terça-feira, dezembro 16, 2025

A arma da dívida

 

Este mapa da dívida do Visual Capitalist esconde a real dívida pública chinesa

ECO — IGCP quer financiar-se em 24 mil milhões através de obrigações


Parece muito, mas estava mais ou menos programado pelo IGCP desde que, pela última vez, batemos com a cabeça no MURO DA DÍVIDA PÚBLICA, em 2011, e fomos resgatados pela Troika (BCE, FMI, UE).

Já agora, não somos os únicos encalacrados. A nossa dívida pública é de 93,6% do PIB. 

A economia assente no endividamento histórico das nações tem acontecido, em ciclo geralmente longos, em todo o mundo, desde que há transações comerciais baseadas no dinheiro, isto é, na confiança, pois as moedas não são mais do que símbolos de confiança. E quando esta falha, e a moeda começa a ser falsificada (começando por retirar os metais mais valiosos das ligas que as compõem, etc.), há uma deterioração dos termos de troca e um endividamento crescente. Este endividamento tornou-se, aliás, uma artimanha do crescimento em muitos países, de que os mais recentes e notórios são os da China, Japão e Estados Unidos. Ao pé destes, o caso português é praticamente irrelevante, e está hoje razoavelmente sob controlo, ao contrário dos casos pequinês, de Singapura,dos Estados Unidos, ou de Singapura, por exemplo.

Há, porém, que distinguir o endividamento público resultante do empobrecimento puro e duro dos países, por exemplo, resultante de guerras e invasões (Líbano, Sudão, Eritreia, Ucrânia e Rússia, por exemolo), ou do peso crescente das despesas sociais públicas (Itália, Grécia, Bélgica, Canadá, Portugal, etc.), daquele que resulta do uso do endividamento como uma forma de alavancagem do investimento (China, Japão e Estados Unidos, entre outros).

Dívida Pública % do PIB *

R P China 200-300% **

Sudão 272%

Japão 237%

Singapura 173%

Líbano 164%

Venezuela 164%

Eritreia 164%

Grécia 154%

Itália 135%

Estados Unidos 124%

Cuba 119%

França 113%

Canadá 111%

Cabo Verde 109%

Butão 108%

Bélgica 104%

São Tomé e Príncipe 103%

Espanha 102%

...

Portugal 93,6%


* https://pt.tradingeconomics.com/country-list/government-debt-to-gdp

** Esta % inclui as dívidas não incorporada na Dívida Pública relatada das empresas públicas e dos veículos de endividamento dos governos locais.


segunda-feira, dezembro 08, 2025

O mundo depois da guerra na Ucrânia


Uma leitura do National Security Strategy 2025

Este documento do governo americano, em estilo jornalístico direto, cuja leitura recomendo, condensa uma alteração profunda na diplomacia americana, que configura basicamente o novo posicionamento dos Estados Unidos perante a emergência do que reconhecem ser um mundo multipolar (Estados Unidos, Europa*, China), onde, porém, tencionam continuar a ser militarmente dominantes, deixando embora de ser vendedores de bíblias e democracia.

Objetivos principais consagrados neste documento, por vezes contraditório, enviesado ou vago:

— manter as vias de comunicação, nomeadamente marítimas, aéreas e eletrónicas, abertas e protegidas tanto dos piratas convencionais, como de terroristas e estados com pretensões de dominação global ou regional;

— impedir que os excessos de capacidade produtiva e comercial da China e da Europa continuem a esvaziar a América de fábricas, trabalhadores, conhecimento e tecnologia, agravando ainda mais o astronómico défice da sua balança comercial, usando para tal tarifas alfandegárias como arma destinada a restabelecer o equilíbrio orçamental e uma agressividade mercantilista renovada;

— consolidar as suas alianças estratégicas e parcerias no mundo, aumentá-las, até, nomeadamente na América do Sul e em África, para assim poderem manter o modelo cultural em que acreditam, mas sobretudo garantirem o acesso a recursos estratégicos imprescindíveis ao crescimento económico na era da robótica e da IA: metais, raros e não raros, energia, muita energia!

As considerações sobre o fim das grandes migrações dizem respeito apenas aos Estados Unidos, apesar das insinuações sem fundamento estatístico (2) que apontam à União Europeia. O cenário catastrófico que o documento traça sobre a Europa, cujo PIB em Paridade do Poder de Compra é maior do que o dos Estados Unidos (1), é claramente desproporcionado. Creio mesmo que a Europa, além de ser o principal parceiro comercial dos Estados Unidos fora do continente americano (3), é também o seu único contraponto credível relativamente aos seus excessos da ganância monopolista.

Curiosamente, os Estados Unidos da era Trump, ao anunciaram a sua descolagem orçamental dos sistemas de defesa dos países aliados, libertaram a Alemanha e o Japão dos constrangimentos impostos a estas duas potências mundiais no rescaldo da derrota destes dois países na Segunda Guerra Mundial. Entre o Trump I e o Trump II, o Japão transformou os seus dois navios de grande convés (porta-helicópteros) em porta-aviões capazes de operar com F-35, e acaba de ameaçar Pequim nas suas intenções de invadir a Formosa, o que, a socorrer, alteraria o equilíbrio estratégico na região do Índico-Pacífico.

Querer a **paz através da força**, o mantra que os rapazes do Trump repetem sem parar, está neste momento à prova na Venezuela. Certamente um bom teste para verificar a consistência da estratégia que acabam de anunciar aos quatro ventos.

Creio que os Estados Unidos temem, de facto, a Europa (um receio que vem de longe, como se sabe...), sobretudo se esta, depois de Putin vier a incorporar a Ucrânia na União Europeia e numa NATO-Europa, e conseguir, por outro lado, estabelecer uma parceria comercial (e depois estratégica) com a Rússia, colocando os Estados Unidos e a China numa situação geo-estratégica mundial inteiramente nova e duradoura.
NOTAS

1. O PIB, em Paridade do Poder de Compra, da Europa, considerando as medições do FMI, Banco Mundial e os números da CIA (The World Factbook), é superior ao dos Estados Unidos e inferior ao da China.
2. A presença muçulmana na Europa que tanto aflige Donald Trump e J. D. Vance, não vai neste momento além dos 5%, e estima-se que em 2050, andará entre os 11% e os 14%. Muito longe, portanto, do limiar dos 30-40%, a partir do qual, os problemas de representação política e cultural étnica, religiosa ou étnico-religiosa, começam a tornar-se problemáticos. É certo que nos Estados Unidos apenas 1% dos cidadãos são muçulmanos, mas, por outro lado, 13% a 14% são afro-americanos e 20% são latinos. Quer dizer, há uma percentagem de norte-americanos que não fazem parte da maioria branca caucasiana que supera os 30% e caminha rapidamente para os 40%, o que não seria um problema se o racismo não fosse tão acentuado entre a elite republicana que ocupa atualmente a Casa Branca!

3. Se considerarmos a Europa democrática alargada (incluindo a União Europeia, o Reino Unido, a Suíça, a Noruega e outros países democráticos, excluindo a Rússia e a Ucrânia), o volume total de comércio com os Estados Unidos supera claramente o comércio destes com a China, sendo portanto a Europa a maior parceira comercial dos EUA fora do continente americano, i.e., depois do México e do Canadá. Já agora, a UE é a maior parceira comercial da China.

* — o documento prefere referir a Rússia, certamente pela contagem de espingardas!