sábado, dezembro 04, 2010

Alta Velocidade 8

Pinhal Novo-Caia: prioridade apesar do colapso financeiro

A China encomendou em 2009 à Bombardier (Canadá) 80 comboios ZEFIRO 380
Cada tren de alta velocidad Madrid-Valencia consume 487,6 euros de energía eléctrica por trayecto

(03/12/2010) El consumo de energía en un trayecto de Madrid a Valencia en la línea de alta velocidad de Levante es de 5.994,62 kilovatios, de los cuales el tren devuelve a la red pública 576,93 kilovatios hora. Así el consumo neto del tren es de 5.417,69 kilovatios hora (13,83 kilovatios hora por kilómetro), lo que al precio actual del kilovatio hora de nueve céntimos de euro supone 487,6 euros por tren. — in Via Libre.

Temos que explicar aos nossos ignaros economistas e aos politicóides do PSD e do CDS que a Alta Velocidade ferroviária, e em geral a refundação da rede ferroviária nacional, agora na chamada bitola europeia, ou mais correctamente, em bitola internacional (UIC), é uma prioridade, assim como a construção de um porto de águas profundas à entrada do Tejo, na Trafaria, depois de realizada a obra do chamado fecho da golada, e até uma nova ponte sobre o Tejo, precisamente entre Algés e a Trafaria, fechando o anel da 2ª Circular. Só depois destas prioridades cumpridas (daqui até 2030) fará ou não sentido retomar a discussão sobre o novo aeroporto de Lisboa, pois o que está serve, melhor que muitos outros, para as encomendas que temos. Já viram alguma vez a Portela fechar por mau tempo, como ocorre na Madeira, nos Açores e por essa Europa fora? Não chegou a recente Cimeira da NATO para perceber as enormes vantagens aeroportuárias e de segurança de um aeroporto com as características da Portela? (1)

É urgente redefinir as nossas prioridades estratégicas, e não basta dizer laconicamente, como faz Cavaco Silva, que o futuro está no mar. Assim dito, sem mais, não está!

Mas para conseguirmos redefinir as nossas prioridades estratégicas, é fundamental fazer uma revolução política. Ou seja, é necessário e urgente forçar a diminuição substancial da burocracia e o arejamento da nomenclatura partidária, retirar peso às corporações e às aristocracias burguesas e financeiras clientelares, tornar em suma o país mais civilizado, livre, ágil, transparente, competitivo, trabalhador e ousado.

Mas isto não chega! Sanear o Estado, apertar o cinto e levar a cabo uma expropriação fiscal da comunidade, sem mais, pode revelar-se uma receita para o desastre. Terminado o ciclo do endividamento especulativo, sem criação efectiva de riqueza não conseguiremos pagar o que devemos, e a consequência fatal desta impossibilidade será uma queda no abismo da pobreza estrutural e de uma degradação política interminável. Se não percebermos colectivamente esta realidade, e sobretudo sem a humildade necessária para aceitar corrigir o que está mal ou é injusto, e aceitar cooperar de forma solidária no relançamento democrático e económico do país, espera-nos o pior. Os recentes exemplos de deserção da solidariedade por parte da Portugal Telecom, Caixa Geral de Depósitos, juízes e magistrados do Ministério Público, Hospitais EPE, Governo Regional dos Açores, etc., não auguram nada de bom. Sobretudo porque os atávicos e indigentes parlamentares e partidários que temos continuam a confundir a democracia com as suas medíocres existências e sobrevivências burocráticas aninhadas numa sopa fiscal que, se persistirem na estupidez populista que diariamente exibem nas televisões e jornais, acabará por expeli-los pela janela de uma qualquer alternativa autoritária ao regime que alegremente afundaram.

O mundo continua apesar da crise financeira e económica global, a qual, na realidade, traduz um ajustamento das placas tectónicas do desenvolvimento e da divisão mundial do trabalho. E uma das realidades de grande impacto na economia e no emprego que despontam no horizonte da escassez certa que nos espera no sector dos combustíveis líquidos, é a prioridade crescente dada ao transporte ferroviário de alta velocidade, movido a electricidade, e num prazo de 50 anos ou menos, a energia electromagnética. É por isso que a ligação de Portugal à rede europeia de Alta Velocidade ferroviária é uma prioridade absoluta, e não relativa, ou meramente discutível, como são outros desígnios possíveis para Portugal.

Rede ferroviária chinesa cresce em alta velocidade

Até meados dos anos 1980, a China dependia de antigos trens a vapor para ligar diferentes pontos de seu vastíssimo território. Agora já tem mais de 6.900 quilômetros de vias férreas para veículos de alta velocidade, constituindo a maior rede do mundo, e em ampliação. A China investe grandes somas em vias férreas e prevê acrescentar mais 16 mil quilômetros até 2020.

Este ano, o governo destinou US$ 80 bilhões para construir ferrovias, criando seis milhões de empregos, para ligar as prósperas cidades costeiras com o extremo oeste, e também linhas que saem deste país e atravessam a Ásia até chegar ao Oriente Médio e à Europa. Já existem dois mil quilômetros de vias férreas nas quais podem circular trens de alta velocidade que atingem 350 quilômetros por hora. — Mitch Moxley, na agência IPS, Vermelho.


Rede de alta velocidade na China já ultrapassa sete mil quilómetros

A China inaugura mais uma linha ferroviária de alta velocidade na próxima terça-feira, reforçando a posição de líder mundial do sector com uma rede que, em menos de uma década, ultrapassou os sete mil quilómetros de extensão.

A nova linha, um troço de 202 quilómetros entre Xangai e Hangzhou, é também o palco do novo recorde mundial de velocidade: 416,6 kms/hora.

Nos testes realizados o mês passado, o mais moderno TGV chinês, o "CRH380A", excedeu em 22,3 Kms/hora a marca alcançada no verão de 2008 na primeira linha férrea chinesa de alta velocidade, que liga Pequim a Tianjin.

O engenheiro-chefe do Ministério dos Caminhos de ferro, He Huawu, anunciou esta semana que a China está a desenvolver um comboio ainda mais rápido, capaz de atingir 500 kms/hora, a velocidade de alguns aviões pequenos.  — in OJE/Lusa, 22/10/10.


China To Connect Its High Speed Rail All The Way To Europe
By Bridgette Meinhold, 03/15/10

China already has the most advanced and extensive high speed rail line in the world, and soon that network will be connected all the way to Europe and the UK! With initial negotiations and surveys already complete, China is now making plans to connect its high speed rail line through 17 other countries in Asia and Eastern Europe in order to connect to the existing infrastructure in the EU. Additional rail lines will also be built into South East Asia as well as Russia, in what will likely become the largest infrastructure project in history. — in Inhabitat.


China is pulling ahead in worldwide race for high-speed rail transportation
By Keith B. Richburg, May 12, 2010

QINGDAO, CHINA -- Last year, China surpassed the United States as the world's largest automaker. The country is aggressively making jets to compete with Boeing and Airbus. And in recent years, with little outside notice, China made another great leap forward in transportation: It now leads the world in high-speed rail. — in Washington Post.

O futuro dos transportes pertence aos grandes navios de mercadorias e de passageiros, e pertence ao transporte de massas de mercadorias e passageiros por via férrea. Aviões, automóveis e em geral o transporte individual dependente de consumos energéticos intensivos será relegado para um segundo plano. Portugal tem 900 Km de costa marítima e um sistema de portos importante, mas que precisa de ser renovado, melhor apetrechado e sobretudo ligado à rede europeia de transporte ferroviário em bitola UIC. O primeiro passo a dar é a construção da nova linha férrea de Alta Velocidade entre Caia e o Pinhal Novo, com ramais igualmente em bitola UIC ligando a nova linha aos portos de Setúbal e Sines. Esta obra, que conta com apreciáveis subsídios comunitários, permitirá ligar Lisboa à nascente rede europeia de Alta Velocidade. E não precisaremos para tal de nenhuma ponte Chelas-Barreiro. Os comboios poderão atravessar a Ponte 25 de Abril, sem qualquer problema nem atrapalhação, desde que venham calçados com eixos telescópicos, e desembarcar os passageiros na Nova Estação Central de Lisboa, que deveria construir-se no centro da capital, ou seja, nos terrenos da antiga Feira Popular.

NOTAS
  1. O aeroporto da Portela, embora pequeno e mal tratado pelas corrompidas administrações que por lá têm passado (com as turmas de boys & girls do PS e do PSD) é um dos mais fiáveis de toda a Europa. E porquê? Por quatro razões: 1) climatológicas; 2) topográficas; 3) geográficas; e 4) concepção original da infraestrutura. Ou seja, a Portela nunca fecha por causa de ventos, tempestades de neve, ou nevoeiros (a má visibilidade do aeroporto não ultrapassa o baixíssimo valor de 162 horas/ano); pela sua altitude (114m acima do nível do mar), está livre de inundações e dos bancos de nevoeiro matinais (a hora de ponta dos aeroportos!) que ameaçam claramente a Ota... e Alcochete; a sua proximidade do centro urbano diminui custos e aumenta paradoxalmente os níveis de segurança (como ficou demonstrado com a recente realização da cimeira da NATO); e por fim, as duas pistas em X previnem os impactos negativos dos ventos cruzados decorrentes das condições meteorológicas oceânicas. Os aviões são cada vez menos ruidosos e poluentes, e o perigo de queda durante as descolagens e aterragens é estatisticamente desprezível — nunca houve, felizmente, nenhum grande acidente com aeronaves comerciais em Lisboa. Como se isto não bastasse, a época dos hubs aeroportuários (que Lisboa, além do mais, nunca poderá ser) já passou. As ligações ponto-a-ponto, enquanto for possível andar de avião, e as companhias de baixo custo, são a novidade e a tendência, como ficou cabalmente demonstrado pelo êxito da vinda das Low Cost para Faro, Porto e Lisboa. (5-12-2010)

España: estado de excepção

Quando menos se espera...

Como se a situação portuguesa não fosse suficiente para nos afligir, temos aqui ao lado uma bomba relógio que pode explodir a qualquer momento. — in O António Maria, 3-12-2010, 18:29.

