quinta-feira, janeiro 31, 2019

A caixa negra de um resgate

Caixa Geral de Depósitos (CGD) (3779646223)

Propaganda não é prosperidade, nem paga dívidas


Resgate a Portugal foi o terceiro maior de sempre na história do FMI 
O Jornal Económico. Mariana Bandeira, 03 Janeiro 2019, 14:09 
O resgate financeiro do Fundo Monetário Internacional (FMI) a Portugal foi o terceiro maior da história da instituição liderada por Christine Lagarde. O ranking das maiores injeções de capital do fundo é encabeçado pela Argentina e pela Grécia.

A venda de ouro português foi uma prática sistemática desde o fim da ditadura. Foi, aliás, esta venda que financiou, em primeiro lugar, os novos direitos sociais do Portugal democrático.

Tal delapidação só parou em 2010, quando o Banco Central Europeu proibiu o governo português de mexer nas 382,5 toneladas que ainda restam das 801,5 toneladas existentes em 1974 (Wikipédia).

Estas reservas são, pois, uma espécie de colateral dos 51,7 mil milhões de euros emprestados pelo BCE e pela UE, para evitar a bancarrota do país cor-de-rosa que temos.

Continuamos, ao fim de três anos de propaganda governamental e partidária responsável por uma divisão social e cultural crescente entre os portugueses, no top dos devedores mundiais:
  • quase 250 mil milhões de euros de dívida pública bruta (a líquida andará pelos 225 mM€) 
  • mais de 700 mil milhões de euros de dívida total. 
Existem mais ou menos dez milhões de contas bancárias em Portugal. Mas total do dinheiro depositado nos bancos não vai além dos 140 mil milhões de euros, ou seja, pouco mais de metade da dívida do Estado e das suas sinecuras.

Por outro lado, menos de 200 mil portugueses têm depósitos superiores a 100 mil euros.

É por estas e por outras que a recente decisão, do PS, PCP e Bloco, de forçar os bancos a comunicar ao fisco as contas com mais de 50 mil euros, se parece com a preparação para uma nova crise financeira indígena. Quando? Quando batermos outra vez à porta do FMI e do BCE, porventura na iminência de uma nova bancarrota nacional. O governo pretende, pois, saber em que bancos e contas estarão os montantes de depósitos e obrigações potencialmente sujeitos a perdas por efeito de um bail-in (resgate interno) em caso de nova crise bancária acompanhada de falência de bancos. A preocupação anunciada com fugas ao fisco não passa de uma cortina de fumo.

A crescente agitação sindical é um sinal claro de que a reversão da austeridade não aconteceu, e que o governo, aflito, se prepara para novas emergências. E você, já se preparou?

O grande buraco da Caixa tem uma cor dominante: a cor da rosa. Parece assim evidente que Geringonça rosa-e-vermelha tudo fará para esterilizar o novo inquérito e os possíveis processos judiciais que entretanto surjam à superficie. Basta investigar Joe Berardo e o que levou Elisa Ferreira (e Francisco Louçã...) para o Banco de Portugal, para que mais este esclarecedor artigo de Helena Garrido abra uma nova e mais negra Caixa de Pandora.
Se os deputados quiserem, haverá culpados na CGD 
Helena Garrido. Observador, 31/1/2019, 7:44 

