segunda-feira, abril 15, 2019

A bolha que empobrece

Vítor Gaspar
Imagem original @EPA (editada)


Enquanto o Fed e os bancos centrais do Japão, UE e UK continuarem a manter as taxas de juro próximas de zero, e a comprar dívida pública e privada (esta, de forma disfarçada), a bolha da dívida global continuará a inchar. Portugal está a ser uma das cobaias nesta experiência. Já todos percebemos, porém, que o perdão das dívidas de uns (governos, especuladores e piratas) traduz-se em austeridade para a maioria, e empobrecimento inexorável das classes médias. A revolta dos coletes amarelos em França é o sinal mais eviente disto mesmo. O silêncio mediático e analítico sobre este fenómeno apenas revela que os intelectuais de hoje não passam duma massa indigente de cabotinos sem ideias e nenhuma coragem. Em Portugal, alguém dirá um dia basta! E quando isso acontecer, preparem-se...

FMI. Esforço de Portugal para pagar dívida e défice será dos maiores até 2021
Em três anos, Portugal precisa de pagar mais de 92 mil milhões de euros em dívida e défice. Esforço ronda os 43% dpo PIB. É o sexto maior num grupo de 26 países ditos avançados. DN

Riscos associados ao refinanciamento de dívidas elevadas não desapareceu, diz Vítor Gaspar.  ECO.

segunda-feira, abril 08, 2019

China, Trade & Power

Mao Zedong - a Longa Marcha ainda não terminou.

Nem capitalismo, nem democracia


Se a China não é um país comunista, então o que é? Não é uma economia capitalista, nem uma democracia. Os americanos classificam-na como um regime revisionista, querendo porventura traduzir com esta expressão a ideia de que a China mistura num mesmo país dois sistemas de produção antagónicos sob um poder despótico protagonizado por um chefe gerado nas entranhas de uma burocracia milenar.

A China imperial esteve praticamente isolada entre as muralhas naturais e artificiais que delimitam o seu vasto território, desde o século 15 até ao fim do século 20. No século 19, a expansão industrial e comercial da Europa e do Japão sujeitariam a China a uma abertura forçada ao exterior, expondo-a a guerras e invasões para as quais não estava, nem poderia estar preparada. Foram tempos difíceis e de humilhação que Beijing certamente não esqueceu. As duas Guerras do Ópio (1839-60) declaradas pelos ingleses, e mais tarde a Segunda Guerra Sino-Japonesa (1937-45), levariam a China para os braços do marxismo-leninismo de inspiração estalinista, e sobretudo para a área de influência económica da então URSS, de cujos hidrocarbonetos dependiam para sair do marasmo medieval em que ainda viviam. Só a descoberta e exploração do petróleo chinês, em Daqing, no ínicio da década de 1960, iria abrir uma janela de oportunidade única a um velho império destruído por mais de um século de guerras, revoluções e fome extrema. Depois da morte de Mao (1976), o visionário Deng Xiaoping encaminhou a China, que se libertava a passos largos da dependência energética dos russos, para o futuro que hoje se conhece. O mundo ocidental de então agradeceu!

Basta olhar para a balança comercial da China desde o início deste século para percebermos que algo mudou drasticamente na sua relação com o resto do mundo. Voltarão os superavits comercial e financeiros da China a ser um problema para o resto do mundo, e em especial para os Estados Unidos e a Europa ocidental? O Departamento de Defesa americano, num relatório de dezembro de 2018, revela poucas dúvidas sobre o potencial da nova ameaça. Trade is power!

China Balance of Trade
source: tradingeconomics.com

Assessment on U.S. Defense Implications of China’s Expanding Global Access
December 2018 
China seeks to be the world leader in artificial intelligence by 2030. [...] 
President Xi and other leaders (...) link the China Dream to two high-profile centenary goals: achieving a “moderately prosperous society” by the 100th anniversary of the CCP in 2021, and building a “prosperous, strong, democratic, civilized, harmonious, and beautiful modernized socialist strong country” by the 100th anniversary of the establishment of the People’s Republic of China (PRC) in 2049. At the 19th Party Congress in October 2017, President Xi also enumerated objectives for the “basic realization of socialist modernization” by 2035, which included China becoming one of the most “innovation-oriented” countries, significant enhancement of the country’s soft power, and continued economic prosperity. [...] 
China wants to shape a world consistent with its authoritarian model—gaining veto authority over other nations’ economic, diplomatic, and security decisions. [...] 
China’s attempts to gain veto authority over other countries’ decisions, and its coercion directed at U.S. allies and partners in particular, will likely threaten U.S. posture and access if not addressed. [...] 
The National Security Strategy states that the United States faces growing political, economic, and military competition with China, and that this is a long-term challenge demanding sustained national attention, prompting a whole-of-government focus on this issue. [...] 
The Department of Defense will continue to assess the military implications of China’s expanding global access and ensure the Department provides combat-credible military forces needed to fight a war and win, should deterrence fail. 
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POST SCRIPTUM

Este artigo foi publicado ontem, 8 de abril, às 00:59. Por coincidência, a expansão global chinesa foi tema de debate entre Miguel Sousa Tavares e Paulo Portas, ao fim do dia, num telejornal da TVI. Portas exibiu os seus pergaminhos de ex-ministro da defesa, de ex-ministro dos negócios estrangeiros e de ex-vice-primeiro ministro, desenhando uma mapa dos investimentos estratégicos da China na Europa. Adiantou que a guerra comercial entre os Estados Unidos e a China não é uma novidade de Trump, pois vem da presidência Obama, e que o mais provável será a China ceder nalgumas das reivindicações dos americanos e dos europeus, nomeadamente na reciprocidade em matéria de investimentos em setores estratégicos: energia, portos, aço, etc., bem como na questão dos direitos humanos e controlo da comunicação social. O modo como a guerra em volta da Huawei, líder das novas redes 5G, evoluir será a pedra de toque do tit-for-tat que o Ocidente tenciona opor à expansão dum país que não aprendeu ainda a lidar com a liberdade individual das pessoas, nem a considerá-las, por isso, cidadãs.

Atualização: 9/4/2019, 11:43 WET

sexta-feira, abril 05, 2019

Um passe de demagogia

Populismo de um governo que anda de Mercedes e BMW

Mas não só...


A lógica da gentrificação, acelerada também por causa da degradação do parque imobiliário dos centros urbanos das principais cidades portuguesas—cortesia da política de rendas condicionadas seguida ao longo de um século—, é esta: os residentes dos referidos centros urbanos, com rendimentos decrescentes, ou já muito degradados, serão expulsos para as periferias urbanas, com ou sem Bloco, com ou sem ajuda do PCP. Ambos os partidos demonstraram, aliás, que também se têm lambusado com este fenómeno especulativo, cientes porventura da sua inxorabilidade.

Os centros urbanos serão progressivamente ocupados por uma nova classe média alta e por novos ricos, de origem nacional e estrangeira, e por um exército de fantamas sem pátria chamados fundos imobiliários.

Mas como são precisos trabalhadores na cidade, sobretudo no vasto setor dos serviços, os novos ocupantes das cidades estruturadas pagarão um adicional ao imposto de renda, com o qual os governos municipais e o governos centrais e regionais financiarão os transportes públicos, podendo até torná-los gratuitos para os novos proletários suburbanos.

Por enquanto, as medidas de António Costa e da Geringonça (PS+PCP+Bloco) soam apenas a demagogia e populismo. Mas existe uma racionalidade cínica na sua origem, a qual configura uma estratégia de mitigação da perigosa e crescentemente tumultuosa erosão das classes média. Chama-se gentrificação.

Na medida em que os residentes empobrecidos, inquilinos e proprietários, já não dispõem de rendimentos suficientes para a reposição do capital imobiliário exaurido, nem muito menos para investir em novos equipamentos, os governos municipais, também eles sob ameaça de falência, são forçados a escolher a nova eugenia pós-industrial, i.e. a substituir o capital morto ou moribundo por capital vivo, rentabilizando cada átomo e cada bit da cibercidade.

É assim que todo o espaço urbano entrou numa cornucópia de valorização especulativa.

A tal ponto que, em breve, para se circular, estacionar, trabalhar, dormir, fazer compras ou disfrutar dos bens culturais de uma cidade, a mesma será segmentada de forma dinâmica e infinitesinmal, sendo o valor de cada uma das suas novas enteléquias medido por parquímetros físicos e virtuais. Estes contadores debitarão os novos acessos à cidade, incluindo os tempos produtivos, as deslocações e os tempos de espera, nas nossas carteiras eletrónicas. Sem a validação destas carteiras seremos, aliás, impedidos de entrar nas cidades.

A segmentação dos escritórios em plantas livres ou cubículos de co-working é a mais recente e melhor demonstração desta hiper-valorização dos centros urbanos e seus equipamentos, bem como da rápida sub-urbanização extensiva das novas mega-cidades. Não haverá mais espaço na cidade, mas apenas espaço-tempo em regime de high frequency trading!

O passe social será, pois, no futuro, uma espécie de cintura sanitária que autoriza e vigia os novos proletários nas suas idas e vindas aos locais de trabalho nas novas metrópoles pós-contemporâneas, por períodos rigorosamente vigiados por parquímetros que penalizam cada tempo de espera, de devaneio, ou de mera curiosidade cultural desinteressada. O tempo de permanência nas novas e deslumbrantes catedrais urbanas terá um custo crescente, instantaneamente debitado no nosso número único de identificação fiscal, social, cultural e criminal.