Aeroporto de Barajas, Madrid.
Defensa asume el control del tráfico aéreo en España para frenar el caos

El Ejecutivo se ha visto obligado a la militarización del control aéreo ante el colapso generado por las "bajas masivas" del 70% de los controladores. Para poder tomar esta medida, que está prevista dentro de un decreto aprobado el mediodía del viernes por el Consejo de Ministros, el Ejecutivo ha publicado la norma de manera extraordinaria en el Boletín Oficial del Estado pasadas las 21.30. Además, el decreto especifica que también se permitirá realizar controles médicos a los controladores "de manera inmediata" para verificar que realmente no están en disposición de realizar sus funciones.

Los pasos de la intervención militar
  1. Ordenar a los controladores que acudan a sus puestos de trabajo. Si no cumplen la orden se enfrentan a graves delitos con penas, incluso penales. 
  2. Abrir al tráfico civil la decena de aeropuertos militares que hay en España. En Madrid se habilitarán el de Torrejón y el de Cuatro Vientos. 
  3. Desplazar a las torres de control de los aeropuertos civiles a coroneles que asuman el mando.
  4. El jefe del Estado Mayor del Ejército del Aire seleccionará y decidirá cuáles son los vuelos prioritarios.— in El País, 3/12/2010, esta noite.

Alguém me telefonara esta tarde (quando me preparava para publicar o post anterior) alertando-me para o facto de o primeiro ministro espanhol ter desistido à última hora de participar na Cimeira Ibero-Americana a decorrer em Mar del Plata, Argentina. Pensei que a situação financeira estaria a deteriorar-se rapidamente, apesar das medidas muito duras há dias anunciadas (privatização parcial da AENA e da centenária Lotaria Espanhola, etc.) Só hora e meia depois vi as as televisões abrirem os noticiários com a notícia do súbito abandono das torres dos aeroportos por parte dos controladores de tráfego aéreo e a paralisia imediata que tal situação gerou nos movimentos da aviação civil e aeroportos.

A greve instantânea, ou, como também se diz, selvagem, dos agulheiros dos céus espanhóis atingiu um ponto vital da mobilidade do país, paralisando todos os voos comerciais em Espanha, e lançando também o caos num série de aeroportos europeus.

Ao que parece esta decisão intempestiva foi uma resposta à decisão do governo de Zapatero de privatizar parcialmente a empresa pública de aeroportos e controlo do espaço aéreo espanhóis, usando de poderes que a boa democracia recomendaria que estivessem reservados, no mínimo, a decisão parlamentar por maioria absoluta. O desespero financeiro do país é tal, que o governo "socialista" parece ter esquecido os limites intrínsecos da acção política democrática. O resultado está à vista, e não é nada bonito, nem animador no que se refere à imagem civilista construída nos últimos 34 anos de democracia. De repente, ou seja, em menos de 12 horas, o governo cozinhou e decretou um Estado de Excepção, para resolver manu militari uma crise laboral extrema, mas não mais do que uma crise laboral. Que péssimo augúrio!

POST SCRIPTUM — para uma percepção correcta da greve dos controladores aéreos, vale a pena ler: Los internautas preguntan a César Cabo, Secretario de comunicación de Unión Sindical de Controladores Aéreos (El País) 

ACTUALIZAÇÕES
  • Fotogaleria do El País (5-12-2010)
  • Ao contrário das traduções trapalhonas dos nossos noticiários, o que se passou em Espanha não foi uma "requisição civil", mas sim a imposição da lei militar a centenas de civis por causa de uma "greve selvagem". O importante é realçar quão fina é a fronteira entre um estado democrático e o "estado de excepção" manu militari. Para quem tiver dúvidas, leia este filme dos acontecimentos pelo insuspeito (de antipatia pelo PSOE) El País. (5-12-2010)
  • As palavras de João Proença e de José Sócrates (Diário de Notícias), ambos "socialistas", são uma espécie de aviso à navegação de quem já está a pôr a barbas de molho pelo que aí vem, por exemplo, com o plano de privatização da ANA e de alienação de outros anéis preciosos, que a classe política instalada quer vender à pressa e ao desbarato, para continuar a gozar dos seus indecorosos privilégios. Não esperem, porém, que a pancada, e a revolta da classe média (praticamente inevitável), ocorram nos mesmos lugares e horas. E pensem duas vezes antes de usar os militares! (5-12-2010)

sexta-feira, dezembro 03, 2010

Bancarrota-8

Pausa para respirar... e agir

A guerra financeira entre o dólar (pegado à libra) e o euro prossegue, com golpes baixos e muitos sorrisos. Os analistas anglo-saxónicos pintam diariamente quadros negros sobre o continente europeu, e Trichet lá vai respondendo de forma imprevisível e por vezes surpreendente ("Europe needs budgetary federation" — EUobserver"). O BCE andou e anda a comprar dívida soberana no mercado secundário. Bastou esta notícia não confirmada directamente pelo BCE, mas que quem comprou divulgou anonimamente, para os especuladores abrandarem os seus ataques aos flancos mais frágeis da dívida soberana europeia: Grécia, Irlanda, Portugal... e Espanha.

Jean-Claude Trichet disse hoje que o BCE continuará a comprar dívida pública dos países do euro e pediu sanções automáticas para os países que falhem compromissos orçamentais.

(…) O presidente da instituição escusou-se, no entanto, a pronunciar-se directamente sobre as informações publicadas pela imprensa sobre a compra em grande quantidade de títulos de dívida portugueses e irlandeses na quinta-feira.

(…) Na mesma conferência, o presidente do BCE pediu um sistema de sanções quase automáticas para os países que não cumpram os compromissos orçamentais, insistindo que os governos devem credibilizar os programas de ajustamento e reformas estruturais. — in "Trichet pede sanções automáticas e garante que BCE vai continuar a comprar dívida", 03 Dezembro 2010 | Jornal de Negócios com Lusa.

Este recuo dos especuladores é, porém, meramente táctico, pois o problema de fundo subsiste: a dívida soberana europeia é uma bolha especulativa gigantesca (ver este gráfico de maio —Europe's Web of Debt—do NYT) e vai acabar por rebentar. Daí que seja da mais elementar prudência pagar todas as nossas dívidas quanto antes, não contrair mais empréstimos, aplicar as poupanças em bens duradouros com uma grande valorização potencial (ouro, terra fértil, casas em segunda mão bem localizadas e a bom preço, e pouco mais), evitar investimentos especulativos em produtos financeiros e seguros mal explicados e de duvidosa proveniência (1).

A perspectiva sombria de um estouro da moeda única europeia não está —muito longe disso— afastada do horizonte mais próximo. Como não estão também afastadas as probabilidade reais de uma quarentena fora do euro para alguns dos leitões da Europa (PIGS), que nada devem à fama que os suínos sempre tiveram em matéria financeira — criar um porco foi, durante milénios, uma boa forma de investimento e de poupança.

Uma coisa é certa: espera-nos uma década de contínuo empobrecimento, pois os juros anuais da nossa dívida pública (6,5 mil milhões de euros em 2010, ou seja, qualquer coisa como 6,5 pontes Vasco da Gama) já ultrapassam tudo o que gastamos com a nossa alimentação! Se não pararmos imediatamente todas as Parcerias Público Privadas no sector da saúde e dos transportes, se não adiarmos a Alta Velocidade (à excepção da ligação para passageiros e mercadorias entre o Pinhal Novo e Caia) e não afastarmos para as calendas gregas o monstro aeroportuário da Ota em Alcochete, seremos inexoravelmente expulsos da Eurolândia. É uma aposta que faço com os meus leitores.

Há, porém, sinais de esperança. A venda do diário "i" pelo Grupo Lena é um sintoma claro de que as obras públicas já pararam, por falta de objectivos sensatos, por falta de financiamento e porque os projectos anunciados revelarem todos uma rentabilidade nula fora do regaço protector do agora obviamente falido cliente Estado. Se até Junho de 2011 (2), o défice e a dívida pública não recuarem para os valores exigidos pelo BCE e pela Alemanha, as penalizações serão a matar. Ou seja, a janela de oportunidade para se fazer o que é preciso fazer é de apenas um semestre. Será este o definitivo prazo de validade de José Sócrates?

Como se a situação portuguesa não fosse suficiente para nos afligir, temos aqui ao lado uma bomba relógio que pode explodir a qualquer momento. Chama-se Espanha (3) e a ela devemos qualquer coisa como 86 mil milhões de euros!

Vivi em Espanha alguns anos e tenho vários amigos do coração por lá. Num painel sobre as televisões autonómicas para o qual fui convidado, creio que no ano 2002 ou 2003, interroguei-me sobre a origem de tanto dinheiro, e sobre a viabilidade futura das autonomias, não pelo lado da sua legitimidade, mas tão simplesmente pelo lado da despesa. Quem pagava então, e quem pagaria no futuro semelhante gasto fiscal? Outro aspecto da sociedade espanhola que me causou sempre igual apreensão foi a dimensão e ineficiência de boa parte dos seus serviços públicos, bem como a presença ostensiva dos grandes oligopólios no quotidiano dos espanhóis. Lá como cá a democracia era e é um bem recente, degustado como uma iguaria deliciosa cujo preço ninguém perguntava, nem pergunta (ou só agora começa a perguntar...) Os resultados que eu temia estão à vista e, claro está, nada pude fazer para os evitar, apesar de ter falado e escrito sobre o tema vezes sem conta.

A situação em Espanha é tanto mais dramática quanto boa parte da população continua anestesiada pelos poderes político-partidários e mediáticos. Lá como cá, os comportamentos chegam a ser de uma irracionalidade impensável. Em Portugal, por exemplo, com o anúncio antecipado da subida do IVA em 2011 (certamente para estimular o crescimento do PIB ainda este ano...), a venda de automóveis aumentou mais de 50% relativamente a 2009. Em Espanha, felizmente para todos, as medidas governamentais têm sido mais sensatas. Mas chegarão? A imprensa anglo-saxónica tem as maiores dúvidas!

— As necessidade financeiras do Estado espanhol para 2011 ascendem a 21% do respectivo PIB, ou seja a 226 mil milhões de euros! Mas os bancos, por sua vez, também precisam de refinanciar as respectivas dívidas num montante de 220 mil milhões de euros!!

(…) Should the EU really impose a 6.7pc interest charge on Ireland’s bail-out loans, it should not be surprised if the new Irish government in January walks away from the whole stinking arrangement, and pulls the plug on Europe’s banking system.