Com a informação disponível neste momento já é possível concluir que o período que gerou mais perdas para a CGD foi o que vai de 2005 a 2007, quando Carlos Santos Ferreira era presidente do banco e Armando Vara e Francisco Bandeira faziam parte da sua equipa. No relatório e contas de 2016 conclui-se que 39,5% das perdas apuradas nesse ano (imparidades) vieram de financiamentos concedidos entre 2005 e 2007. 
É nesse período que se inicia o processo da Artlant com a espanhola La Seda; é nesses anos que se financia Vale do Lobo; é nesses anos que se concedem empréstimos que envolvem indirectamente a CGD na guerra pelo controlo do BCP e é nesse tempo que se dá crédito para controlar a Cimpor. Quando Carlos Santos Ferreira passa para o BCP, a administração seguinte da CGD, liderada por Fernando Faria de Oliveira e que vai até 2010, gera igualmente perdas significativas (23,6% dos 5,6 mil milhões de euros de perdas apuradas em 2016), mas já estamos perante erros por omissão, por não decidir acabar com alguns projectos.
Joana Amaral Dias: “A Caixa é um poço sem fundo” 
Jornal i, 01/02/2019 12:09 
Injetámos mais ou menos 20 mil milhões de euros na banca nos últimos dez anos; destes, seis mil milhões de euros foram para a Caixa. Recordo que, em 2012, a Caixa não fez parte do escrutínio da troika e logo nesse ano foram injetados pelo governo de Pedro Passos Coelho 1,5 mil milhões de euros sem qualquer auditoria. Agora não há imparidades no banco? Vão justificar esses 6 mil milhões como? E esta auditoria da EY é de 2000 a 2015 porque é óbvio que antes de 2000 exatamente a mesma promiscuidade se passou na Caixa Geral de Depósitos, não há dúvidas. Teve momentos melhores, teve momentos piores, talvez este momento tenha sido pior, sobretudo depois de 2005, mas isso não foi um vírus ou um bug do milénio. A Caixa sempre foi este poço sem fundo, serviu como braço forte do poder político para basicamente comprar aliados, para arquitetar uma perigosa rede clientelar que contribui para que Portugal seja campeão da corrupção.

Atualizado em 02/02/2019, 16:08 WET

quarta-feira, janeiro 30, 2019

Uma ciência do medo não é ciência

Trade and Migration @ Copenhagen Consensus

Parte significativa da ciência tornou-se, infelizmente, especulativa, ideológica e corrupta. Há boa e má ciência. A má ciência, uma espécie de máquina, dependente dos impostos que a financiam, que se alimenta da propagação do medo, está a expulsar a boa ciência do mercado. Por cá, e no resto do mundo.

Mas como não há bem que sempre dure, nem mal que nunca acabe, à litania do medo contrapõe-se paulatinamente uma espécie de novo otimismo racional. Vale a pena conhecê-lo.

Duas referências, para começar:


domingo, janeiro 27, 2019

Um novo Tratado de Tordesilhas, ou?

Federica Mogherini, chefe diplomática da União Europeia

Maduro terá que abandonar o poder em breve


A Rússia não tem força para transformar a Venezuela numa espécie de Ucrânia. E a China também não tem interesse em precipitar os acontecimentos nesta direção. O resultado de mais um braço de ferro entre o despotismo asiático e as democracias ocidentais só pode ser um: salvar ambas as faces, do Ocidente e do Oriente, levando o senhor Maduro a passar umas férias nas Caraíbas.

O modo como a crise na Venezuela evoluir (Guterres tem que abrir os olhos!) depois do reconhecimento de Juan Guaido pela maioria dos estados americanos (12 contra 3) e pela União Europeia, deixará ver de forma bem nítida a fratura em curso na famosa globalização. O recuo dos Estados Unidos e dos seus aliados na Síria depois de uma clara vitória da Rússia e do Irão da guerra civil que destruiu boa parte daquele país, será, por assim dizer, compensado com o despedimento de Maduro e a subsequente pressão contra a excessiva presença económica, militar e diplomática da Rússia e da China naquelas paragens. As negociações, que já estarão a decorrer, suponho, sobre a revisão drástica da permeabilidade do continente americano à influência chinesa, russa e indiana, ditarão a duração e os contornos mais ou menos violentos da guerra entre Maduro e Guaido.

O equilíbrio MAD nunca esteve na realidade em causa, mesmo durante a implosão da URSS. O que sim tem estado a mudar é a posição geográfica do centro de gravidade da prosperidade mundial. No século 15, por volta de 1430, a China fechar-se-ia paulatinamente ao mundo, assustada com o eterno perigo do Norte, ou por outro motivo ainda por esclarecer. O seu hoje incensado Almirante Zheng He (1371—1433 ou 1435), depois de sete viagens memoráveis (1403, 1407, 1409, 1413, 1416, 1421, 1429) pelos mares da China, Oceano Índico, até à costa ocidental de África, que poderiam ter aberto o caminho marítimo da China até à Europa, não chegou a conhecer o Infante Dom Henrique (1394—1460), vinte e três anos mais novo, o qual, em 1415, daria início a um ciclo de expedições marítimas que acabariam por nos levar à China, em 1513-1517, e ao Japão, em 1543.

