Hamid Karzai, um dos cleptocratas aliados dos Estados Unidos. in The Guardian |
Precisamos de uma frente política contra o flagelo da corrupção
Thieves of State—Why Corruption Threatens Global Secutity (2015), de Sarah Chayes [Amazon] é um livro muito bem escrito, vivo, sobre a natureza e proliferação recente dos estados falhados, e sobre o modo como se transformaram nos principais enzimas do terrorismo dos últimos vinte anos, de que a crise de migrantes que aflige neste momento a Europa é ainda uma consequência direta.
A corrupção extrema, sistémica, que contaminou boa parte dos países produtores de petróleo e matérias primas críticas, ou de mão de obra quase escrava, no Médio Oriente, África, Ásia e América Latina, ou que se encontram nas rotas de passagem destes bens essenciais, é, segundo Sarah Chayes, a principal causa do radicalismo, extremismo e fundamentalismo religioso que neste momento alastra a uma velocidade impressionante.
É importante notar que esta degenerescência tem origem no Ocidente europeu e norte-americano.
No fundo, o velho colonialismo deu lugar a uma nova e mais destruidora colonização de vastos territórios do planeta, de que as cleptocracias extrativas violentas de países como o Afeganistão, Tunísia, Egito, Argélia, Nigéria, Uzbequistão, ou Marrocos, são exemplos escalpelizados por Sarah Chayes.
O livro não trata da corrupção nas Américas, ou na Europa, mas sabemos hoje que o fenómeno da corrupção e da captura dos países mais desenvolvidos por elites corruptas, gananciosas e descaradas, é cada vez mais preocupante. O livro de Sarah Chayes não deixa, neste ponto, de ser esclarecedor, na medida em que ao explicar os principais mecanismos da corrupção que envolvem governos, burocracias e redes criminosas multifacetadas, deixa entrever muito do que sabemos acontecer, por exemplo, em Portugal.
Por este livro ficamos a saber como a corrupção é sobretudo instrumental, e arma privilegiada do cada vez mais decadente e perigoso imperialismo americano, mas também das degeneradas, populistas e corruptas democracias de tantos países. Quanto mais insustentável se revela o paradigma de desenvolvimento especulativo estabelecido ao longo dos últimos trinta anos, no Japão, Estados Unidos e Europa, de que as crises orçamentais, o endividamento e a promiscuidade total entre bancos e governos, são as evidências que se agravam a cada repetição, mais se agrava a tendência para o estabelecimento de redes de corrupção sistémica.
Assim sendo, o combate à corrupção é hoje a prioridade das prioridades. Justifica mesmo a criação de uma frente ampla de cidadania para a denunciar, analisar e derrotar. Se continuarmos a fechar os olhos a este problema, mais nos aproximaremos do plano inclinado que conduziu dezenas de povos e países para a condição de estados falhados dominados por elites criminosas que acabarão destruídas pela insurreição dos povos que ofendem, ou pelos seus próprios aliados estratégicos de circunstância.