(…) Has Mr Zapatero read the IMF’s devastating Article IV report on his own country? It states that the government’s “gross financing needs” for 2011 will be €226bn, or 21pc of GDP. “Spain’s financing requirements are large and, retaining market confidence will be critical. Spain has exhausted its fiscal space. Targets should be made more credible.”

Madrid must attract €226bn of good money from Spanish savers, German pension funds, French banks, Japanese life insurers, and China’s central bank, so that an incompetent government (this one happens to be socialist, but the Greek conservatives were worse) can continue to run budget deficits of 7pc to 8pc of GDP in 2011. Why should they lend a single pfennig, having already been told by EU leaders that they will face scalping if Spain ever needs a rescue?

(…) Furthermore, Spanish banks will need to roll over €220bn in 2011 and 2012, according to Enrique Goñi, head of Banca Cívica. “We’re in the antechamber of a new liquidity crisis. We’re living through a financial pre-collapse,” he said. — in "Germany faces its awful choice as Spain wobbles", by Ambrose Evans-Pritchard, The Telegraph (29 Nov 2010).

— A Eurolândia (e sobretudo a Alemanha) está metida numa camisa de sete varas. Não pode suportar indefinidamente todas as dívidas soberanas dos membros da união monetária, sob pena de rebentar com a poupança de quem a tem, e colocar a Europa à beira da ruína. E não pode inundar as economias de liquidez, sob pena de desvalorizar perigosamente o euro, criar uma inflação potencialmente incontrolável, e acabar por destruir a moeda única.

(…) Investors’ no-confidence vote in the aid package for Ireland may force European policy makers to expand their arsenal to fight the debt crisis threatening to tear the euro apart.

Options outlined by economists at Societe Generale SA and Barclays Capital include: Boosting the 750 billion-euro ($975 billion) temporary rescue fund or turning it into an asset- buying program; cutting interest rates on bailout loans; issuing joint bonds for the 16 euro nations or flooding the economy with cash from the European Central Bank.

(…) “As the crisis deepens and threatens core countries, the future of monetary union continues to be called into question,” said Chandler. “As the situation becomes more desperate, the unthinkable has to be thought. Quantitative easing by the ECB may be one of the few ways out.”  — in "Contagion May Force EU to Expand Arsenal to Fight Debt Crisis", By Simon Kennedy and James G. Neuger, Bloomberg - Dec 1, 2010.

NOTAS
  1.  Outra opção que começa a ser interessante, e que poderá ser objecto de grande concorrência em breve, são os depósitos a prazo. Consultar esta tabela comparativa de depósitos a prazo, publicada hoje pelo Money GPS.
  2. A portinhola do BCE onde se financiam a 1% os bancos comerciais, para logo comprarem dívida soberana com rendimentos acima dos 5% (6%, 7%, e 9%), ou realizar operações de empréstimos a particulares e empresas com TAEGs acima dos 20%, deveria fechar-se no próximo dia 31 de Janeiro. Mas a necessidade de um contra-ataque do BCE contra o cerco montado pelos estrategas financeiros de Wall Street e da City londrina contra o euro, manterá a dita portinhola do easy money aberta até Junho. É por isso que os próximos seis meses vão der decisivos. E é por isso que a cidadania deverá exercer toda a sua vigilância e pressão sobre a corja político-partidária — do governo, às oposições, passando pelo senhor Cavaco. Os candidatos presidenciais que se opõem ao actual presidente da república são irrelevantes. Por patriotismo, deveriam fazer uma coisa: desistir da farsa eleitoral que aí vem, colocando assim o regime perante as suas responsabilidades. [3-12-2010; 22:40]
  3. Li, já depois de publicado este post, o artigo de Paul Krugman, O Prisioneiro Espanhol, publicado no i [4-12-2010, 1:19]

Futebol

A FIFA sabe onde está o dinheiro!
Cristiano Ronaldo, anúncio da Nike.
A Inglaterra ficou chocada. Portugal e Espanha tinham condições ímpares. Mas os próximos dois campeonatos mundiais de futebol irão para a Rússia e para o Qatar. Explicação: a FIFA sabe onde está o dinheiro. É aliás fácil saber: está onde há petróleo, matérias primas fundamentais, ou trabalho barato. A Rússia já anunciou que quem comprar um bilhete para o próximo mundial de futebol terá transportes gratuitos entre os vários estádios do campeonato. Ora aí está uma coisa que nem o reino de sua majestade inglesa, nem o rei espanhol, nem Portugal poderiam oferecer. A explicação é simples: não temos petróleo, o petróleo já está de novo nos 90 dólares (o Pico do Petróleo veio para ficar e a China não pára de pressionar a procura), e as energias alternativas continuam e serão por mais uma ou duas décadas puras miragens que os pobres países "vanguardistas" como nós pagarão antecipadamente em nome de quase-monopólios piratas.

quarta-feira, dezembro 01, 2010

Regressar à monarquia

A III República faliu. E agora?



Duarte de Bragança considera que a actual crise que Portugal enfrenta é “comparável à vivida nos tempos da Primeira República”, e defende que a solução seria o país regressar à monarquia, razão pela qual insiste na realização de um referendo. — in Público.

Depois de o actual presidente da república ter presidido ao afundamento de Portugal, que nos resta? Fará sentido instaurar uma monarquia constitucional, com o objectivo de atingir a prosperidade das restantes monarquias europeias: Bélgica, Dinamarca, Espanha, Liechtenstein, Luxemburgo, Mónaco, Noruega, Países Baixos, Reino Unido e Suécia? Ou é melhor re-eleger o traste Aníbal Cavaco Silva para o cargo imprestável de presidente da república? Esta discussão parece fora do tempo, mas talvez se torne moda bem antes do senhor Duarte de Bragança ter preparado convenientemente o seu primogénito para voos inesperadamente altos.

Mesmo as piores monarquias europeias, Inglaterra, Bélgica e Espanha, estão melhores do que nós! São países civilizados, onde a lei e os tribunais funcionam a tempo e horas, há estado social efectivo, os rendimentos per capita são dos mais altos do planeta, o pluralismo partidário é total e as liberdades são conquistas plenamente assumidas por todos os actores democráticos. Tão ou mais importante: a distribuição da riqueza é muitíssimo mais justa em todas estas monarquias do que em Portugal, e os respectivos governos e partidos políticos não foram, como por cá, capturados por clientelismos partidários, corporativos, ou burocráticos, nem por nomenclaturas ocultistas, nem muito menos por castas consanguíneas. Já algum sociólogo ousou fazer um mestrado sobre os apelidos da nova nomenclatura minocrática?

Sete dos dez países com maiores rendimentos per capita no mundo, são monarquias: Luxemburgo, Noruega, Qatar, Dinamarca, Emiratos Árabes Unidos, Holanda e Suécia (Wikipedia). Não vejo, pois, onde possa estar a superioridade dos regimes republicanos, e nomeadamente das três repúblicas portuguesas que se seguiram ao regicídio. 
  • A primeira sucumbiu ao cretinismo parlamentar, à corrupção e ao ateísmo oportunista e estúpido. Nasceu sem nobreza pública, de um regicídio, e foi miseravelmente à falência.  
  • A segunda, nasceu de um golpe de estado militar, impôs-se como uma ditadura durante 48 anos, e acabou por morrer às mãos de outro golpe de estado militar.  
  • A terceira, ou seja aquela que, ironicamente, no ano do centenário do regime republicano, volta a mergulhar o país numa vergonhosa bancarrota, nasceu de uma revolta corporativa no seio do exército, impôs-se como uma democracia burocrática e populista (minocracia), sem horizonte claro nem imaginação, entregue aos mesmíssimos vícios que colocaram Salazar ao leme da mais longa ditadura europeia do século 20, e a que restam escassos anos de vida
Se a União Europeia se aguentar, ou enquanto o euro e a União Europeia se aguentarem, Portugal estará, em princípio, a salvo de novo golpe de estado, revolta popular ou guerra civil. Mas se, ou melhor dizendo, quando o sonho alemão de uma grande Europa, de Lisboa a Vladivostoque, voltar a soçobrar —o que acontecerá inevitavelmente se a guerra financeira em curso entre o dólar-libra e o euro se resolver contra o euro-marco (com o apoio entusiasta do Bloco de Esquerda e imbecis da mesma laia)—, podemos todos ter a certeza de que a Espanha voltará a ser uma ameaça à pouca soberania que Portugal ainda tem, e que este indecoroso e miserável regime republicano será pasto de novo golpe de estado e tumulto populista, se entretanto não tivermos encontrado um novo enquadramento institucional para o nosso país.

Olhando para o panorama desolador das próximas eleições presidenciais, e para o incurável e terminal cretinismo parlamentar da nossa pseudo-democracia, apenas antevejo uma solução capaz de evitar mais uma longa noite de ignorância e medo: regressar à monarquia. Ou melhor, criar uma nova monarquia, constitucional, democrática, laica, eficiente, transparente, justa e solidária. Para lá chegar não é preciso muito. Basta um referendo!

A Bulgária está a pensar fazê-lo. Somos menos espertos, ou corajosos, do que eles?

POST SCRIPTUM (2-12-2010) — Na realidade, uma monarquia europeia civilizada e pós-moderna, a que poderíamos chamar monarquia republicana (!), é em tudo semelhante a uma república, com uma única mas essencial diferença: poder assegurar, através de um biopoder residual, a existência de uma ultima ratio civilizada em caso de bloqueio grave do regime democrático. Este poder moderador, ou salomónico nos casos mais críticos, tem que estar acima das querelas partidárias, e por conseguinte não pode em caso algum emanar dos partidos políticos, nem ser por estes condicionado (desde logo na própria hipótese de candidatura). Esta monarquia republicana (isto é, constitucional, parlamentar, referendária, em suma, democrática) não resolveria, nem todos, nem sequer os nossos principais problemas, mas ajudaria a reafirmar a condição montesquiana a que toda a democracia tem que obedecer sob pena de, subvertendo a lógica da separação dos poderes, deitar fora a verdadeira democracia, colocando no seu lugar aquilo que designo por minocracia: um regime de aparência democrática, mas assente em bases eleitorais tendencialmente minoritárias, alienadas e/ou e distorcidas, e subordinado aos impérios gémeos da burocracia e da partidocracia.

terça-feira, novembro 30, 2010

Bancarrota - 7

O perú não chega ao Natal
e o reCavaco que se ponha a pau!
Insolvent – Greece, Ireland, Portugal and probably Spain
Posted by Neil Hume on Nov 30 10:45.

