sexta-feira, outubro 08, 2004

Marcelo 2

Demissão encomendada


Desejo a Marcelo Rebelo de Sousa a inspiração, a força e o apoio de que necessita para tirar todas as conclusões da iniciativa tomada ao responder como respondeu à manobra entrista do PP (consolidada definitivamente a partir do momento em que Santana Lopes e Paulo Portas deram o nó da governação.)


Não sei se a Media Capital anda bem ou não. Mas parece-me que a entrada anunciada da RTL no núcleo duro do negócio de Paes do Amaral prenuncia, no mínimo, alguma ânsia de liquidez, ou de estratégia... Olhando retrospectivamente para a aventura mediática deste empresário mal conhecido, e do obscuro grupo que lidera — a Media Capital [1] —, reparamos que em tempos teve, e depois vendeu, uma porrada de publicações de papel, cuja heroína se chamara, durante uma década, O Independente. Escrevi no Indy mais de 500 críticas de índole sobretudo artística e cultural, sem uma vez sequer pairar sobre o meu laptop a mais leve pressão editorial. Obtive sempre a máxima cooperação e cordialidade do director Paulo Portas (uma figura bem mais complexa do que parece.) Depois, quando menos se esperava, a porrada de revistas esfumou-se na decadência editorial, no colapso do cash flow, e finalmente na cessação informal de contratos e encerramento ou venda das publicações a terceiros. Pouco tempo depois, nascia a nova aventura de Miguel Paes do Amaral: a TVI. O grupo Media Capital, nasceria de jure apenas este ano! Mas sob designação diversa, o grupo de média de Paes do Amaral começou de facto a operar em 1992, adquirindo ou lançando um leque renovado de revistas, estações de rádio e o mais irritante, inútil e boçal projecto Web made in Portugal, chamado IOL. O negócio da publicidade em outdoors (e em indoors!) — uma vergonha nacional e uma deriva da maior estupidez [2] — tornou-se entretanto outra ambicionada galinha dos ovos de ouro para Paes do Amaral.

Se repararmos com atenção, o sucesso deste grupo adveio e advem dos seus directores de conteúdos, em particular de Paulo Portas, quando era director de O Independente, e depois de José Eduardo Moniz, quando assumiu a direcção de programas da TVI. Sem eles, o grupo nunca teria existido, ou esfumar-se-ia rapidamente. O caso da pressão governamental exercida sobre a Media Capital, e que esta, por sua vez, induziu sem demora na direcção de Marcelo Rebelo de Sousa, adquire assim contornos picantes!
Marcelo Rebelo de Sousa, mesmo que esteja a apostar na cisão do PPD/PSD (separando as duas componentes cada vez mais radicalizadas deste mini-bloco central), e por conseguinte, na única condição contitucionalmente válida para a demissão do actual governo e consequente convocação de eleições gerais antecipadas, a verdade é que o desastrado Santana Lopes e a equipa de mentecaptos e acólitos que o rodeia lhe deu completamente o flanco. A verdade é que o actual Governo, pela cabeça do seu Primeiro Ministro (qual Salomé despeitada), veio pedir publicamente e em todos os órgãos de comunicação social, a cabeça de Marcelo Rebelo de Sousa. Se dúvida houvesse, a Media Capital, através do seu maior accionista, desvaneceu-a, antes mesmo que o comentador tivesse oportunidade de se defender na edição do seu programa previsto para depois de amanhã, e passando indecorasamente por cima do director de programas e principal responsável pelo êxito da TVI, José Eduardo Moniz.
Miguel Sousa Tavares diz que vai falar com José Eduardo Moniz e com Marcelo Rebelo de Sousa, antes de tomar uma decisão pessoal sobre o imbróglio criado. Os jornalistas da TVI fizeram circular um abaixo-assinado exigindo explicações ao principal accionista da empresa. José Eduardo Moniz, ainda em Cannes (creio) proclama que não admite ingerências na programação da TVI, que quer Marcelo Rebelo de Sousa de volta, e que quando chegar a Lisboa vai tirar tudo a limpo... e tirar também as devidas consequências do ocorrido... Numa palavra: o director de programas da TVI tem o preocupado grupo Media Capital e respectivos parceiros presos pelos c...!
Como vai acabar este Big Brother dos poderosos? Tudo depende das reais intenções de Marcelo Rebelo de Sousa, e da maturidade dos militantes do PSD para uma cisão (de resto, inevitável) do PPD, com vista a uma necessária recomposição do espectro partidário português. O País já entrou numa das mais dramáticas décadas da sua história. E como tal, não se compadece nem com o adiamento oportunista da crise do actual sistema político, nem com o prolongamento sofrido da actual situação social. Precisamos todos de falar claro, e de poder experimentar soluções políticas efectivamente alternativas. O Cozido à Portguesa, o Social-Porreirismo, a endogamia cabotina e a chulice comunitária chegaram ao fim. Precisamos todos de trabalhar. E precisamos que o poder caia nas mãos de quem pensa, e não de quem rouba, nada fazendo, ou fazendo tudo mal, o nosso futuro colectivo. Desejo a Marcelo Rebelo de Sousa a inspiração, a força e o apoio de que necessita para tirar todas as conclusões da iniciativa tomada ao responder como respondeu à manobra entrista do PP (consolidada definitivamente a partir do momento em que Santana Lopes e Paulo Portas deram o nó da governação.)

Quanto ao que Moniz irá fazer, ninguém, nem ele, o sabe ainda. Mas uma coisa é certa: se bater com a porta, o grupo Media Capital morrerá e outra televisão, quem sabe, outro grupo mediático, fortemente financiado pelos nossos vizinhos espanhóis, sob a liderança reforçada de José Eduardo Moniz, nascerá, para bem da liberdade e do pluralismo que tanto preocupam este Governo desgraçado.


Notas:
1. Li atentamente o prospecto lançado em Março de 2004 para a mais recente operação de venda de acções da Media Capital, publicado pela CMVM. Fiquei com dúvidas, nomeadamente sobre a particular juventude e carácter enigmático das empresas que formam o grupo:

Accionistas da sociedade Grupo Media Capital,SGPS, S.A.

— Vertix, SGPS, SA, com sede na Rua Silva Carvalho, 347, 1º Dto., Lisboa, com o capital social de 50.000 Euros, pessoa colectiva n.º 503 664 499, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa sob o número 6714;
— HMTF Madeira Cayman, L.P., uma sociedade com sede em Cayman Islands, The Huntlaw building, Fort Street, George Town, Grand Cayman, Cayman Islands;
— Hercules Enterprises, Inc, uma sociedade com sede na República do Panamá, Ficha
n.º 336763, Rolo 56674, Imagem 64, Apartado Aéreo no. 614, Panamá 94-A;
— Alvor 2004, SGPS, S.A., com sede na Rua da Páscoa, n.º 62 ? B, Lisboa, com o capital social de 50.000 Euros, dos quais 15.000 Euros se encontram realizados, pessoa colectiva n.º P-506886379, que se encontra em processo de registo na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa;
— Heisamore, SGPS, S.A., com sede na Rua da Páscoa, n.º 62 ? B, Lisboa, com o capital social de 50.000 Euros, dos quais 15.000 Euros se encontram realizados, pessoa colectiva n.º P-506886352, que se encontra em processo de registo na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa;
— Partrouge, SGPS, S.A., com sede na Rua da Páscoa, n.º 62 ? B, Lisboa, com o capital social de 50.000 Euros, dos quais 15.000 Euros se encontram realizados, pessoa colectiva n.º P-506886387, que se encontra em processo de registo na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa;
— Fredter, SGPS, S.A., com sede na Rua da Páscoa, n.º 62 ? B, Lisboa, com o capital social de 50.000 Euros, dos quais 15.000 Euros se encontram realizados, pessoa colectiva n.º P-506889874, que se encontra em processo de registo na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa.

............


Os membros do Conselho de Administração da Vertix, SGPS, S.A.:
Presidente: Miguel Maria Sá Paes do Amaral (1)
Vogais: Jared Scott Bluestein (1)
Eduardo Gonzalo Fernandez - Espinar Fernandez (1)
(1) O registo da sua eleição encontra-se pendente na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa.

— Os membros do órgão de administração da HMTF Madeira GP Ltd, General Partner da
HMTF Madeira Cayman, L.P.:
Administrador Único: Thomas O. Hicks

— Os membros do órgão de administração da Hercules Enterprises, Inc:
- Rodolfo Ramon Chiari Correa
- Roberto Ramon Aleman Healy
- Alvaro Antonio Aleman Healy.

— Os membros do órgão de administração da Alvor 2004, SGPS, S.A.:
Administrador Único: José Firmino Vieira de Meirelles Corte-Real (1)
(1) O registo da sua nomeação encontra-se pendente na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa.

— Os membros do órgão de administração da Partrouge, SGPS, S.A.:
Administrador Único: José Firmino Vieira de Meirelles Corte-Real (1)
(1) O registo da sua nomeação encontra-se pendente na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa.

— Os membros do órgão de administração da Fredter, SGPS, S.A.:
Administrador Único: José Firmino Vieira de Meirelles Corte-Real (1)
(1) O registo da sua nomeação encontra-se pendente na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa.

— Os membros do órgão de administração da Heisamore, SGPS, S.A.:
Administrador Único: José Firmino Vieira de Meirelles Corte-Real (1)
(1) O registo da sua nomeação encontra-se pendente na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa.


[2] É tempo de a cidadania verberar contra a violentação comercial do espaço público pelos conglomerados de média. Contra toda a legislação sobre segurança, e contra todo o bom senso que deve existir em matéria de salubridade estética do espaço comum, estas ditas empresas de meios não sossegam enquanto não enfiarem a sua repetitiva e quase sempre desmiolada e manipulativa publicidade nos mais ínfimos interstícios da esfera pública, privada e mesmo íntima dos cidadãos. A sociedade consumo acabou e temos que nos preparar para esta realidade... A reconversão ideológica vai ser terrível, mas tem que começar, e quanto mais cedo melhor. Por razões óbvias (a penúria orçamental de governos e municípios), nenhum político se atreve a encarar este problema de frente e com vontade de agir. Tanto faz que venham do PP, como do PPD ou do PS (não é, caro António José Seguro?) Mas o problema tem que começar a ser resolvido, e creio que começará a partir da acção cidadã. São os munícipes, com ou sem apoio das ONGs, que mais cedo ou mais tarde irão reagir contra a presente pornografia publicitária. E quanto mais tarde, pior — claro está.

O-A-M #56 08 Outubro 2004

quinta-feira, outubro 07, 2004

Marcelo 1

Santana e a liberdade de opinião


Se ninguém no interior do PSD tomar a iniciativa de declarar uma cisão ideológica e organizacional da deriva populista e autoritária que tomou conta do partido e da governação, Jorge Sampaio não encontrará motivo suficiente, à luz da actual Constituição, para demitir o actual Governo, dissolver a Assembleia da República e convocar Eleições Legislativas antecipadas.


Eu nunca votei no PPD/PSD. Quando era trotskysta votava na LCI e depois dessa inesquecível aventura juvenil votei consecutivamente no Partido Socialista, mesmo desconfiando frequentemente de alguns dos seus protagonistas. Ora esta circunstância nunca diminuiu o prazer com que sempre escutei e vi o comentário semanal de Marcelo Rebelo de Sousa ao longo dos últimos quatro anos e meio.
Todos conhecíamos o seu credo político e religioso, todos sabíamos por que clube de futebol torcia, mas precisamente por serem transparentes as suas convicções, mais valor adquiriam semanalmente os seus exercícios críticos sobre a situação do País. Fino na observação, arguto nos argumentos, claro nas palavras e sibilino quanto baste nas estocadas que regularmente enfiava nas suas vítimas circunstanciais, o comentário do “Professor Marcelo” chegava a milhões de Portugueses como um breve mas verdadeiro acto de consciência sobre a nossa condição colectiva. Mesmo quando percebíamos que tomava de ponta algum político em particular, aquele sermão de Domingo era um verdadeiro tónico para o começo de cada semana de trabalho. A sua voz valia mais do que o latim farisaico de toda a corja de cortesãos que louvam chefias, traficam influências e acautelam reformas. A isenção de Marcelo Rebelo de Sousa é sobretudo uma isenção autoral, baseada no respeito intrínseco da lógica dos argumentos e na ética dos factos a que se aplicam. Num País democrático e livre, o contraditório a exercer sobre as opiniões que expendia sempre teve (e terá!) o seu lugar próprio. Esse lugar chama-se liberdade de opinião e de imprensa. Não se chama tempo de antena governamental ou para-governamental, nem arreganhar o dente do autoritarismo, como sucedeu com o recado que Santana Lopes encomendou a Paes do Amaral e ao seu Ministro dos Assuntos Parlamentares (cujo nome desconheço, e não pretendo recordar).

