutely vital part of that wider conflict.” In Paul Rogers, Lebanon: war takes root — The combination of United States global strategy, Israeli determination and Hizbollah resilience mean only one thing: a long war., Open Democracy, 03 Ago 2006.

Imagem: AP

Comentários não publicados: não darei seguimento a comentários acompanhados de links associados à guerra psicológica que acompanha a actual invasão do Líbano pelas tropas de Israel. Temos que impedir os falcões humanos de voar, mas sem cair na tentação de usar a pornografia do horror como arma de arremesso. AC-P

APELO DA AMNISTIA INTERNACIONAL

OAM #129 19 JUL 2006

segunda-feira, julho 10, 2006

Pamplona

Catia Coias - Pamplona

Largada Humana


Recebi uma nota da minha amiga e artista Cátia Coias sobre uma corrida de nus humanos contra a célebre largada de touros de Pamplona, que todos os anos leva milhares de turistas sedentos de uma prova de adrenalina proporcionada pela proximidade dos míticos animais —os touros— à capital Navarra. Há sempre feridos graves nesta loucura, que também se pratica em Portugal, nomeadamente na região do Ribatejo (Montijo, Alcochete, etc.), embora com menos profissionalismo comercial. A Espanha há muito que vende bem os seus produtos taurinos. Confesso que nunca me entusiasmaram, nem lá nem cá, sobretudo quando a faena é de morte!
Não vou entrar na antropologia dos sacrifícios e desafios ancestrais de que as touradas são ainda uma sobrevivência. Basta-me a certeza de serem provas de primitivismo cultural, ainda que bem menos malignas do que o desporto da guerra real com que continuamos a conviver macabramente. Provocar sem necessidade os touros, animais nobres e respeitáveis, não já em nome de um ritual atávico genuíno, mas para proveito puro das indústrias turísticas de Verão e gáudio de populações urbanas desejosas de novidade, parece-me prova evidente de falta de imaginação. Não se poderia re-desenhar o ritual agora degenerado de maneira a obter um sucedâneo interessante, criativo, e onde sobretudo o desporto radical não implicasse uma violência gratuita sobre o belo touro? O Mariscal seria capaz de ter uma boa ideia!

A Corrida dos Nus ou Largada Humana, que começou como uma reacção cultural adversa aos hábitos tauromáquicos dos espanhóis, parece coisa de somenos, quase oportunista, que não teria nenhuma possibilidade de existir se as largadas originais não fossem um facto. No entanto, já vamos na quarta edição desta contraposição cultural festiva, inteligente e erótica, ao pseudo ritual pamplonês. Com o tempo — quem sabe — esta largada humana poderá mesmo vir a ocupar a cabeça do cartaz turístico de Pamplona. Não se esqueçam que ninguém apostaria, há dois ou três anos atrás, que os nossos ambiciosos irmãos ibéricos iriam deixar de fumar. E deixaram!

Ao contrário das imbecis fotografias de manadas de indígenas em pelota promovidas pelo puritano norte-americano Spencer Tunick, estas largadas humanas revelam uma frescura antropológica bem mais estimulante. O seu intrínseco erotismo é inteligente, alternativo e propositivo. Há nesta manifestação de criatividade partilhada uma espécie de actualização muito oportuna das fantasias solares célticas e das provocações dionisíacas mediterrânicas. Havendo imaginação, haverá esperança :-)


Fotografia de Cátia Coias: "Largada Humana", Pamplona, 2006.

OAM #128 10 JUL 2006

sábado, junho 17, 2006

General Motors 1

GM Opel

Trocar a Opel por turbinas eólicas?


As acções da General Motors e da sua subsidiária financeira GMAC - General Motors Acceptance Corporation, têm vindo a cair aos trambolhões desde 2004. Hoje fazem parte daquele lixo financeiro a que os americanos de Wall Street chamam ‘junk bonds’. Assim sendo, só muito dificilmente o histórico fabricante de automóveis poderá sobreviver sem a sua subsidiária financeira, de onde obteve grande amparo económico, sobretudo durante a década dourada da especulação imobiliária. Como a GMAC atravessa momentos de extrema dificuldade, devido nomeadamente ao abrandamento e previsível fim da bolha especulativa do sector imobiliário, bem como à subida consistente das taxas de juro nos EUA e na Europa, o binómio não parece nada prometedor! Como escreve Gail MarksJarvis no Chicago Tribune de 24 de Março 2006, “Actualmente, as obrigações (da GMAC) com vencimento em 2014 estão a ser vendidas or 89 cêntimos de dólares. Numa situação típica de declaração de falência, os detentores de títulos receberão à volta de 40 cêntimos de dólar.

O fecho iminente da fábrica da Opel na vila portuguesa da Azambuja e a sua anunciada transferência para a cidade espanhola da Saragoza, apesar dos incentivos governamentais (43 milhões de euros para se instalar em Portugal, além de benefícios fiscais e apoio à formação que ultrapassaram os 80 milhões de euros), traduz, da parte da GM, uma necessidade urgente e inadiável de reportar às autoridades financeiras e agências de rating estado-unidenses e internacionais cortes significativos nas suas responsabilidades com o capital humano (salários, férias, seguros, segurança social e pensões de reforma). Tal como está a situação no grupo General Motors, talvez não adiante. Mas uma coisa é certa: com ou sem a falência anunciada deste gigante do século 20 (ainda haverá muita engenharia financeira pela frente..), dezenas de unidades fabris e milhares de trabalhadores em todo o mundo irão ser atingidos pela dramática crise da GM. A fábrica da Opel na Azambuja tem os dias contados.