[...] Ireland is insolvent, Portugal is quietly insolvent, Greece is de facto insolvent and Spain will be insolvent once the problems in its banking sector are recognised.
[...] Buiter predicts the ECB could be forced to buy Spanish government paper and fund its banking system by purchasing the debt from the European Financial Stability Facility if things get really bad. — in FT Alphaville .
A compra da cadeia de lojas Carrefour pelo Continente, em 2007, coincidiu com uma proliferação de lojas de mini-preço pelo país fora. É isto que importa reter, e não a histeria hipnótica organizada em volta da vinda do FMI. Estamos falidos e em regime de piloto automático desde 8-9 de maio último, sob comando da Alemanha e do BCE. A classe partidária portuguesa, por inteiro, incluindo o traste presidencial, é responsável por este descalabro.

Como o LEAP2020/GEAB anunciou, em 8-9 de maio deste ano deu-se um golpe de Estado no seio da União Europeia, o qual devolveu à Alemanha e à França os comandos de um projecto por eles imaginado no pós-guerra. Desde aquele fim-de-semana furtivo que Portugal se tornou num protectorado de Bruxelas.

No entanto, Alemanha tem um dilema pela frente:
  • se duplicar ou triplicar o Fundo Europeu de Estabilização Financeira (EFSF), para acorrer às insolvências dos PIGS, da Bélgica e da própria França, incorrendo no mesmo estratagema do Quantitative Easing (QE) adoptado pela declinante América de Bush e Obama, o euro chegará rapidamente à paridade com o dólar, e as economias emergentes, capitaneadas pela China, Rússia, Brasil e Irão fugirão destas pseudo moedas de reserva a sete pés... seja para um novo regime de trocas internacionais bilaterais (yuans por rublos, reais por pesos, etc.), seja para o ouro. Se Angela Merkel optar por "salvar" os gastadores improdutivos da Europa, o ouro poderá facilmente duplicar ou triplicar o seu valor no prazo de um a dois anos!  
  • Se, por outro lado, a Alemanha deixar cair aos trambolhões uma parte significativa da União, e os PIGS empobrecerem demasiado, passando a abastecer-se cada vez mais nas lojas chinesas, a Alemanha ver-se-à forçada abandonar o euro, lançando a Europa numa convulsão sem precedentes.
É um dilema dos diabos!

Bancarrota - 6

Medidas simples, duras, mas claras e eficazes
Ponham um tecto máximo nas reformas pagas pelo Estado... de 1700 euros, e ponha-se fim à acumulação de pensões e reformas pagas com o dinheiro dos contribuintes. Como a Suíça fará a partir de 2011. Quem quiser mais, poupe e invista em PPRs.




Reformas na Suíça com tecto máximo de 1700 euros
Na Suíça, ao contrário de Portugal, não há reformas de luxo. Para evitar a ruína da Segurança Social, o governo helvético fixou que o máximo que um suíço pode receber de reforma são 1700 euros. E assim, sobra dinheiro para distribuir pelas pensões mais baixas. — 2010-11-10. Ver Causa defendida no Facebook

Banco de Portugal: Sector público tem de aumentar poupança
O Banco de Portugal antecipa uma recessão em 2011, por efeito do Orçamento do Estado. Um ajustamento inescapável, diz, defendendo como “prioridade” o aumento da poupança do sector público. Os investimentos, defende, devem ser canalizados “para finalidades comprovadamente reprodutivas”. E só a credibilidade na execução orçamental reduzirá os custos da mudança. — Jornal de Negócios.

domingo, novembro 28, 2010

Bancarrota-5

Dívidas soberanas, quem paga?

Photograph: Matt Dunham/AP
The sorrow of Portugal

Yesterday, I had a rather sad conversation with a friend in Portugal. The country has just had to force through another austerity budget; and fears are mounting that it will be next in line for an EU bail-out. “We should never have entered the euro”, my friend lamented. “Everything went downhill from there. For us and for everyone.” — in Finantial Times, Nov. 26, 2010.

Those too young to vote, yet with their futures at stake, have organically come together to be heard.

'The word spread through Twitter and Facebook; rumours passed around classrooms and meeting halls: get to Westminster, show them your anger.'

Outside Downing Street, in front of a line of riot police, I am sitting beside a makeshift campfire. It's cold, and the schoolchildren who have skipped classes gather around as a student with a three-string guitar strikes up the chords to Tracy Chapman's Talkin Bout a Revolution. The kids start to sing, sweet and off-key, an apocalyptic choir knotted around a small bright circle of warmth and energy. "Finally the tables are starting to turn," they sing, the sound of their voices drowning out the drone of helicopters and the screams from the edge of the kettle. "Finally the tables are starting to turn."

Then a cop smashes into the circle. The police shove us out of the way and the camp evaporates in a hiss of smoke, forcing us forward. Not all of us know how we got here, but we're being crammed in with brutal efficiency: the press of bodies is vice-tight and still the cops are screaming at us to move forward. Beside me, a schoolgirl is crying. She is just 14. — in Guardian.co.uk, 24 Nov, 2010.

A União Europeia pode quebrar pelo elo mais forte: a Alemanha. Porquê? Porque das duas uma: ou os estados falidos da Europa assumem rapidamente dietas violentas nos seus orçamentos Pantagruélicos, e por esta via põem em causa os privilégios das corporações, nomenclaturas, burocracias e bases eleitorais de que dependem para se manterem no poder, ou então, persistem nas actuais manobras de retórica populista e de dissimulação orçamental com as graves implicações que uma tal opção terá para o euro enquanto moeda de reserva alternativa ao papel higiénico norte-americano. Adiar por mais um ano, ou até por mais seis meses, a inevitável austeridade orçamental que permitirá estancar a gangrena financeira dos países sobre-endividados, levará o Fundo Europeu de Estabilização Financeira (EFSF) a ter que duplicar a sua actual capacidade de resgate das dívidas soberanas (750 mil milhões de euros), para acudir ao dominó das bancarrotas europeias actualmente em curso.

A simples probabilidade de o Banco Central Europeu entrar pela mesma via da Reserva Federal, o chamado Quantitative Easing (QE), pondo os computadores a criar dinheiro electrónico sem qualquer base de riqueza efectivamente criada, levou já o Brasil, a China, a Rússia e o Irão —a que se somará em breve um número crescente de países produtores de matérias primas, energia e trabalho barato— a estabelecer uma estratégia monetária de recurso que poderá passar pelo abandono das moedas de reserva americana e europeia. A actual corrida ao ouro e à prata, e a retenção destes metais preciosos pelos grandes produtores, são um sintoma claro de que o sistema monetário nascido dos acordos de Bretton Woods está mais do que moribundo. Morreu e vai ser em breve enterrado.

Os verdadeiros credores da nossa dívida colectiva, pública e privada, isto é, aqueles que produzem a maioria dos bens transaccionáveis que preenchem as nossas vidas mais ou menos confortáveis e neuróticas, não estão dispostos a financiar por muito mais tempo o nosso consumo e o nosso lazer sem um contra-valor real. A China, o Brasil, a Rússia, o Irão, e os estados petrolíferos do Médio Oriente, estão atulhados de liquidez virtual e fartos de inflação. Querem agora uma parte crescente dos nossos activos em troca de mais petróleo, em troca de mais soja, e em troca de mais telemóveis e computadores.

A Revolução Industrial fez-se em cima de uma escabrosa pilha de cadáveres e escravos. Durou 200 anos e não sobreviverá a 2030. Os escravos coloniais, sobretudo depois do renascimento da China, e da grande rebelião muçulmana em curso, deixaram de obedecer ao império judaico-cristão e rejeitam também categoricamente a supremacia branca, anglo-saxónica e protestante. Um novo mundo, inimaginável por enquanto, está em gestação. A geratriz desta revolução está no Oriente. Aos antigos cruzados resta-lhe acordar.

Os desafios são arrepiantes. Não, não são nenhuma farsa, como as minocracias burocráticas europeias querem fazer crer. A Alemanha está muito consciente destas ameaças, e por isso não irá tolerar por muito mais tempo a irresponsabilidade populista dos pequenos burocratas e regimes corruptos do Sul da Europa. Em breve colocará a União perante um dilema sem precedentes: ou se colocam os PIGS em quarentena, fora do euro, durante 1, 2, 4... 10 anos, ou a Alemanha bate com a porta e regressa ao marco. Se o falido Reino Unido continua com a sua libra esterlina, se a Suécia continua com a sua coroa, porque não libertar a economia alemã do fardo de alimentar porcos a pérolas e burros a pão de Ló? Na realidade, parece-me mais verosímil uma saída da Alemanha do Sistema Monetário Europeu, do que a expulsão das paquidérmicas minocracias burocráticas do Sul da Europa, e da sacrificada Irlanda, do ilusório bem-estar em que têm vivido desde o aparecimento da moeda única.

Premier Wen Jiabao shakes hands with his Russian counterpart Vladimir Putin
on a visit to St. Petersburg on Tuesday. ALEXEY DRUZHININ / AFP

China, Russia quit dollar in trade settlement

China and Russia have decided to renounce the US dollar and resort to using their own currencies for bilateral trade, Premier Wen Jiabao and his Russian counterpart Vladimir Putin announced late on Tuesday. — in People's Daily Online, November 24, 2010.

Yuan begins trading against the rouble

SHANGHAI - China started allowing the yuan to trade against the Russian rouble in the interbank market from Monday as policymakers promote the currency's use in global trade and finance.

The move will help "facilitate bilateral trade between China and Russia and help develop yuan trade settlements," according to a statement published on the website of the China Foreign Exchange Trade System (CFETS), a subsidiary of the People's Bank of China. — in China Daily, Nov. 23, 2010.