O passe gratuito não passa, pois, de uma ilusão, mas de uma ilusão necessária à paz social de um género de democracia em fase terminal.

A endogamia

Common fruit fly females prefer to mate with their own brothers over unrelated males.
Wikipedia.

... e a degradação da espécie partidária


A endogamia partidária é o acasalamento de indivíduos geneticamente próximos e do mesmo partido político. Resulta num aumento da zigosidade, que pode aumentar as hipóteses dos descendentes serem afetados por genes recessivos ou problemas de má-formação ética. Isto geralmente conduz a uma depressão endogâmica partidária, a qual conduz invariavelmente à degradação genética, cognitiva, e moral da Política.

Uma definição menos metafórica diria que a endogamia partidária é uma forma de eugenia social, através da qual se procede a uma paulatina seleção dos "bem nascidos" (a "família socialista", "social democrata", "centrista", "comunista", etc.) para fortalecimento geral de um determinado grupo social, ou de mero poder, hierarquizado, cuja sobrevivência e fortalecimento dependem, em grande medida, desta espécie de continuidade genética partidária. Noutro plano (o do colapso seletivo da classe média americana), mas que concorre para este mesmo argumento, vale a pena ler Coming Apart, The State of White America, 1960-2010, de Charles Murray. Aqui se descreve como a eugenia económica e cognitiva tem vindo a estilhaçar seletivamente a sociedade americana nas últimas décadas, à medida que as classes médias e o "sonho americano", nascidos do petróleo barato e abundante, da expoliação colonial, da revolução industrial, e da expansão económica que se seguiu à Segunda Guerra Mundial, entraram em declínio, dando lugar a um novo e poderoso fenómeno de segregação económica, social, política e cultural.


 

Marcelo diz que “vale a pena rever a lei” quanto a nomeações de familiares
Observador, 4/4/2019, 21:17

O problema não está, no entanto, nos casos particulares, mas no padrão genético da coisa.

É aqui que a endogamia tem tecido o regime que se seguiu ao colapso da ditadura, clonando em modo 'democrático' o corporativismo salazarista, ressuscitando o jornalismo situacionista (lamentáveis as prestações dos comentaristas da RTP/SIC e os alinhamento noticiários da RTP/SIC) e retomando uma forma de rotativismo partidário na forma do chamado Bloco Central. Não deixa de ser uma ironia vermos o PCP e o Bloco juntarem-se ao arco do poder no branqueamento do PS e do que acaba por rebentar como o grande escândalo político que explica como foi possível os bancos e os oligopólios indígenas terem rebentado com o país, deixando o povo encalacrado até, pelo menos, 2040.

Era tão simples evitar tudo isto com uma lei simples sobre conflito de interesses!


Atualização: 6/4/2019 12:30 WET

quarta-feira, abril 03, 2019

O que é a democracia?


Resposta rápida


Se alguém assassinasse Trump, a Rainha de Inglaterra, ou António Costa, os três países a que estes políticos pertencem continuariam as suas vidas sem sobressaltos de maior depois dos funerais e dos declarados dias de luto nacionais. Se alguém assassinasse Putin, Xi Jinping, ou Nicolas Maduro, os regimes dos países que estes senhores comandam entrariam inexoravelmente em colapso. É esta a diferença entre democracia e ditadura. Podemos interpretar esta ideia como um corolário da teoria urbanística de Gonçalo M. Tavares sobre a velocidade das ditaduras e a lentidão das democracias.

A 11 mil metros de altitude, entre Bruxelas e Lisboa. 30-03-2019

terça-feira, abril 02, 2019

Atrair milionários ou vender a independência a patacos?

Clique para ampliar

Irá a Espanha ficar com 100% das barragens portuguesas?

“O regulador espanhol que supervisiona a energia e outros setores quer fazer passar uma proposta que vai impor metas às energéticas através de rácios, limitando desta forma a remuneração a entregar aos investidores e o nível de dívida destas empresas.”
Negócios, 5/2/2019

“A energética vai reforçar o investimento em renováveis e redes nos países onde está presente, e Portugal não será exceção. Quanto à compra de novos ativos, como as barragens da EDP, garante que “considera sempre todas as opções”.”
Jornal de Negócios, 1/4/2019

A dívida da EDP é gigantesca (como há muito vimos alertando): mais de 16 mil milhões de euros! Daí a alienação de ativos. Só que entregar a concessão das barragens da EDP a Espanha é uma daquelas linhas vermelhas que só políticos e governos traidores atravessam, sem cuidar das consequências. Se o governo português não bloquear esta pretensão dos senhores Mexia e Manso, 100% das principais barragens portuguesas estarão nas mãos dos espanhóis (Iberdrola). Onde é que as nossas corrompidas elites têm a cabeça? Nos bolsos, suponho!


Centrais hidroelétricas portuguesas em operação: 73

EDP: 63 centrais hidroelétricas; 35 parques eólicos

Iberdrola: 0 centrais hidroelétricas; complexo hidroelétrico do Alto Tâmega (3 barragens em construção: 2023); 3 parques eólicos.


Atualizado: 2/4/2019, 17:01 WET

Porque vem Aga Khan para Portugal?


Mais do que o número de fiéis locais, são as condições legais e fiscais que trouxeram a sede mundial do Imamat Ismaili para Lisboa


Esta milionária incarnação entre o Céu e a Terra, oriunda de uma antiga seita minoritária que cindiu do islamismo xiita no longínquo século VII da nossa era, vem para Portugal com imunidade diplomática para si, família e colaboradores próximos, gozando ainda de total isenção de impostos diretos. Os deuses estão acima das autoridades tributárias deste mundo, já sabemos, mas os semi-deuses, como Aga Khan, cobram um dízimo e meio aos rendimentos mensais do seus estimados 15 milhões de fiéis.

O Economist tem uma opinião sobre esta emigração de luxo: Portugal é uma democracia fraquinha. Mas o nosso magnífico presidente embelezou a coisa, e as televisões e jornais locais não vêm, não ouvem, e não leem.

A segurança da operação por parte deste milionário ismaelita assenta na convicção de que em Portugal existem dois partidos: o PSD e o PS. O primeiro, sob a batuta de Rui Machete, iniciou as negociações com Aga Khan, o governo PS concluiu-as, e Marcelo oferece um banquete no Palácio de Belém. A Geringonça não passa, como se vê, de um episódio de conveniência do rotativismo do Bloco Central.

Aga Khan tem andado ultimamente a saltitar de democracia em democracia (Suíça, Reino Unido, Canadá, França), mas como a repressão à fraude e evasão fiscal tem apertado nestas mesmas democracias, Portugal pôs-se a jeito.

Why did Aga Khan move to Portugal? 
French paper “Regards” mentioned that Aga Khan is “head of a financial empire that controls worldwide companies with various activities: banking, telephony, hospitality, air transport and energy” and that Aga Khan is known to “celebrity gazettes for his passion for horse racing and expensive divorces” and therefore the tax exemption to such a rich person was unjustified.
[...]
Sarkozy’s fall came sooner than Aga Khan would have predicted, but Aga Khan had already found a safe haven in Portugal where the tax treatment he would receive would be predictable and the ruling authority would treat him consistently whether or not the government would be with the Socialist Party or with the Social Democratic Party. When Aga Khan’s news of his move to Portugal broke out, Portugal’s Foreign Minister Rui Machete of the Social Democratic Party mentioned that this move had materialized after six years of negotiations. 
[...]
Aga Khan purchased the Mendonça Palace, located right in the center of Lisbon for 12 million euros and has promised to invest 10 million euros in the Portuguese economy. 
The move to Portugal is more than anything, a smart business move. While at his French headquarters, Aga Khan did receive a lot of favors from Sarkozy, the deal with Portugal was much sweeter and importantly, not at the risk of reversal by either of the ruling parties. 
The agreement gives Aga Khan the status of a diplomat and gives Aga Khan the freedom to transfer all of his global assets to Portugal (and from Portugal to the outside world) without any restrictions. Under Article 12 “Funds, foreign currency and assets”, it mentions that Aga Khan “may hold funds, securities, gold and other precious metals, or foreign currencies.” It also mentions that Aga Khan “shall be free to receive any such values from within or from outside Portugal and hold and transfer the same within Portugal or from Portugal to any country and to convert any currency held or bought into any other currency.” 
Tax exemptions are obviously there exempting Aga Khan from any kind of national and local tax, including transfer or capital gain tax, income tax, wealth tax and stamp duty. Moreover, all gifts and donations given to Aga Khan will be tax deductible. Aga Khan will also not pay any duties on the purchase, ownership, registration, use or sale of land, air or sea vehicles, including spare parts and consumables. Any value-added tax which the Aga Khan would pay, would be fully refundable to Aga Khan. 
Under the agreement, Aga Khan would also enjoy ceremonial diplomatic treatment which is given to foreign high entities. He would also be immune from any judicial action and legal proceedings. He also negotiated similar treatment for his family members and senior officials working for him. 
The above diplomatic status and tax exemptions would have been impossible to achieve in an open democracy like Canada and would have only been possible in a country like Portugal – which is described as a ‘flawed democracy’ by the Economic Intelligence Unit of the Economist Group.