Seiscentos anos depois, a China quer refazer a Rota da Seda, por mar e terra, cruzando toda a Eurásia, mas também os mares da China, o Oceano Índico, África e o Atlântico. A sua ambição é, pois, incomensurável com as pretensões algo tacanhas do que resta do império dos czares russos. Num certo sentido, podemos dizer que Putin é, de momento, o braço armado da China nesta sua acelerada fase expansionista, mas que a imensa terra russa é também uma espécie de espaço vital futuro da China.

Daqui a dificuldade de saber onde estão os meridianos do futuro Tratado de Tordesilhas que irá regular uma nova divisão ao meio do planeta humano. Há que procurá-los, pois a alternativa a uma divisão pacífica das influências pode ser mesmo a extinção da humanidade.

Existe uma teoria diferente sobre a carnificina venezuelana (1), a qual interpreta o 'golpe' contra Nicolás Maduro como uma placagem ao acesso oriental (sobretudo da China) ao petróleo venezuelano. De um ponto de vista geoestratégico, esta interpretação decorre de uma visão que, no essencial, diz isto: os impérios marítimos e coloniais que dominaram o mundo nos últimos seiscentos anos irão ceder ao poder da grande massa continental e humana que é a Eurásia. O objetivo tático para apressar esta mudança tectónica passa, segundo os teóricos desta visão, por separar a Europa ocidental da América, forçando-a a ser apenas a península ocidental cooperante de uma Eurásia centrada nos seus grandes poderes estratégicos: Alemanha, Rússia, Irão, Índia, e China.

Vale a pena, para uma melhor compreensão deste ponto de vista, ler dois artigos recentes (de que incluímos dois extratos) escritos por Pepe Escobar e por Federico Pieraccini.

“The supreme nightmare for the U.S. is in fact a truly Eurasian Beijing-Berlin- Moscow partnership.” 
“The Belt and Road Initiative (BRI) has not even begun; according to the official Beijing timetable, we’re still in the planning phase. Implementation starts next year. The horizon is 2039.” 
[...] 
“The New Silk Roads were launched by Xi Jinping five years ago, in Astana (the Silk Road Economic Belt) and Jakarta (the Maritime Silk Road). It took Washington almost half a decade to come up with a response. And that amounts to an avalanche of sanctions and tariffs. Not good enough. 
Russia for its part was forced to publicly announce a show of mesmerizing weaponry to dissuade the proverbial War Party adventurers probably for good – while heralding Moscow’s role as co-driver of a brand new game. 
Were the European peninsula of Asia to fully integrate before mid-century – via high-speed rail, fiber optics, pipelines – into the heart of massive, sprawling Eurasia, it’s game over. No wonder Exceptionalistan elites are starting to get the feeling of a silk rope drawn ever so softly, squeezing their gentle throats.” 
— in Pepe Escobar, “Back in the (Great) Game: The Revenge of Eurasian Land Powers”, Consortium News, August 2018.



“Even if the US dollar were to remain central for several years, the process of de-dollarization is irreversible.  
Right now Iran plays a vital role in how countries like India, Russia, and China are able to respond asymmetrically to the US. Russia uses military power in Syria, China seeks economic integration in the Silk Road 2.0, and India bypasses the dollar by selling oil in exchange for goods or other currency.  
India, China, and Russia use the Middle East as a stepping stone to advance energy, economic and military integration, pushing out the plans of the neocons in the region, thereby indirectly sending a signal to Israel and Saudi Arabia. On the other hand, conflicts in Syria, Iraq and Afghanistan are occasions for peacemaking, advancing the integration of dozens of countries by incorporating them into a major project that includes Eurasia, the Middle East and North Africa instead of the US and her proxy states.  
Soon there will be a breaking point, not so much militarily (as the nuclear MAD doctrine is still valid) but rather economically. Of course, the spark will come from changing the denomination in which oil is sold, namely the US dollar. This process will still take time, but it is an indispensable condition for Iran becoming a regional hegemon. China is increasingly clashing with Washington; Russia is increasingly influential in OPEC; and India may finally decide to embrace the Eurasian revolution by forming an impenetrable strategic square against Washington, which will shift the balance of global power to the East after more than 500 years of domination by the West.”
—in “Russia, China, India, and Iran: The Magic Quadrant That is Changing the World”
by Federico Pieraccini @ Strategic Culture Foundation, 25.01.2019


Post scriptum

Acabo de ler a comunicação de Georges Soros ao Forum de Davos deste ano. Pela sua clareza relativamente à China, recomendo a sua leitura e deixo aqui um extrato elucidativo.