Que fazer?

Este artigo ocorreu-me quando lia o célebre livro de Lester Brown, Plan B, cuja versão portuguesa será apresentada no próximo mês de Outubro em Trancoso, durante a realização do Tribunal Europeu do Ambiente, sob os auspícios da respectiva Câmara Municipal e da Fundação Arte Ciência e Tecnologia - Observatório. A passagem do livro que aguçou a minha curiosidade foi esta:

Segundo consultor de energia Harry Braun, uma vez que as turbinas eólicas são semelhantes aos automóveis, na medida em que cada unidade dispõe de um gerador eléctrico, de uma caixa de velocidades, de um sistema de controlo electrónico e de um travão, será possível produzi-las em série numa cadeia de montagem. (...) O baixo custo associado à produção em massa poderia baixar o custo da electricidade gerada pelo vento para valores abaixo dos 2 cêntimos de dólar por Kw/h ” — Lester R. Brown, Plano B 2.0


Se a Opel sair da Azambuja antes do prazo celebrado em contrato com o Governo português, a GM deverá cumprir as cláusulas penalizadoras previstas, e no mínimo devolver a parte correspondente dos benefícios fiscais e de apoio à formação profissional recebidos. Com o patrocínio do Governo de José Sócrates, seria então possível a formação de um novo consórcio com o objectivo de retomar o complexo da Opel para outro fim. Não seria difícil obter um bom preço pelas instalações (e mesmo algumas máquinas), sobretudo se a perspectiva da falência mundial da General Motors se vier a confirmar ao longo de 2007. Talvez agora, quem sabe, Patrick Monteiro de Barros pudesse finalmente servir o seu país, desenhando um ambicioso projecto industrial associado à produção em série de turbinas eólicas de alto rendimento! Haveria certamente empresas interessadas no consórcio (EDP, SHELL, General Electric, Siemens Windpower, Vestas Wind Systems, ABB, etc.) Em vez de um cluster automóvel antiquado, teríamos um cluster revolucionário, associado a uma indústria no seu início, com um largo futuro pela frente, capaz de reformar radicalmente toda a zona industrial da Margem Sul. O Grande Estuário, uma tempestade mental que eu e outros sonhadores vimos alimentando desde 2005, prevê que a grande metamorfose de Portugal, na sua adaptação ao século 21, passa por aumentar radicalmente as competências das autarquias municipais (e dos governos regionais) e por criar uma grande região macropolitana — Lisboa e Vale do Tejo, estendendo o centro da cidade para a margem Sul do Tejo e criando uma grande capital europeia nas duas margens do rio... —, com a missão histórica de se tornar uma das primeiras grandes regiões de desenvolvimento pós-carbónico do mundo. Mais ambicioso ainda: deveríamos candidadar Lisboa aos Jogos Olímpicos de 2020, fazendo confluir nessa grande realização o novo ciclo de desenvolvimento do país. Uma das estratégias fundamentais para a Margem Sul passa, precisamente, por requalificar o seu caótico e mal tratado tecido urbano e arquitectónico, e por redireccionar a sua vocação industrial para a economia da sustentabilidade, das energias renováveis e do conhecimento!

Um exemplo... a Dinamarca.

A Dinamarca (sem a Gronelândia) tem menos de metade da superfície de Portugal, tem sensivelmente metade da nossa população, tem um PIB ligeiramente inferior ao de Portugal — $187.721.000.000 USD contra $203.947.000.000 USD —, mas detem um PIB per capita que é quase o dobro do português: $34.600 contra $19.300 (a Europa a 25 detem um PIB/capita de $28.100). Pois bem, este pequeno e rico país europeu é actualmente o maior produtor mundial de turbinas eólicas! Detêm 40% do mercado mundial e emprega, só na Dinamarca, 20 mil pessoas neste sector. O cluster de Investigação e Desenvolvimento (I&D) associado a esta notável performance tem já 25 anos de rodagem e conta, no sector envolvente à produção de turbinas eólicas, com mais de 150 investigadores dedicados às áreas da meteorologia, fadiga de materiais, aerodinâmica e dinâmica estrutural, interacção de grelhas, etc. Em 2002, para dar impulso, estratégia e sustentação a este objectivo, foi criado o Consórcio Dinamarquês para a Energia Eólica, que conta aliás com um notável sítio na web.

Mais de 100 mil dinamaqueses investiram nesta nova economia, que é bem mais do que uma simples indústria, e muito mais do que uma agência de importação de materiais e know how subsidiário. Há 5500 turbinas instaladas, que geram 3.100 MW de energia eléctrica. 75% destas turbinas são propriedade privada. Em 1983 a Dimarca não produzia nenhuma energia eólica. Em 2004, 20% da sua energia eléctrica tinha origem no vento, contra uma média europeia de apenas 2,4% (em Portugal, no mesmo ano: 1,8%; e em 2005: 3,6%). Para o ano de 2008 a Dinamarca prevê que 25% da sua energia eléctrica terá origem eólica, subindo para 35% em 2015.