—in Akbar Khoja, “Why did Aga Khan move to Portugal?”, Inside Ismailism, August 8, 2018

Atualizado em 2/4/2019, 10:44 WET

segunda-feira, março 11, 2019

Refogar um país em lume brando

Clara Ferreira Alves. Fotografia de António Pedro Ferreira (original: a cores)

Um manifesto imprevisto


Bastaria para fundar uma nova força política vencedora e reformadora, se não estivéssemos todos mortos...

CLARA FERREIRA ALVES:

O que quero saber é simples e não cabe aqui. Quero saber porque é que o partido socialista está a destruir sem reformar, de forma errática, odiosamente injusta para com os destituídos, a melhor invenção da democracia, o Sistema Nacional de Saúde. 
Quero saber porque é que a Segurança Social, a tal reformada com sucesso, demora um ano a entregar as pensões ou obriga os reformados a apurar os cálculos finais, onde quase sempre faltam anos e descontos. 
Quero saber porque é que a velhice em Portugal é a mais desoladora da Europa e porque é que se tornou um negócio rentável a sobrepor à tragédia demográfica. 
Quero saber porque é que apesar de anos de reformas administrativas, a burocracia continua um mistério dependente da boa vontade de funcionários e não da agilidade do sistema. 
Quero saber porque é que todos os dias há uma greve impulsionada pelos mesmos partidos que sustentam o Governo no Parlamento. 
Quero saber porque é que a ambição é vista como um defeito e os melhores de nós continuam a emigrar para outros mundos tal como no tempo das caravelas. 
Quero saber porque é que a regionalização é um desígnio nacional quando nem as ruas da capital a descentralização consegue limpar. 
Quero saber porque é que os sistemas judicial e judiciário continuam a albergar o racismo, a homofobia e a violência contra as mulheres como se fossem atos da natureza. 
Quero saber porque é que o futebol e os clubes continuam a ter um regime benéfico de isenções e a manifestar-se acima das leis. 
Quero saber porque é que a proteção do ambiente e dos ecossistemas são luxos para privilegiados. 
Quero saber porque é que os feriados e as pontes continuam a ser a expressão máxima da felicidade coletiva e constituem privilégios intocáveis. 
Quero saber porque é que as famílias e os apelidos continuam a regular a mobilidade social exceto quando substituídos pelo nepotismo das famílias partidárias. 
Quero saber porque é que a normalidade, uma vida normal, continua a ser a medida da retribuição e porque é que a originalidade é punida, exceto se integrada. 
Quero saber porque é que tanto o proletariado como a burguesia nunca se constituíram como consciência, preferindo a anestesia do hipermercado e da televisão. 
Quero saber quem são os arquitetos da nossa venda progressiva a países e estados inimigos da democracia e da transparência. 
Quero saber porque é que os professores estão em guerra há anos e ninguém se lembrou de reformar um sistema calcificado que se recusa a evoluir. 
Quero saber porque é que as universidades portuguesas subsistem na indigência financeira e doutrinária. 
Quero saber porque é que o único tema são os funcionários públicos. Quero saber porque é que o nosso sistema fiscal é sacrificial sem reciprocidade. 
Quero saber porque é que reduzimos a austeridade e a escassez a uma qualidade intrínseca da cidadania.

sábado, março 09, 2019

Uma borboleta chamada BE

Marisa Matias e Miguel Portas, um par que mudou o Bloco

Tenho a impressão que vou votar no Bloco. E não será só por gostar de mulheres


A abstenção dá-me azia. E votar em branco faz de mim um rato de sacristia. O Bloco ainda está a tempo de se tornar um partido de poder, certamente de esquerda, de causas tipicamente pós-modernas, mas também com realismo e sentido das proporções. A limpeza da casa ideológica está no bom caminho, mas fazem falta mais umas boas sessões psicanalíticas e teóricas de desconstrução marxista. A prioridade é estabilizar o PS naquilo que sempre foi e é, travando o oportunismo populista de António Costa, que pode causar estragos irreparáveis ao regime, mas também a emergência dum PS de esquerda, em vez de social-democrata, liderado por Pedro Nuno Santos. Um PS cavalgado pelo homem que faz (creio) a ligação do Bloco à Geringonça poderá realizar o sonho alquímico de Francisco Louçã, mas dará cabo do BE. Por sua vez, o centro-direita explodiu e continua à procura da sua identidade perdida. Vão precisar de mais uma ou duas legislaturas para se reencontrarem, tal como previ ao ver nascer a Geringonça. Isto, se a Aliança tiver algum sucesso!

Preferia ter uma democracia sem partidos, participativa, cognitiva, tecnologicamente avançada, culturalmente sofisticada. Mas enquanto lá não chegamos, o meu voto é oscilante, ou puramente tático. Não tenho partido desde 1976...

Não ignoro os perigos do oportunismo e do populismo que infelizmente contaminam todos os partidos. A recessão demográfica acompanhada do envelhecimento populacional é o principal problema português. Daqui decorrem todas as outras dificuldades, alguma delas insanáveis. O endividamento público insustentável, longe de ser apenas o efeito de más políticas governamentais e partidárias, é o resultado direto do custo desproporcional do estado social relativamente aos impostos exigidos ao trabalho e ao investimento produtivo. A fadiga fiscal resultante diminui inevitavelmente as poupanças pública e privada, atrasa os investimentos, reduz os rendimentos e a produtividade do trabalho, induz maior atrito laboral, social e cultural na sociedade, e tende, por fim, a transformar o aparelho do estado numa almofada corporativa, que todos os partidos e uma boa parte da sociedade disputam, mas que é muito prejudicial à saúde democrática do regime.

O olho da direita deixa-me ver uma realidade onde se percebe claramente que o empobrecimento associado ao crescimento das burocracias partidárias e corporativas assim como à crescente indigência social, tende a fazer resvalar democracias frágeis como a nossa para a emergência de regimes populistas e autoritários de esquerda. Por outro lado, o olho da esquerda mostra-me como, quem tem algo de seu, se for encostado às cordas da expropriação fiscal, acabará por exigir e conseguir o regresso de uma ditadura da propriedade. Estes são, porém, olhares estrábicos. E o estrabismo, como sabemos, tende a ignorar o que um dos dois olhos vê. A visão maniqueísta é, assim, uma visão estrábica.

A quadradura do círculo é esta: precisamos de um estado social financiado por quem trabalha, por quem investe e pelos rendimentos do capital. Mas o paradigma demográfico de que já fazemos parte impõe-nos, sob pena de matarmos, de uma maneira ou doutra, o próprio estado social e a democracia, uma racionalização e otimização sem precedentes do aparelho de estado, do perímetro da solidariedade intergeracional, e de cada euro fiscal gasto. Esta revolução exige revolucionários. Esta revolução exige uma mudança radical nos padrões éticos da nossa democracia. Os thesaurus das ideologias dominantes, à esquerda e à direita, estão demasiado exauridos para que das suas linguagens consigamos extrair novos discursos políticos que façam sentido e sirvam para orientar a ação coletiva. Precisamos de novas palavras e gestos para gerir as nossas vidas.

Uma parte crescente dos eleitores deixou de votar porque não se revê nas ofertas eleitorais disponíveis, em nenhum dos partidos do regime eleitos e por eleger. Lembro-me sempre, a este propósito, da anedota bocageana do homem que andava nu pelas ruas com uma peça de fazenda ao ombro... à espera da última moda! Andar nu ao frio não é solução. Há que votar onde a nossa a carteira pede, ou onde o nosso coração manda. Alternativa a isto é votar com os pés, emigrando. Infelizmente, é o que centenas de milhar de portugueses voltaram a fazer.

Votar no Bloco é um voto útil contra a maioria absoluta de António Costa. E isso me basta, por enquanto.

Post scriptum

Quase 24 horas depois de ter publicado este post encontrei esta pérola no Expresso, oriunda do Diário de Notícias:

Francisco Louçã: “O Bloco pode vir a ser o segundo maior partido”
Expresso, 09.03.2019 às 12h34 
Francisco Louçã acredita que o Bloco de Esquerda (BE) pode ultrapassar os sociais-democratas nas eleições. “O PSD é o segundo partido. Mas o Bloco de Esquerda pode vir a ser o segundo partido, é claro que pode”, garante numa entrevista ao “Diário de Notícias”. 
O histórico dirigente, que não faz parte de qualquer organismo do partido, defende que “o BE deve ambicionar que a alternância não seja sempre entre PS e PSD e portanto que passe a haver um polo à esquerda que seja um referencial.” E vai mais longe: “Se o PSD disputa 20% não há nenhuma razão para que o Bloco de Esquerda não queira, um dia, ultrapassar esse nível.”

Louçã até tem razão quando defende que “o BE deve ambicionar que a alternância não seja sempre entre PS e PSD e portanto que passe a haver um polo à esquerda que seja um referencial.” E vai mais longe: “Se o PSD disputa 20% não há nenhuma razão para que o Bloco de Esquerda não queira, um dia, ultrapassar esse nível.” Se o PSD se partir aos bocadinhos, como parece ser seu destino sob a batuta serôdia de Rui Rio, o chamado centro direita entrará numa década de agonia, uma vez mais à procura do Francisco Sá Carneiro que, como todos sabemos, morreu a 4 de dezembro de 1980. Num país de indigentes profissionais, e de classe, como o nosso, nunca houve uma direita que não fosse, ela também, estatista e subsidio-dependente, logo com algum tecido adiposo de esquerda e muita vontade de ‘trabalhar’ para o estado. Ora assim sendo este nosso pequeno Portugal, é bem provável que uma parte do eleitorado laranja emigre para o PS, na esperança que este se modere, e que o Bloco continue a crescer nos prados mais verdejantes do PCP e do PS.