Crisis of Fiat Currencies: US Dollar Surpluses Converted into Gold
China, Russia, Iran are Dumping the Dollar

China and Russia are both large gold producers and for a number of years have been buying up domestic gold and silver production, so that it never reaches the market and does not affect prices. If anything the absence of sales tends to push the markets higher. As a matter of fact Russia and India are visible buyers. Even Iran with its oil surplus recently announced that they had purchased 340 tons of gold. Their recent gold purchases are very significant as affiliate members, which have access to the present and ultimate direction of the group. You might say buying gold has been a protective effort to shield members and close observers from the problems generated by dollar policies. They are accumulating gold, as many have been worldwide, for the past ten years, but particularly over the past few years. — in Global Research, November 22, 2010.

China to rebuild Argentine rail
BEIJING - CHINA and Argentina have agreed to invest about US$10 billion (S$13.8 billion) over several years to renovate the Latin American country's dilapidated railway system and build a subway for its second-largest city.

(…) Argentina's once-extensive rail network was largely dismantled during the privatisations of the 1990s. But as agricultural output soars, farmers and grain elevators - who send more than 80 per cent of grains by costly road transport - have been calling for investment to revive the railways. —  in Strait Times, Jul 13, 2010.

China, Argentina to settle trade in yuan: Xinhua

HONG KONG (MarketWatch) -- China and Argentina have agreed to set up a 70 billion yuan ($10.24 billion) currency swap system that will enable trade between the two nations to be settled in the Chinese currency, the state-run Xinhua News Agency reported Monday. — in Market Watch, March 30, 2009.

Os dados estão lançados. Não vejo como possamos, a menos que optemos por uma sinistra deriva suicida, deixar de olhar os problemas de frente. A globalização, tal como foi engendrada, exportou a economia para o Oriente (1) e levou o Ocidente à bancarrota. Para controlar os estragos e retomar um certo equilíbrio na divisão internacional do trabalho teremos que voltar a levantar barreiras à circulação libertina dos capitais, das mercadorias e das pessoas, em nome da integridade produtiva das nações e em nome da sustentabilidade dos ecossistemas de que a vida humana é parte integrante e indissociável.

As democracias ocidentais deixaram há muito de ser democracias (basta ler as estatísticas eleitorais.) Na realidade, o que temos são sociedades burocráticas sem trabalho, que nada ou pouco produzem, e que consomem o que de facto não podem pagar, a não ser contraindo mais daquilo que rapidamente aprendemos todos a contrair nas últimas quatro décadas: dívidas!

Os países europeus terão que passar rapidamente por um processo de profunda revolução ideológica e política. Vai ser preciso libertar da esfera burocrática estatal toda a comunicação, toda a administração e toda a ciência. Mas vai ser, por outro lado, absolutamente necessário reincorporar na esfera social, de uma forma distinta dos actuais sectores públicos, e público-privados, o bem comum: o ar que respiramos, a água que bebemos e alimenta o resto da Natureza, as vias da mobilidade humana, as fontes de energia, a agricultura e a indústria. Não é a propriedade privada em si que está em causa, mas a sua concentração, monopolização e transfiguração financeira. A tarefa é avassaladora e complexa. Mas nem por isso menos inadiável.


NOTAS
  1. List of countries by steel production

sábado, novembro 20, 2010

O amigo americano

Portugal, uma espécie de Suíça diplomática?

Air Force One com Barack Obama aterra na Portela (Foto —pormenor— de Rui Spotter)
Com a 10ª maior ZEE do mundo em perspectiva, Portugal passará a deter um domínio estratégico na ordem dos 3.119.799 Km2. Só para termos uma ideia do que isto é, basta pensar que corresponde mais ou menos à superfície da Índia. Embora o Portugal à tona dos mares (continental e insulares) ocupe a modestíssima posição 109 entre todos os países do mundo, já quando medimos o território nacional e a sua ZEE, ficaremos certamente entre os 10 maiores países do mundo!  — in O António Maria, 22 nov 2008.

Escrevi há exactamente dois anos atrás que Portugal voltará a ter um papel de charneira diplomática entre o Ocidente e o Oriente. A formulação de um novo Tratado de Tordesilhas aproxima-se rapidamente. Previ então que a nova Rússia penderia para Ocidente. Vamos ver o que nos reservam a segunda viagem de Medvedev a Portugal e esta crucial Cimeira da NATO (1).

Pensemos por um momento nesta coincidência: Durão Barroso tornou-se presidente da Comissão Europeia na era Bush, e viu renovado o seu cargo já com Obama no poder; Vítor Constâncio é chamado a ocupar o cargo de vide-presidente do Banco Central Europeu no pico da maior crise financeira mundial desde 1929, e certamente naquela que é a maior ameaça à consolidação do euro como nova moeda de reserva mundial; Portugal venceu o Canadá na corrida para a posição de membro não-permanente do Conselho de Segurança da ONU; António Borges é o novo director para a Europa do FMI; António Horta Osório tornou-se recentemente presidente executivo do Lloyds Bank, deixando o Santander; Hu Jintao decidiu fazer uma viagem relâmpago a Lisboa poucos dias antes da cimeira da NATO, a que se seguiria uma viagem igualmente relâmpago de Sócrates a Macau, para se encontrar com o primeiro ministro chinês Wen Jiabao; Obama, enfim, escolhe Portugal para aquela que é já uma das mais importantes reuniões da NATO de sempre — pois, ao contrário dos inúmeros obituários já escritos sobre a organização, esta poderá ser dado neste encontro à beira Tejo o pontapé de saída para uma nova partilha do planeta entre os hemisférios ocidental e oriental. É o que venho chamando há já alguns anos o novo Tratado de Tordesilhas.


Tal como quando a Inglaterra viu bloqueados os seus acessos ao Oriente e ao Norte de África, por causa do fiasco das Cruzadas e da Guerra dos Cem Anos, teve que se virar para a praia lusitana, casando a sua Princesa Filipa de Lencastre com João I de Portugal, como meio expedito de lançar uma ponte em direcção ao Golfo da Guiné (a célebre Costa do Ouro), onde se encontrava o metal de que tanto precisava, nomeadamente para pagar a guerra contra os franceses, também agora a América e o Reino Unido, ambos falidos até à medula, e de quem a Alemanha, a Rússia, a China e 4/5 do planeta desconfiam, precisam hoje de Portugal e do seu imenso mar territorial, para segurar o Atlântico Norte e Sul, impedir a expansão descontrolada da China e garantir os bons ofícios de um amigo nos corredores da diplomacia do euro.


Portugal é um país pequeno, mal governado e coberto de dívidas. Mas se houver alguém lúcido entre as nossas desmioladas elites, verá que está na hora de arregaçar as mangas e de disciplinar a burguesia clientelar, as corporações profissionais e partidárias, e a burocracia, por forma a podermos tirar real vantagem da nossa nova centralidade geo-estratégica. É preciso acantonar imediatamente a corrupção, o desperdício e a balbúrdia parlamentar. Só depois, poderemos renegociar as nossas dívidas em paz, sem assassinar a classe média, nem humilhar os pobres, os desempregados e os idosos. Só depois poderemos cobrar à vontade, de Washington a Pequim, a nossa boa vontade e experiência diplomáticas. Um pequena quermesse entre os grandes colocará as nossas finanças públicas em ordem num ápice. Mas antes de tudo o mais teremos que despedir o imprestável Sócrates, e o imprestável Cavaco, mais as procissões de inúteis e corruptos que os seguem.

NOTAS
  1. Pouco depois de publicado este texto, veio a confirmação (ler notícia do DN) de que a Rússia iniciou oficialmente um processo de convergência com os países da NATO. O cenário de um dia destes estar entalada entre a China e o Irão foi seguramente determinante para a nova estratégia de Moscovo.

terça-feira, novembro 16, 2010

Novo Estado

nE
O Estado português nascido em 25 de Abril de 1974 morreu de hipertrofia. Logo, é preciso um "novo Estado" (nE). Não confundir com Estado Novo!

O velho Estado era assim:
  • grande, obeso, paquidérmico
  • invasivo
  • ineficiente
  • gastador
  • burocrático
  • corporativo
  • clientelar
  • opaco
  • populista
  • corrupto
O novo Estado deveria ser assim:
  • pequeno
  • regulador
  • eficiente
  • poupado
  • expedito
  • estratégico
  • democrático
  • transparente
  • solidário
Os paradigmas actuais da discussão política, impostos pelos partidocratas do regime, são inúteis. É preciso mudar os termos do debate público democrático.

Banqueiros piratas

Não têm emenda!



Sócrates e Cavaco querem negociar por baixo da mesa, com Passos de Coelho, duas grandes obras públicas desenhadas à medida das suas clientelas: o novo aeroporto da Ota em Alcochete (os terrenos foram comprados pela SLN dos piratas do BPN) e o "TGV", por imposição dos nossos maiores credores: Espanha!

O que o pirata-mor Ricardo Salgado disse à senhora Judite de Sousa na Grande Entrevista da RTP 1 sobre o novo aeroporto e a TAP é uma completa mistificação e mais uma tentativa descarada de embuste. Foi para passar esta manobra que se fez "entrevistar". Já ninguém se lembra, pelos vistos, se é que alguma vez a imprensa se fez eco do escândalo, que foi este mesmo pirata quem impingiu a falida Portugália Airlines (PGA) à falida à TAP, por mais de 100 milhões de euros!

Vamos aos factos duradouros e praticamente inamovíveis:
  • Tráfego de e para a Europa na Portela = 84%
    • União Europeia — 55%
    • Portugal e Ilhas — 24%
    • restante Europa — 5%
  • Tráfego de e para países terceiros = 16,5%.
    Curiosidade: nestas rotas, em 2007, apenas um Boieng 747 aterrava diariamente na Portela, mas há 10 anos eram 4, e no início dos anos 70 aterravam e descolavam diariamente várias destas enormes aeronaves.
A pergunta óbvia é esta: justifica-se gastar 5 mil milhões de euros para servir o A380?
Claro que não! E porquê?
  1. Em primeiro lugar, porque o A380, mais silencioso e ágil do que o Boeing 747, pode aterrar e manobrar perfeitamente na Portela;
  2. Em segundo lugar, e mais importante, porque o A380 vai ser utilizado sobretudo nas rotas de longo curso e grande tráfego como as de Nova Iorque-Paris, Nova Iorque-Londres, São Paulo-Londres, São Paulo-Paris, São Paulo-Frankfurt, São Paulo-Beijing, São Paulo-Xangai, etc. Ou seja, num campeonato que não está ao alcance de um país periférico e falido como Portugal.
Logo, o que está em causa na manobra de pressão do senhor do BES, e por interposta pessoa, dos piratas da SLN/BPN, e dos seus acólitos partidários, é simplesmente compensar, num toma lá dá cá, a ligação ferroviária de Alta Velocidade/Velocidade Elevada para passageiros e mercadorias entre Caia e Lisboa (Poceirão e Pinhal Novo ficam na Grande Lisboa!), contratada e confirmada com Madrid em várias cimeiras ibéricas, por um aeroporto inútil que, não só não salvará a falida TAP, como, tal como sucedeu com o novo aeroporto de Atenas, nos conduzirá mais depressa para uma década de bancarrota e vergonha nacional.