Nos últimos 25 anos o custo de produção da energia eólica caíu 80%. O bonito da coisa é que continuará a decrescer nas próximas décadas. Associada ao desenvolvimento desta tecnologia virá uma aceleração sem precedentes da tecnologia de acumulação energética em baterias de hidrogéneo. O vento, como o Sol, as ondas do mar e os vulcões que fervilham nos Açores não se esgotam como se estão a esgotar o carvão, o petróleo e o gás natural. Não produzem gases que agravem o efeito de estufa e as doenças respiratórias. Não causam, ou não deverão causar, guerras, pois, ao contrário do petróleo e do gás natural, existem por toda a parte. E além do mais, Portugal é um país especialmente favorecido por todas estas novas fontes energéticas. Falta-nos apenas a ambição... e uma reciclagem urgente da nossa classe política.



Deal for GMAC stake doesn't protect bonds
by Gail MarksJarvis, in Chicago Tribune, March 24, 2006

GMAC is not struggling financially like GM. But GM, which lost $10.6 billion last year and is trying to restructure, owns GMAC, so their financial futures are intertwined.

Bankruptcy experts say that as long as GMAC remains with GM, the lending business can be held responsible for GM's financial obligations, such as pension liabilities. So both have junk bond ratings. GM's rating is worse than GMAC's.

Analysts have speculated that if a majority interest in GMAC is sold, it might be able to avoid GM's problems if the automaker ends up filing for Chapter 11 bankruptcy. But analysts have grown concerned as General Motors continues to seek a partner.

Moody's analyst Mark Wasden said he is no longer confident that a highly rated entity like a large bank will buy the controlling stake of GMAC. And if that doesn't happen, GMAC's credit rating will likely stay below junk status.

Wasden said he is concerned about the lack of progress in concluding the sale as well as by GM's deteriorating condition.

"With the passage of time, the transaction has become more complicated than anticipated," he said.

This week, Moody's announced that it was placing GMAC on "watch" for a downgrade.

If the GMAC deal doesn't happen, he said, the bonds investors now have could sink to a lower level of junk, likely eroding their holdings.


LINK




COMENTÁRIO

Muito bom o teu artigo sobre a GM e o aproveitamento das linhas de montagem das fábricas de automóveis que fiquem paradas. O caráter positivo do artigo, apontando uma alternativa clara de estratégia de desenvolvimento para Portugal, com exemplos concretos, é particularmente feliz, na linha, aliás, do livro do Lester Brown. Pena que, entre tantos países citados no Plan B 2.0, a propósito das práticas e apostas sustentáveis na área dos recursos energéticos, nem uma só vez apareça o nosso. Um pinzinho, uma bandeirinha pequena que fosse a assinalar alguma iniciativa que servisse como sinal de que estamos vivos para além do futebol, despertos para a nossa própria riqueza em vento e mar (pelo menos) - como isso me faria orgulhoso!

Este é um "cluster" que abre muitas e boas perspectivas, em termos da discução de estratégias e políticas públicas que atirem o nosso desenvolvimento para a vanguarda da nova economia sustentável que irá surgir inevitavelmente dos escombros do fim que parece ser já o anunciar desta nova e provavelmente derradeira crise do petróleo.

Entretanto, não esquecer que em Portugal parece estar em desenvolvimento o primeiro projecto de exploração comercial de energia das ondas em todo o mundo. O potencial desta energia renovável parece ser tão grande ou maior que o da energia eólica - façamos pois figas para que o projecto em curso seja o início de algo importante nesta área também, não só com a instalação do Pelamis, como com a produção comercial futura no nosso país destas engenhosas boias aquáticas gigantes que mais parecem uma sequência de três salsichas metálicas flutuantes interligadas e que aproveitam a energia das ondas do mar para produzir energia eléctrica.

Querem algo mais fácil? Parques eólicos com torres aerogeradoras de última geração produzindo o equivalente de energia à produção de um poço de petróleo e parques de energia das ondas ao longo da nossa costa - será que não há por aí um Escolari qualquer com poder suficiente para mobilizar a massa cinzenta dormente desta malta da política e dos nossos queridos empresários para este novo e verdadeiramente emplogante campeonato? Aliem-se aos dinamarqueses, aos ingleses - façam qualquer coisa, caramba! Os golos estão aí, como não estavam há muito, para serem marcados! Que comece o campeonato! É gooooolo de Portugal!!!!!

Emanuel Cerveira Pinto
18 JUN 2006

COMENTÁRIO
Dos 192 países registados, Portugal encontrava-se em 2005 na posição 39 no que se refere ao seu Produto Interno Bruto per capita por Paridade do Poder de Compra (PPC). No entanto, no que se refere à sua performance futebolística, encontra-se (para já...) na posição 16... Ora bem, aqui está um desígnio nacional que todos os portugueses entenderiam: colocar o nosso PIB/capita (PPC) na mesma posição do futebol, i.e., subir no prazo de uma década, 23 lugares na escala mundial do rendimento médio individual.
Embora tenha piorado no seu protagonismo futebolístico, a Dinamarca, no que ao PIB/capita (PPC) se refere, estava em 2005 na oitava posição do ranking planetário. O futebol e os países não se medem aos palmos!

