quinta-feira, julho 07, 2011

All's Well That Ends Well

Bitola europeia Lisboa-Madrid finalmente assegurada. Aeromoscas da Ota em Alcochete cai no dia em que a Moody's desferiu um ataque sem precedentes à integridade económica portuguesa. Que nos sirva de lição!


Reportagem de Carlos Enes com entrevista a António Brotas (TVI)

Já sabíamos, mas confirmou-se no Negócios da Semana desta noite. A última pergunta de José Gomes Ferreira ao actual dirigente da CIP, António Saraiva (um tipo que me cai bem), foi sobre o "TGV". Sim, é verdade: as confederações empresariais máximas de Portugal e Espanha levaram a Carta da Blogosfera a Garcia!

Uma nova linha ferroviária em bitola europeia, preparada para comboios de Velocidade Elevada e Alta Velocidade, e transporte de mercadorias e de passageiros, ligará a futura estação internacional do Caia ao Poceirão (a existente estação de mercadorias) e ao Pinhal Novo (a existente e nova estação de passageiros), com um apeadeiro em Évora. Quem quiser chegar até ao centro da cidade-região de Lisboa, vai pela Ponte 25A, no próprio "TGV", ou apanhando uma composição da Fertagus. E se quiser derivar para o Algarve, é só esperar pelo pendular, que o levará até Albufeira em hora e meia de conforto. Do Poceirão, as longas composições de 750 metros de comprimento farão o vai-e-vem entre os portos de Setúbal e Sines e o resto da Europa. Melhor era impossível :)

Álvaro Santos Pereira percebera já a razão da coisa. Passos de Coelho também, mas precisava de conforto, depois do encontrão de Madrid. Foi um parto difícil, mas não faltaram parteiras disponíveis! A Blogosfera de que este blogue é feito não cabe em si de contente e envia um grande abraço a todos os que sem qualquer interesse material e grande seriedade intelectual pugnaram desde 2005 por este desfecho. Chin-chin :)

A Takargo emendou a mão. José Gomes Ferreira emendou a mão. A CIP, com novo presidente, e a quem Luís Mira Amaral a tempo soube expor a saída para o impasse, aderiu à racionalidade meditada de uma solução. O novo ministro da economia foi precioso. E Passos de Coelho deu mais um passo na direcção certa. Até a Ana Paula Vitorino colocou uma cereja no topo do bolo da razoabilidade: o dinheiro disponibilizado por Bruxelas não só não pode ir para outros devaneios, como a taxa de juro associada é uma dádiva dos céus nos tempos de agonia que atravessamos. Desperdiçar tal maná seria um crime imperdoável!

Agora só falta pensar na completa reestruturação da Refer e da CP, na captação de uma parte do negócio —que Espanha domina e bem— para o nosso país, recuperando o que ainda restará da memória ferroviária e de um imaginário que Cavaco Silva trocou por betão, e construir por fim a Nova Estação Central de Entrecampos (com Metro directo para o Aeroporto de Lisboa, na Portela, claro), dando enfim uso estratégico ao buraco da Feira Popular.

O principal está assegurado: iniciar, com o pé direito, a ligação ferroviária contínua dos nossos portos e das nossas principais cidades a Espanha e ao resto da Europa.

POST SCRIPTUM — recebi de Joaquim Silva uma observação pertinente a propósito deste post:
“Só falta convencê-los de que cada novo metro de bitola de 1435 mm  a construir deve suportar 35 ton ao eixo, para assim permitir a circulação rápida de comboios com  vagões  de mais de 100 pés (30,48m) de comprimento e transporte em "doubleslack" (empilhamento duplo). Se os convencermos, todos os CAV também lá passarão....”


O QUE O ANTÓNIO MARIA PUBLICOU NO DIA 2 DE JULHO DE 2005

O Lobby da Ota e o velho eixo Norte-Sul

Parece que a solução preferida pelo actual Governo PS, incapaz de resistir aos argumentos do lobby Norte-Sul, passa por uma decisão em dois compassos: Primeiro, adaptar o aeroporto de Alverca, transformando-o numa espécie de extensão da Portela, até 2015. Com esta medida de recurso, anunciada frequentemente por oposição à Ota (que não é...), pretende-se garantir que o incremento previsto de tráfego aéreo de pessoas e mercadorias nos próximos 10 anos seja devidamente aproveitado pelo aeroporto de Lisboa, e não desviado para outras paragens. Segundo, construir o aeroporto da Ota, para inaugurar em 2015, 2020 ou 2030. Esta decisão, que é muito cara e apresenta problemas técnicos importantes (nebulosidade elevada e constante, níveis de ocupação urbana/industrial da área, obstáculos naturais à navegação aérea, proximidade do leito de cheias do Tejo, etc.) reflecte uma capitulação face aos interesses instalados naquela zona (capacidade de armazenagem e distribuição residente no eixo compreendido entre Vila Franca de Xira e Santarém) e sobretudo perante o lobby atávico do eixo Norte-Sul.