Remarks delivered at the World Economic Forum 
Davos, Switzerland, January 24, 2019 
“China is not the only authoritarian regime in the world but it is the wealthiest, strongest and technologically most advance. This makes Xi Jinping the most dangerous opponent of open societies. That’s why it’s so important to distinguish Xi Jinping’s policies from the aspirations of the Chinese people. The social credit system, if it became operational, would give Xi total control over the people. Since Xi is the most dangerous enemy of the open society, we must pin our hopes on the Chinese people, and especially on the business community and a political elite willing to uphold the Confucian tradition.” 
—in Georges Soros
NOTAS



  1. Este relatório anual do Observatorio Venezolano de Violencia dá bem a dimensão da crise política, social e humanitária desencadeada pela ditadura de Nicolás Maduro.

Atualizado em 28/1/2018, 13:05 WET

sábado, janeiro 19, 2019

Stalindo!



O fim da suposta superioridade moral da esquerda


Não é um problema de cuecas. É um problema de máscaras que sucessivamente caem: o espancamento de gays na festa do Ávante, a generosidade do ex-BES para com a mesma festa, um gigantesco património imobiliário isento de impostos, e agora isto: o genro do secretário-geral Jerónimo de Sousa obtem adjudicação direta da Câmara Municipal (comunista) de Loures para realizar tarefas para as quais não tem histórico nem parece especialmente preparado. A Câmara diz que recebeu orçamento mais barato. Pois é, todos sabemos como se fazem estes orçamentos!

Dir-se-à que é o mesmo que os sucessivos governos escandalosamente fazem com os escritórios de advogados, etc. Pois, mas este é que é o ponto: não há nenhum problema de ilegalidade, até porque se desenharam as leis para que não haja. Mas há um problema de moralidade, e nisto, o PCP é, afinal, mais um partido político, igual aos outros, ou antes, mais hipócrita que os outros, pois assenta a sua lenga lenga ideológica numa superioridade moral que não possui, e numa epistemologia política que nunca passou de mera propaganda demagógica. Na primeira oportunidade, a máscara cai. Se pudesse, assim como louva os ditadores da Venezuela e da Coreia do Norte, o PCP imporia em Portugal uma ditadura do proletariado. Diz o seu Programa, recauchutado em 2016 por causa da geringonça, que mudou a "expressão", mas mantém o "conceito"!!!

Ler a propósito:

Contrato com genro de Jerónimo. Câmara de Loures repudia “eventual promiscuidade”
Observador, 18/1/2019, 13:16

PCP responde a nova realidade revolucionária
Sítio oficial do PCP, 25 Maio 2016

sexta-feira, janeiro 18, 2019

O embuste ferroviário da Geringonça

Aceder ao mapa interativo da UE


Orgulhosamente sós, mas socialistas!


Em 27 de Maio de 2010, a “Rede Ferroviária Nacional REFER E.P.E.” remeteu ao Tribunal de Contas, para efeitos de fiscalização prévia, um contrato de concessão, celebrado, em 8 de Maio de 2010, entre o Estado Português, enquanto Concedente, e a sociedade “ELOS – Ligações de Alta Velocidade, S.A.”, na qualidade de Concessionária, tendo por objecto a atribuição a esta última da concessão do projecto, construção, financiamento, manutenção e disponibilização de infra-estruturas ferroviárias no troço Poceirão-Caia e ainda do projecto, construção, financiamento, manutenção, disponibilização e exploração da Estação de Évora, o qual entrou em vigor na data da sua assinatura. 
—in Tribunal de Contas, Acórdão N.º 09/2012, 21.mar. - 1ªS/SS (Processo n.º 233/2011)
“Em vez de abordagens de concorrência desenfreadas que são sempre possíveis no mercado liberalizado, mas num mercado Ibérico que tem sempre uma proteção natural (bitola ibérica), precisamente a questão da bitola (a europeia) não nos faz sentido.” 
— Pedro Marques, ministro do planeamento (TSF, 21/10/2018) 

Em 2023, a Espanha vai concluir a sua ligação ferroviária UIC (vulgo, ‘bitola europeia’) a França, por Irún.