Antonio Cerveira Pinto
18 JUN 2006



OAM #127 17 JUN 2006

quinta-feira, junho 15, 2006

Ellipse Foundation

João Rendeiro: fundo de investimento ou colecção?

“Até agora e até abrirmos o Art Center, apesar de a Colecção Ellipse já estar disponível no site da Fundação há muito tempo, não houve nenhum comentador que se tivesse dado ao cuidado de clicar na internet e ver a importância da Colecção”. — João Rendeiro (Ellipse Foundation/ Contemporary Art Collection)

Li a entrevista dada por João Rendeiro a Sandra Vieira Jürgens sobre aquilo que parece ter sido o óbvio fracasso do fundo de investimento em ‘arte contemporânea’ lançado sob os auspícios do Banco Privado Português e com o entusiasmo do seu presidente, João Rendeiro, e dos seus dois consultores especializados, Alexandre Melo e Pedro Lapa.

Pedro Lapa, por acaso, já era director do Museu do Chiado, quando a iniciativa de João Rendeiro teve lugar (em 2002), tendo ao mesmo tempo seleccionado para ambos os teatros de operações — o Museu do Chiado e o então fundo de investimento do Banco Privado (agora rebaptizado Fundação Ellipse, com sede em Amesterdão) — os seguintes artistas: Gillian Wearing, James Coleman, Jimmie Durham, João Onofre, Rosângela Rennó, William Kentridge. Donde que a sua tentativa de desvalorizar um óbvio caso de conflito de interesses e de abuso dos mecanismos de legitimação inerentes à actividade museológica desinteressada do Estado, não colhe. Quando falo desta situação a amigos estrangeiros olham-me com grande incredulidade como se estivesse a falar de um caso na Nigéria, no Chade ou na República Centro Africana.

As explicações dadas agora pelo financeiro parecem confusas. Afinal de que trata a sua colecção?

De um fundo de investimento privado com garantias dadas pelo seu banco, cujo fim último é especular com a compra e venda de obras de arte?

De uma colecção privada do Sr. João Rendeiro, do Banco Privado e de mais alguns amigos seus, que não aspira a outro fim que o deleite estético e a benemérita intenção de prestar um serviço à comunidade?

Ou de uma Fundação? E se for este o caso, com que fins? Apenas coleccionar? Ou também especular com investimentos em arte? O recente caso Afinsa pesa seguramente sobre este confuso projecto, inicialmente vendido em Portugal, em Espanha e no Brasil, como aposta certa para chegar a rentabilidades da ordem dos 12,4% ao ano, e agora reduzido a tímido sonho cultural.

Recomendo, pois, a leitura da entrevista dada pelo banqueiro a Sandra Vieira Jürgens no sítio da ARTECAPITAL, e depois, a comparação do respectivo conteúdo com duas outras leituras:

— a de uma notícia do sítio brasileiro ISTO É DINHEIRO, de 17/03/2004 sobre as intenções do Presidente do Banco Privado Português numa sua visita a São Paulo, de que cito esta passagem esclarecedora:
“O produto financeiro anunciado é semelhante a um fundo de investimento internacional. Os investidores serão cotistas da empresa Elipse Foundation. A entidade ficará responsável pela organização e promoção da nova coleção. A aplicação mínima é de US$ 300 mil. Será preciso ainda esquecer do dinheiro durante um período que pode variar entre sete e nove anos. ‘No longo prazo, os ganhos são atraentes’, diz Rendeiro. Entre 1986 e 2002, o Contemporary Art, índice do mercado internacional de arte contemporânea, rendeu, em média, 12,4% ao ano.

A Elipse Foundation terá um patrimônio total de US$ 25 milhões para garimpar obras com potencial de valorização pelo mundo afora. A meta posterior é vender a coleção para um museu. Não se assuste com o fantasma da falta de clientes que ronda esse mercado — o Banco Privado Português garante a compra das peças. Mas não assegura, contudo, o preço. Como em qualquer aplicação financeira, portanto, existe risco. O investimento tem o aval do próprio banqueiro, um bem-sucedido colecionador de arte. Para atrair a confiança dos clientes, Rendeiro promete: aplicará US$ 2,5 milhões do próprio bolso.”

— e a de uma outra notícia publicada pelo Portal da Bolsa de 26/03/2004:

“João Rendeiro revelou ainda que a Ellipse Foundation, uma fundação criada pelo BPP para investir em arte, já terminou a sua colocação de capital, junto de 40 investidores portugueses, espanhóis e brasileiros. O investimento total de 20 milhões de euros irá ser colocado ao longo de 4 anos.”

Sabemos agora que ‘a lógica inicial está ultrapassada’. E que ‘A fundação não reuniu, como se propôs, 40 investidores portugueses, espanhóis e brasileiros. Nem exige já a participação mínima de 250 mil euros’, como se pode ler na notícia dada pelo Diário de Notícias online de 22/05/2006.