A canalha que se governa com o país só tem que ter presente uma coisa: sempre que fomos à falência, o regime mudou de mãos!

domingo, novembro 14, 2010

Bancarrota-4

Expulsar Portugal da Eurolândia?

Masaccio, "Expulsão de Adão e Eva do Paraíso"

O charlatão que elegemos para primeiro ministro anunciou, em perfeito jet lag (1), mais uma boa notícia sobre a nossa excelente economia: estamos a crescer mais do que o previsto e mais do que a generalidade dos nossos parceiros europeus. Esqueceu-se "o engenheiro" de dizer que a boa performance das exportações se deve ao crescimento alemão, que houve compras antecipadas e por atacado de automóveis e outros bens e serviços na previsão de uma subida generalizada dos impostos, e que pese embora as quebras acentuadas das receitas turísticas, sobretudo hoteleiras, o fenómeno chamado Low Cost deu origem a uma verdadeira ponte aérea entre Porto, Lisboa, Faro e Funchal, de um lado, e dezenas de cidades europeias, originando uma nova e surpreendente classe de passageiros frequentes composta por emigrantes portugueses. Ouve-se falar inglês, italiano e francês no Porto e Matosinhos, como nunca se ouviu. Mas o que realmente tem feito a diferença, suspeito bem, é a frequência com que os nossos emigrantes se deslocam a Portugal, para ver familiares, tratar dos seus negócios e comer pataniscas, desde que a Ryanair, a easyJet, a Vueling e a Air Berlim, entre outras companhias aéreas de baixo custo, começaram a fazer o que a TAP (2) há muito deveria ter começado a fazer, mas não fez — subordinada que esteve nas últimas décadas aos negócios privados dos piratas do Bloco Central e da Tríade de Macau.

Das exportações atraídas pelo crescimento alemão e asiático, e dos fluxos de poupança que as mais recentes vagas de emigração aportam ao país, ninguém se pode queixar e todos temos que agradecer. São factores de resiliência que ajudam a compreender porque não nos estatelamos ainda ao comprido, mas que nenhum político pode exibir como mérito próprio. A corja partidária, sobretudo aquela corja que há três décadas coloniza a nossa democracia como se de uma coutada ou grande tacho se tratasse, continua a comportar-se, no meio da maior crise de endividamento de que há memória neste país, como uma insaciável ninhada de ratos mimados. O descalabro começou na fase terminal da dita era Cavaco. Daí a aliança descarada entre o incapaz e recandidato presidente, e o mitómano que dá pelo nome de Sócrates!

Mas se é verdade que as exportações têm vindo a crescer a bom ritmo, e que centenas de milhar de portugueses emigrados continuam a investir no seu país, não é menos verdade que o nosso endividamento colectivo, a dívida externa portuguesa, e sobretudo o escandaloso descalabro das finanças públicas geridas pelo Terreiro do Paço, ameaçam atirar Portugal para fora do Sistema Monetário Europeu, isto é, para fora do euro! Se em 2011 Portugal, como é cada vez mais provável, suspender o pagamento de dívidas ao exterior e declarar a bancarrota do Estado, a que se seguirá um processo formal de reestruturação da sua dívida soberana, não será o fim do mundo, mas será certamente o princípio do fim desta República.

É à luz da óbvia gravidade da situação em que nos encontramos que as palavras de Luís Amado ao Expresso e a agitação crescente nas hostes do PS devem ser compreendidas. O Partido Socialista, se não conseguir acantonar a horda de piratas que tomou de assalto o PS e o Estado, entrará num imparável e humilhante processo de suicídio político e desagregação. Para evitar esta possível morte prematura, só tem uma coisa a fazer: apear o vilão Sócrates do poleiro!

Como aqui se escreveu várias vezes, o actual ministro dos negócios estrangeiros seria uma boa alternativa ao imprestável Sócrates, na perspectiva da formação duma grande coligação governativa (PS, PSD, CDS). Esta coligação, apesar de problemática, é há muito a única geometria político-partidária, no actual quadro constitucional, capaz e reunir a autoridade democrática e traçar a bissectriz programática imprescindíveis ao estabelecimento dum acordo de regime para uma década, do qual venha a constar como prioridade única fundamental o emagrecimento do paquiderme estatal criado pela simbiose oportunista entre a nomenclatura partidária, a burguesia corporativa, a clientela económico-financeira e a burocracia (3). Um estado menos obeso será necessariamente mais transparente, mais ágil, e mais solidário.



As alternativas reduziram-se drasticamente nos últimos meses. Se nada se fizer no PS —i.e. se ninguém com a coragem suficiente exigir um congresso socialista antes mesmo das próximas presidenciais (marcando em larga medida o desfecho destas) para apear Sócrates e a canalha que o rodeia, e preparar o PS para forçar o inanimado Cavaco e o novel Passos de Coelho a sentarem-se à mesa de uma grande coligação, então seremos inexoravelmente expulsos do euro (4).

NOTAS
  1.  Sócrates estava em Macau quando se congratulou com o crescimento inesperado do PIB, numa viagem desesperada para convencer o primeiro ministro chinês (Wen Jiabao) a convencer o presidente chinês (Hu Jintao) de que os piratas lusitanos que levaram Portugal à bancarrota precisam desesperadamente que a China compre um, dois, ou três mil milhões de euros da nossa dívida soberana, e que entrem também no capital dos sobre endividados BCP e EDP. Só que até agora, para além das palavras protocolares, népias! É provável que a China ajude Portugal, mas para que tal aconteça, creio que Hu Jinato e Wen Jiabao esperarão pela saída do imprestável Sócrates. É esta a conclusão que retiro das movimentações desesperadas da Tríade de Macau.
  2. Há muito que Bruxelas decidiu liberalizar os céus da Europa e privatizar o transporte aéreo, proibindo os estados nacionais de injectar dinheiro nas suas obesas e ineficientes companhias de bandeira. Países como Portugal, Espanha e outros inventaram no entanto mil e um subterfúgios para continuarem a alimentar o endividamento imparável destas companhias à custa dos contribuintes adormecidos — mantendo assim porcas orçamentais invisíveis com que têm vindo a amamentar as respectivas nomenclaturas, cada vez menos democráticas: partidos e deputados (recordemos o caso extraordinário da deputada Inês Medeiros, mas também os milhões em descontos destinados aos passageiros frequentes da nossa classe partidária), legiões de administradores fictícios e comissários políticos, e as empresas clientelares do regime (recorde-se o caso da falida PGA impingida politicamente pelo BES à falida TAP). A companhia administrada pelo gaúcho Fernando Pinto conta apenas com três activos de monta: a posição dominante nos voos entre o Brasil, Angola e Europa; os seus pilotos e o pessoal de manutenção de aeronaves. Tudo o resto é prejuízo ou leasings por pagar. Ou muito me engano, ou o governo português vai ser obrigado, por quem lhe empresta o dinheiro para pagar aos funcionários públicos, reformados e pensionistas, a privatizar a TAP em 2011. O governo "socialista" quererá fazê-lo, mas colocando o ónus do despedimento de alguns milhares de trabalhadores (336 da Groundforce já marcharam) aos ombros do comprador. Acontece, porém, que Sócrates e os capachos Vieira da Silva e Teixeira dos Santos, já perderam toda a margem de negociação. Resta-lhes tão só obedecer ao BCE e a Bruxelas. Ou então, um golpe de génio: vender a TAP, o BCP e uma fatia estratégica da EDP (10%) aos chineses! Sempre evitávamos a entrada de Madrid no Terreiro do Paço, e colocávamos Portugal num novo plano de diplomacia estratégica.
  3. Para além do emagrecimento do Estado e de boa parte das instituições democráticas (alteração da lei eleitoral e diminuição do número de deputados, câmaras municipais e freguesias urbanas), devemos exigir de quem nos levou à falência mais estas prioridades estratégicas:
    • revisão imediata de todas as Parcerias Público-Privadas, incluindo rescisão de boa parte das mesmas e incriminação eventual dos seus autores;
    • revisão imediata da política de gestão dos recursos hídricos nacionais, abolindo de imediato o sórdido processo de privatização das águas públicas;
    • revisão imediata da política energética nacional, trocando a actual estratégia de exaustão e assalto oligopólico aos recursos energéticos efectivos e potenciais do país, por uma estratégia pública rigorosa e drástica de eficiência energética;
    • actualização instantânea dos valores mínimos exigíveis das rendas urbanas, indexando os valores por metro quadrado a uma regra de cálculo transparente e justa, indexada ao efectivo poder de compra de cada cidade e aglomerado urbano, calculado pelos municípios e freguesias;
    • criação de um Plano Nacional de Mobilidade Sustentável, com gestão descentralizada até ao nível das freguesias, onde o transporte colectivo, público, empresarial e comunitário deverá contar com claros incentivos e benefícios, relativamente ao transporte individual motorizado;
    • simplificação da administração da justiça e efectivo controlo democrático sobre o poder judicial;
    • criação de legislação clara sobre a defesa legítima de interesses, conflitos de interesses, incompatibilidades e tráfico de influências;
    • liberalização do contrato de trabalho individual, tendo em vista a sua competitividade relativamente à legislação europeia predominante, regras de transparência e justiça relativa para ambas as partes contratantes.
  4. A saída de Portugal do Sistema Monetário Europeu seria sempre uma medida extrema que a Comissão Europeia procurará evitar a todo o custo. Até porque colocaria imediatamente na mesa os problemas da Irlanda e da Grécia — já para não falar de Espanha, a quarta economia da União. Prevejo, pois, que Bruxelas e o BCE prefiram manobrar no sentido da remoção do entulho socratino da nossa governança, e da formação de uma coligação governamental de grande maioria, com um primeiro ministro do PS e um vice-primeiro ministro do PSD, capaz de simultaneamente levar a legislatura até ao fim, e de introduzir as correcção drásticas de que Portugal precisa para reganhar a confiança dos mercados financeiros, destroçada pelas sistemáticas mentiras e manobras evasivas dos piratas que tomaram de assalto o PS e o País.