Até agora, janeiro de 2019, Portugal nada fez para cumprir o que sucessivamente assinou com a Espanha e com a União Europeia. Existe apenas um projeto desenvolvido pela sociedade ELOS para o novo traçado Poceirão-Caia em bitola europeia. Este projeto e o contrato estão prontos desde 2010, mas em 2012 o Tribunal de Contas recusou-lhe o necessário visto, encontrando-se desde então encalhado nos tribunais e na chamada Operação Marquês, nomeadamente por causa do envolvimento de José Sócrates e do Grupo Lena na embrulhada.

O dinheiro europeu que havia para a designada ligação ferroviária entre Lisboa e Madrid (Poceirão-Caia) perdeu-se. Só no Quadro Financeiro que se inicia em 2020 este processo poderá ser eventualmente retomado. Até lá, o Estado português não tem dinheiro para indemnizar a ELOS sem agravar o periclitante e vigiado défice público, quanto mais para realizar o que diz a propaganda eleitoral de António Costa.

O consórcio ELOS registou naturalmente os direitos do projeto de execução objeto do contrato público realizado. Se o Estado persistir na rejeição do mesmo, terá que lançar novo concurso, com a agravante de os futuros concorrentes saberem à partida que os governos indígenas se comportam como se vivessem numa qualquer república das bananas, onde há tribunais dominados pela política, e onde o direito é tratado como uma boneca de trapos.

O Estado alega que o concurso era ilegal. Mas quem elaborou o concurso foi a estatal REFER, hoje denominada Infraestruturas de Portugal (1). Logo, depois de condenado no tribunal arbitral a pagar 150 milhões de euros à ELOS, há uma probabilidade elevada de o Estado perder o recurso que fez para os tribunais judiciais.

A melhor opção para o interesse público seria pois chegar a acordo com a ELOS, retomando-se o contrato de concessão de 2010, que seria depois apresentado em Bruxelas com a correspondente candidatura aos fundos a disponibilizar pelo Quadro Financeiro que se inicia em 2020.

Qualquer país só terá acesso a fundos europeus se apresentar um projeto de execução. A propaganda, e os Power Point não chegam!

Dado que o troço em causa, entre o Poceirão e Caia, faz parte do Corredor do Atlântico, a comparticipação comunitária para a sua realização seria elevada. Este troço é provavelmente o mais fácil e o menos caro de construir em toda a Europa.

Dois anos e meio bastariam para concluir um projeto com estas características e dimensão.

A opção decidida por este governo aposta, porém, e uma vez mais, no erro, na ignorância crassa e na submissão a interesses de curto prazo (2), os quais irão transformar Portugal numa ilha ferroviária, com consequências destrutivas potenciais enormes e duradouras ao eliminar a necessária redundância do nosso sistema de transportes. Basta ver qual foi a resposta da Autoeuropa às sucessivas greves que o PCP provoca e dirige no porto de Setúbal: levar os carros para o porto de Santander!

Para já, a solução ainda é viável, pois a rede de bitola ibérica continua de pé em Espanha, mas assim que esta for descontinuada junto à fronteira portuguesa, o que certamente acontecerá até 2023, à Autoeuropa só restará uma resposta estratégica à instabilidade sindical e à política errática dos nossos desmiolados e corruptos políticos: transferir a sua fábrica de Palmela para Espanha.

Entretanto, esta foi a solução ferroviária anunciada pelo irresponsável e cobarde ministro Pedro Marques:

— Ligação Évora-Elvas: 80Km, via única, bitola ibérica

Custará 530 milhões de euros, mais 150 milhões de indemnização (+juros) à ELOS, ou seja, qualquer coisa, como 700 milhões de euros.