Atualização 10/3/2019 19:17 WET

E se eu tivesse dois sexos?

Hermafrodito adormecido. Museu do Louvre.
Cópia romana restaurada de um original helénico do século II AC.

O problema da identidade de género


A integração cultural da alteridade sexual é um fenómeno recente nas democracias modernas. Não ocorre em regimes não democráticos, e mesmo nestes é uma novidade. Basta pensar na primeira pessoa: e se eu tivesse nascido hermafrodita, qual teria sido a minha vida? As morfologias sexuais dominantes, e os comportamentos sexuais dominantes impuseram-se ao longo da evolução das espécies seguindo provavelmente o paradigma seletivo proposto por Darwin, mas assim como todo o organismo animal, ou melhor todo o organismo vivo complexo, resulta não apenas de processos de seleção, mas também de processos contínuos de colaboração (Margulis, L.), também no plano cultural das sociedades humanas, quanto mais livres e evoluídas estas são, maior é a sua propensão para a integração cooperante das diferenças no enriquecimento integral da espécie. Como em todas as dialéticas sociais, há excessos de ambas as partes. Só a discussão aberta em pleno espaço público, sem polícias, poderá abrir as nossas mentes e corpos ao desconhecido, ampliando o diapasão da realidade.

sexta-feira, março 08, 2019

Estados Unidos já exportam mais petróleo que a Arábia Saudita

Ciclar para ampliar. Origem da img.


Al Gore, que esteve recentemente no Porto a dar mais um dos seus shows sobre as alterações climáticas e a necessidade de substituir as energias fósseis por energias verdes, começou bem, há uns anos, mas duvido cada vez mais da sua forma de proselitismo nos tempos que correm. No preciso momento em que os Estados Unidos ultrapassaram a Arábia Saudita na exportação de petróleo e seus derivados, e países como a China e a Índia, já para não falar de África, precisam de energia barata para poderem desenvolver as suas infraestruturas de saneamento, distribuição de água potável, produção agrícola intensiva, criação de cidades sustentáveis, mobilidade, etc., o discurso de Al Gore parece-me cada vez mais maniqueísta, e nada construtivo. A situação é muito complexa, e por isso, necessita de abordagens abrangentes, sofisticadas, e bem informadas. Não da repetição 'ad nauseam' de caríssimos shows para inglês ver.

O consumo de petróleo nos Estados Unidos estabilizou, mas a sua produção, não!

De facto, o aperfeiçoamento das tecnologias de extração de crude das rochas betuminosas levou o até agora maior consumidor de energia do planeta a transformar-se também num exportador, sobretudo de gasolina e outros derivados do crude. Esta é uma situação que vai ter consequências tectónicas na geopolítica mundial, nomeadamente na América Latina, na Índia e na China, e sobretudo em África.

Esta notícia desenvolvida pelos noruegueses da RYSTAD vai seguramente obrigar a uma revisão das nossas convicções e previsões sobre os efeitos potencialmente catastróficos do chamado peak oil (o fim do petróleo barato). Sabendo-se que a taxa de crescimento demográfico mundial estabilizou por volta de 1964-65, e que a população total do planeta, além de estar a envelhecer, começará a decair a partir de 2055 (segundo o Deutsche Bank), ou de 2100 (segundo as Nações Unidas), é hoje possível imaginar um cenário energético global mais eficiente e mais limpo, mas onde as chamadas energias limpas continuem a ser minoritárias relativamente às energias fósseis.

Eu diria, portanto, que teremos que estar cada vez mais atentos ao lóbi verde, das indústrias às ONGs, todas generosamente financiadas pelos nossos impostos. É que a sobrevivência de grupos de interesses ameaçados pela realidade tende a fabricar más notícias à medida que os consensos se desfazem.

NORTH AMERICA BECOMES SELF-SUFFICIENT IN OIL
RYSTAD ENERGY, March 7, 2019

In a pivotal geopolitical shift, the United States will soon export more oil and liquids than Saudi Arabia. This remarkable turnaround is made possible by the continued rise in oil production from US shale plays and the increased oil export capacity from the Gulf Coast. 
The US has for decades relied on large-scale imports to satisfy its thirst for oil, but this is about to change. The Energy Information Administration (EIA) reported last week that the United States exported more crude and petroleum products than it imported. Granted, the EIA followed up with a report this week that US crude oil stocks had risen by 7.1 million barrels in a week, driven by a renewed appetite among US refineries for imported heavy crude oil. However, for the rest of the year, US exports will grow fast with increasingly attractive price spreads, while US demand for imported heavy oil should again diminish. 
“The oil market is overly preoccupied with short-term US crude stocks, but the big picture tells a new story. Increasingly profitable shale production and a robust global appetite for light oil and gasoline is poised to bring the US to a position of oil dominance in the next few years,” said Rystad Energy senior partner Per Magnus Nysveen. 
He added: 
“The political and economic impact of this shift in global trade has already been dramatic, and will be even more pivotal within the next five years. The US trade deficit will evaporate and its foreign debt will be paid quickly thanks to the swift rise of American oil and gas net exports. The tanker shipping industry will see the boom of the millennium, as the excess fossil fuels from America will find plenty of eager buyers in fast-growing Asia.

quinta-feira, março 07, 2019

Costa mau e Costa péssimo

António Costa - O Programa da Cristina - captura de écrã (editada)

António Costa é um verdadeiro ás, a fugir


Mariana Mortágua tem razão: “O que está em causa é o negócio de venda do Novo Banco. O Governo não pode chutar para o Banco de Portugal e para o anterior Governo as responsabilidades”, diz, lembrando que o Bloco sempre avisou que esta venda iria dar problemas, porque o privado iria usar a garantia.

A resolução do BES foi decidida em Bruxelas, não em Lisboa. O BES não recorreu ao BCE, quando podia, pela razão simples de que não quis ou não pôde (...) mostrar os livros daquele polvo medonho, condição para qualquer operação de reforço de capitais autorizada por Bruxelas. Por outro lado, Portugal, atado ao programa de estabilização financeira da Troika, não tinha poder para decidir resgatar o BES com dinheiros públicos, o tal empréstimo que Ricardo Salgado foi pedir a Passos Coelhos e ao Aníbal. Ou seja, ao contrário do exemplo que Ricardo Salgado evocou na sua última entrevista radiofónica, desde que Portugal entrou em pré-bancarrota, o Banco de Portugal, subordinado ao Banco Central Europeu, deixou de ter plena autonomia para tomar certas decisões, tal como o nosso governo perdeu desde o Memorando de Entendimento de 2011, e não recuperou até hoje, autonomia suficiente para tomar certas decisões de natureza financeira. Em suma, o Banco de Portugal não é o Banco de Inglaterra, e António Costa, e antes dele Pedro Passos Coelho e José Sócrates não são a Rainha de Inglaterra. Por algum motivo pouco estudado surgiu o Brexit!

No entanto, uma vez realizada a experiência da resolução do BES, de que a DG COMP e o BCE foram decisivos e co-responsáveis protagonistas, as trapalhadas que vieram depois (venda do Novo Banco à Lone Star, etc.) já não são, de facto, da conta da toda poderosa direção geral da concorrência europeia, a DG COMP, mas sobretudo do governo que liderou o negócio com o famigerado abutre financeiro. 

António Costa, que sabe muito bem que pautas lhe foram transmitidas pelos banqueiros portugueses no almoço do Ritz de 16 de novembro de 2015, não pode tentar tapar o Sol com a peneira. Afirmou hoje, textualmente, o seguinte:

“Eu creio que desde a data da resolução em 2014 todos temos o dever de não estar surpreendidos com o que venha a acontecer com o Novo Banco: ficou claro qual era o estado da instituição financeira e tudo aquilo que aconteceu desde então tem permitido perceber que quando se fez a separação entre o chamado banco mau e o chamado banco bom, verdadeiramente o que ficámos foi com um banco mau e um banco péssimo”, apontou, referindo-se à operação realizada ainda na vigência do anterior Governo PSD/CDS-PP.” 
“Nós temos de ir à raiz do problema, a auditoria que foi ordenada pelo Governo será em tudo idêntica à da Caixa Geral de Depósitos e sobre a fase anterior à resolução”

Esta manobra só pode ter uma intenção: matar à nascença o apuramento da verdade sobre as responsabilidades de António Costa no buraco negro em que a venda do Novo Banco se transformou, sugerindo que uma parte das mesmas poderão estar, como de facto estão, em Bruxelas. Mas falta, ainda assim, retirar as necessárias conclusões sobre o que fazer ao 'banco péssimo'. E este é um dossier que pertence exclusivamente ao primeiro ministro da geringonça.

Convém, enfim, recordar o que o primeiro ministro disse sobre a venda do Novo Banco.