Última actualização: 14 novembro 2010; 10:49

terça-feira, novembro 09, 2010

Bancarrota-3

7,01% !

“Portugal continua a bater recordes na sua dívida a dez anos. Neste momento, estamos nos 7,01%, a taxa que o Estado iria pagar se se tivesse endividado hoje. Amanhã iremos fazer um leilão desta mesma dívida. Por isso, a não ser que haja uma recuperação forte, será à volta desta taxa que o Estado irá pagar”, indica Filipe Silva, gestor do mercado e dívida do Banco Carregosa. — Renascença.

Para termos uma ideia do que significa um juro de 7%, basta dizer que por cada mil milhões de endividamento teremos que pagar dois mil milhões daqui a dez anos, quando o empréstimo e respectivos juros estiverem finalmente saldados. Por cada euro, pagaremos dois, e assim sucessivamente.

Como as necessidades de endividamento anual do Estado estão na ordem dos 24 mil milhões de euros por ano, tal significa que daqui a 10 anos teremos que pagar o dobro destas quantias se os juros se mantiveram na casa dos 7%. É por causa deste simples cálculo, que na prática significa uma espiral de endividamento exponencial, que Portugal entrou inexoravelmente no precipício da bancarrota.

Nada nos salvará de uma intervenção drástica do Fundo de Estabilização Financeira Europeu e do FMI. Ou melhor, que venham o mais depressa possível, para evitar que os piratas que assaltaram o país continuem a roubar desalmadamente tudo o que podem e encontram pelo caminho!

O senhor constitucionalista Jorge de Miranda deveria reformar-se e deixar de dizer baboseiras. Os políticos que levam um país à bancarrota devem ser investigados, sim! E devem ser presos, se cometeram crimes, ainda que sob protecção de cargos ministeriais e públicos de diversa ordem, sim!!

Entretanto, recomendo a leitura de mais este artigo oportuno e bem meditado de Rui Rodrigues:
As infra-estruturas numa economia nova

Os únicos investimentos em infra-estruturas, em que se deveria apostar, seriam aqueles que poderiam tornar a economia mais competitiva e que possibilitassem o aumento das exportações, tais como numa nova rede ferroviária de bitola europeia e nos portos de mar. (Público)

sexta-feira, novembro 05, 2010

III guerra mundial

EUA presos no elevador do endividamento



Stuck In A Falling Elevator

There is this very interesting NOVA video called ‘Trapped in an Elevator‘ where this poor office worker goes out for a brief smoke, goes back inside and is then trapped for 48 hours stuck on the 13th floor, of all things.  He presses the panic button, calls for help on the telephone, yells like crazy but no one answers.  Even though there is a camera monitor that sees him and records his struggles to survive, the people supervising the building never bother to look at the monitors and rescue him.

(…) The Democratic Party stabbed Obama in the face when they sided with a foreign leader, Netanyahu, against their own leader and this led to a total loss of prestige and power and Obama is now perceived as a servant, a doorman or doormat rather than a leader and this perception has grown across the board.  Those Americans stuck in the elevator try to contact their concierge at the front desk but he isn’t bothering much anymore.  He is sick and tired of his job and indifferent to the status of the people dying in the stuck elevators.

— Elaine Meinel Supkis in "Culture of Life News" 

Os Estados Unidos estão a criar dinheiro virtual (ou seja, meramente escriturado) como doidos. A ideia de descer os juros do banco central até zero (uma ideia peregrina inventada pelos japoneses, e responsável pela depressão da sua economia, que dura há já 20 anos!), foi copiada pela América de Bush, e também do desgraçado Obama. O senhor Trichet tem resistido, mas a verdade é que já empresta a 1% aos bancos comerciais, para estes cobrarem quase 7% por algumas das dívidas soberanas europeias! Aliás, o custo total de alguns créditos pessoais já ultrapassa os 30% —basta fazer uma simulação nalguma das calculadoras disponíveis nos sítios web da banca portuguesa!!

Mas o grande perigo está mesmo na contrafação imparável de dinheiro virtual através do sofisma financeiro chamado Quantitative Easing. Os Estados Unidos são os campeões desta economia de casino, sem cuidar que foi assim que a Alemanha de Weimar implodiu, ou mais recentemente, que o Zimbabué se transformou num estado falhado. Angela Merkel, pressionada pelo eleitorado alemão, que ainda não se esqueceu das consequências trágicas de confundir dinheiro com notas de Monopóio, meteu travão às quatro rodas em matéria de controlo dos endividamentos europeus, exigindo novas regras de penalização dos infractores nacionais da União, e sobretudo apoiando o BCE na sua anunciada política de garrote relativamente aos improdutivos e perdulários governos europeus.

O grande problema das economias ocidentais foi terem exportado, ao abrigo da livre circulação e liberdade dos mercados financeiros, boa parte da sua capacidade produtiva real para o Oriente, crendo que uma economia de serviços e de consumo poderia substituir o pão que comemos diariamente, e o telemóvel que trazemos no bolso. Não pode! Que tem o trigo, os metais raros, e as fábricas; quem tem as matérias primas e a mão de obra barata disponível a produzir os bens transaccionáveis, é que, no fim do dia, dará as cartas da economia mundial. Ou seja....

O facto de não existir ainda um ciclo fatal de hiperinflação nos Estados Unidos, ou mesmo na Europa, reside precisamente na circunstância de as quantidades inimagináveis de dinheiro virtual criado pelo Ocidente (o buraco negro dos derivados financeiros equivale já a 12 vezes o PIB mundial!) estar, no fundo, a ser absorvido pelos países produtores de energia fóssil, matérias primas, alimentos e produtos acabados, que têm vindo a engolir o papel higiénico que lhes enviamos em troca dos bens que importamos massivamente. Daqui ao estalar de uma guerra cambial, e desta a um conflito militar de proporções inimagináveis, é um passo, ou tropeção, que pode ocorrer a qualquer momento.

Uma III Guerra Mundial poderá de facto vir a ser precedida por uma guerra cambial à escala planetária. Lula vai reunir os países emergentes para responder a esta loucura. O Japão, a quem Obama já prometeu intermediação, pode declarar guerra à Rússia e à China, por causa do excesso das reservas em dólares que acumulou, porque já não pode lucrar com yen carry trade (i.e. combinar uma moeda fraca com empréstimos interbancários a taxas zero ou próximas do zero) e porque o pico petrolífero vai lançar as economias mundiais num remoinho muito perigoso.

EDP no vermelho

EDP entrou no túnel sem saída do endividamento



A EDP, tal como o Governo, anuncia lucros onde a ruína ameaça de forma cada vez mais evidente. Mexia e Sócrates são feitos da mesma massa de vendedores de banha da cobra. Um dia destes descobrimos que, afinal, a EDP está falida, tal como a Caixa, o BCP, o BES, e o País!

Os dados objectivos da EDP, em 30 de Junho de 2010 (constam do Relatório de Contas acessível no respectivo sítio web) são estes:

Dívida Líquida = 16.107.900.000 €
Total dos Passivos Não Correntes = 21.799.817.000 €
Total Passivo = 29.882.974.000 €

Mexia faz conferências de imprensa como Teixeira dos Santos, para dizer que tem lucros, e que por isso, consegue financiamento nos mercados. Mau sinal! O ritmo das conferências irá certamente aumentar, para disfarçar o embaraço crescente, mas os resultados das safras irão rapidamente começar a empalidecer, tal como vem acontecendo com a dívida soberana portuguesa.

Há muito que venho chamando a atenção para o endividamento do país: Estado, bancos, empresas públicas (TAP, CP, RTP, Carris, Metro) e EDP. Os nossos economistas políticos andaram a dormir na forma quando lhes gritava aos ouvidos para olharem para a dívida pública e para a dívida externa. Agora ainda não acordaram para o endividamento das empresas estratégicas do país. Tal como os carros com mais de 4 anos, os economistas deveriam ser obrigados a fazer revisões anuais das suas faculdades de juízo.


POST SCRIPTUM
8-11-2010 — "BCP e EDP têm muito a ganhar com accionistas chineses".
Não foi preciso esperar mais do que uns dias para confirmar o que acima se escreveu, reiterando o que temos vindo a escrever sobre a EDP desde Março de 2009. A compra de 2% da EDP pela China é a confirmação de que a EDP, com o seu altíssimo grau de endividamento, não passa dum gigante com pés de barro, muito apetecível para uma país como a China.

terça-feira, novembro 02, 2010

Mr Hu Jin Tao

Retribuir a concessão de Macau

Deveríamos negociar uma concessão territorial à China, por 100 anos (porque não, nos arredores de Sines ou Beja, ou mesmo da Costa da Caparica), em troca do financiamento parcial da dívida externa portuguesa e de investimentos localizados no nosso país — sobretudo no sector portuário e ferroviário.

Os chineses poderiam financiar e explorar por um período de 50 anos o novo porto de águas profundas no "Fecho da Golada" (Trafaria), provavelmente o mais estratégico dos investimentos que Portugal poderá fazer nas próximas décadas, a par da ligação prioritária da sua rede ferroviária de transporte de passageiros e mercadorias ao projecto de interoperabilidade da rede ferroviária europeia de Alta Velocidade e Velocidade Elevada em bitola internacional, actualmente numa fase adiantada de concretização.

A China precisa do Atlântico como do pão para a boca. E quer ter na Europa um aliado estratégico na sua cavalgada para se posicionar entre 2015 e 2020 como primeira potência económica e financeira mundial, com uma capacidade de defesa militar estratégica e táctica à prova de provocações. Ora se precisa da Europa e do Atlântico, precisa de Portugal!