Sucede que o que precisaríamos era de uma viragem estratégica de fundo na definição da ossatura identitária do País.
A nossa independência esteve associada, durante 837 anos, ao eixo Norte-Sul (projecção constitutiva da nacionalidade) e à aliança anglo-portuguesa, nascida do casamento de Philippa of Lancaster, de Inglaterra, com João I, de Portugal (1387), e reforçada pelo Tratado de Metween (1703). Não creio que este eixo continue a fazer sentido. Pelo contrário, a sua manutenção forçada tem sido um obstáculo decisivo ao desemburramento do País. No quadro europeu actual - e que aí vem - Portugal precisa de reorientar corajosamente a sua ossatura identitária. E na minha opinião deverá fazê-lo redesenhado as suas unidades administrativas principais. Para tal, e para além das 2 Regiões Autónomas já existentes (Madeira e Açores), deveriam ser criadas mais duas: a de Lisboa e Vale do Tejo e a do Norte. No resto do País, proceder-se-ia a uma redução forçada e drástica do número de municípios, mantendo o actual esquema básico de administração (excepção feita dos chamados Governos Civis, que deveriam acabar antes da actual legislatura!)

Se virmos a coisa por este prisma perceber-se-à facilmente que o Porto deverá expandir-se para Norte e para Leste, reforçando estrategicamente os seus laços históricos e fraternais com a Galiza e Leão (Vigo, Santiago, Ourense, Corunha, Salamanca), mas buscando ao mesmo tempo uma via de acesso rápido ao resto da Europa), e que Lisboa tem que crescer em direcção ao Sul e também, obviamente, a Leste (Setúbal, Badajoz, Madrid, Barcelona). A nova Lisboa do século 21 deve cruzar o rio Tejo sem medo dos castelhanos! E para isso, um novo aeroporto deveria nascer na Margem Sul, no Montijo, em Rio Frio, em suma, entre os estuários do Tejo e do Sado.

A este novo eixo estratégico fundamental da ossatura identitária portuguesa costumo chamar o EIXO TRANS_IBERIANO. Ao velho eixo Porto-Galiza, deveríamos passar a chamar, como poeticamente lhe chamou José Rodrigues Miguéis, PORTUGALIZA. As novas nações europeias serão sobretudo nações em rede, sentimentais, no grande território do Atlântico aos.... De contrário, será o fim da Europa.

Em O Grande Estuário, projecto dinâmico e aberto de reflexão pública sobre Lisboa, a Grande Área Metropolitana de Lisboa e a Região de Lisboa e Vale do Tejo, continuamos a pensar que será possível manter o aeroporto da Portela, com duas extensões próximas (Montijo e Tires). Mas poderá realmente a Portela manter-se por muito mais tempo onde está? Poderiam as pistas do Montijo e de Tires, e novas obras na Portela, configurar uma solução sustentável até 2020-2030? As opiniões dividem-se... e os estudos técnicos também. Segundo Rui Rodrigues, a queda da taxa de crescimento do número de voos e de passageiros, em consequência de novas e mais rápidas ligações ferroviárias entre Lisboa e Madrid (AV e VE), afastaria, pelo menos para já, a necessidade imperiosa de equacionar a construção de uma nova infraestrutura de raiz. O argumento parece razoável, e ainda mais se lhe acrescentarmos os efeitos expectáveis de uma alta contínua do preço do petróleo (praticamente inevitável no actual quadro mundial de aproximação do chamado Peak of Oil Production). Em todo o caso, se um dia tivermos que avançar para um novo aeroporto internacional que altere radicalmente o actual estado de coisas, então a solução mais conforme com a inadiável actualização das nossas prioridades estratégicas no novo contexto europeu estará seguramente ao Sul do Tejo (Rio Frio...) e não no beco da Ota. Entretanto, esta discussão deve ser pública, e não um cozinhado de políticos levianos. O que não aceito é o autoritarismo governamental quando se apropia deste tema como coisa sua (não é!) Precisamos de esclarecimento cívico, sem filtros, nem ruído de despiste (media scrambing).


Actualização [10.07.05]

Recebi de Rui Rodrigues um conjunto de análises, estudos e opiniões sobre o binómio Rede Ferroviária/Novo Aeroporto de Lisboa, que vale a pena consultar. Mantenho porém a opinião de que Alverca não é alternativa à Ota. O novo aeroporto internacional de Lisboa deverá situar-se algures entre os rios Tejo e Sado. Rio Frio continua a ser uma hipótese lógica e interessante

ÚLTIMA ACTUALIZAÇÃO: 7 Jun 2011 11:26

2 comentários:

Anónimo disse...

Viva Antonio.

Parabens pela capacidade de sintese.

Igualmente de acordo que Portugal deve considerar=se e considerar a bitola europeia, sendo este um factor de integracao europeia.

No entanto deixou mais alguns dados que devem ser ponderados.

Segundo o INE *relatorio de 2008*, 60% das trocas por rodovia vao ate Espanha, 19% ate Franca e apenas o restante para alem de Franca.

O Transporte ferroviario de mercadorias alem fronteira nao chega a 1%. No transporte de mercadorias a velocidade nao e o factor importante, mas sim a regularidade.

Franca e Alemanha como exemplos estao a adoptar o modelo americano e canadiano no transporte de mercadorias *embora nao tenham o problema da bitola*, que e entregar as linhas sem valor para o trafego de passageiros aos operadores do transporte de mercadorias, ou seja, entregar-lhes o negocio, e eles que o explorem segundo o seu modelo, disponibilizando e claro a capacidade excedente.

Fica aqui mais uma achega no sentido da flexibilizacao e rentabilizacao do sector.

A

Rui

Sérgio disse...

No meio da tempestade dos ratings afinal encontro neste magnifico blog uma luz de bonança e esperança! Esperamos que seja o início de boas noticias pois passo a passo chegaremos lá!! (sem trocadilhos com o nome do 1º ministro claro...)