Para saber o que está por detrás da pressão intolerável exercida pelo enigmático e pardo Sr. Paes do Amaral sobre Marcelo Rebelo de Sousa (uma pressão aliás ilegítima, ilegal e suficiente para retirar ao Sr Paes do Amaral a faculdade de empresariar negócios de comunicação) recomendo que se siga a pista do dinheiro. Como sempre sucede nestes casos de promiscuidade entre governantes e empresários, o segredo está quase sempre aí. Por exemplo, não é verdade que a Media Capital se encontra neste momento no meio de uma operação com o Metro de Lisboa, cujo fim é alastrar mais ainda a nódoa da publicidade que encharca o quotidiano de todos nós? Não se esperaria, ao invés, que o Metro de Lisboa, equilibrasse o uso de um espaço público exclusivamente pago com os impostos dos Portugueses e com Fundos Comunitários (igualmente pagos com os impostos de todos os Europeus) entre zonas reservadas à publicidade comercial e zonas reservadas a suportes de comunicação comunitária (por exemplo, de associações do pequeno comércio tradicional, Câmara Municipal de Lisboa, Associações Culturais da Cidade, Organizações Não Governamentais, etc.)? E já agora, pode o Metro de Lisboa negociar, sem recorrer a consulta pública, a cedência do espaço que ocupa (mas não é seu) a uma qualquer empresa com que resolva privilegiar relações de interesse? E se pode, deveria poder?

O caso da censura a Marcelo Rebelo de Sousa releva, todavia, de uma guerra mais profunda e que pode rebentar a qualquer momento. Trata-se do futuro do actual PPD/PSD. O Cavalo de Tróia chamado Paulo Portas encontra-se bem aninhado no âmago do velho Partido fundado, entre outros, por Francisco Sá Carneiro e Pinto Balsemão. Paulo Portas, depois de já ter atrelado o futuro político de Santana Lopes ao seu próprio calendário desconstrutivo, sabe que se for a eleições sózinho mostrará ao mundo que o seu PP, na realidade, não existe (e que portanto não passa dum parasita do PSD). Assim sendo, Paulo Portas tem que gizar um de dois cenários até 2006: ou garantir que o PP vai coligado com o PSD às próximas Legislativas, ou provocar a aparição de uma nova força partidária, sempre depois do prazo legal de dissolução da Assembleia da República, mas a tempo de constituir uma nova força partidária com capacidade de triplicar o ridículo score eleitoral do PP. Num caso e noutro, a sensibilidade social-democrata mais genuína do PPD/PSD está tramada!

Creio que é esta realidade profunda que, em última análise, explica a reacção de Marcelo Rebelo de Sousa, e as reacções solidárias para com ele de Marques Mendes e Pacheco Pereira. Não se pode fingir por muito mais tempo o facto de que a aliança entre Santana Lopes e Paulo Portas visa redefinir profundamente o actual espectro partidário. Ou muito me engano, ou teremos dois novos partidos nas eleições de 2006: o PSD, por um lado, liderado por Marques Mendes; e o PPD, por outro, com Paulo Portas na respectiva liderança (e Santana Lopes na corrida para a Presidência da República). Vai ser uma balbúrdia? Pois vai! Mas há alternativa? Não creio. As cartas deste jogo já foram jogadas...

Finalmente. como irá agir o PR?
Se ninguém no interior do PSD, tomar a iniciativa de declarar uma cisão ideológica e organizacional da deriva populista e autoritária que tomou conta do partido e da governação por efeito da sólida ligadura estabelecida entre Santana Lopes e Paulo Portas, separando assim o PSD do PPD, através de um Congresso fundacional que crie um novo Partido, Jorge Sampaio não encontrará motivo suficiente, à luz da actual Constituição, para demitir o actual Governo, dissolver a Assembleia da República e convocar Eleições Legislativas antecipadas.

Eu diria, portanto, que o futuro está nas mãos de Marcelo Rebelo de Sousa, Marques Mendes, Pacheco Pereira, em suma, de todos os verdadeiros social-democratas do partido que Pedro Santana Lopes herdou sem nenhuma legitimidade.

O-A-M #55 07 Outubro 2004

domingo, outubro 03, 2004

Socrates 4

John F. Kennedy

A sombra de Kennedy?


Aparentemente temos o PS de volta.
Em primeiro lugar, porque o Congresso marcou um ponto de viragem nos hábitos de opacidade das múltiplas organizações da nossa democracia. Não apenas o PSD e o PP, mas também o Bloco de Esquerda e o PC, a CGTP e a UGT, as associações profissionais e as ditas organizações não governamentais, a partir de agora, terão que pensar muito seriamente no refrescamento dos esquemas de escolha e validação daqueles que em seu nome falam e decidem. Este foi sobretudo o mérito da mediatização da campanha eleitoral que precedeu o Congresso, e da emergência de uma verdadeira ala esquerda dentro do PS, protagonizada por Manuel Alegre.
Em segundo lugar, porque o tele-ponto que guiou as intervenções de José Sócrates permitiu emitir para todos nós um conjunto de mensagens meticulosamente estudadas. E estudadas, não para ecoarem como simples efeitos de retórica populista (à maneira de tudo o que Santana Lopes diz e desdiz), mas para perdurarem como pistas de um ideário de acção e de governo em plena formação. O PS de José Sócrates quer retomar o caminho prudente de António Guterres, mas ambiciona aprofundar um contrato político sério com os mais atentos da nossa sociedade, propondo, por assim dizer, uma exigente partilha de responsabilidades. A tal chamou “Novas Fronteiras”: Conhecimento, Tecnologia, Decisão, Competitividade, Ambiente. Faltou apenas um tema crucial: Sustentabilidade...
Em terceiro lugar, porque a esmagadora maioria obtida por José Sócrates (que não retira nenhuma importância, antes pelo contrário, ao peso político daqueles que se reuniram em volta de Manuel Alegre), lhe permitirá congregar o PS nas principais batalhas eleitorais que se avizinham, as quais, se correrem bem, poderão garantir o regresso do Partido Socialista ao Governo já em 2006.
Até aqui, tudo bem...
Falta agora descortinar o enigma da convocação dos mortos!

José Sócrates resolveu chamar John F. Kennedy do além, ao que parece, para patrocinar o “new deal” que pretende propor, desde já, aos Portugueses. Longe vá o agoiro! E Porquê? Porque Kennedy, e todos os que antes e depois dele tentaram recuperar o famoso New Deal de Franklin Roosevelt, falharam! Kennedy, que se propôs levar os norte-americanos até uma New Frontier (que Eisenhower, antes dele anunciara, e não conseguiu alcançar), apenas atingiu um dos objectivos desse seu famoso programa: ultrapassar a União Soviética na corrida espacial. Todos os restantes objectivos, de natureza sobretudo social e económica, falharam! Como falharam mais tarde os programas semelhantes ao New Deal, de Lyndon B. Johnson (a Great Society) e de Bill Clinton (o New Covenant).
A receita Keynesiana de Roosevelt para a primeira Grande Recessão que atingiu os Estados Unidos em 1929 acabaria por dar excelentes resultados, quer nos cuidados intensivos prestados a uma economia e a uma sociedade apanhada pela espiral negra das falências empresariais e do desemprego, quer na aura imensa deixada pelo New Deal na História do Capitalismo do século 20. A verdade, porém, é que a mesma receita parece impossível de aplicar nas sociedades capitalistas actuais, por um conjunto de razões basicamente dependentes de três gandes fenómenos implosivos:
— a crise energética mundial (que nada parece ser capaz de inverter);
— a crise ecológica global provocada, entre outros factores, pelo aquecimento do planeta, pela falta de água, pela destruição das florestas e pela contaminação dos mares e grandes lagos;
— a reificação financeira do sistema económico mundial, cujos processos de globalização impedem qualquer eficácia duradoura nas políticas económicas nacionais, ou mesmo regionais (Comunidade Europeia, etc.)

O que é que nós podemos fazer por Portugal? O que é que todos poderão fazer pelo mundo? — perguntam os espíritos angustiados de hoje. Bom, algo mais do muito que se fez no tempo de Roosevelt, e certamente muitíssimo mais do que foi feito durante a breve e trágica passagem do jovem Kennedy pela Casa Branca. A evocação de Sócrates evidencia, todavia, uma preocupação profunda. Será seguramente precisa muita imaginação, muito estudo e muitíssima coragem para definir a estratégia de eutanásia que teremos necessariamente que administrar à exangue Sociedade de Consumo. Resta saber se o novo candidato a Primeiro-Ministro conseguirá galvanizar a sociedade para a penosa tarefa de abrir os olhos para a realidade que nos espera. Lembrem-se só que a carnificina do Iraque e do Médio Oriente é apenas o começo de uma luta fratricida por um recurso energético sem o qual ainda ninguém sabe como sobreviver: o petróleo.

O-A-M #54 03 Outubro 2004

Livros escolares

Deputados, professores, editores e sindicalistas (apenas parte deles, claro) instalaram no País uma rede de cumplicidades altamente duvidosa, cujo resultado é o inacreditável negócio dos livros escolares. Cada escola decide como quer os livros que impõe aos seus alunos. Os livros, por sua vez, são “actualizados” praticamente todos os anos. Como se não bastassem estes manuais, os empresários do sector (os editores) inventaram e convenceram os profs que seria muito interessante juntar aos ditos, uns cadernozitos de exercícios, e fazer uns lindos pacotes (“bundles”, como dizem os anglo-saxões), de que os pais não conseguem safar-se, mesmo que achem tais apêndices um substituto indecente da própria actividade esperada dos docentes. Como o peso dos custos assumidos pelas famílias com este negócio indecente não pára de crescer, os generosos bancos deste País matraqueiam os média com publicidade enganosa sobre a solução milagrosa dos seus créditos à compra de livros escolares — compre agora, e pague depois! Concluindo: o negócio do livro escolar, tal como está, precisa urgentemente de ser objecto de um inquérito implacável, pois tudo leva a crer que o mesmo se transformou nos últimos anos (com o beneplácito do PS e do PSD) numa ilegítima, irracional, inadmissível, escandalosa e pouco menos que mafiosa actividade. O País é pobre, os políticos são os primeiros a sabê-lo, e alguém anda a roubar as famílias portuguesas à pala do direito à educação!

Se há um ensino obrigatório, universal e gratuito para os primeiros doze anos de vida de cada cidadão, é óbvio que tal gratuitidade deve abranger os manuais escolares, e assim sendo, a produção destes e a sua utilização devem obedecer a uma gestão de recursos inteligente e rigorosa. Isto significa, por exemplo, que para cada disciplina devrá haver apenas um ou dois modelos disponíveis, sendo que ambos terão que obedecer aos conteúdos pedagógicos e respectiva metodologia expositiva decididos em sede governamental (seja esta o Ministério da Educação, ou outra instância reguladora, por exemplo, um Conselho Nacional de Educação, onde tenham assento as várias partes envolvidas no préstimo e recepção do bem educativo). A actualização objectiva das matérias pedagógicas a transmitir aos alunos deve ser produzida com conta, peso e medida, e sobretudo com um enorme sentido de responsabilidade científica, pedagógica e orçamental. Como pode aliás ser doutra maneira, quando todos os exames de fim de curso, ou ainda de acesso a graus subsequentes de ensino, são, como devem ser, exames nacionais? Como pode co-existir a actual bandalheira dos manuais escolares com a norma dos exames nacionais?! Cheira demais a negócio sórdido e a cumplicidade de interesses, para que não se exija de imediato a mudança radical do actual regime.
Para os que argumentam contra a gratuitidade dos livros escolares necessários ao cumprimento da escolaridade obrigatória, com base no peso desta medida no OGE, a resposta é simples: se o ensino é obrigatório, por fazer parte de uma assunção constitucional, e sobretudo estratégica, da nossa identidade cultural, então as ferramentas básicas do mesmo devem ser facultadas gratuitamente. Refiro-me, naturalmente, aos livros escolares, ao transporte escolar, ao desporto e outras actividades extra-curriculares realizadas no interior do recinto escolar e ainda aos apoios pedagógicos especiais. Tudo isto é óbvio, mas não necessariamente insuportável em termos orçamentais. Um exemplo: já alguém pensou na poupança que poderíamos ganhar imediatamente com a distribuição gratuita dos manuais escolares se os mesmos fossem distribuidos via Internet, em formato PDF, deixando-se aos alunos a opção de imprimir ou não, em cada momento, as páginas necessárias ao seu trabalho?