O banqueiro queixa-se de que ninguém viu o sítio onde publicita a novel colecção, e que os jornalistas se perdem em assuntos de menor importância. Pois fique o banqueiro sabendo que me dei ao trabalho de visitar o dito sítio. Não me admira, depois de passar os olhos pelas aquisições, que os investidores não tenham chegado aos quarenta ambicionados, e que boa parte dos que entraram tenham entretanto saído. A colecção é, de facto, irrelevante e desactualizada, não obedecendo a nenhuma estratégia inteligente, nem no plano financeiro, nem no plano da avaliação crítica. Tratando-se de uma aposta na chamada ‘arte contemporânea’, i.e. num período pretérito e bem delimitado da arte do século 20, denota óbvia falta de recursos para se abalançar em objectivo tão ambicioso. Será que ninguém explicou ao banqueiro quanto custam hoje obras significativas de autores vivos como Gehrard Richter, Cy Twombly, Andrew Wieth, Charles Ray, Brice Marden, Jeff Koons, Sigmar Polke, Elsworth Kelly, Robert Rauschenberg, Damien Hirst, Jasper Johns, David Hockney, Agnes Martin, Bruce Nauman, Robert Ryman, Georg Baselitz, Frank Stella, Andreas Gursky, Jannis Kounellis, Julian Schnabel, Christopher Wool, Nan Goldin, David Salle, Mathew Barney, Thomas Ruff, Ross Bleckner, Vanessa Beecroft, Malcom Morley, Sol LeWitt ou Mariko Mori? Estou apenas a citar alguns dos 200 autores ‘contemporâneos’ com maiores volumes de negócios e com os quais, por sinal, se poderia de facto fazer um excelente investimento em ‘arte contemporânea’...

Se, ao invés, a intenção fora a de investir em futuros, i.e. se a estratégia adquirida pelo banqueiro pretendia antecipar os novos valores da arte do século 21, então o erro foi ainda mais desastroso. Não há na lista de autores/obras disponíveis no sítio da Ellipse Foundation, um único autor representativo da centena e meia de artistas pós-contemporâneos que agora mesmo poderia ditar para este postal electrónico. A arte do século 21 é antes de mais uma arte post-contemporânea. O seu processo generativo fundador começou no início da década de 90 do século passado e deve a sua originalidade a um processo de ruptura multi-dimensional com as práticas teoricamente esgotadas e corrompidas da ‘arte contemporânea’. Trata-se de uma arte nascida de linguagens inteiramente novas, essencialmente cognitivas antes de se tornarem intuitivas, expressivas e performativas. Para um pequeno coleccionador, como parece ser o caso de João Rendeiro, olhar para o complex media em que se move a arte mais sintomática do início deste século ainda poderá ajudar a salvar o seu mal encaminhado empreendimento.

Para provar que passei os olhos pela mal-formada colecção Ellipse, deixo à apreciação do leitor uma lista com todos os autores representados na dita colecção. Os números entre parêntesis curvos correspondem ao número de obras por autor. Os números entre parêntesis rectos, correspondem à minha avaliação pessoal das obras adquiridas numa escala de 1 a 10...

Aballí, Ignasi (6) [1]
Ackermann, Franz (1) [1]
Ahtila, Eija-Liisa (1) [5]
Arrechea, Alexandre (1) [3]
Atay, Fikret (1) [7]
Baldessari, John (1) [5]
Balka , Miroslaw (1) [5]
Balkenhol, Stephan (1) [5]
Barney, Matthew (1) [5]
Becher, Bernd and Hilla (1) [7]
Bickerton, Ashley (2) [6]
Bradley, Slater (3) [6]
Breuning, Olaf (15) [6]
Cabrita Reis, Pedro (2) [1]
Coleman, James (1) [7]
Cragg, Tony (1) [6]
Croft, José Pedro (1) [2]
Da Cunha, Alexandre (2) [3]
Dijkstra, Rineke (7) [2]
Dittborn, Eugenio (2) [4]
Dunham, Carroll (1) [5]
Durham, Jimmie (7) [7]
Einarsson, Gardar Eide (3) [4]
Eliasson, Olafur (2) [4]
Fulton, Hamish (1) [6]
Gober, Robert (2) [7]
Gonzales-Torres, Felix (1) [5]
Gordon, Douglas (1) [6]
Graham, Dan (4) [7]
Graham, Rodney (1) [6]
Hammons, David (1) [5]
Hatoum, Mona (1) [2]
Havekost, Eberhard (1) [1]
Herrera, Arturo (2) [1]
Hirschhorn, Thomas (2) [3]
Höfer, Candida (3) [4]
Huyghe, Pierre (2) [5]
Iglesias, Cristina (2) [3]
Michael Elmgreen & Ingar Dragset (2) [2]
Islam, Runa (1) [4]
Jamie, Cameron (3) [3]
Jankowski, Christian (1) [5]
Julien, Isaac (1) [5]
Kabacov, Ilya & Emilia [6]
Kelley, Mike (1) [6]
Kentridge, William (3) [6]
Klauke, Jurgen (1) [4]
Kuitca, Guillermo (1) [3]
Lawler, Louise (4) [5]
Lockhart, Sharon (1) [4]
Lucas, Sarah (1) [3]
Marepe (2) [1]
McBride, Rita (2) [1]
McCollum, Allan (1) [4]
McDermott & McGough (1) [1]
McQueen, Steve (1) [2]
Meireles, Cildo (1) [3]
Mir, Alexandra (4) [1]
Moffatt, Tracey (1) [?]
MP & MP Rosado (4) [1]
Neshat, Shirin (1) [3]
Neto, Ernesto (1) [3]
Neuenschwander & Guimarães, Rivane & Cao (1) [?]
Onofre, João (1) [2]
Opie, Catherine (3) [?]
Orozco, Gabriel (2) [5]
Ortega, Dámian (1) [1]
Oursler, Tony (1) [6]
Pardo, Jorge (2) [1]
Pettibon, Raymond (18) [5]
Pfeiffer, Paul (1) [2]
Pierson, Jack (2) [1]
Prince, Richard (4) [5]
Puch, Gonzalo (2] [1]
Rennó, Rosângela (4) [1]
Rosefeldt, Julien (2) [2]
Rosenblum, Adi + Muntean, Markus (3) [2]
Sachs, Tom (1) [1]
Sala, Anri (1) [1]
Sarmento, Julião (1) [1]
Scheibitz, Thomas (1) [1]
Schorr, Collier (4) [5]
Schütte, Thomas (2) [5]
Sekula, Allan (2) [4]
Shearer, Steven (2) [1]
Sherman, Cindy (6) [7]
Simmons, Laurie (3) [3]
Simpson, Lorna (2) [3]
Slominski, Andreas (1) [1]
Solakov, Nedko (1) [1]
Starkey, Hannah (1) [1]
Struth, Thomas (1) [3]
Tillmans, Wolfgang (1) [1]
Tiravanija, Rirkrit (1) [1]
Trockel, Rosemarie (1) [?]
Uslé, Juan (1) [1]
Vale, João Pedro (1) [1]
Varejão, Adriana (1) [4]
Walker, Kara (1) [4]
Wall, Jeff (1) [5]
Wearing, Gillian (4) [6]
Weiner, Lawrence (3) [3]
Fischli & Weiss (2) [3]
Williams, Sue (3) [5]
Wilson, Robert (1) [5]