A China é do signo Peixes, tal como Portugal! Ou seja, é um povo de formigas, mas de formigas tão ao mais individualistas que as formigas lusitanas — daí que, sem governos fortes, tendam para a dispersão e a perda de rumo. Têm o gosto pela aventura e pela emigração. Gostam de trabalhar, têm espírito de iniciativa, são evasivos e subtis ao mesmo tempo, são excelentes comerciantes, como qualquer galaico-lusitano de gema. A única coisa importante que nos diferencia é a mudança do ciclo histórico. Mas se soubemos conviver e traficar com eles durante 446 anos, porque não saberemos agora renovar o pacto de cooperação por mais uns séculos?!

Eu nasci em Macau e tenho um apelido que só há pouco anos os portugueses começaram a soletrar e escrever sem erros (Cerveira). Talvez por estes dois episódios sempre me senti mais como um cidadão do mundo, do que como português do Norte, ou mouro de Lisboa. Talvez por este cosmopolitismo quase genético, me atrevo a propor ao meu país um acto de ousadia estratégica e imaginação: renovar o pacto de amizade e cooperação com a China por mais 400 anos!


POST SCRIPTUM

Estava errado: afinal China e Portugal não são do mesmo signo zodiacal, como em tempos escrevi. Portugal aparece reiteradamente anunciado como Peixes, mas a China moderna parece pertencer à constelação Caranguejo com ascendente em Balança... (30 jul 2012)

segunda-feira, novembro 01, 2010

Um caso de estudo

Tit for tat vence dilema do prisioneiro Sócrates



Portugal está na bancarrota. Pergunta: quem foi responsável por semelhante desastre e pelas pilhagens que contribuíram para este desfecho? Foi apenas o PS e quem o tomou de assalto, ou há que assacar também responsabilidades ao PSD, nomeadamente ao PSD de Cavaco Silva, de onde surgiram figuras tão pouco recomendáveis quanto Oliveira Costa e Dias Loureiro, possíveis cúmplices do maior assalto a uma instituição financeira (SLN/BPN) alguma vez praticado no nosso país?

A convicção popular reparte, ainda que de modo desigual, as responsabilidades do colapso em curso, pelos dois principais protagonistas do chamado Bloco Central que nos tem governado desde 1983.

Sendo embora evidente as especiais responsabilidades do PS e do mentiroso compulsivo José Sócrates na década de escondida estagnação e sobre endividamento que Portugal atravessou desde o início deste século, é também verdade que o decrescimento tendencial da nossa economia e a divergência relativamente à média europeia começou no início dos anos 90, ainda com o governo de Aníbal Cavaco Silva, que acabaria aliás por perder as eleições de 1995, no rescaldo da recessão de 1993 (1).

Foi esta percepção, e ainda a noção generalizada de que os demais partidos com assento parlamentar (CDS-PP, PCP e Bloco de Esquerda) não passam de contra-pesos do regime, incapazes, individualmente ou em qualquer coligação imaginável, de fazer qualquer coisa de útil pelo país, que acabou por induzir na consciência colectiva, e nas sondagens, duas convicções complementares, apesar de terríveis:
  1. que o equilíbrio de uma solução de emergência nacional para a crise aguda em que estamos teria que ter um larguíssimo apoio parlamentar;
  2. e que assim sendo, seria fatal como o destino um entendimento entre os dois maiores partidos, significando tal entendimento na prática uma óbvia concessão de maiores e mais decisivos poderes ao PSD —certamente antes do fim ou interrupção do actual ciclo legislativo.
Mas transformar este sentimento popular numa efectiva alteração do cenário político não é coisa fácil, sobretudo tendo presente a natureza burlona e golpista dos piratas que tomaram de assalto o PS e o Estado, e os foram esvaziando de conteúdo, autonomia e fundos.

Desde que António Guterres perdeu o controlo do seu próprio governo a favor da tríade de Macau, e com total descaramento, desde que o senhor Sócrates Pinto de Sousa foi colocado onde está, que a partidocracia vigente caminha de forma acelerada para uma cleptocracia, com tudo o que de suicida tal descarrilamento democrático significa. Estancar a hemorragia orçamental populista que alimentou e é propícia a favorecer rapidamente o colapso de qualquer regime democrático exige, antes de mais, expor, denunciar publicamente, e derrotar o verdadeiro exército de corrupção instalado em boa parte dos vértices do poder e que se espalhou como metástases de um cancro por toda a sociedade que depende da apropriação dos fundos comunitários e da pilhagem fiscal.

Ora, como não podia deixar de ser, os piratas resistem com tudo o que têm à mão a ceder as posições que ocuparam sob a capa do processo democrático. A cooperação entre os dois principais partidos com assento parlamentar é mais do que nunca necessária, mas o poder mafioso existente fez e fará tudo para torpedeá-la.

Passos Coelho apercebeu-se, felizmente a tempo, desta fatalidade do comportamento adversário, o qual queria impor ao PSD uma submissão pura e simples aos seus desígnios, em troca de uma partilha subreptícia dos negócios ruinosos em curso, e do banquete orçamental. Para tal manobra, Sócrates e a tríade de Macau contaram aliás com vários apoios laranjas, do intriguista-mor do reino, Marcelo Rebelo de Sousa, até aos mais chegados, e felizmente exonerados, conselheiros do actual líder do PSD: Ângelo Correia e António Nogueira Leite.

Como aqui se recomendou sempre, a melhor estratégia para lidar com esta verdadeira conspiração seria manter bem alta a perspectiva de uma rejeição do orçamento do PS por parte do PSD, deixando Sócrates, a tríade e o próprio Cavaco entregues ao bluff anunciado de uma demissão do governo.

O PSD, apesar de ter culpas no cartório, não é responsável pelo agravamento extremo da situação económica e financeira a que a pirataria e a mentira do governo Sócrates conduziram o país. E por isso, só um tolo, suicida, ou vendido, aceitaria comungar com o PS as responsabilidades pela dita bancarrota. O dilema do prisioneiro estava assim criado, e o jogo da mais extraordinária negociação política dos últimos tempos iria ter finalmente lugar.

Eduardo Catroga, que o anti-ético conselheiro de estado e intriguista-mor do reino "professor Marcelo" apelidou este Domingo, em tom pejorativo, de "avozinho" e "Avô Cantigas", liderou de forma absolutamente brilhante uma equipa de negociadores que acabaria por derrotar por KO humilhante o capacho Teixeira dos Santos, e por via deste capacho, esse quisto do regime que é necessário lancetar quanto antes: José Sócrates Pinto de Sousa. Não vou descrever a cronologia deste Tit for tat, mas foi tão extraordinário e emocionante que espero venha a ser objecto de uma tese de mestrado ou doutoramento sobre como a arte de negociar pode salvar um regime à beira do colapso de um suicídio mais do que plausível.

O dilema do prisioneiro ainda não chegou ao fim, mas tudo indica que quem verdadeiramente assaltou o pomar é já conhecido de todos. Só falta mesmo que as autoridades policiais tomem conta do caso, e antes disso, que os socialistas recuperem as rédeas do PS. A desautorização flagrante das palavras do capacho Teixeira dos Santos, isto é, a desautorização flagrante do chefe do governo e ainda secretário-geral do PS, José Sócrates, por parte de Francisco Assis, assinalam não apenas a dimensão quase esmagadora da vitória de Eduardo Catroga e Passos Coelho, mas também o início da limpeza doméstica que o Partido Socialista terá que fazer rapidamente se quiser estar à altura das circunstâncias extremas que aí vêm — e que também dele exigirão cooperação e responsabilidade.

A realidade é o que é. E no que se refere às próximas eleições presidenciais, os dados estão lançados, e os resultados antecipados já são conhecidos: Cavaco Silva, apesar de provavelmente sofrer de doença grave, será reconduzido eleitoralmente no cargo, deixando para trás uma colecção de candidatos impossíveis de levar a sério. Mas assim como os partidos precisam todos de uma grande limpeza interna e de arejar as respectivas ideias, éticas, metodologias e programas, também a presidência da república terá que aproveitar as próximas eleições para estancar as tendências cesaristas que crescem na sua Casa Civil. A situação do país não se compadece com menos.

Prevejo há muito a necessidade de formação dum governo de grande coligação (PS-PSD-PP) antes ou depois da reeleição de Cavaco Silva, antes ou depois de terminar a actual legislatura. Embora não seja de excluir uma vitória por maioria absoluta do PSD nas próximas eleições legislativas, antecipadas, ou no prazo regular, a instabilidade política inerente ao declínio económico-financeiro de Portugal que se prevê que venha a ocorrer até, pelo menos, ao fim da próxima década, exigirá uma adaptação do regime a tão dramática emergência nacional, a qual deverá passar, na minha opinião, por uma arquitectura de alianças estável, baseada numa plataforma de responsabilidade política, de ética institucional e de solidariedade social consensual entre uma boa maioria da população.

Pelo que se conhece de Cavaco Silva e das tendências cesaristas em desenvolvimento no interior da sua Casa Civil, pouco poderemos esperar de bom do Palácio de Belém. Compete aos partidos, após a sua urgente e radical renovação (do Bloco ao PP), impedir que a democracia portuguesa se transforme num inferno, acalentando na bicharada de Belém o sonho imoral de uma democracia tutelada.


NOTAS
  1. "Em 2010 termina uma década de crise e estagnação da economia portuguesa, usando os índices tradicionais dos capitalistas vejamos um pouco esta realidade: na década de 80 (1981-1990) o crescimento médio do Produto Interno Bruto (PIB) português foi de 3,8% com picos de 7,6% e 7,9%, respectivamente em 1987 e 1990, e um ano de recessão em 1984, numa evolução do PIB de -1%; na década de 90, encontramos já uma descida do crescimento médio para 3% com picos de 4,2% e 4,9%, em 1997 e 1998, e também um ano de recessão em 1993, numa evolução negativa de -0,7%; na década que agora termina, constatamos um crescimento médio de 0,5%, com pequenos picos de 2% e 1,9%, em 2001 e 2007, mas desta vez com dois anos de recessão em 2003 e 2009 com decréscimos respectivos de -0,8% e -2,7% a -3%, dependendo das diferentes projeções do Banco de Portugal ou do FMI, assinalando ainda que o crescimento em 2008 fosse de 0%. " — in "Portugal: uma década de decadência económica" (Diário Liberdade.)