Pois aqui está uma “nova fronteira” a ultrapassar pelas novas energias convocadas por José Sócrates.

O-A-M #53 03 Outubro 2004

Expresso contra informa

o Gato, o Rato e o fim do extremo-centrismo


A actual maioria tinha um pequeno problema mediático de fim-de-semana: o congresso do Partido Socialista.
A abertura do conclave dera o tom, e o tom não era nada bonito para a actual coligação ilegítima que cavalga o País. Havia, por conseguinte, que roubar a cacha ao PS nos principais mass media dos indígenas. E assim se fez, sob a batuta do mais descafeínado dos pasquins oficiais: o Expresso.
Paulo Portas e Santana Lopes, ou alguém solícito por ambos, encarregou-se de deixar cair a dica num bitoque do Snob. A nódoa alastrou até Paço d'Arcos, e ei-la replicando-se e triplicando-se por tudo quanto é câmara mediática da mais imbecil imprensa do mundo. Como a coisa não tinha nenhum fundamento, a não ser o da necessidade de esfregar as nossas trombinhas atávicas com um pouco de emoção cor-de-rosa, e roubar espaço e tempo à pedrada no charco atirada pelo actual congresso do PS, logo chegaram os desmentidos da praxe. Enfim, somos todos parvos, não é verdade?
Mas já agora... duas ideias para treinar a mioleira embatucada de muitos de nós.
Ao contrário do que o toque a reunir da burocracia do PS tenta fazer crer, a verdade é que o PS extremo-centrista morreu. E morreu pela mesma razão que o Soarismo morreu: o Muro de Berlim caíu em 1989 e já não há fundos comunitários para alimentar a endogamia, o cabotinismo e a irresponsabilidade que imperaram nesta praia Lusitana ao longo dos últimos vinte anos. Como se isto não bastasse, não há nem vai haver nenhuma retoma da economia mundial nos tempos mais próximos, e quando ela vier, se vier, será uma retoma anémica e passageira (como as muitas recentemente anunciadas). Em suma, o desastre do Iraque e o modo como o Ocidente enfeudado a Bush pretende enfrentar o tema do Terrorismo (podemos lançar a ARTE CONTRA O TERRORISMO, mas não podemos lançar e propagandear uma GUERRA CONTRA O TERRORISMO), apenas irá piorar os cenários já de si muito graves da crise energética, ecológica e humanitária em que estamos metidos até ao pescoço. Abreviando razões, o PS só pode mesmo caminhar num sentido: o da defesa inteligente dos mais fracos, que em breve serão milhões, e o da defesa de uma reimposição estratégica do Estado no jogo das necessidades e das vontades do conjunto da população que aqui vive, trabalha, ou simplesmente sobrevive. Resta apenas saber se esta viragem do PS para a realidade será operada por Sócrates, ou directamente por Guterres (cujo silêncio parece augurar um exercício de penitência e humildade genuíno...) Cá estaremos para dar uma ajudinha! Preconceitos para trás! Precisamos de um pragmatismo de tipo novo, i.e de emergência.

Por outro lado, na banda direitinha do espectro partidário, o panorama caminha na direcção diametralmente oposta: quando o centro eleitoral estoirar, o PP sairá finalmente do interior do seu cavalo de Tróia (i.e. a coligação governamental, sabiamente cavalgada por Paulo Portas) para fundar um novo Partido, verdadeiramente populista e verdadeiramente de direita. O PSD já começou o seu processo de desagregação, sob o impacto insistente do núcelo duro do PP, extraordinariamente potenciado e acelerado pela inépcia caricata de Santana Lopes — esse génio de telenovela que os jornalistas da nossa imprensa tradicional tanto adoram e adulam. Paulo Portas tem-no efectivamente agarrado pelos c... Nada separará, tão cedo, estes siameses. Salvo Jorge Sampaio, se deixar de ser o verbo de encher que tem sido ultimamente e, por uma vez, assumir as suas responsabilidades institucionais com inteligência histórica. Só nessa eventualidade improvável, os planos de Portas sofreriam algum atraso. Até lá, o Paulinho continuará a brincar com o Pedrinho, como os gatos brincam com os ratos... antes de os comerem.

O-A-M # 52 03 Outubro 2004

sábado, outubro 02, 2004

Professores mal colocados

Trapalhada electrónica


Parece que quem realmente resolveu o bug (infiltrado?) no programa de colocação de professores não foi nada a ATX, mas três crackers de uma Direcção-Geral do Ministério da Educação do Norte. Resolveram o problema em três dias, e não em meia hora (!), mas, para não enredar mais a Ministra nos seus “pecebe?” optou-se por premiar uma empresa privada desconhecida pelo feito, não fosse a Comunicação Social agarrar-se com unhas e dentes às canelas dos pobres tarefeiros que, pelos vistos, o Estado tem ao seu serviço — e resolveram o essencial do problema. A dita ATX menciona um único cliente no seu portfolio: o Banco Espírito Santo.

Se repararem no texto publicado pela ATX sobre assunto, notar-se-à uma curiosa ambiguidade no mesmo:

“ A ATX congratula-se por ter contribuído para a resolução do problema da colocação de professores do Ministério da Educação que afectou a normal abertura do ano lectivo.
Contactada pelo ME para avaliar o problema, a ATX desenvolveu um novo algoritmo e implementação para o processo de colocação, reduzindo consideravelmente o tempo do cálculo.
Este resultado foi também possível devido à estreita colaboração com os serviços do Ministério e da sua equipa informática.
A ATX agradece igualmente à Microsoft e HP a instalação e disponibilização do hardware envolvido no processo. ”


Seria bom que esta aparente fuga de informação desse lugar a mais e melhores informações...

- O-A-M #51 01 Outubro 2004

sexta-feira, outubro 01, 2004

PT Wireless carissima

Dizem eles: 0,1 Euros/ min...
Digo eu: 6 Euros/hora (ou seja 1 conto e duzentos dos antigos!)

GRANDE ROUBALHEIRA !!!!!!

Além do mais, o principal objectivo desta gentinha é claro:
ocupar ilicitamente o espaço virtual disponível, que é e deve continuar a ser um bem comum,
com apoio sonambulista (ou declaradamente corrompido) daqueles que elegemos para nos Governar .

Juntas de Freguesia, Câmaras Municipais, Associações Culturais e Desportivas, Organizações Não Governamentais, pequenos negócios e pequenas empresas privadas, empresários inteligentes, desencadeiem um movimento alternativo a esta roubalheira organizada pelos novos carteis emergentes! Os carteis que os precederam tomaram conta do mundo físico e deram cabo dele. Os novos carteis preparam-se para usurpar literalmente todos os canais de comunicação entre humanos, para melhor ajudarem os carteis anteriores nas macabras façanhas em que estão envolvidos e nas que virão a estar no futuro.

Hackers de todo o mundo, uni-vos!

Warchalking total contra quem não nos quer bem e pretende assenhorear-se do que não é seu!

Ponhamos os nossos próprios hotspots ao serviço da comunidade, sem medo dos tão propalados abusos.

COMO?
Muito simples:
1) criem, discutindo sempre as melhores condições de tecnologia e preço, os v/ próprios Hot Spots (zonas de acesso wireless).
2) Disponibilizem gratuitamente os vosso Hot Spots à comunidade que vos rodeia.

Temos que impedir que os Senhores da Economia Global (e da nossa desgraça colectiva) tomem conta do território virtual, de todos os canais do espectro radioelectrico e dos nós da rede Internet, para impor a sua avarícia e todo o lixo mediático com que já hoje encharcam o nosso quotidiano — nas televisões, nas ruas, nos passeios, nos jardins, no metropolitano, nas estradas e nas auto-estradas, nos telemóveis..., sem que ninguém se levante e diga:

BASTA DE BIG BROTHER!
BASTA DE FASCISMO MEDIÁTICO!


Estamos diante dum desafio muito sério. Temos que lhe fazer frente com determinação e génio.
Trata-se de uma luta crucial pela defesa da liberdade e da democracia.

Portugueses, acordem!

Divulga este manifesto contra a cartelização do espaço comunicacional.

- O-A-M #50 01 Outubro 2004

domingo, setembro 26, 2004

Socrates 3

Manuel Alegre: o pragmatismo das causas


Já se sabia que o candidato do aparelho iria ganhar. Tinha tudo a seu favor na lógica burocrática e interesseira dos exangues partidos políticos da nossa democracia. Mas o que não se sabia é que Manuel Alegre iria protagonizar o início de uma metamorfose profunda no pragmatismo corrompido de que padece a generalidade das forças partidárias do nosso País. De facto, o pragmatismo dos interesses, das subserviências e das pequenas e grandes corrupções chegou ao fim.
Maria Belem Roseira

E chegou ao fim por uma simples e única razão: deixou de haver margem de manobra para o despesismo corrupto, para a irresponsabilidade política e para a indecência manifesta. O tempo das vacas gordas dos Fundos de Coesão chegou ao fim. Malbaratámos esta oportunidade única de organizar as nossas vidas? Os políticos passaram o tempo a tomar conta de si mesmos? Deixaram o País de tanga e sem ideias? Vem aí um ciclo irreversível de recessões e uma imparável curva ascendente nos custos da energia e do dinheiro? Que fazer com os políticos que temos? Para já, vigiá-los de perto e sem descanso!

A vitória de Manuel Alegre não passou nunca por ganhar agora a direcção do PS. Passou sim, e conseguiu-o, por mobilizar a opinião socialista para o futuro da força partidária que, sózinha ou acompanhada, terá o destino do País nas mãos em 2006 ou em 2010. O número, sem precedentes, de militantes que pagaram as quotas atrasadas e acorreram às urnas, e o número de votantes regulares no PS que pediram — e continuarão a pedir — a sua adesão ao partido (entre os quais me incluo), não apenas na esperança de uma mudança imediata do comportamento político e ético do PS, mas sobretudo pela convicção de que é urgente preparar o Partido Socialista para os desafios dramáticos que a sociedade Portuguesa vai encontrar nas próximas duas décadas, representam, creio bem, o início de uma metamorfose sem precendentes na história dos partidos Portugueses. Os desafios do futuro imediato exigem, pois, muito mais do que um mero rotativismo eleitoral em volta do bloco central dos interesses que, ao longo das últimas décadas, se revelou incapaz de definir uma estratégia clara e sustentável para Portugal, mas soube, isso sim, aproveitar-se sem escrúpulos da abundância que transbordava das mesas orçamentais do poder.

Manuel Alegre e a sua equipa estão pois de parabéns por esta extraordinária e corajosa pedrada no charco.
Os escriturários da opinião pública, disfarçados nas suas cândidas máscaras de isenção jornalística (como se boa parte do jornalismo que temos não fosse uma mera sucursal das agendas políticas do atarantado poder económico lusitano), versejaram sobre as virtudes do pragmatismo, em volta da improbabilidade ministerial de Manuel Alegre, esquecendo que, a seu tempo, não faltarão nem candidatos nem boas escolhas, seja para o Governo, seja para a Presidência da República. Bastaria um pouco de honestidade intelectual para ter reparado na qualidade programática do Manifesto proposto por Manuel Alegre (sobretudo o ponto relativo à necessidade de recuperar a ideia de um Estado Estratega, por oposição ao traiçoeiro Estado Mínimo). Bastaria ter reparado nas prestações de Maria Belém Roseira, para saber que a mesma seria uma Primeira-Ministra infinitamente mais inteligente, arguta e humana que o populista desastrado Pedro Santana Lopes, o qual herdou o poder dum correlegionário transfuga, como se o poder não passasse duma Lotaria de fim-de-semana. Se os opinadores de pacotilha não dependessem tanto do que lhes pagam para dizer e escrever baboseiras, talvez dissessem a verdade. Assim, apenas conspiram a soldo do status quo.

Como escrevi, a propósito do escândalo de pedofilia (não percebo que faziam os manos Pedroso no campo de visão dos média, a noite passada, na sede de campanha de Manuel Alegre...), e também sobre a evolução da actual coligação partidária de direita, o sistema político estabilizado (e corrompido) em volta de um Bloco Central de poder acabou. Tal só foi possível enquanto rios de dinheiro afluiam ao nosso País. O mundo Ocidental vai ser forçado a aprender a superar a ideologia consumista, e o nosso País vai atravessar um longo período de penúria orçamental, desemprego e mal-estar. Neste quadro político-social, nada impedirá a radical clarificação dos interesses de cada um. Os partidos políticos tenderão, pois, a ser mais descaradamente liberais e populistas na banda direita do espectro partidário (a solução Buchista é a preferida pelo estratega Paulo Portas), e mais intervencionistas e sociais (sem prejuízo de um inevitável emagrecimento do Estado) na banda esquerda do mesmo espectro eleitoral. Isto significa que o tempo das maiorias absolutas (aliás episódico) acabou definitivamente. O nosso sistema partidário vai ter que aprender rapidamente a preparar cenários estratégicos de cooperação formal, i.e. coligações eleitorais de incidência governamental. O novo rotativismo será assim muito mais clarificador para todos os que votam e para todos os que exercem o poder.