in Sítio da Ellipse Foundation


OAM #126 14 JUN 2006

sexta-feira, junho 09, 2006

Nuclear 1

O Mapa nuclear do séc. 21

Nuclear Reactor vessel Fifteen years ago I thought solar power was impractical because I thought nuclear power was the answer. But I spent some time on an advisory committee on waste disposal to the Atomic Energy Commission. After that, I began to be very, very skeptical because of the hazards. That's when I began to study solar power. I'm convinced we have the technology to handle it right now. We could make the transition in a matter of decades if we begin now.” — M. King Hubbert (1974)

A energia nuclear não é renovável, nem substitui o potencial energético e tecnológico dos hidrocarbonetos. Mas teremos alternativa? As reservas de urânio conhecidas, no máximo uns 4 milhões e 500 mil toneladas, das quais se extraem por agora cerca de 35 mil ton./ano, para um consumo anual médio de 65 mil toneladas (o diferencial provem da recuperação do vasto arsenal atómico da ex-URSS e do enriquecimento de escórias por aproveitar) duraria 69 anos (2075) se o actual número de reactores (441) e o respectivo consumo se mantivessem inalteráveis. No entanto, em Dezembro de 2004 o American Nuclear Society registava mais 49 reactores em construção ou encomendados. E por outro lado, países como a China (11 reactores), a India (22 reactores) e a Rússia (38 reactores) estão muito longe de atingir os patamares nucleares dos Estados Unidos (104 reactores) e da Europa a 25 (166 reactores). As contas são simples: quando a China, a India e a Rússia se aproximarem dos patamares nucleares norte-americano e europeu, sobretudo depois de os preços do petróleo e do gás natural ultrapassarem certos limiares, o actual número de reactores nucleares poderá facilmente chegar aos 650. Estaremos então no ano 2020... O consumo de urânio poderá andar pelas 97.500 ton./ano. A esperança de vida das centrais de fissão nuclear projectar-se-à então para o ano 2057, e não para o ano 2075, como sucederia se os actuais consumos de urânio não sofressem qualquer incremento! Valerá a pena? Será inevitável? Chegará a fusão nuclear entretanto?

Depois de terminado o ciclo da fissão nuclear, basicamente destinado à produção de electricidade, as gerações futuras ficarão com um lixo muito perigoso para administrar, cuja diluição natural custará biliões de Euros, durante muitíssimos anos, já que a escória nuclear pode levar até 500 anos a “dissolver-se” na Natureza. Por outro lado, a curto e médio prazo, nenhuma das conhecidas alternativas ao petróleo, ao gás natural e ao carvão (hidroeléctricas, paineis solares, eólicas, bio-massa, bio-diesel, hidrogéneo, ondas e termo-despolimerização), são capazes de gerar os montantes de energia eléctrica necessários para evitar um duradouro apagão à escala planetária! Os conflitos bélicos em curso e futuros andam há muito e continuarão a andar todos em volta destes problemas. Onde está o resto do petróleo?! Onde está o urânio?! Onde estão as terras capazes de processar a alimentação necessária a um planeta a caminho dos 9 mil milhões de almas?! Estas são as grandes perguntas do século, cujas respostas parecem continuar mais na ponta dos “cutters”... e dos mísseis nucleares, do que no bom senso. Já ouviram falar de Negawatts?