Esta falsa solução, que apenas se destina a vencer o medo atávico de Madrid, e os interesses de curto prazo dos operadores que entretanto tomaram conta da falida CP Carga, ficará rapidamente à mercê dos portos secos que a Espanha irá plantar em Salamanca e Badajoz.

Os portos de Matosinhos, Aveiro, Figueira da Foz, Lisboa, Setúbal e Sines, deixarão paulatinamente de receber mercadorias destinadas à Europa, ou mesmo a Espanha, assim que o país vizinho acabar com a bitola ibérica na raia, uma decisão já tomada e com datas conhecidas. Idem para as exportações de bens produzidos no nosso país.

Os grandes investimentos ferroviários desmiolados de Pedro Marques e de António Costa, e da nacionalista Geringonça, serão, em suma, um desperdício absoluto que pesará ainda mais na canga da divida pública e da falta de competitividade da nossa economia, tornando Portugal um país ainda mais periférico do que já é.

O novo troço Poceirão-Caia, com 167 Km, custaria 1200 milhões de euros. Chave na mão. Ou seja: 8,75 M€/ Km para uma solução errada, em vez de 7,2 M€/ Km numa solução certa e, além do mais, previamente assumida com Espanha e com a União Europeia!!!

Este post foi escrito em colaboração com Rui Rodrigues. Recomendamos a leitura da apresentação que se segue.

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NOTAS

1. “A de 1 de junho de 2015, na sequência do Decreto-Lei nº 91/2015 de 29 de maio, a Rede Ferroviária Nacional – REFER, E.P.E. (REFER, E.P.E.) incorpora, por fusão, a EP - Estradas de Portugal, S.A. (EP, S.A.) e é transformada em sociedade anónima, passando a denominar-se Infraestruturas de Portugal, S.A. (IP, S.A.).”
<http://www.infraestruturasdeportugal.pt/sobre-nos/historico/refer>
2. Perante a teimosia atávica do Bloco Central, formou-se uma espécie de oligopólio entre a Takargo, da Mota-Engil, associada para este efeito à espanhola Ibercargo, e o gigante MSC, a segunda maior empresa de transporte contentorizado do mundo, sediada na Suíça, e propriedade do bilionário italiano Gianluigi Aponte, que adquiriu a CP Carga S.A., mudando-lhe o nome para MEDWAY. O terminal rodoferroviário de Vila Nova de Famalicão é um remendo sem futuro, mas que assegura ao gigante MSC uma posição forte na grelha de partida da privatização do transporte ferroviário em Portugal, bem como no futuro do transporte contentorizado na Península Ibérica.

Atualização: 19/1/2019, 11:28 WET

A seca do PSD

O queiroziano conselheiro Menezes


PSD partido em três


A saída de Santana Lopes que rombo provocará no PSD, nas Europeias, e depois nas Legislativas? Montenegro, sem sequer se deslocar à arena dos conselheiros Acácio, para já, placou Rio, que até teve que repescar um cadáver de Gaia em seu auxílio para ver a sua moção aprovada, com apenas 25 votos de vantagem em 126!
Há muito que defendo o fim do Bloco Central, à esquerda, mas também à direita. 
A Geringonça acabou com o PS centrista. A cisão de Santana acabou com o PSD centrista. Só Rui Rio e o Parque Jurássico do PSD não entenderam ainda que o mundo mudou.
Carlos Moedas não virá para Lisboa tão cedo. Sobram portanto duas alternativas visíveis a Rui Rio: Luís Montenegro e Miguel Morgado. 

A crise europeia e a recessão mundial não chegarão a tempo de ferir dramaticamente a Geringonça, mas o PS não chegará à maioria absoluta. A Geringonça vai pois continuar por mais uma legislatura. 

O Rio vai entretanto secar. Se for até ao fim deste ano, Montenegro terá hipóteses de lhe suceder. Mas se fio de água se aguentar por mais um ou dois anos (2019-2020), então Morgado terá hipóteses de encabeçar um PSD muito diferente do atual.

Este país já não é para velhos que não souberam dar conta do recado enquanto mandaram.

terça-feira, janeiro 15, 2019

Era uma vez a TAP

Movimentos de passageiros nos aeroportos portugueses em 2017 (1)

Como tem vindo a TAP a perder os aeroportos para as low-cost...