 

quarta-feira, fevereiro 20, 2019

PCP quer destruir a ADSE

Marta Temido, uma espécie de submarino nuclear do PCP à deriva no Governo

Se não é verdade, parece


ADSE não cede e diferendo com privados mantém-se 

Ainda não será desta que a “guerra” entre os prestadores privados de saúde e a ADSE ficará resolvida. A reunião marcada para esta tarde, entre o Conselho Geral e de Supervisão (CGS) do subsistema de saúde dos funcionários públicos e a ministra da Saúde, servirá para dar conta das preocupações a Marta Temido. O presidente do CGS, João Proença, referiu ao DN/Dinheiro Vivo que o objetivo é avançar para as negociações reafirmando a necessidade de “um urgente diálogo”. 
João Proença sublinha que “o governo é a nossa tutela, não é parte desinteressada, não é árbitro, não é moderador. É parte interessada”. O antigo líder da UGT espera, de resto, que o governo “defenda os interesses da ADSE, lembrando contudo que “as posições do Conselho Geral e de Supervisão não são necessariamente as da ADSE” e que o que “importa é negociar”, reforça o presidente do CGS. 
DN

A ADSE está transformada em mais uma arma de luta dissimulada do PCP. Pelo que não é de excluir ser a guerra que eclodiu com os hospitais privados tão só o resultado de uma manobra de provocação do PCP, e mais uma das suas táticas eleitorais.

As posturas atávicas do Presidente da República e do PM, mais a atuação desastrosa da que mais parece ser uma ministra sombra do PCP na Saúde, deu no que estamos todos a assistir. João Proença dá a cara para esconder o que os comunistas não querem que se saiba: que é o Comité Central do PCP quem, afinal, mexe os cordelinhos da ADSE, usurpando os interesses e direitos pagos pelos respetivos beneficiário. 

Que tal um referendo para saber se os associados da ADSE querem, ou não, o fim da ADSE? O PCP quer!

Se não, vejamos: os beneficiários da ADSE são cerca de um milhão e duzentos mil—já agora, convinha a ADSE informar o país qual é, afinal, o número exato dos seus associados. No entanto, apenas 8315 associados elegeram os seus atuais representantes no Conselho Geral e de Supervisão da ADSE, I.P.. Esta lista é composta por quatro pessoas, três do PCP e um híbrido do PS (João Proença).

Aqui vai a lista, para percebermos melhor o que na realidade poderá estar na base da tentativa de um governo de esquerda, apoiado por comunistas, trotskystas e maoistas, de destuirem a ADSE e reduzirem, pelo caminho, o Serviço Nacional de Saúde a escombros de uma qualquer Venezuela em chamas:

Francisco José dos Santos Braz (Membro do Comité Central do PCP)
António José Coelho Nabarrete (FENPROF/ SGPL)
João António Gomes Proença (Ex-SG da UGT)
Manuel Bernardino Cruz Ramos (PCP)
Mandatária da lista: Ana Joaquina Gomes Avoila (PCP/ Sindicato dos Trabalhadores da Função Pública)

A imprensa do regime continua a tapar o Sol com a peneira do ruído mediático que mais convém a quem os mantém na unidade de cuidados intensivos.

POST SCRIPTUM

A posição responsável e conciliadora da presidente da ADSE não bate certo com o que o advogado comunista Eugénio Rosa [Vogal do Conselho Diretivo da ADSE (eleito pelos representantes dos beneficiários)] e o socialista João Proença [Presidente do Conselho Geral e de Supervisão da ADSE] dizem pela boca fora, certamente ecoando os respetivos diretórios partidários, mas não o pensamento, nem a voz, nem sobretudo os interesses vitais de quem financia a ADSE com as suas quotas salariais mensais (3,5% dos vencimentos). Está na altura de se estabelecerem regras claras de transparência em mais uma instituição financeiramente independente (não é alimentada pelo Orçamento de Estado), mas capturada pelos partidos políticos.

ADSE recusa abdicar de 38 milhões de euros  
Vogal Eugénio Rosa contraria presidente Sofia Portela e garante que não voltam atrás no pedido de reembolso exigido a privados.  
Ler mais e ver video em Correio da Manhã, 20/2/2019 01:30.

Última atualização: 20/2/2019, 17:31 WET

quinta-feira, fevereiro 07, 2019

Pedro Marques e as Berlengas

G2 approaching from Shanghai Hongqiao on the first day of 350km/h operation on Beijing-Shanghai HSR.
Photo: N509FZ

A história da bitola explicada às criancinhas

“Ferrovia 2020 tem uma taxa de execução de 40%”, diz Pedro Marques 
SAPO, Ana Sofia Franco, 06/02/2019, 13:18 
“A nova ligação ferroviária a construir entre Évora e Elvas pretende reforçar a conexão ferroviária dos portos e das zonas industriais e urbanas do sul de Portugal a Espanha e ao resto da Europa.”
Esta é uma daquelas afirmações mecanicamente reproduzida por todos os jornais, seguramente fazendo copy-paste dum despacho da Lusa que, por sua vez, foi buscar a frase ao sítio da Infraestruturas de Portugal, sem sentido, nem verdade, mas que retrata bem o pântano de propaganda em que estamos mergulhados.

A Espanha vai ter todas as suas linhas ferroviárias transfronteiriças, quer em direção a França, quer em direção a Portugal, mudadas para bitola europeia (UIC), até 2023. Sendo assim, nenhum comboio oriundo de Portugal poderá em breve cruzar a fronteira, pois o anunciado plano ferroviário do ministro Pedro Marques continua a prever apenas linhas férreas de bitola ibérica. Sabendo deste atavismo ferroviário dos sucessivos governos lusitanos, os espanhois começaram a construir portos secos em Badajoz e Salamanca. Ou seja, os comboios portugueses levam as mercadorias até à fronteira e depois haverá que fazer o respetivo transbordo para a rede ferroviária espanhola de bitola europeia.

Os estados falidos não têm, por definição, capital. Logo, devem evitar negócios cada vez mais competitivos e assentes em capital intensivo, financeiro e humano. É por isso que a CP Carga foi entregue aos italianos da MSC, que a CP irá ser privatizada mais cedo do que tarde, e que a TAP acabará por colapsar, e o governo de turno será, então, obrigado a terminar o processo de privatização que ficou a meio.

Temos um país sem capitalistas, sem bancos, e com um Estado sem capital. Logo, não é assim tão difícil saber o que fazer... E no entanto, António Costa e o seu caricato ministro das infraestruturas, curiosamente semi-demissionário e a caminho de Bruxelas (dizem), insistem em despejar centenas de milhões de euros em soluções ferroviárias sem futuro. Fazem-no, quero crer, porque ninguém até hoje lhes desmontou a doutrina Cravinho sobre o território, e também porque simplesmente desconhecem o que é uma bitola ferroviária, e para que serve!

Vamos, enfim, esclarecer este mistério que tanto confunde governantes, políticos e jornalistas.

O mérito vai inteirinho para o Professor do Técnico, Jorge Faria Paulino, uma das vozes mais autorizadas em matéria de mobilidade e transportes que, como eu, participa num dos mais animados grupos de discussão da blogosfera sobre ferrovia, aeroportos e transporte aéreo, barragens e energia.

Pedro Marques leva mercadorias, de Sines até Badajoz...

Aqui vai...
Um pequeno esclarecimento relativamente à bitola... 
1. Em meados do século 19, quando o transporte ferroviário se implantou nos países do Mundo, as duas superpotências eram a França e o Reino Unido. E eram elas que controlavam o Globo, em termos tecnológicos, militares, comerciais e económicos.

2. A França utilizava a bitola [distância entre carris] internacional, também chamada "bitola francesa" (1,435 a 1,50 m). O Reino Unido usava duas bitolas: uma bitola larga (1,667 a 1,70 m ), para zonas planas e de grande circulação; e uma bitola estreita (0,90 a 1,0 m), para percursos sinuosos, pouco utilizados ou de montanha. 
A França estava na Europa Continental. Quem se queria ligar a ela e permutar produtos com a sua poderosa economia, tinha de ter a bitola francesa. Por isso a leste da França (Bélgica, Holanda, Alemanha, Itália, etc) todos os países usaram a bitola francesa (aliás, politicamente, quem mandava nesses países ainda era o que restava das monarquias implantadas por Napoleão e sua família ao redividir a Europa). 
Os britânicos implantaram a bitola inglesa larga e estreita no seu país (então, Reino Unido e na Irlanda) e no seu império (Áfricas, India e outras Ásias, América do Sul e central). A bitola larga era muito mais cara do que a bitola estreita, pelo que, nos territórios que constituiam o Império Britânico, se passou a privilegiar sempre a bitola estreita ou métrica (que ainda hoje lá está...). 
Por questões de marketing e de estratégia militar, o Reino Unido procurou assustar a Espanha e a Rússia, que tinham sofrido na pele com as invasões napoleónicos, afirmando que para melhor defesa dos seus territórios, deveria haver uma descontinuidade na via férrea. Assim não seriam tão rapidamente invadidos (as tropas napoleonicas andavam em marcha a pé; com o caminho de ferro passaram a circular de comboio e assim aconteceu até à 2ª Guerra Mundial). E foi assim que a Espanha e a Rússia passaram a ter bitola larga e a bitola estreita, britânicas.