Actualização: 16-08-2007


Citação: On The Nature Of Growth. M. King Hubbert 1974. PDF (500 Kb)
Imagem: esquema de um reactor nuclear de água pressurizada - PWR.
MAPAS — para obter 2 mapas actualizados da localização das centrais nucleares por esse mundo fora, basta encomendá-los ao American Nuclear Society.
Reactores nucleares: excelente artigo no Wikipedia.
Um artigo publicado no FEASTA - Foundation for the Economics of Sustainability, que desmistifica a ideia de que o nuclear é uma energia limpa. In WHY NUCLEAR POWER CANNOT BE A MAJOR ENERGY SOURCE by David Fleming, April 2006

OAM #125 08 JUN 2006

terça-feira, junho 06, 2006

Futuro 21

7 New Denmarks, Hydrogen Society, partial view

Depois de O Grande Estuário:
Too Perfect Seven New Denmarks


A representação da Dinamarca à próxima Bienal de Veneza de Arquitectura é um projecto chamado Too Perfect Seven New Denmarks, encarregado pelo Danish Architecture Centre e comissariado e desenhado (em colaboração com PLOT) por Bruce Mau, um dos mais notórios designers gráficos da actualidade. O projecto é obviamente o resultado de uma cooperação intensa entre vários gabinetes de arquitectura dinamarqueses e consegue, através de uma excelente estratégia criativa, de informação e representação informacional, projectar uma imagem optimista e criativa de um país europeu aparentemente pequeno, mas cheio de ambição.
O projecto resume-se basicamente a 7 perguntas provocatórias:

  1. What if Denmark was the port to the New Europe? (E se a Dinamarca fosse o porto da Nova Europa?)

  2. What if Denmark had an energy bill of zero? (E se a Dinamarca tivesse uma factura energética igual a zero?)

  3. What if Denmark farmed pharmaceuticals? (E se a Dinamarca cultivasse remédios?)

  4. What if Denmark was the world's housing factory? (E se a Dinamarca fosse a grande fábrica mundial da habitação?)

  5. What if Denmark made parenting effortless? (E se a Dinamarca transformasse o cuidado dos filhos numa tarefa fácil)

  6. What if Denmark doubled its coastline? (E se a Dinamarca duplicasse a sua linha de costa?)

  7. What if Greenland was Africa's water fountain? (E se a Dinamarca fosse a fonte aquática da África?)


O ponto de partida deste exercício de imaginação e de cidadania pró-activa é o próprio panorama dramático que temos diante de nós, em todo o planeta: fim dos combustíveis fósseis baratos, aquecimento global, degelo dos glaciares, erosão e exaustão dos solos agrícolas, falta de água, etc. Perante este panorama preocupante, das duas uma: ou não lhe prestamos atenção e nos auto-condenamos à extinção; ou, pelo contrário, reagimos, e as estratégias de minimização e de eventual ultrapassagem das dificuldades extremas que temos pela frente serão tantas quantas a nossa imaginação e inteligência colectivas conseguirem produzir. Outro ponto de partida interessante desta proposta especulativa, fortemente apoiada por instituições culturais e empresas privadas, é o da necessidade de enfrentar a perda de competitividade europeia face à emergência da nova Eurásia, cujo crescimento económico e regime de exploração do trabalho (segundo os tão propalados modelos liberais do Capitalismo) são e serão imbatíveis no decorrer das próximas décadas. A ideia básica é a seguinte: porquê procurar competir num terreno completamente desvantajoso, se pudermos mudar o paradigma do desenvolvimento?
Ora é precisamente esta mudança de paradigma que, de uma forma ou de outra, acaba por vertebrar boa parte das soluções propostas por Too Perfect Seven New Denmarks.

Transformar a Dinamarca no maior porto europeu do Báltico, quando se sabe que o transporte marítimo (ao contrário do transporte aéreo ou terrestre) vai ser decisivo ao longo de todo o século 21, pois é o único que está virtualmente preparado para receber sistemas de propulsão nuclear, é obviamente uma ideia interessante, tanto mais que o estudo se propõe desta forma libertar um espaço urbano precioso para novos estilos de vida.

Já a ideia de substituir todas as fontes de energia fóssil por hidrogénio pode ser mais discutível. Mas ainda assim, o princípio de pensamento usado é mais do que defensável: cada país terá que inventariar rapidamente quais são as suas escapatórias — primeiro face à subida vertiginosa dos preços do petróleo e do gás natural (que os países ricos e produtores poderão pagar, mas os pobres e sem reservas de hidrocarbonetos, não); depois, face à necessidade inevitável de os substituir por outras fontes energéticas e por outras matérias primas e sistemas de reciclagem.

Libertar os terrenos agrícolas saturados de adubos e pesticidas, a favor de uma paisagem que recupere a biodiversidade e a beleza ambiental e favor de uma nova espécie de agricultura — a farmacocultura — ganhando neste capítulo vantagens competitivas sobre uma Eurásia demasiado ocupada com a produção quantitativa de baixo custo — é seguramente uma boa opção, sabendo-se como se sabe do enorme potencial científico da farmacologia europeia.