Mas voltando ao novo sistema partidário em gestação (por força da dramatização social que aí vem), e que, em boa verdade, começou a ganhar claramemte forma na banda direita do espectro partidário, a partir do núcleo inovador formado em torno de Paulo Portas, o Partido Socialista, depois das eleições primárias de ontem, viu abrirem-se as portas de Pandora a uma transformação inevitável — a que José Sócrates deverá prestar a melhor atenção, se não quiser naufragar rapidamente nas tumultuosas águas conspirativas do aparelho que o elegeu. As direcções partidárias de todos os partidos com ambição governamental (mas também os sindicatos e associações patronais, as ONGs, etc.) terão, a partir agora, que adoptar mecanismos eleitorais e de validação das suas estruturas, públicos e transparentes . Sobretudo os partidos políticos, terão que abrir as suas portas, de forma institucionalmente clara, a quem neles vota. É por isto, e não pela espuma eleitoral de ontem, que a derrota de Manuel Alegre foi uma vitória.

- O-A-M #49 26 Setembro 2004

sábado, setembro 04, 2004

Bárbaros de Beslán

Petróleo, Guerras Assimétricas e Terrorismo


Sobreviventes de Beslan. Photo: Sky NewsO-A-M
#48
04 Setembro 2004

Depois de assistirmos a um Primeiro-Ministro de gatas perante o seu obstinado e calculista Ministro da Defesa, vimo-lo hoje babar-se de pena diante da tragédia de Beslán. Podia ter enviado uma mensagem de repúdio da acção terrorista. Podia ter enviado um fax de solidariedade com o povo Russo à pessoa (sinistra) de Vladimir Putin. Mas não, o importante foi desmultiplicar-se em poses televisivas lacrimejantes sobre o sucedido, fazendo alusões soezes à embrulhada em que se viu envolvido por causa das Women on Waves e da qual saíu completamente ridicularizado por Paulo Portas. Não vomitei, porque me ri.
Como se isto não bastasse, tive ainda a infelicidade de escutar o pomposo Ângelo Correia, armado em especialista do Médio Oriente e dos Assuntos Árabes, dizendo disparates de monta sobre a Chechenia. Para ele, o terrorismo não passa de uma fúria anti-civilizacional; as forças de intervenção militar não provocaram o terrível desfecho que os pais e mães das crianças temiam (e à semelhança do que sucedera em Moscovo); a Chechenia não tem interesse económico nenhum, muito menos que justifique aquele inferno; em suma, há que malhar nos turras, mesmo matando uns milhares de compatriotas pelo caminho, e pronto. Sempre gostaria de saber por quem corre este condottieri...

A minha posição de princípio sobre o terrorismo é a mesma que a defendida sobre o uso da guerra na resolução de conflitos de interesses: por mais sérios que estes sejam, nada os justifica numa sociedade tecnológica e informacionalmente aberta. Mas isto não significa alimentar a ingenuidade de pensar que o terrorismo (acções de sabotagem, assassinatos selectivos ou em massa, bombas humanas, raptos e sequestros, sobretudo dirigidos a alvos indefesos) seja uma invenção do Diabo. Ou que seja o resultado de mentes doentiamente saturnianas. Ou ainda uma praga, denominada agora com o pomposo nome de Choque de Civilizações. O TERRORISMO, como escrevi noutra ocasião [Vontade e Terror], TAMBÉM É A CONTINUAÇÃO DA POLÍTICA POR OUTROS MEIOS. Sem compreender as causas dos conflitos, não poderemos pois fazer qualquer juízo de valor sério sobre as suas consequências trágicas. Repudiamo-las como provas da barbárie humana, mas não devemos, por respeito à nossa faculdade de julgar, valorizar como intolerável uma acção terrorista, e como justificado o bombardeio massivo de cidades, vilas e aldeias por Forças Armadas de um qualquer Estado. As vítimas são as mesmas, e o seu horror também!

Sugiro, em suma, que nesta como noutras matérias da vida actual, busquemos activamente a informação para lá dos esquemas de contra-informação veiculados por uma imprensa de massas cada vez mais estupidificada, corrompida e directamente ligada aos interesses dos respectivos donos. Neste caso, recomendo vivamente a leitura do relatório sobre a Chechenia elaborado pela Radio Nederland.

Petroleo y terrorismo: una relacion explosiva

El diario holandés Het Financieele Dagblad, especializado en temas económicos, publica un artículo titulado: "El hambre de petróleo alimenta el terrorismo", de Heiko Jessayan.  El articulista constata que la ingerencia estadounidense convierte al Cáucaso en un verdadero polvorín. Detrás del drama del secuestro en Moscú, consecuencia del conflicto entre Rusia y Chechenia, están los intereses financieros de empresas petrolíferas transnacionales como Chevron, Exxon Mobil y Unocal. Según Jessayan la guerra fría está lejos de haber terminado.

artigo completo

Importante relatório sobre Chechenia

sexta-feira, setembro 03, 2004

Women on Waves 7

Bluff de Paulinho Portas vence Santana Lopes por K.O. ao primeiro assalto!


OAM
#47
03 Setembro 2004
Depois de levar um puxãozinho de orelhas do Presidente da República e Comandante Supremo das Forças Armadas, Santana Lopes proclamou (à laia de retaliação contra o excesso de zelo provocatório do Sr Portas) que o debate sobre a lei do aborto regressaria à agenda política já no próximo período legislativo. Anunciou que não gostava de coisas estáticas e que a inflamação pública em volta do aborto poderia acalmar muito em breve. A postura denotava uma óbvia confrontação com o chefe do partido minoritário da actual coligação. Iria resistir ao confronto?
Vimos, ao final da tarde de ontem, que não! O Paulinho bateu o pé; ameaçou rebentar com a coligação; e o Santana Lopes amochou que nem um cordeirinho manso antes do sacrifício. Que mau passe! Pensou que o seu amigo de tantas confidências iria tramá-lo? Pensou que ele estaria disposto a romper a coligação? Mau jogador de Póker este Primeiro-Ministro.
Paulo Portas jamais romperia a coligação, por que no dia em que o fizer, se o fizer antes de quebrar de vez a espinal-medula do PSD, perderá qualquer possibilidade de voltar ao poder em muito tempo, perdendo de seguida o PP (que naturalmente se revoltaria contra ele). Por outra parte, talvez seja mais fácil a Santana Lopes levar um Governo minoritário até ao fim da Legislatura, negociando habilmente com um PR tolerante e com um PS ainda em crise, do que prosseguir o Calvário da convivência com o actual líder do PP. Não ver o tabuleiro do actual xadrez político-partidário desta forma vai-lhe sair muito caro.
Quanto ao Presidente da República, perante o verdadeiro caos que reina na Administração Pública e a instabilidade psicológica que grassa na sociedade civil, a continuar o ambiente de confronto entre a ambição desproporcionada de Paulo Portas e a própria estabilidade institucional, o melhor será tirar as devidas ilações da filosofia que presidiu à decisão de empossar o actual governo de opereta. O chefe de um governo democrático não pode ser condicionado pelo seu Ministro da Defesa, sujeitando-se ciclicamente à chantagem do fim da coligação, sob pena de assistirmos a um aviltamento ainda maior do actual sistema político.

quinta-feira, setembro 02, 2004

Women on Waves 6

Artista, médica e navegante holandesa põe Governo Português em transe ideológico


WoW modelO-A-M
#46
02 Setembro 2004
Poucos saberão que há precisamente um ano as Women on Waves (WoW), apresentaram na Mediamatic Foundation / perspectives on digital culture uma exposição da sua actividade simultaneamente social, política e artística. Nela se puderam apreciar quatro instalações de Willem Velthoven, em colaboração com Rebecca Gomperts, a clínica móvel de abortos, A Portable, do Atelier van Lieshout (AvL), e documentação sobre a então mais recente expedição marítima das WoW. A clínica móvel, A-Portable, continua a ser considerada uma peça chave do Atelier van Lieshout, tendo sido aliás apresentada na Bienal de Veneza (2001) e na AvL Ville (Roterdão, 2002).
Como podemos ler no Sítio da Mediamatic Supermarkt,
os projectos iniciados pelas WoW transcendem as fronteiras tradicionais; não apenas entre países, mas também em domínios profissionais diversos, tais como o direito, a medicina, a navegação marítima, a arte e a literatura. Um dos objectivos cruciais das WoW é alertar a opinião pública. A par das campanhas de sensibilização e apoio, as artes visuais e os novos média, mas também a moda e a imagem em movimento têm-se vindo a revelar como ferramentas importantes deste projecto”.

Olhando para a história recente dos tactical media e do hacktivismo, categorias com menos de uma década, daquilo a que poderíamos chamar uma arte pós-Contemporânea, este foi porventura o gesto ético e artístico com maiores repercussões no quotidiano sócio-político de um País. Não se trata de nenhuma brincadeira. Mas poucas vezes uma “obra de arte” — ainda que híbrida—, foi capaz de precipitar um Governo europeu em tamanha atrapalhação. Enviar navios de guerra (ainda que obsoletos) contra uma embarcação europeia, desarmada, pacífica, com uma tripulação exclusivamente feminina e em missão ideológica mais do que legítima, deixou a actual maioria governamental numa figura caricata dificilmente ultrapassável. A gargalhada seria geral se o assunto não fosse, como é, demasiado sério.

Soube que a manifestação de ontem em frente à residência do Primeiro-Ministro foi, como muitas outras, anémica e pobre de ideias. A culpa principal é, obviamente, da decadência manifesta das forças políticas tradicionais (partidos, grémios e sindicatos); demasiado usadas, falhas de imaginação, burocratizadas e sobretudo corrompidas pela proximidade do Poder que a Democracia naturalmente lhes faculta. Creio sinceramente que a reforma dos métodos de debate e agitação política já só pode ter origem em vórtices criativos exteriores a este tipo de organizações. As ONG são um bom começo. Mas a minha convicção profunda é que o mais interessante há-de surgir dos novos colectivos em torno daquilo a que poderíamos chamar criatividade cognitiva. Mas para chegarmos aqui — como o fez Rebecca Gomperts e as WoW, precisamos de entender uma coisa essencial: vivemos sob a influência permanente de um novo tipo de realidade. Chama-se realismo mediático.

PS1 — As declarações do Primeiro-Ministro, à saída do Palácio de Belém, sobre o agendamento político da legislação sobre o aborto no decorrer do novo ano parlamentar, podendo ter em vista regulamentar a actual Lei por forma a incluir os riscos psicológicos no elenco das condições clínicas que possibilitam a IVG, é, para além de uma bofetada de luva branca no Sr Portas, um sinal extremamente auspicioso para o desenrolar civilizado deste terrível debate. Esperar para ver...

PS2 — Devo ao Nuno Sacramento (a quem enviei os meus blogs sobre as WoW) o link que me permitiu este artigo.

PS3 — No âmbito da Porto 2001, a convite de Miguel von Haffe Pérez, Meta Bauer comissariou a exposição First Story-Women Building / New Narratives for the 21st Century, na qual as WoW participaram. A acção em que estão neste momento envolvidas é assim uma segunda visita ao nosso País, cujo êxito espectacular se está a dever em grande medida ao atrofiamento neuronal irreversível dos rapazes que actualmente cavalgam o Governo Português. [04 Set 2004]

quarta-feira, setembro 01, 2004

Women on Waves 5

WOMEN ON WAVES ATTACKED BY PORTUGUESE GOVERNMENT, NOT IN OUR NAME!


Photo: Women on WavesBarcos de guerra bloqueiam Ms. Borndiep a 15 milhas da costa Portuguesa.
29-08-04, 17:15 : A Marinha de Guerra Portuguesa circunda o navio da Women on Waves e impedem a aproximação do navio à costa Portuguesa. Foto: Nadya Peek for Women on Waves.