3. Mais tarde, os ingleses acharam que era uma tolice ter 2 bitolas, porque assim tinham necessidade de ter vias algaliadas em muitos locais e percursos. E acabaram com a bitola larga e a bitola estreita e passaram tudo para a bitola francesa (que assim se passou a chamar de bitola internacional). E na Inglaterra e zonas limitrofes onde a Revolução Industrial fizera do Reino Unido a maior superpotência, eles mudaram a bitola em questão de poucos anos.

4. Em Portugal, os técnicos superiores (leiam-se engenheiros) tinham formação teórica na França (École Nationale de Ponts et Chaussées, onde tudo era republicano e defensor da Revolução Francesa). Por isso, em Portugal, a primeira linha que se fez na zona de Lisboa também tinha bitola francesa (ou internacional). 
Como os espanhóis tinham enveredado pela bitola larga e a bitola estreita britânicas, Portugal teve de seguir a mesma metodologia, para não ficar uma ilha ferroviária que não se poderia ligar à Europa. 
Agora os espanhóis estão a mudar progressivamente as suas grandes linhas para bitola internacional e Portugal estará de novo em risco de se tornar numa ilha ferroviária. Em suma, pensava-se melhor em meados do século 19 em Portugal do que agora... 
Jorge Paulino Pereira

quarta-feira, fevereiro 06, 2019

César e Francisco

El papa Francisco, durante la rueda de prensa en el avión de regreso a Roma.
ALESSANDRA TARANTINO (AP)/ cropped

O meu reino não é deste mundo


El cinismo del papa Francisco 
La neutralidad del Vaticano en la crisis venezolana sirve de apoyo a Maduro
RUBÉN AMÓN
El País, 5 FEB 2019 - 15:30 CET 
No es Irán la única teocracia contemporánea que abjura del presidente Guaidó. Se resiste a reconocerlo el Vaticano, tanto por la idiosincrasia bolivariana del papa Francisco como porque su actual secretario de Estado, Pietro Parolin, fue el artífice de la reconciliación —de la comunión— entre el chavismo y la Santa Sede en los tiempos idólatras del mariscal Hugo. 
Es la razón por la que Nicolás Maduro ha pedido la mediación moral y política del sumo pontífice. Pretende involucrarlo como árbitro de una conferencia de países “neutrales” —México, Uruguay— convocada en Montevideo este jueves como salida al aislamiento del tirano venezolano.

Interessante, esta análise! É um facto que as ditaduras nunca assustaram o Vaticano. Basta lembrar a Itália de Mussolini, a Espanha de Franco, o Portugal de Salazar, e o Chile de Pinochet. Porque haveria então o Papa Francisco, que encanta o hedonista Marcelo, de se preocupar com o chavismo e o seu desastrado herdeiro, Nicolás Maduro? A Deus o que é de Deus, a César o que é de César. Foi este negócio com as autocracias que garantiu a esta, como a outras igrejas, a longevidade do atavismo religioso. Secundariamente, esta posição 'simpática' para com o ditador Maduro, até permitirá ao Vaticano fazer a mediação que o resto dos europeus já não é capaz.

Russos e chineses acharam que poderiam avançar pelo Atlântico e pelas Américas dentro. Não podem. Mas lá que os Estados Unidos e os caniches europeus lhes deram pretexto, nomeadamente na forma hipócrita, interesseira e estúpida como lidaram com o colapso da União Sovética, e mais recentemente com a Ucrânia, ou ainda com a soberania sobre o mar do Sul da China, deram...

Agora vai ser preciso reequilibrar os dispositivos de forças, quer a leste de Berlim, quer no quintal latino-americano dos gringos. Voltamos sempre ao mesmo: a paz futura depende da realização dum Novo Tratado de Tordesilhas. Dum lado deve ficar a Euro-América, do outro a China. No meio, precisamos dum continente independente, próspero e neutral: a África.

Dito isto, a posição diplomática assumida pelo governo português é absolutamente correta. Não se defendem os interesses de Portugal, nem dos portugueses emigrados na Venezuela, apoiando um ditador alimentado com sinodólares e euros de Moscovo.

Vamos provavelmente assistir a um prolongado braço de ferro, sobretudo porque dependerá de concessões a fazer ao longo da antiga cortina de ferro, na Síria e... no Irão. Já agora, um Irão nuclear será um player decisivo no Médio Oriente, podendo mesmo afastar o espectro de Putin na região. Daí que seja tempo de os americanos e europeus darem corda aos snickers!


REFERÊNCIAS
El Papa sobre Venezuela: “Temo un derramamiento de sangre” 
DANIEL VERDÚ
El País, A bordo del avión del Papa 28 ENE 2019 - 14:23 CET 
La posición del Vaticano en el conflicto de Venezuela ha sido siempre ambigua y discreta. Su frustrado papel como mediador lo requirió en su momento. Pero ahora, en pleno ultimátum de un nutrido bloque de países a Nicolás Maduro para que convoque elecciones, millones de venezolanos y los propios mandatarios implicados —con Juan Guaidó a la cabeza de la oposición— se preguntan cuál es la opinión del Papa y la postura que adoptará la Santa Sede, con enorme influencia en la comunidad católica del país, en un conflicto que camina peligrosamente hacia la violencia. El Papa, tras varios días de silencio, pidió en el Ángelus del domingo en Panamá “una solución justa y pacífica”. Pero, ¿qué quiere decir eso? 
Los hombres de Pinochet en el Vaticano 
JUAN JOSÉ TAMAYO
El País, 2 MAR 1999 
Desde su toma de poder en Chile, tras el golpe de Estado contra el presidente Salvador Allende, el general Pinochet buscó denodadamente el apoyo del Vaticano a su dictadura militar alegando como credenciales su fe católica y su cruzada contra el marxismo, llevada a cabo en plena sintonía con Juan Pablo II, antimarxista como él. Mientras el arzobispo de Santiago de Chile, cardenal Silva Enríquez, denunciaba los atentados de Pinochet contra los derechos humanos -incluido el derecho a la vida- a través de la Vicaría de Solidaridad, el Vaticano legitimaba las actuaciones del dictador, sobre todo a través de la nunciatura.Tras los resultados adversos del plebiscito de octubre de 1988, que le obligaron a abandonar el poder, Pinochet redobló sus esfuerzos por asegurarse el aval del Vaticano, confiando en que saliera en su defensa en caso de que fuera procesado. Y la larga sombra del general se extendió hasta la curia romana, donde hoy ocupan puestos de responsabilidad de primera línea personalidades eclesiásticas afines a él.


domingo, fevereiro 03, 2019

Deem uma cana de pescar a África!

Origem

O atual modelo de ajuda humanitária a África é uma forma de colonialismo


A Europa está a envelhecer, os Estados Unidos estão a envelhecer, a China está a envelhecer, o Japão e a Rússia estão a envelhecer rapidamente. Por sua vez, a população dos Estados Unidos crescerá menos de 80 milhões até chegar aos 400 milhões de almas irrequietas em 2050. África, pelo contrário, viu a sua população passar de 140 milhões em 1900, para mil milhões em 2010. Mas já em 2050 poderão chegar aos 2,5 mil milhões de pessoas, mais do que um em cada três seres humanos do planeta!

Assim, enquanto os Estados Unidos viram multiplicar-se por quatro o número dos seus residentes entre 1900 e 2018, em África e no mesmo período a população multiplicou-se por nove!

Duas conclusões parecem óbvias: não houve nenhum genocídio visando a raça africana, e os conhecidos genocídios regionais e locais tiveram origens sobretudo de ordem geoestratégica mascaradas com conflitos religiosos e étnicos. A outra conclusão, que deverá ajudar-nos a ver com outros olhos a segunda maior massa continental da Terra, é esta: o modelo da ajuda humanitária a África é um modelo esgotado e cada vez mais oportunista, cujo prosseguimento só poderá dificultar a emancipação e o desenvolvimento genuíno deste continente e das suas gentes.

Quanto mais tarde percebermos isto, maiores serão os efeitos negativos sobre a Europa da continuação da espoliação africana em curso.

Os projetos que americanos, europeus e asiáticos continuam a desenvolver em África são sucedâneos do colonialismo. No essencial, aportam latas de feijão e de sardinha em troca de petróleo, ouro, gás natural, diamantes, metais raros, etc., corrompendo para este efeito as elites locais, e deixando as populações sem ferramentas, nem conhecimentos imprescindíveis a um crescimento endógeno, livre e saudável. A África precisa de saneamento básico, de cidades saudáveis, de hospitais, escolas e universidades, de redes de mobilidade física e eletrónica avançadas, de planeamento familiar, e sobretudo de estados constitucionais democráticos, onde a liberdade e a responsabilidade cidadãs ganhem plena expressão nos mecanismos de decisão e representação democráticas, nas liberdades individuais e coletivas, e na prevalência das leis sobre os poderes discricionários.

Chegou, creio, o momento de oferecer a África as estratégias e os conhecimentos que melhor e mais rapidamente permitirão transformar a sua explosiva demografia em formas avançadas e atuais de desenvolvimento económico, social, e cultural. O cinismo chinês não é senão mais uma forma de expropriação destrutiva do território e da paisagem humana. O brutalismo imperial dos Estados Unidos é moralmente inaceitável. A Europa, pela sua longa história de proximidade ativa e contato com África, está em condições para promover um quadro de cooperação inteiramente diverso do modelo assistencialista, que ou mascara interesses ocultos, ou meramente satisfaz as burocracias que vivem da especulação mediática com a miséria alheia.