As hélices dos ATR72 foram incapazes de competir com as turbinas dos B737-800 da Ryanair na ponte aérea entre Lisboa e Porto.

Se a TAP ainda detém 52% dos movimentos de passageiros na Portela, é igualmente verdade que esta vantagem relativa tem vindo a decair rapidamente face à concorrência das companhias e da lógica low-cost. Se incluirmos os voos low-cost realizados pela própria TAP, poderá concluir-se que a tendência dominante do transporte aéreo na Europa forçará a TAP a mudar radicalmente as ruinosas prioridades estratégicas estabelecidas por Fernando Pinto e pelo desmiolado Bloco Central que nos tem governado.

Por sua vez, o ataque das low-cost aos arquipélagos pode ser já considerado como a principal causa do boom turístico nos Açores. A TAP recua ano a ano em todos os aeroportos nacionais, e a SATA poderá não resistir a uma ofensiva privada às ligações entre os Açores e o continente americano, via Ryanair, ou IcelandAir. A IcelandAir é uma das potenciais compradoras da SATA, e já assegura a gestão da TACV - Transportes Aéreos de Cabo Verde.

Quanto à Portela, dado que 72% dos movimentos aéreos nos nossos aeroportos têm origem na Europa, a expansão do aeroporto de Lisboa dará necessariamente prioridade às companhias e tráfego low-cost.

Já nem a TAP usa as famosas mangas em parte das suas ligações aéreas — por dificuldades na triagem da bagagem, e por uma questão de preço (as mangas são caras, e as manobras de estacionamento consomem combustível) e rapidez, pois maioria dos passageiros ponto-a-ponto transporta a bagagem na cabine.

Como só 10% dos movimentos nos aeroportos portugueses são intercontinentais, haverá certamente na Portela novas áreas destinadas aos voos europeus ponto-a-ponto.

A ampliação da Portela não vai pois servir o estagnado hub da TAP, que tenderá aliás a sofrer mais com as crises económicas no Brasil, Venezuela e Estados Unidos, do que com a próxima recessão europeia. Algumas das mangas telescópicas construídas durante o consulado ruinoso do gaúcho Pinto deverão, pois, desaparecer. Do que a ANA precisa agora é de espaço para estacionar aeronaves, de explorar todo o espectro horário disponível e, finalmente, de continuar a otimizar a gare e os sistemas de check-in.

A ideia de que a Portela será um aeroporto para a TAP, IAG, Air France e Lufthansa, e o Montijo um apeadeiro para as low-cost parece-me, em suma, de pernas para o ar, pois conduziria a um negócio pouco eficiente. O conceito de eficiência dirá pouco às empresas públicas e a quem delas se serve, mas canta de modo completamente distinto junto das empresas que realmente competem no mercado e são ambiciosas, como a Vinci é.

Para já, portanto, a Portela vai ser transformada num aeroporto low-cost. Se houver crescimento que o exija, o Montijo será uma pista suplementar da Portela.

No entanto, a solução mais provável, apesar do acordo assinado entre o governo e a Vinci, é haver novo chumbo do estudo de impacte ambiental da solução Montijo, atirando o NAL para o fim da concessão: 2062.

Em 2040 será então retomada a decisão de construir o NAL de Rio Frio/ Canha, um aeroporto com 4 pistas, ligado por ferrovia à região de Lisboa e Setúbal, ao Algarve e a Espanha.

O aeroporto da Portela de Sacavém, projetado pelo arquiteto Francisco Keil do Amaral, será finalmente encerrado no dia 19 de outubro de 2062, depois de 120 anos de excelente serviço prestado ao país — dois anos depois da inauguração do Novo Aeroporto de Lisboa.

A venda dos terrenos da Portela contribuirá então para a construção do novo aeroporto.

Só não sei uma coisa: haverá ainda uma companhia portuguesa chamada TAP?

NOTAS

  1. ANAC – Autoridade Nacional da Aviação Civil. BET Boletim Estatístico Trimestral, nº36 - 4º Trimestre de 2017. 
Atualização: 16/1/2019 09:55 WET