OAM #45
01 Setembro
2004
Como se previa, o ministro fatal deste Governo de opereta esperou pouco para tramar o seu parceiro de coligação. Com o Primeiro Ministro em parte incerta, Paulo Portas começou uma guerra, com fragata, corveta e tudo, contra um pequeno rebocador transformado em navio de apoio à causa da legalização do aborto. A situação actual é a seguinte: Portugal bloqueou e bloqueia (através de ameaça militar!) a entrada em Portugal de um navio comunitário em missão de paz; Portugal impediu e impede a circulação livre de cidadãos comunitários no seu território, sem uma única base legal válida; o inenarrável Ministro da Defesa declara, com aquele seu ar parvo, que o assunto, para o Estado Português, está encerrado. O Primeiro-Ministro parece continuar de férias. O Presidente da República já deve ter regressado de Atenas... para assumir o cargo de Comandante Supremo das Forças Armadas. Só não se sabe se vai cumprir a sua promessa de garantir a tal continuidade do espírito do Governo legítimo que deu lugar à presente aberração.
Mas desenganem-se todos, a começar pelo Sinistro Portas: o assunto não está encerrado não senhor! Muito pelo contrário, só agora começou a deflagrar como uma verdadeira bomba mediática por essa Europa fora — a tal Europa Comunitária, de fronteiras abertas, com moeda única e uma soberania crescentemente partilhada, mas que o Paulo betinho sempre odiou (porque são assim alguns betinhos, que nunca viram nem tropa, nem guerra, na puta da vida), embora tenha, neste preciso momento, como seu Presidente, o homem que lhe deu a mão (ou a quem deu a mão): José Manuel Barroso.
O Paulinho conseguiu colocar a imagem do nosso País atrás das dos Irlandeses e Polacos, mas à sua maneira: i.e. estrondosamente. Para que toda a Europa confirme o que já suspeitava: que os Portugueses são um povinho atrasado com' ó caraças! E que gostam bué de Fundos Comunitários. Mas lá trabalhar, lavar os dentes, cortar as unhas, conhecer nem que seja mais um desportozinho além do futebol, deixar de cuspir para o chão, ou de estacionar em cima dos passeios, iss' é qu' era bom! Além do mais, os Portugas, ao que parece, têm a mania de foder as gajas e metê-las na pildra sempre que estas se atrevem a abortar fora duma clínica madrilena ou londrina.

Não em meu nome! Não em nosso nome!

Precisamos de gritar bem alto isto, ou algo parecido, ao longo deste mês. De modo a que saiba que em Portugal não habitam apenas indígenas da Idade Média, corruptos e atrasados mentais.

O nível da resposta da actual maioria à tempestade que se foi levantando depois do acto filho-da-puta de Paulo Portas ficou bem ilustrado na prestação da ex-comunista (e actual personagem rasteira do PSD) Zita Seabra. Depois de alardear como uma peixeira de fracos recursos oratórios que fora ela quem ensinara aos Espanhois como redigir a sua Lei do Aborto, deu-nos a conhecer que toda a sua recém-iluminação e clarividência sobre temas tão complexos como o da Interrupção Voluntária da Gravidez — inatingível por qualquer homúnculo de esquerda — tinha origem numa nova e fascinante Sociologia: a Sociologia do Cabeleireiro. Quem não passou, como ela, pelas passas dum Cabeleireiro, não pode saber até que ponto as mulheres Portuguesas estão tão bem informadas sobre como e onde abortar! Ficámos ainda a saber, de borla (um bónus para a plateia...), que já não existe proletariado. Metalúrgicos, mineiros, extractores de petróleo, montadores de automóveis, de televisões, de DVDs ou de computadores, apanhadores de café e chá, enroladores de charutos, operários têxteis, do calçado ou da indústria alimentar,... nada. Já nada disto existe. E quem lho disse, foi alguém, no cabeleireiro...
É certo que muito boa gente — tanto do PSD, como do PP — anda nestes dias com a pele arrepiada. E que alguma dessa gente teve a coragem de distanciar a sua opinião destas aberrações ideológicas e destes repelentes abortos do carreirismo. Temo, porém, que tais actos de civilidade e inteligência não cheguem para atalhar a verdadeira destruição ideológica actualmente em curso no interior do PSD, pela mão do Sr. Santana Lopes, e pela cabeça do Sr. Paulo Portas.

Estou disposto a assinar qualquer petição cujo título comece por: WOMEN ON WAVES ATTACKED BY PORTUGUESE GOVERNMENT, NOT IN OUR NAME!

terça-feira, agosto 31, 2004

Women on Waves 4

Tenho vergonha deste País


OAM #44
31 Agosto
2004

Sr. Primeiro Ministro,
Lamentável, o comportamento do seu Governo na questão do barco das Women Waves. Invocar a questão da soberania neste caso, não só é completamente ilícito, como estampa nos olhos da EUROPA uma imagem retrógrada e hipócrita dum País que até hoje apenas recebeu e ainda nada pagou pela sua condição Comunitária. O Sr esqueceu-se que a soberania nacional dos Países Comunitários caminha para uma soberania partilhada (e não tosca e ridiculamente Nacionalista, como atesta este seu comportamento face às Women on Waves). O Sr esqueceu-se que impediu a entrada no nosso País de cidadãos Comunitários, como se fossem perigosos terroristas! O Sr esqueceu-se do dever de auxílio e solidariedade aos navegantes que clara e honradamente anunciaram os propósitos da sua viagem a Portugal (deixando-os ao largo das 12 milhas, sem alimentos frescos e sob condições climatéricas adversas). Tenho realmente vergonha do comportamento do seu Governo, e temo que o seu Ministro da Defesa tenha avançado muito mais depressa do que previ na transformação ideológica do seu Partido. O PPD que começa a desenhar-se no horizonte tem todas as características oníricas sonhadas pelo seu aliado de circunstância, e nenhuma das sonhadas por Sá Carneiro. O Senhor, se nada fizer, ficará na História como o ingénuo veículo desta aberração.
Atentamente,

AC-P

PS — incito quem ler este Blog a manifestar a sua opinião no Portal do Governo, enviando uma msg de protesto contra este comportamento ilícito, hipócrita e desumano do Governo de Santana Lopes

segunda-feira, agosto 30, 2004

Convenção Bush

Smart mobs e Tactical media: a nova cultura democrática em acção.


Bush no moreOAM #43
30 Agosto
2004
Sou um dos muitos espectadores Portugueses que não perdem The Daily Show de Jon Stewart (na SIC Radical). Depois dos dois últimos filmes de Michael Moore, este é sem dúvida o mais corrosivo e inteligente programa mediático contra o descalabro da América de Bush. No entanto, não se fique com a ideia de que a contestatação criativa e humorística à sinistra pandilha de ladrões que ocupou o poder nas terras do Tio Sam se fica por estes dois excelentes protagonistas galácticos. Activistas de todos os credos e múltiplos colectivos de arte pós-Contemporânea formam já uma imensa rede de enxames inteligentes (os chamados Smart Mobs) anti-Bush.
A Convenção Nacional Republicana, que começa hoje em Nova Iorque, e durará até dia 3 de Setembro, promete pois atrair sobre si uma sucessão de ondas de protestos com os mais diversos matizes e intensidades. Estas eleições deixaram há muito de ser um problema local, dada a hegemonia prepotente exercida pelos Estados Unidos sobre todo o planeta. Desde que a Direita Republicana tomou de assalto as principais instâncias do Poder naquele País, boa parte do mundo ficou suspensa do que sai ou deixa de sair dos sinistros neurónios da cáfila de aldrabões e assassinos capitaneada por Bush. Creio que cada um de nós vota, pelo menos abstractamente, nestas eleições. Tal é a importância que instintivamente atribuimos ao respectivo “day after”. Uma boa táctica, neste novo contexto tecnológico e de cidadania global, seria organizar uma votação virtual à escala planetária, paralelamente ao escrutínio Norte-americano.
Para quem estiver interessado no tema, recomendo alguns destaques recentes, que reuni no blog Radar de hoje.

domingo, agosto 29, 2004

Women on Waves 3

O ridículo Ministro da Defesa Nacional não vive na Europa!


Paulo Portas: metamorfoseOAM
#42
29 Agosto 2004
O imprestável Ministro da Defesa acabou por levar adiante a sua provocação contra a esperada visita a Portugal das Women on Waves. Interpretando a Lei Internacional sobre acolhimento de navios em águas territoriais com aquele calculismo cínico que tão bem caracteriza os pequenos ditadores, o Sr. Portas decidiu impedir a entrada de um navio Europeu num porto Português. Trazia bombas? Droga? Imigrantes escondidos em caixotes de bananas? Mafiosos ligados às redes criminosas de prostituição infantil? Não. Trazia, tão só, um grupo de mulheres e uma causa.
As mulheres são cidadãs europeias, e a causa — a da interrupção voluntária da gravidez — há muito que vem sendo debatida e votada em todos os países da Comunidade.
Para além do oferecimento de serviços de aconselhamento médico, as Women on Waves proporcionam ainda a possibilidade de realizar abortos em águas internacionais, sempre que reunidos os pressupostos previstos na generalidade das legislações comunitárias (e em particular na legislação Holandesa). O Governo Português não tem, pois, nada a ver com este assunto. Tal como não teria se iniciativa cívica similar viesse a ter lugar, por exemplo, no interior de um autocarro Espanhol que viesse a Lisboa defender as mesmas ideias e oferecer a prestação dos mesmos serviços, desta vez em Badajoz, ou se ainda um avião Francês viesse à Portela, fretado por uma ONG determinada a realizar acção idêntica. A interdição executada por este Governo de opereta não passa assim de uma ilegalidade e de uma prepotência manifestas. Aliás graves, se tivermos em conta que ambas se dirigiram contra cidadãos europeus no uso dos seus direitos e liberdades democráticas.
A Direita Portuguesa que actualmente nos desgoverna (por pouco tempo, felizmente) é de uma hipocrisia caricata. Na sua impotência empresarial, política e militar, rasteja como uma pedinte queixosa e baba-se diante dos divinizados Fundos Comunitários (que logo rouba, corrompe ou desbarata em parvoíces). Quando lhe convem, porém, puxa dos pergaminhos inexistentes e transforma o exercício da Política numa Revista nacionalista ao estilo do mais decadente Parque Mayer.
Como previa, o Paulo Portas continua muito bem colocado para destruir ou tomar conta do PPD. Quanto a Santana Lopes, vamos vê-lo frequentemente a assobiar para o ar e a passar intermináveis férias de trabalho em Ibiza. Do Sr. Sampaio, nem pio.

Post-scriptum [22:00] — O PPD pronunciou-se formal e pomposamente, através dum qualquer néscio recentemente promovido por Santana Lopes, a favor do “combate” contra a terrível ameaça à soberania nacional chamada Women on Waves. Que vergonha! Onde já vai o PPD de Paulo Portas...
Toda a gente sabe que as fragatas e as aeronaves do Paulinho nada fazem que se veja, em matéria de controlo da pesca ilegal nas águas territoriais Portuguesas (que aliás, para este efeito, são naturalmente e cada vez mais águas territoriais comunitárias), ou na caça aos traficantes de droga que desembarcam as suas mercadorias de Norte a Sul do País, ou no ataque às redes de tráfico e exploração de seres humanos (mulheres e crianças principalmente), ou na luta contra o expatriamento fraudulento de capitais para o “off-shore” da Madeira e similares. O Paulinho e o novo PPD são impotentes (coitados!) para fazer face a qualquer destas guerras. Mas têm uma coragem do caraças para bloquear, como se de uma armada hostil se tratasse, um pequeno rebocador com 8 mulheres ao serviço de uma causa ideológica comum à esmagadora a maioria da população europeia. Os Espanhóis têm uma expressão muito engraçada para este tipo de exercício virtual do poder: “paja mental” (i.e. pívia mental!).

sábado, agosto 28, 2004

Women on Waves 2

O ridículo Ministro da Defesa Nacional


Paulo Portas: des-foto oficialOAM
#41
28 Agosto 2004
Como era de esperar, a turma de direitinhas que comanda este Governo de opereta tinha que asnear na questão da visita do Women on Waves a Portugal. Gostam de Audis, de Nokias, de Personal Trainers, mas em tudo o resto, estes indígenas, permanecem atávicos, pacóvios, manhosos, e néscios. Falam do alto do seu machismo duvidoso contra o sexo oposto, como se a sorte deste último dependesse dos seus frágeis neurónios. São boçais quando assomam pomposamente no pequeno écrã. Não sabem que a sociedade civil não é uma repartição, nem uma paróquia do Governo. Em suma, divertem-se a fazer figuras betinhas e tristes, enquanto lhes não dermos um valente pontapé eleitoral pela espinha acima!