Deixemos de assustar os europeus com as crises de migração e de refugiados oriundas de África, e pensemos nas melhores formas de saldar a nossa própria dívida para com os povos africanos.

REFERÊNCIAS

There’s a strong chance a third of all people on earth will be African by 2100 
By Gilles Pison 
Quartz, October 11, 2017 

The population of Africa is increasing rapidly. From an estimated 140 million in 1900, it had grown to a billion by 2010. According to United Nations “medium scenario” projections, this figure will rise to 2.5 billion in 2050 and more than 4 billion in 2100. Today, one out of six people on Earth live in Africa. These same projections predict that the proportion will be one in four in 2050 and more than one in three by 2100.

World Population Growth 
Our World Data, by Max Roser and Esteban Ortiz-Ospina 

200 years ago there were less than one billion humans living on earth. Today, according to UN calculations there are over 7 billion of us.1 Recent estimates suggest that today's population size is roughly equivalent to 6.9% of the total number of people ever born.2 This is the most conspicuous fact about world population growth: for thousands of years, the population grew only slowly but in recent centuries, it has jumped dramatically. Between 1900 and 2000, the increase in world population was three times greater than during the entire previous history of humanity—an increase from 1.5 to 6.1 billion in just 100 years.

sexta-feira, fevereiro 01, 2019

Para que serve o défice zero?

Este triunvirato do Bloco Central conta agora com os votos do PCP e do Bloco

Orçamento fictício do Estado financia bancos falidos


Caixa, BCP e BPI venderam os anéis, perdão, os palácios da Baixa. Daí os lucros. Só em 2018 a Caixa alienou 300 milhões de euros em património e crédito mal parado. Quanto ao resto, a realidade é simplesmente esta: os portugueses estão a pagar em austeridade cor-de-rosa e vermelha, nomeadamente através de cativações excessivas da despesa orçamental, o financiamento do Fundo de Resolução, ao qual os bancos, por sua vez, vão buscar a massa para manterem as portas abertas e fabricarem resultados virtuais.

O truque é este: Centeno força o défice zero nas contas públicas, para com a massa assim poupada ir mantendo o Fundo de Resolução com dinheiro (emprestado, claro!) para alimentar os burros financeiros a Pão de Ló e ostras. Doutra maneira, o BCE e Bruxelas não deixavam...

Caixa teve lucro próximo dos 500 milhões de euros em 2018 
O Jornal Económico, 01 Fevereiro 2019, 08:37 
A Caixa Geral de Depósitos (CGD) registou, em 2018, um resultado líquido próximo dos 500 milhões de euros, o que representa uma subida de 860% face aos 51,9 milhões de euros contabilizados no ano anterior, sabe o Jornal Económico. O banco do Estado divulga esta sexta-feira os seus resultados de 2018.

PS: Como escrevi no post anterior, o grande buraco da Caixa tem uma cor dominante: a cor da rosa. Tal não significa, porém, que o PSD e o CDS não estejam no mesmo barco do grande desfalque democrático: BPN, BES, BANIF, Montepio, Caixa. Estão, e tudo teve origem no fartar vilanagem do Bloco Central da Corrupção.

Do que consigo vislumbrar, o buraco negro do La Seda —uma das causas principais do colapso na Caixa— foi resultado, ou de um risco empresarial, ou de uma fuga em frente, ou de um embuste por parte da família Matos Gil face ao descalabro que começara a afundar, desde 2006-07, o grupo têxtil de Barcelona fundado em 1925.

A família Matos Gil era representada no La Seda por Fernando Freire de Sousa (marido de Elisa Ferreira), e tinha relações com este grupo catalão, pelo menos desde 2003, através da Selenis, uma fábrica de PET sediada em Portalegre, propriedade da Imogil. O La Seda comprou, em 2003, uma parte da Selenis, por 35 milhões de euros.

Através de Manuel Pinho (Governo e BES), a gula do inner circle de Sócrates, assessorado pelos então testas de ferro na Caixa, Carlos Santos Ferreira e Armando Vara, fez o resto.

Carlos Costa não teve, parece-me, qualquer papel no descalabro da Caixa, nem em Espanha, nem em Portugal.

Se bem que Fernando Freire de Sousa se tivesse afastado do La Seda em 2008. Por algum motivo o fez..., pois doutro modo não se percebe porque abandonou a família Matos Gil no preciso momento em que José Sócrates colocava a primeira pedra da grande fábrica de PET em Sines (2008), conseguida precisamente pelos manos Manuel e João Paulo Matos Gil. O antigo representante da Imogil no La Seda deve, pois, explicações sobre o envolvimento da banca pública e de José Sócrates na construção da fábrica de PET em Sines. Por sua vez, a ida de Elisa Ferreira para o Banco de Portugal, e do seu marido, Fernando Freire de Sousa para a direção do CCDR-N, pouco tempo depois do atual governo entrar em funções, com este histórico, não podem deixar de suscitar alguma perplexidade.

quinta-feira, janeiro 31, 2019

A caixa negra de um resgate

Caixa Geral de Depósitos (CGD) (3779646223)

Propaganda não é prosperidade, nem paga dívidas


Resgate a Portugal foi o terceiro maior de sempre na história do FMI 
O Jornal Económico. Mariana Bandeira, 03 Janeiro 2019, 14:09 
O resgate financeiro do Fundo Monetário Internacional (FMI) a Portugal foi o terceiro maior da história da instituição liderada por Christine Lagarde. O ranking das maiores injeções de capital do fundo é encabeçado pela Argentina e pela Grécia.

A venda de ouro português foi uma prática sistemática desde o fim da ditadura. Foi, aliás, esta venda que financiou, em primeiro lugar, os novos direitos sociais do Portugal democrático.

Tal delapidação só parou em 2010, quando o Banco Central Europeu proibiu o governo português de mexer nas 382,5 toneladas que ainda restam das 801,5 toneladas existentes em 1974 (Wikipédia).

Estas reservas são, pois, uma espécie de colateral dos 51,7 mil milhões de euros emprestados pelo BCE e pela UE, para evitar a bancarrota do país cor-de-rosa que temos.

Continuamos, ao fim de três anos de propaganda governamental e partidária responsável por uma divisão social e cultural crescente entre os portugueses, no top dos devedores mundiais:
  • quase 250 mil milhões de euros de dívida pública bruta (a líquida andará pelos 225 mM€) 
  • mais de 700 mil milhões de euros de dívida total. 
Existem mais ou menos dez milhões de contas bancárias em Portugal. Mas total do dinheiro depositado nos bancos não vai além dos 140 mil milhões de euros, ou seja, pouco mais de metade da dívida do Estado e das suas sinecuras.

Por outro lado, menos de 200 mil portugueses têm depósitos superiores a 100 mil euros.

É por estas e por outras que a recente decisão, do PS, PCP e Bloco, de forçar os bancos a comunicar ao fisco as contas com mais de 50 mil euros, se parece com a preparação para uma nova crise financeira indígena. Quando? Quando batermos outra vez à porta do FMI e do BCE, porventura na iminência de uma nova bancarrota nacional. O governo pretende, pois, saber em que bancos e contas estarão os montantes de depósitos e obrigações potencialmente sujeitos a perdas por efeito de um bail-in (resgate interno) em caso de nova crise bancária acompanhada de falência de bancos. A preocupação anunciada com fugas ao fisco não passa de uma cortina de fumo.

A crescente agitação sindical é um sinal claro de que a reversão da austeridade não aconteceu, e que o governo, aflito, se prepara para novas emergências. E você, já se preparou?

O grande buraco da Caixa tem uma cor dominante: a cor da rosa. Parece assim evidente que Geringonça rosa-e-vermelha tudo fará para esterilizar o novo inquérito e os possíveis processos judiciais que entretanto surjam à superficie. Basta investigar Joe Berardo e o que levou Elisa Ferreira (e Francisco Louçã...) para o Banco de Portugal, para que mais este esclarecedor artigo de Helena Garrido abra uma nova e mais negra Caixa de Pandora.
Se os deputados quiserem, haverá culpados na CGD 
Helena Garrido. Observador, 31/1/2019, 7:44 

Com a informação disponível neste momento já é possível concluir que o período que gerou mais perdas para a CGD foi o que vai de 2005 a 2007, quando Carlos Santos Ferreira era presidente do banco e Armando Vara e Francisco Bandeira faziam parte da sua equipa. No relatório e contas de 2016 conclui-se que 39,5% das perdas apuradas nesse ano (imparidades) vieram de financiamentos concedidos entre 2005 e 2007. 
É nesse período que se inicia o processo da Artlant com a espanhola La Seda; é nesses anos que se financia Vale do Lobo; é nesses anos que se concedem empréstimos que envolvem indirectamente a CGD na guerra pelo controlo do BCP e é nesse tempo que se dá crédito para controlar a Cimpor. Quando Carlos Santos Ferreira passa para o BCP, a administração seguinte da CGD, liderada por Fernando Faria de Oliveira e que vai até 2010, gera igualmente perdas significativas (23,6% dos 5,6 mil milhões de euros de perdas apuradas em 2016), mas já estamos perante erros por omissão, por não decidir acabar com alguns projectos.
Joana Amaral Dias: “A Caixa é um poço sem fundo” 
Jornal i, 01/02/2019 12:09 
Injetámos mais ou menos 20 mil milhões de euros na banca nos últimos dez anos; destes, seis mil milhões de euros foram para a Caixa. Recordo que, em 2012, a Caixa não fez parte do escrutínio da troika e logo nesse ano foram injetados pelo governo de Pedro Passos Coelho 1,5 mil milhões de euros sem qualquer auditoria. Agora não há imparidades no banco? Vão justificar esses 6 mil milhões como? E esta auditoria da EY é de 2000 a 2015 porque é óbvio que antes de 2000 exatamente a mesma promiscuidade se passou na Caixa Geral de Depósitos, não há dúvidas. Teve momentos melhores, teve momentos piores, talvez este momento tenha sido pior, sobretudo depois de 2005, mas isso não foi um vírus ou um bug do milénio. A Caixa sempre foi este poço sem fundo, serviu como braço forte do poder político para basicamente comprar aliados, para arquitetar uma perigosa rede clientelar que contribui para que Portugal seja campeão da corrupção.