Uma grande fracção dos combustíveis gastos nos transportes terrestres destina-se à fileira da construção civil: camiões com andaimes, areia, brita, cimento, pedra, tijolo, ferro, armações, coberturas, pavimentos, isolantes, tintas, material eléctrico, equipamentos telefónicos, telemáticos e de segurança, electrodomésticos, etc..., circulam e saturam as auto-estradas e as estradas da Europa e do mundo. A energia gasta na produção destes camiões, na construção e manutenção das vias terrestres, na alimentação dos veículos, na manipulação de todos estes materiais avulsos, faz da construção civil a mais artesanal e atrasada indústria do século 21. E além disso, faz dela uma actividade económica cada menos competitiva e insustentável do ponto de vista financeiro. O crash imobiliário actualmente em gestação, e que provavelmente irá estourar ao longo de 2007, lançará este sector numa dramática encruzilhada de paradigmas. Pois bem, Bruce Mau e os arquitectos que com ele trabalharam propõem a recuperação do espírito da Bauhaus como melhor estratégia para resolver o grande problema que aí vem. Trata-se, no fundo, de renovar o programa da concepçãp/produção da unidade habitacional à luz dos princípios inovadores de Walter Gropius: a casa como máquina de habitação pode ser produzida de forma concentrada, modular e em série! Desta vez, porém, haverá que aplicar as melhores tecnologias e o melhor pensamento computacional para conseguir gerar um novo conceito de habitáculo modelar, sustentável, complexo, variável, orgânico, leve, acoplável, inteligente... e sensível. Que a Dinamarca possa ser a primeira grande fábrica do novo falanstério do século 21, eis um desafio entusiasta em que não me importaria nada de participar.

A população europeia tem vindo a decrescer, em grande medida porque o sistema capitalista tornou a vida familiar e reprodutiva num inferno. Que podemos fazer? Pois fazer deste problema a ocasião para o desenvolvimento de uma estratégia de económica de diferenciação e especialização cognitiva, científica e tecnológica, onde, uma vez mais, a Eurásia não poderá susbtituir-se a esta nova simbiose entre economia e cidadania.

Duplicar a linha de costa, seguindo a teoria dos fractais, sabendo que com tal mega-projecto se libertam espaços inesperados para o novo hedonismo, sustentável, do século 21, é um achado ditirâmbico de génio!

Como genial é a ideia de aproveitar as quantidades inimagináveis de água doce que começaram a desprender-se da Gronelândia (por efeito do aquecimento global) para acudir às zonas áridas do planeta (em especial a África) onde morrem por anos milhões de pessoas, ora por falta do precioso líquido, ora em consequência das doenças causadas pela contaminação do mesmo, ora em resultado das guerras, chachinas e genocídios provocados pelas disputas territoriais em volta dos escasos recursos hídricos disponíveis.

A Dinamarca é um pequeno grande país europeu. Deu ao mundo grandes desenhadores de utopias. Too Perfect Seven New Denmarks é o exemplo perfeito de que poderemos voltar a contar com eles. O facto de em Portugal termos lançado, em 1 de Maio de 2005, um projecto em muitos aspectos semelhante — O Grande Estuário — mostra tão sómente que os tempos da utopia regressaram. No princípio do século 20, chamou-se Construtivismo. Eu agora, a esta nova utopia, chamo Reconstrutivismo!


Too Perfect Seven New Denmarks
What if Denmark was the port to the New Europe? Superharbour proposes to
consolidate all industrial harbour activity into one Baltic gate in order to liberate
the harbor cities for new forms of urban life.
What if Denmark had an energy bill of zero? HySociety proposes a design plan to
reduce Denmark's consumption of fossil fuels to zero, by feeding waste energy back
into the consumption loop.
What if Denmark farmed pharmaceuticals? Pharmland proposes that Denmark transform
its farmland into pharmaceutical production sites, creating a much higher yield per
hectare and liberating much of the country's landscape.
What if Denmark was the world's housing factory? House Express argues that most
manufacturing industries have evolved from craftsmanship to mass production. But not
the construction industry. This project shows how that evolution could create housing
for the global market.
What if Denmark made parenting effortless? Child Inc. argues that, as with many
industrialized societies, Danish society is turning into a childless one. This project
proposes solutions to a series of lifestyle conflicts, solutions which will radically
transform the notion of caring for children.
What if Denmark doubled its coastline? Endless Coastline is a tool kit that
structures tourism and prevents it from destroying the authenticity of a place, in
part by increasing Denmark's most sought-after feature: its coastline.
What if Greenland was Africa's water fountain? New Greenland argues that lack of
water is one of the world's most pressing dilemmas. Greenland, a semi-autonomous
region of Denmark, has the natural resources to relieve a major part of the world's
water stress.
To launch its utopias into the world and test their pragmatism, this open letter
is formulated as an exhibition of propositions addressed to the people who hold the
purse strings and have the power to make each pragmatic utopia come true. Should
Denmark take the shape of the future ? or should the future take the shape of Denmark?
Sincerely,
Bruce Mau Design
and the Too Perfect Project Team



OAM #124 06 JUN 2006