Teoria da conspiração: o Sr Portas gostaria imenso de aproveitar a visita do Women on Waves para criar incidentes de toda a ordem. Para além do frenesim que seria lançar a sua Armada poderosa contra o rebocador holandês, não deve deixar de aproveitar todas as ocasiões que se lhe ofereçam para entalar suavemente o Santana Lopes, ensinando-lhe pacientemente a meta do futuro PPD, a que PP, um dia, voltará (como líder, claro!). Vamos ver como reage o nosso Chavez.

quinta-feira, agosto 26, 2004

Women on Waves 1

Aborto: a coragem de agir


Women on Waves rumam a PortugalOAM
#40
26 Agosto 2004
O navio da Organização Women on Waves zarpou do porto Den Helder (Holanda) no passado dia 23 de Agosto rumo a Portugal. Esta viagem de apoio à implementação de leis justas sobre a interrupção voluntária da gravidez (IVG) tem origem num apelo e num convite feitos sucessivamente pela Psicóloga Cecília Costa e pelas Organizações Não te Prives, Youth Action for Peace, UMAR e Club Safe.
O nosso País, por influência hipócrita e malévola das hostes mais reaccionárias da Igreja e dos partidos de direita (PP e PPD), continua tendo a lei do aborto mais vil de toda a Europa.
Numa sondagem do Jornal de Notícias, publicada a 26 de Agosto, ficámos a saber que 63% dos Portugueses acolhem favoravelmente esta viagem solidária e activista da Organização Holandesa. É um bom indicador, mais um, do sentimento maioritário que vem crescendo contra os efeitos desastrosos e venais da Direita no Poder.
Parece que o Sr. Portas quer, a este propósito, puxar dos seus ridículos galões de Ministro da Defesa, por um lado, pedindo explicações ao Governo Holandês sobre esta acção cívica, e por outro, ameaçando intimidar as pessoas que decidirem acorrer aos diversos portos onde o Women on Waves atracar. Como se não bastasse, uma qualquer alegada Organização Pró-vida recomenda acções de vandalismo de Estado contra o Womens on Waves! Vamos a ver no que vai dar mais esta provocação da Direita do Sr. Portas e do Sr. Santana Lopes.
É tempo de mostrar ao pequeno provocador do regime (Paulo Portas) que o seu tempo de governante tem prazo. Como?
— Indo ao encontro do Women on Waves, para saudar a iniciativa e dar-lhe um apoio bem visível.
— E recorrendo a todos os meios de esclarecimento público possíveis: Blogs, SMS, telefonemas e mensagens de correio electrónico dirigidas ao Ministério da Defesa, ao Primeiro Ministro (apesar de estar em férias...), ao Presidente da Assembleia da República e ao Presidente da República.
O importante é que cada de nós pense na insensatez da actual situação; na vergonha de termos uma lei e um Estado tão cretinos em matéria tão importante; no facto de mais de 20 mil mulheres Portuguesas abortarem clandestinamente em cada ano que passa, sujeitando-se a perigar a sua própria vida, a agravar ainda mais a tensão psicológica inerente a uma IVG, e sujeitando-se a ser perseguidas policialmente, julgadas e condenadas a pesadas penas de prisão.
O importante é que cada um de nós se mobilize para conversar com os amigos sobre este assunto, e por si só ou em grupo, decida fazer alguma coisa. Não custa nada enviar um mail com duas linhas de protesto aos principais responsáveis deste País.

QUEREMOS UMA LEI DA INTERRUPÇÃO VOLUNTÁRIA DA GRAVIDEZ, DEMOCRÁTICA E JUSTA!
FIM À HIPOCRISIA DA DIREITA!
FIM À CLANDESTINIDADE E EXPLORAÇÃO DAS MULHERES QUE ABORTAM!
FIM À HUMILHAÇÃO!

Links:

segunda-feira, agosto 23, 2004

Ciber politicos

Com vai a nossa partidarite electrónica?


m.alegre: sitio WebOAM
#39
23 Agosto 2004

Passei a tarde de Domingo a visitar as estratégias Web dos três candidatos à liderança do PS. O resultado foi algo decepcionante. E foi-o por três causas distintas: o das opções informáticas; o da fraca usabilidade e deficiente qualidade da escrita para Web; e o da rarefacção e assimetria dos conteúdos. Esperava que a Web Política surgisse finalmente nesta competição intra-partidária como uma pedrada no charco preguiçoso das nossas práticas eleitorais. Esperava que o exemplo das Presidenciais norte-americanas, actualmente em curso, exercesse maior influência no modo como os três candidatos aderiram à peculiar fricção digital que caracteriza a tecnosfera. Continuo a pensar, apesar do que vi, que o oportunismo enquistado nas articulações aparelhísticas do PS só irá começar a ceder quando as suas óbvias entorses cívicas forem claramente expostas à opinião pública; e quando os eleitores socialistas (os fieis, os estratégicos e os tácticos) começarem a exercer uma influência séria na vida interna do Partido Socialista. O PS, ao contrário do que afirma jacobinamente João Soares, não é nem deve ser um partido de militantes, mas um partido de eleitores — o que faz toda a diferença! Esperava muito mais pica destes ciber-candidatos. Mas vamos, então, às ditas causas...

Opções informáticas
jsocrates: sitio web Neste ponto, as opções não são nada alternativas, nem “modernas”, à excepção do Blog de Manuel Alegre, feito com o Movable Type e animado por Helena Roseta e José Magalhães, e que poderia, apesar da sua frescura, ter sido menos preguiçoso no desenho e concepção do respectivo ‘template’. Na realidade, os três domínios Web usam (na Web de Manuel Alegre) e abusam (nas páginas de José Sócrates e de João Soares) das tecnologias — e sobretudo dos pacotes comerciais — da Microsoft.
Esta empresa, como todos sabem, tem actualmente um gigantesco processo contra a Comunidade Europeia por causa da Guerra das Patentes em volta da criação computacional e informática. Esta empresa exerce um predomínio comercial absolutamenhte ilegítimo, imoral e inexplicável junto do Estado Português. A famosa fuga de informação sobre as putativa existência de ADM no Iraque, que viria a propiciar o suicídio (ou assassinato) de David Kelly, teve origem numa fragilidade típica dos produtos Microsoft, neste caso no Word (cujos rascunhos subsistem invisivelmente arquivados no DOC final). Os produtos desta empresa têm, como toda a gente sabe, mais buracos de segurança que um queijo Gruyère. Estados, regiões, cidades, grandes e pequenas empresas, por esse mundo fora, começaram há já algum tempo a declinar os cantos Evangelistas do Sr. Gates. Muitos deles passaram, ou estão em vias de passar, para o outro lado da barricada, na guerra informática em curso entre os defensores do Código Secreto e os defensores do Código Aberto (Open Source). E o mais importante, no caso que aqui analisamos, é isto: para publicar documentos na Web não se precisa, para nada, das soluções engatadas da Microsoft.
Os resultados de usarem e abusarem do Microsoft Visual Studio estão à vista no modo como, por exemplo, alguns browsers correntes se recusam a ler os chamados caracteres especiais incluídos nos documentos XML do Sr. Sócrates. Nesta matéria, Senhores candidatos, menos seguidismo, mais contemporaneidade técnica e táctica, e um nadinha de radicalismo, seriam bem-vindos.

Usabilidade e escrita para Web
Ler documentos escritos num livro ou numa revista de papel não é a mesma coisa que ler (e não VER, como aparece anacronicamente no site de M. Alegre) esses mesmos documentos na Web, numa agenda electrónica, ou num telemóvel. Embora a arrumação de ideias e de conteúdos seja mais cuidada no Sítio de Manuel Alegre que nos outros dois (rarefeita na DOT COM! de José Sócrates, e gongórica na página de João Soares), a verdade é que todos revelam desconhecimento absoluto das noções elementares de comunicação na tecnosfera, a que há muito damos os nomes de USABILIDADE e ESCRITA INTERACTIVA. Assim como estão, os manifestos e as moções não chegam a lado nenhum! E sabem porquê? Em primeiro lugar, porque foram ali enfiados com grande desprezo pela funcionalidade e elegância próprias do HTML, e com um lamentável exibicionismo Microsoftiano (dos pacotes Visual Studio e Word ao insuportável Power Point). Em segundo lugar, porque foram publicados na Web, não para serem lidos, mas para que a gente os imprima e depois leia no intervalo do almoço! Ora não é nada disto que se espera de uma guerra de candidaturas animada na Web. E não sendo animada, não suscitando atenção junto de quem se espera que surta efeito, em primeiro lugar, i.e., os internautas, para que serve? Para inglês ver?
Uma nota ainda sobre os formulários de apoio e votação. Se posso votar consecutivamente num mesmo candidato, aumentando artificiosamente o seu score (caso patente na página de João Soares), ou se posso inscrever apoios fictícios, inflaccionando alegremente a corte virtual dum candidato (caso patente na página de José Sócrates), então estamos a brincar à Net. E isso é péssimo, tanto para os Digitais que navegam nas suas águas, como para os Analógicos que vierem a saber da marosca.
A possibilidade de rentabilizar politicamente alguma vantagem competitiva, esperável deste tactical media, parece de momento condenada. Esta perspectiva pouco ou nada afectará a campanha aparelhística de Sócrates. Pouco poderá acrescentar ou diminuir às hipóteses de Soares. Mas, curiosamente, poderá fazer toda a diferença na campanha de Manuel Alegre. Este candidato, tal como antes o malogrado Sousa Franco, caíu bem junto de uma opinião pública farta de jovens ambiciosos sem palavra. Eu compraria um automóvel em segunda mão ao Manuel Alegre. Aos seus rivais, muito provavelmente, não.

Conteúdo
jsoares: sitio web João Soares quer este mundo e o outro; é ligeiro no discurso e ainda mais ligeiro nas ideias; é demasiado reiterativo; exibe um narcisismo em torno da sua pureza partidária que irrita qualquer mortal; afunda-se, resumindo, num demagógico oceano de generalidades. José Sócrates parece uma esfinge! Ele e a sua DOTCOM tiveram uma ideia luminosa: chama-se Plano Tecnológico. E nem mais uma ideiazinha para o debate; nem mais uma elucubração programática, pequenina que fosse, para o País atónito com o seu fantástico Plano Tecnológico. Nada... Sorri como Gioconda e espera que os aparatchiks façam o resto.
Finalmente, Manuel Alegre: li a sua moção, que deveria ter disponibilizado gratuitamente na Web, usando a sua linguagem própria, ie, o HTML, em vez de nos obrigar a comprar licenças Microsoft para o efeito. Até ao momento, é a única coisa produzida com pés e cabeça para o Congresso do Partido Socialista. Sem entrar na discussão dos temas, a sensação com que fiquei foi de que se trata de uma proposta de trabalho simultaneamente realista, corajosa e imaginativa. Recolhe preocupações actuais de muita gente. Reitera que as coisas não podem continuar como estão. Arrisca soluções. Revela-se combativo. Anuncia uma esperança.

É bem possível que o PS ganhe as próximas eleições, independentemente de quem esteja no comando das suas hostes. Seria uma pena que em vez de uma visão clara a nortear as energias positivas deste País, caíssemos de novo no pântano dos compromissos endogâmicos do extremo-centrismo. Temos que derrotar a Direita dos interesses. Temos que impedir a reedição do Bloco Central dos interesses. Mas temos, também, que saber evitar a Esquerda dos interesses — que também existe...

Precisamos de regras justas, de transparência e de responsabilidade.

LINKS: Manuel Alegre [Sítio] [Blog] José Sócrates [Sítio] João Soares [Sítios]

sábado, agosto 21, 2004

EUA 1

Espião da CIA denuncia o desatino da actual política externa americana


OAM
#38
21 Agosto 2004
Through our Enemies' Eyes e Imperial Hubris: Why the West is Losing the War on Terror, escritos pelo agente da CIA Mike Scheuer, compilam dados terríveis de uma política imperial cada vez mais intolerável. O radicalismo islâmico pode muito bem ser apenas a vanguarda de uma resistência muito mais vasta à ganância, à pirataria e ao autismo suicida do Senhor Bush e das pandilhas que o manobram e seguem.
Vale a pena ler o artigo do Guardian sobre o último livro de Mike Scheuer.

RSS Feed—We could have stopped him. CIA spy warns 'war on terror' could plunge US into even greater danger. Julian Borger reports. [Guardian Unlimited]

sexta-feira, agosto 20, 2004

Slow Food

Cultura e património gastronómicos: quem os defende?

rabanadas e formigos
Rabanadas e Formigos à moda de Cinfães do Douro.

OAM
#37
20 Agosto 2004

O movimento Slow Food começou em 1986, em Cuneo, na região do Piemonte (Itália). Chegou a estar na moda durante a década de 90, mas em Portugal mal aflorou.
Os seus pressupostos continuam vivos e talvez valha a pena aplicá-los, com imaginação e alguma disciplina, ao relançamento de um Slow Food Portugal, ou algo semelhante.