Atualizado em 02/02/2019, 16:08 WET

quarta-feira, janeiro 30, 2019

Uma ciência do medo não é ciência

Trade and Migration @ Copenhagen Consensus

Parte significativa da ciência tornou-se, infelizmente, especulativa, ideológica e corrupta. Há boa e má ciência. A má ciência, uma espécie de máquina, dependente dos impostos que a financiam, que se alimenta da propagação do medo, está a expulsar a boa ciência do mercado. Por cá, e no resto do mundo.

Mas como não há bem que sempre dure, nem mal que nunca acabe, à litania do medo contrapõe-se paulatinamente uma espécie de novo otimismo racional. Vale a pena conhecê-lo.

Duas referências, para começar:


domingo, janeiro 27, 2019

Um novo Tratado de Tordesilhas, ou?

Federica Mogherini, chefe diplomática da União Europeia

Maduro terá que abandonar o poder em breve


A Rússia não tem força para transformar a Venezuela numa espécie de Ucrânia. E a China também não tem interesse em precipitar os acontecimentos nesta direção. O resultado de mais um braço de ferro entre o despotismo asiático e as democracias ocidentais só pode ser um: salvar ambas as faces, do Ocidente e do Oriente, levando o senhor Maduro a passar umas férias nas Caraíbas.

O modo como a crise na Venezuela evoluir (Guterres tem que abrir os olhos!) depois do reconhecimento de Juan Guaido pela maioria dos estados americanos (12 contra 3) e pela União Europeia, deixará ver de forma bem nítida a fratura em curso na famosa globalização. O recuo dos Estados Unidos e dos seus aliados na Síria depois de uma clara vitória da Rússia e do Irão da guerra civil que destruiu boa parte daquele país, será, por assim dizer, compensado com o despedimento de Maduro e a subsequente pressão contra a excessiva presença económica, militar e diplomática da Rússia e da China naquelas paragens. As negociações, que já estarão a decorrer, suponho, sobre a revisão drástica da permeabilidade do continente americano à influência chinesa, russa e indiana, ditarão a duração e os contornos mais ou menos violentos da guerra entre Maduro e Guaido.

O equilíbrio MAD nunca esteve na realidade em causa, mesmo durante a implosão da URSS. O que sim tem estado a mudar é a posição geográfica do centro de gravidade da prosperidade mundial. No século 15, por volta de 1430, a China fechar-se-ia paulatinamente ao mundo, assustada com o eterno perigo do Norte, ou por outro motivo ainda por esclarecer. O seu hoje incensado Almirante Zheng He (1371—1433 ou 1435), depois de sete viagens memoráveis (1403, 1407, 1409, 1413, 1416, 1421, 1429) pelos mares da China, Oceano Índico, até à costa ocidental de África, que poderiam ter aberto o caminho marítimo da China até à Europa, não chegou a conhecer o Infante Dom Henrique (1394—1460), vinte e três anos mais novo, o qual, em 1415, daria início a um ciclo de expedições marítimas que acabariam por nos levar à China, em 1513-1517, e ao Japão, em 1543.

Seiscentos anos depois, a China quer refazer a Rota da Seda, por mar e terra, cruzando toda a Eurásia, mas também os mares da China, o Oceano Índico, África e o Atlântico. A sua ambição é, pois, incomensurável com as pretensões algo tacanhas do que resta do império dos czares russos. Num certo sentido, podemos dizer que Putin é, de momento, o braço armado da China nesta sua acelerada fase expansionista, mas que a imensa terra russa é também uma espécie de espaço vital futuro da China.

Daqui a dificuldade de saber onde estão os meridianos do futuro Tratado de Tordesilhas que irá regular uma nova divisão ao meio do planeta humano. Há que procurá-los, pois a alternativa a uma divisão pacífica das influências pode ser mesmo a extinção da humanidade.

Existe uma teoria diferente sobre a carnificina venezuelana (1), a qual interpreta o 'golpe' contra Nicolás Maduro como uma placagem ao acesso oriental (sobretudo da China) ao petróleo venezuelano. De um ponto de vista geoestratégico, esta interpretação decorre de uma visão que, no essencial, diz isto: os impérios marítimos e coloniais que dominaram o mundo nos últimos seiscentos anos irão ceder ao poder da grande massa continental e humana que é a Eurásia. O objetivo tático para apressar esta mudança tectónica passa, segundo os teóricos desta visão, por separar a Europa ocidental da América, forçando-a a ser apenas a península ocidental cooperante de uma Eurásia centrada nos seus grandes poderes estratégicos: Alemanha, Rússia, Irão, Índia, e China.

Vale a pena, para uma melhor compreensão deste ponto de vista, ler dois artigos recentes (de que incluímos dois extratos) escritos por Pepe Escobar e por Federico Pieraccini.

“The supreme nightmare for the U.S. is in fact a truly Eurasian Beijing-Berlin- Moscow partnership.” 
“The Belt and Road Initiative (BRI) has not even begun; according to the official Beijing timetable, we’re still in the planning phase. Implementation starts next year. The horizon is 2039.” 
[...] 
“The New Silk Roads were launched by Xi Jinping five years ago, in Astana (the Silk Road Economic Belt) and Jakarta (the Maritime Silk Road). It took Washington almost half a decade to come up with a response. And that amounts to an avalanche of sanctions and tariffs. Not good enough. 
Russia for its part was forced to publicly announce a show of mesmerizing weaponry to dissuade the proverbial War Party adventurers probably for good – while heralding Moscow’s role as co-driver of a brand new game. 
Were the European peninsula of Asia to fully integrate before mid-century – via high-speed rail, fiber optics, pipelines – into the heart of massive, sprawling Eurasia, it’s game over. No wonder Exceptionalistan elites are starting to get the feeling of a silk rope drawn ever so softly, squeezing their gentle throats.” 
— in Pepe Escobar, “Back in the (Great) Game: The Revenge of Eurasian Land Powers”, Consortium News, August 2018.



“Even if the US dollar were to remain central for several years, the process of de-dollarization is irreversible.  
Right now Iran plays a vital role in how countries like India, Russia, and China are able to respond asymmetrically to the US. Russia uses military power in Syria, China seeks economic integration in the Silk Road 2.0, and India bypasses the dollar by selling oil in exchange for goods or other currency.  
India, China, and Russia use the Middle East as a stepping stone to advance energy, economic and military integration, pushing out the plans of the neocons in the region, thereby indirectly sending a signal to Israel and Saudi Arabia. On the other hand, conflicts in Syria, Iraq and Afghanistan are occasions for peacemaking, advancing the integration of dozens of countries by incorporating them into a major project that includes Eurasia, the Middle East and North Africa instead of the US and her proxy states.  
Soon there will be a breaking point, not so much militarily (as the nuclear MAD doctrine is still valid) but rather economically. Of course, the spark will come from changing the denomination in which oil is sold, namely the US dollar. This process will still take time, but it is an indispensable condition for Iran becoming a regional hegemon. China is increasingly clashing with Washington; Russia is increasingly influential in OPEC; and India may finally decide to embrace the Eurasian revolution by forming an impenetrable strategic square against Washington, which will shift the balance of global power to the East after more than 500 years of domination by the West.”
—in “Russia, China, India, and Iran: The Magic Quadrant That is Changing the World”
by Federico Pieraccini @ Strategic Culture Foundation, 25.01.2019


Post scriptum

Acabo de ler a comunicação de Georges Soros ao Forum de Davos deste ano. Pela sua clareza relativamente à China, recomendo a sua leitura e deixo aqui um extrato elucidativo.

Remarks delivered at the World Economic Forum 
Davos, Switzerland, January 24, 2019 
“China is not the only authoritarian regime in the world but it is the wealthiest, strongest and technologically most advance. This makes Xi Jinping the most dangerous opponent of open societies. That’s why it’s so important to distinguish Xi Jinping’s policies from the aspirations of the Chinese people. The social credit system, if it became operational, would give Xi total control over the people. Since Xi is the most dangerous enemy of the open society, we must pin our hopes on the Chinese people, and especially on the business community and a political elite willing to uphold the Confucian tradition.” 
—in Georges Soros
NOTAS



  1. Este relatório anual do Observatorio Venezolano de Violencia dá bem a dimensão da crise política, social e humanitária desencadeada pela ditadura de Nicolás Maduro.

Atualizado em 28/1/2018, 13:05 WET