Recuerdo


Em 1979 participei num evento artístico em Malpartida de Cáceres, chamado SACOM II, sob a batuta de Wolf Vostell. Um dos momentos desse festival de inspiração neo-Dada chamou-se “Comidas Olvidadas”. Provaram-se petiscos variados e raros (como umas inesquecíveis alheiras de caça e umas morcelas de arroz, preparadas pela já desaparecida Túlia Saldanha).

Este interesse pelas tradições e diversidade gastronómicas é muito antigo. Gostaria de recordar, a este propósito, a importância que tiveram, e porventura ainda têm, entre nós, as Associações de Jantaristas, as Penhas Gastronómicas e os Festivais e Semanas Gastronómicas. Estas práticas, porém, correm o risco de desaparecer sob a pressão das batatas fritas e dos ‘hamburgers’ congelados. A dinâmica perversa dos patrocínios comerciais e do lucro rápido, por outro lado, há muito que ameaçam a integridade das feiras e semanas gastronómicas.

A protecção das tradições e da diversidade dos alimentos, das bebidas e dos pratos regionais Portugueses implica uma tomada de consciência urgente. Só depois, poderemos agir e organizar uma estratégia de salvaguarda destes valores patrimoniais em vias de extinção.

Ameaças

Não são apenas as espécies animais e vegetais que desaparecem a uma velocidade assustadora. A monotonia ruidosa dos McDonald's, dos Kentucky Fried Chiken, das Pizza Hut, das Coca Cola, e quejandos, simbolizam um outro tipo de empobrecimento a que devemos fazer frente: o da extinção da diversidade gastronómica, o do atrofiamento e desaparecimento das comidas tradicionais, o do fim da cultura gastronómica como forma de convivência e hedonismo salutar.

Os processos judiciais e acções de ‘tactical media’ que, à semelhança dos levados a cabo contra as grandes empresas tabaqueiras, começaram agora contra os fabricantes de ‘fast-food’, trazem-nos a esperança de ver o tema da diversidade alimentar na agenda cultural do século 21.

A propaganda negativa contra a falta de cuidado, ou de escrúpulos, dos monopólios da alimentação e das bebidas, está aliás a dar excelentes resultados com o polémico filme de Morgan Spurlock — Super Size Me — sobre os perigos do consumo excessivo de hamburgers (artigo do Guardian).

Antecipando este despertar da consciência alimentar e gastronómica, surgiu em Itália um movimento cujo poder de sedução cultural parece imparável: Slow Food.

Movimento Slow Food: excertos (trad. livre) do sítio Web.

Slow Food, fundada em 1986, é uma organização internacional cujo fim é livrar os prazeres da mesa da homogenização da comida e da vida apressadas. Através de múltiplas iniciativas, este movimento internacional promove a cultura gastronómica, desenvolve a educação do paladar, conserva a biodiversidade agrícola e protege os pratos tradicionais em vias de extinção.

Conta actualmente com 80,000 associados em mais de 100 países.

Patrocinada pelo movimento Slow Food e pela Região da Toscânia, foi entretanto criada a Slow Food Foundation for Biodiversity, dedicada especialmente a apoiar projectos em todo o mundo, com particular incidência nos países menos desenvolvidos, onde a saga da homogeneização industrial, tecnológica e consumista pende como uma ameaça igualmente fatal.

75% da diversidade alimentar Europeia desapareceu desde 1900.

93% da diversidade alimentar Americana desapareceu no mesmo período.

30,000 variedades de vegetais extinguiram-se ao longo do século passado, e mais uma desaparece em cada seis horas que passam.

[fim do texto]

terça-feira, agosto 03, 2004

Democracia Digital

A solução é simples, Dr. João Soares: proponha ao PS uma votação electrónica


15 mnOAM
#36
2 Agosto 2004

A extraordinária afirmação de João Soares sobre os salteadores do voto perdido que espreitam a próxima eleição do Secretário-Geral do PS (ver cacha ao fundo deste txt) merece, mais do que uma sonora gargalhada, alguma ponderação. De facto, não foi assim há tanto tempo que ouvimos falar da limpeza dos cadernos eleitorais do Partido Socialista. Podemos, por outro lado, imaginar a dificuldade de garantir uma total transparência eleitoral, se entretanto não houver uma definição e uma publicitação claras das novas regras do jogo. Se, como parece ter afirmado Sérgio Sousa Pinto, João Soares não tem gente suficiente para acompanhar as centenas de mesas de voto previstas, a coisa começa a ficar mesmo feia (para ele claro!)

Para este pequeno grande problema creio, porém, haver remédio seguro. Seja porque faltam militantes nas mesas eleitorais previstas, seja porque faltam mesas de voto e sedes partidárias (não sendo nada conveniente improvisar soluções mais ou menos clandestinas para este género de acto democático), seja, em suma, porque existem militantes irremediavelmente longe de qualquer mesa eleitoral, a solução mais segura e transparente para resolver este problema técnico (sejamos benevolentes...) reside na montagem dum sistema electrónico de votação. Podemos mesmo ir mais longe nesta ideia, propondo que tal sistema se alargue ao campo do debate político, nomeadamente através do lançamento dum Wikiki geral sobre o processo eleitoral e um Blog por cada um dos candidatos. Manuel Alegre, apesar do comentário rasteiro proferido no Domingo pelo tira-nódoas da actual maioria (o Professor Marcelo), adiantou-se na modernização das suas ferramentas de comunicação, lançando a tempo e horas o seu Blog.

Um tal sistema terá todavia que dar as garantias que a actual pseudo-sondagem enxertada na página de João Soares não garante. Podendo qualquer um de nós responder repetidamente (ainda que de 12 em 12 horas!) a esta sondagem, tamanha azelhice técnica permite uma óbvia manipulação de resultados. Quando participei no dito joguinho, os números foram os seguintes: 40.48% para Manuel Alegre, 17.86% para João Soares e 41.67% para José Sócrates. Somando as duas primeiras parcelas teríamos obviamente o fim das aspirações de José Sócrates. Temos que ser mais sérios, não acha Dr. João Soares?

Eu creio que Manuel Alegre, tal como Sousa Franco, nos surpreendeu e gerou uma imediata empatia, junto do eleitorado de esquerda, mas também junto daquele outro eleitorado a que gosto de chamar inteligente. Não há apenas uma Direita dos interesses. Há também, como todos sabemos, uma Esquerda dos interesses, tão ávida quanto a primeira na partilha dos bolos orçamentais, e tão ou mais irresponsável que a exangue burguesia portuguesa no abandono sistemático de uma ideia de vida e de futuro. Estamos todos demasiado desconfiados dos políticos. Não lhes damos, de facto, nenhum crédito. Aturamo-los, procurando apenas errar o menos possível nas escolhas, cada vez mais medíocres, que nos saiem na lotaria. Talvez por isso, uma personalidade como Manuel Alegre tenha surgido diante de nós como uma alternativa, no que poderíamos chamar o campo da dignidade e do compromisso desinteressado com a causa pública. Vamos ver se será capaz de levar a esperança a bom termo.

Para dizer a verdade, de momento, o meu coração inclina-se para Alegre, mas a minha cabeça, para Sócrates. Tudo vai depender do mês de Setembro. Assistimos a uma metamorfose do nosso sistema partidário. Mas assistimos também a uma reforma positiva nas dinâmicas organizacionais dos próprios partidos. O passo seguinte será o de incorporar a grande massa dos simpatizantes, consistentes ou ocasionais, na lógica formativa das maiorias que democraticamente se sucedem no interior das próprias formações partidárias. -- AC-P

Transparência.

A eleição do Secretário Geral do PS pode, e deve, ser um processo profundamente "revolucionário" em Portugal. E pedagógico também. Pela primeira vez um líder partidário será escolhido em sufrágio directo. Voto livre e directo de todos os militantes do PS. Uma mulher ou um homem um voto. Importa pois garantir transparência, limpidez e cumprimento das regras legais de voto e escrutineo. Só assim teremos verdade e democracia. São cada vez mais precisas na nossa, tão desacreditada, vida politica. Este é um objectivo por que me baterei com todas as minhas forças. Até para evitar a previsão que o S.S. Pinto me fez aqui há pouco mais de um mês:"tu vais ser roubado". [8/2/2004]

in site de João Soares

segunda-feira, julho 26, 2004

Socrates 2

José Sócrates lidera sondagens. A dois anos do poder.


José SócratesO-A-M
#35
26 Julho 2004

O Professor Marcelo pareceu-me murcho e inquieto no show de ontem, depois do empate do Benfica contra o Real Madrid. Mostrou-se incomodado pela unanimidade das críticas dirigidas pela generalidade dos opinadores políticos do País ao desastrado Santana Lopes. Até o Alberto João zurziu forte e feio no Paulinho, como se este não fosse um Ministro da República! Em suma, que poderá o Professor Marcelo fazer por "Santanás" (a expressão começou a correr numa reedição paródica da Nau Catrineta) perante tamanho estado de desgraça? Pouco. Mas lá foi adiantando que ninguém, nem sequer a Oposição responsável (quer dizer o PS), deveria desejar a infelicidade ao actual Governo, pois se tal viesse a suceder, as vítimas seríamos todos nós. Queria ele dizer na sua que o próprio José Sócrates, actual candidato favorito à liderança do Partido Socialista, perderia com uma interrupção abrupta do Santanismo. Sócrates, nas palavras do Professor Marcelo, precisa de tempo para definir as suas próprias ideias, as quais, pelos vistos e por enquanto (o Professor leu atentamente a entrevista dada por Sócrates ao Expresso) não existem.

Lá me dei ao trabalho de ler a Única, para conferir a opinião do Professor Marcelo com a realidade...

De facto, Sócrates não apresenta nenhum programa de Governo durante a entrevista conduzida por Cristina Figueiredo e Vítor Rainho. Mas poderia?! Olhem só para algumas (a maioria) das perguntas:

"Que recorda da infância?"; "Até quando viveu na Covilhã?"; "Como foi parar a Engenharia?"; "Quando se começou a interessar por política?"; "Qual era a sua visão do mundo aos 16 anos? Viajava?"; "A sua vida é só política? É assim tão desinteressante? Em jovem teve carro?"; "Nunca teve desilusões amorosas?"; "Até essa altura nunca foi confrontado com a morte de alguém próximo?"; "Há quem diga que aceita mal as críticas"; "Como foi parar à JSD?"; "Mas foi para a JSD por ser betinho ?"; "É um carreirista?"; "Imagina-se a fazer outra coisa sem ser política?"; "Voltou a conduzir?"; "Não admite que se urbanizou?"; "Há pessoas que o acusam de só ter imagem"; "Uma pessoa pode ser excelente político, mas se tiver uma péssima imagem não vai longe"; "Compra a sua roupa?"; "Gasta dinheiro em produtos para a pele?"; "Como se começa a interessar pelas questões do Ambiente?"; "Ainda se recorda do seu primeiro discurso? Estava muito nervoso?"; "Também fica nervoso quando tem de entrar em directo na televisão?"; "O que distingue, hoje o PS do PSD?"; "Qual é a sua posição sobre a liberalização das drogas?"; "Nunca fumou um charro na juventude?"; "Acha que os políticos ganham mal?"; "Diz que ficou marcado pelo divórcio dos seus pais. É divorciado. Acha que os seus filhos também sofreram?"; "No dia do seu casamento, chegou à portagem da auto-estrada e não tinha dinheiro nos bolsos..."; "Defende a adopção de crianças por casais homossexuais?"; "Se tudo correr como o previsto vamos ter dois candidatos a primeiro-ministro em 2006 que são divorciados'"; "Já alguma vez se olhou ao espelho e reconheceu nos seus olhos 'aquele brilhosinho' que dizia ver em Guterres e que, na sua opinião, distingue os grandes políticos?"; "Sabe cozinhar?"; "Vai à missa?"; "E ao futebol?"; "Lê banda desenhada?"; "Beleza, para si, é fundamental?"

As respostas, para serem lidas obviamente entre um banho de praia e umas boas fatias de melão, não poderiam, nem deveriam, esclarecer o Professor Marcelo sobre as suas angustiantes dúvidas quanto ao programa do futuro governo socialista. Até porque o mesmo, a confirmar-se, vem longe. Muito antes disso, o jovem líder tem que conquistar o coração e a cabeça do Partido Socialista. Tem que fazer germinar, no espaço e no tempo, as suas ideias gerais e convicções profundas, tendo em conta os horizontes concretos deste País (que não são nada risonhos). Não pode, do pé p'rá mão, andar por aí a esclarecer tudo e todos sobre o que vai fazer, como se todos nós já tivéssemos adquirido a ideia de que o actual Governo não existe. O Santanismo existe e a sua procissão ainda vai no adro. Vamos pois dar tempo ao tempo, para que, se possível antes das próximas eleições legislativas (mas depois da derrota esclarecedora da actual coligação — não legitimada pelo voto popular — nas próximas eleições autárquicas), o PPD/PSD exiba as suas dilacerantes mal-formações genéticas, o PP radicalize a sua acção catalizadora sobre a atarantada corte de Santana Lopes, e o Partido Socialista, por sua vez, consiga renovar-se enquanto partido político, na forma de uma organização partidária polarizada entre duas tendências politicamente claras: a social-democrata e a socialista. Estamos a assistir ao início de uma metamorfose dolorosa das duas principais forças partidárias portuguesas. Estou convicto de que a mesma, se correr bem, trará benefícios ao nosso sistema político. Mas para chegarmos a essa fase, vamos ter todos que dar uma ajudinha. Diabolizar Santana Lopes de aqui em diante não será a melhor estratégia. Talvez fosse isso que o Professor quis dizer ontem à noite. Faltaram-lhe tão só as palavras certas. -- AC-P

quinta-feira, julho 22, 2004

Socrates 1

Manuel Alegre protagoniza fim do soarismo. Partido Socialista clarifica tendências: social-democratas e socialistas.


O-A-M
#34
22 Julho 2004

Toque de finados no soarismo: depois de Manuel Alegre, grande poeta e símbolo fortíssimo da identidade PS, ter aceite protagonizar a tendência socialista que se oporá ao social-democrata José Sócrates no próximo congresso do Partido Socialista, João Soares passará irremediavelmente à história como ex-putativo herdeiro da dinastia soarista. A ideia de um Partido Socialista encavalitado entre a Social-Democracia e o Socialismo, sob a batuta de um líder bonapartista, chegou ao fim. Mais uma consequência imprevista da decisão presidencial sobre a actual crise política. De facto, como escrevi antes de Sampaio se decidir pela nomeação de Santana Lopes para o cargo de Primeiro-Ministro do recém empossado Governo, a metamorfose à vista do PSD (na direcção de um partido de Direita populista, liberal, católico e totalmente enfeudado aos interesses do que resta da exangue burguesia nacional) terá um efeito dominó sobre todo o espectro partidário.

Não sabemos o que nos reserva o futuro imediato destes ajustamentos tectónicos na estrutura partidária do País. No PS, parece todavia evidente que a sua inadiável clarificação interna, no sentido de uma divisão de forças entre as tendências social-democrata e socialista, fechará de vez o grande ciclo soarista que presidiu (às claras ou na sombra) aos destinos deste vector essencial do regime democrático português. Se nos próximos dois anos Santana Lopes fizer tantos disparates quantos são esperados (pela Oposição e por Paulo Portas), e por conseguinte se puder prever com alguma razoabilidade a vitória da Esquerda nas próximas Legislativas, seria bom para todos que fosse José Sócrates, e não Manuel Alegre, a vencê-las.

Dito isto, parece-me igualmente crucial, para o novo ciclo que hoje começa na vida do Partido Socialista, que a tendência liderada por Manuel Alegre e protagonizada, entre outros, por Maria de Belém Roseira, João Cravinho, Augusto Santos Silva e Jorge Lacão, andasse rapidamente na invenção de um discurso socialista inovador, capaz de forçar os social-democratas do PS a exercitarem um pragamatismo político à altura dos frágeis equilíbrios e carências da sociedade portuguesa. Para isso servem os poetas!
-- AC-P

quarta-feira, julho 21, 2004

Santana Lopes 2

O Governo da Gentinha


patriotica!O-A-M
#33
21 Julho 2004

Não sou eu que o digo. É o Marcelo Rebelo de Sousa, o Pacheco Pereira, e os que ainda irão berrar contra a transformação de Portugal e o seu Governo numa telenovela das nove, com réplicas intermináveis em formato Big Brother e à maneira latino-americana: muitas missas, muitas lágrimas, muita brilhantina, muitos beiços de silicona e muitas maminhas a rebentar de devoção. O PSD vai desaparecer, para ver nascer a variante alfacinha e demagoga do PPD de Sá Carneiro. O CDS vai desaparecer, para dar lugar ao Paulo Portas (também conhecido por Partido Popular na confraria europeia), mas agora na forma castigadora de vórtice galopante da nova Direita Portuguesa (o Jardim que se prepare para o chicote do Mar!). Se querem conselhos, aqui vão:

— jovens turcos do PP, ingressem rapidamente no PPD!
— jovens turcos do PSD, façam agulha para o PS, quanto antes!
— jovens turcos do PS, metam-se no Bloco, e depressa!
— jovens turcos do PCP, metam o indecoroso Carvalhas na rua (a desculpa pode ser uma bem democrática e necessária limitação de mandatos...)
— jovens turcos do Bloco, convençam lá o Louçã a reformar o Trotskysmo.
— jovens turcos em geral: inventem novos partidos!

As restantes siglas são irrelevantes para a metamorfose em curso.

Aos artistas um desafio: esta choldra merece uma BD! -- AC-P

terça-feira, julho 13, 2004

Santana Lopes 1

Do Povo, pelo Povo, para o Povo.


MenemO-A-M
#32
13 Julho 2004

Não resisto a citar o mais conhecido discurso de Abraham Lincoln, 16º Presidente dos Estados Unidos, proferido em 19 de Novembro de 1863, dois anos antes do seu assassinato, e do fim da Guerra Civil que protagonizou e venceu em nome da união norte-americana e do fim da escravatura.

The Gettysburg Address, by Abraham Lincoln.
Four score and seven years ago our fathers brought forth upon this continent, a new nation, conceived in Liberty, and dedicated to the proposition that all men are created equal.
Now we are engaged in a great civil war, testing whether that nation, or any nation so conceived and so dedicated, can long endure. We are met on a great battlefield of that war. We are met to dedicate a portion of it, as the final resting place of those who here gave their lives that that nation might live. It is altogether fitting and proper that we should do this.
But, in a larger sense, we can not dedicate, -- we can not consecrate, -- we can not hallow -- this ground. The brave men, living and dead, who struggled here, have consecrated it, far above our poor power to add or detract.
The world will little note, nor long remember what we say here, but it can never forget what they did here. It is for us the living, rather, to be dedicated here to the unfinished work which they who fought here have thus far so nobly carried on. It is rather for us to be here dedicated to the great task remaining before us, -- that from these honored dead we take increased devotion to that cause for which they here gave the last full measure of devotion; -- that we here highly resolve that these dead shall not have died in vain; -- that the nation shall, under God, have a new birth of freedom; -- and that government of the people, by the people, for the people, shall not perish from the earth.
— in Wikipedia


A comparação é naturalmente lisongeira para Pedro Santana Lopes. Na verdade, os ecos da sua figura hipocondríaca, recordam-nos muito mais depressa um morph patético ente Menem e Berlusconi, do que a austeridade exemplar de Lincoln. Mas ainda assim não convem minimizar o poder do mediatismo demagógico encarnado por esta aparição no cerne da actual crise política. A crise está para durar, tanto na economia como nos modelos institucionais do Estado e da Praxis política em geral. Os senhores Santana Lopes e Paulo Portas têm, pois, uma rica vindima à sua frente. Resta saber como e quando irá acabar. Para melhor prever e compreender as suas tácticas e comportamentos, o melhor será começarmos todos por estudar a história do populismo. Recomendo vivamente, a este propósito, a leitura da entrada Populism da Wikipedia.

Não tenhamos dúvidas sobre a natureza intrinsecamente demagógica do futuro Primeiro-Ministro de Portugal. Os sintomas estão aí: ainda antes de formar Governo, multiplicou-se em entrevistas "exclusivas" aos canais de televisão (com a excepção punitiva da TVI) sobre a futura descentralização do Governo (Economia para o Porto, Turismo para Faro e Agricultura para Santarém...). Depois, antes mesmo de convidar os seus futuros ministros, anunciou um aumento da Função Pública, e anunciou ainda que não dormiria enquanto houvesse um desempregado no nosso País! A procissão vai no adro, e já se vê que o homenzinho não precisa de Governo para nada. Ele é o Governo, e os Ministros serão tão só uma decorativa turma de eunucos ao serviço de sua Senhoria. Os que aceitarem convite, sabem ao que vão. Depois, não se queixem!

Seis meses disto chegarão provavelmente para o Senhor Presidente da República tocar a rebate e convocar finalmente eleições antecipadas. O PS que se apresse, com ou sem Vitorino. -- AC-P

IMG: Carlos Saùl Menem, Presidente da Argentina entre 1989 e 1999. Foto: Scanpix/AFP

domingo, julho 11, 2004

Jorge Sampaio 3

O Presidente fez o que Durão anunciara e todos previam: chamou o PSD a formar Governo.


Santana_JanosO-A-M
#31
10 Julho 2004

Não foi grande proeza prever o desenlace da actual crise política. Havia seguramente a possibilidade de Jorge Sampaio surpreender tudo e todos, convocando eleições antecipadas, como muitos legitimamente lhe pediram. Tal abriria, porém, um precedente muito desestabilizador para o futuro do actual regime político. Se assim tivesse ocorrido, nunca mais um Primeiro-Ministro poderia abandonar funções sem que tal deixasse de implicar novo ciclo eleitoral. No caso vertente, tal opção teria ainda muitos outros inconvenientes — como aliás assinalei no primeiro blog que escrevi sobre este tema.

A continuação de Ferro Rodrigues à frente do PS até às próximas eleições, fossem estas antecipadas ou não, seria um desastre monumental. Como já escrevi por mais de uma vez, eu, como muitos outros portugueses (e eleitores do PS), temos sérias dúvidas sobre a lisura moral do agora demitido Secretário-Geral do Partido Socialista. Havendo, como há, uma tendência no eleitorado para votar numa alternativa de Governo à actual maioria de Direita, seria imperdoável deixar apodrecer a actual crise interna do PS, em vez de lancetá-la com a necessária dose de coragem. Espera-se, como corolário da decisão de Ferro Rodrigues, que a canalha de Matosinhos seja definitivamente irradiada da área do Poder. Nenhum sinistro cálculo eleitoral pode alguma vez desculpar as circunstâncias que antecederam a aflição e morte, em plena campanha eleitoral, de António Sousa Franco.

O Presidente da República prometeu controlar a formação do novo Governo, impedindo que a dupla Santana-Portas desfigure a natureza da coligação e as reformas institucionais prometidas por Durão Barroso. Consegui-lo-à? É essa a sua missão? Parece-me que não. Que podemos pois esperar desta invocada espada de Dâmocles sobre as cabeças de Santana e Portas? Desde logo, uma enorme tensão na vida partidária — entre os partidos, mas sobretudo no interior dos partidos: no PS, no PSD e no PCP. Depois, o comportamento incerto e errático de Pedro Santana Lopes nas suas novas funções. A retoma económica não produzirá efeitos antes de 2005, mas será em seu nome que os ajustamentos da política anterior se farão. As medidas demagógicas que aí vem, se forem, como é esperável, no sentido de aliviar alguns dos constrangimentos impostos pelo Governo de Durão Barroso e Ferreira Leite, deixarão todavia Presidente e Oposição sem grandes argumentos para esgrimir. Quem se oporá a um aumento na Função Pública, ou a uma redução do IRS, ou do IVA? O cenário da fidelidade ao chamado Programa eleitoral do PSD parece assim pouco credível como referência efectiva da acção presidencial.

Embora o futuro seja imprevisível, continuo a pensar que assistiremos a uma bipolarização crescente da vida política Portuguesa, a qual poderá muito bem traduzir-se numa clarificação sociológica definitiva dos dois principais partidos portugueses (PS e PSD) e no consequente fim do que Remo Guidieri chama o "extremo-centrismo" do arco partidário do Poder. O PS poderá afirmar-se como um partido Social-Democrata genuíno, e o partido que resultar da fusão entre o PSD e o PP poderá emergir como a representante programática e civilizada da Direita Portuguesa.

Nada disto me impediu de clamar contra o modo de transmissão do poder entre Durão Barroso e Santana Lopes. Do ponto de vista formal, havia toda a legitimidade para convocar eleições. Outra coisa, bem diferente, é que convenha mais ao País a solução por fim adoptada por Jorge Sampaio. Para futuro, talvez fosse bom adoptar o costume de incluir um vice-Primeiro Ministro em cada Governo, ao qual incumbiria tacitamente a função de substituir o Primeiro Ministro em caso deste abandonar as suas funções ou de ficar temporária ou permanentemente impedido de as cumprir. -- AC-P