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segunda-feira, novembro 12, 2012

Depois de Marx, o FMI

Sopa dos Pobres financiada por Al Capone, em Chicago durante a Grande Depressão (1).

The Chicago Plan: que tal retirar aos bancos o poder de criar dinheiro do nada usando os nossos depósitos e as nossas dívidas como pretexto e colateral? Quem o acaba de propor são dois investigadores do FMI.

A experiência social, de que a Irlanda, Grécia e Portugal têm sido os casos de estudo mais recentes, está a chegar ao fim com resultados claramente desastrosos. É inevitável, nesta fase terminal da longa vaga de expansão inflacionista da economia iniciada no século 20 (D.H. Fischer), que uma sucessão de eventos de instabilidade extrema acabe por terminar num colapso geral. As crises de endividamento exponencial irresolúveis resultantes das bolhas imobiliária, soberana e estudantil, colocaram o sistema financeiro mundial e os governos à beira de um conflito fatal com os povos de onde nasceram e de que se alimentam. À medida que as classes profissionais mais avançadas vão percebendo o que realmente está em jogo, cresce de modo exponencial a sua resistência à avareza, luxúria e arrogância dos banqueiros e seus economistas de trela, e a sua revolta contra a estupidez crónica das democracias populistas degeneradas e os seus cada vez mais corruptos, execráveis ou simplesmente caricatos políticos. Por aqui, a esta corja, já só lhes resta um embate fatal com a multidão!

A sangria fiscal sobre o trabalho e as poupanças atingiu o limite. A degradação dos rendimentos do trabalho ainda não. É por aqui que os piratas julgam poder continuar os seus desesperados movimentos brownianos. Mas desenganem-se! Até no interior do FMI, para além dos sucessivos avisos de Christine Lagarde (de que desconfio por serem sistematicamente dirigidos à Europa, esquecendo os EUA, o Reino Unido, ou a própria China), dois dos seus investigadores, Jaromir Benes e Michael Kumhof, escreveram e publicaram recentemente um texto —“The Chicago Plan Revisited”— que está a queimar como um rastilho o futuro da arrogância cabotina de banqueiros como o indígena que por cá temos, de nome Fernando Ulrich, do já meio catalão BPI.

Este estudo é bem o reflexo da amplitude explosiva da crise financeira que deflagrou nos Estados Unidos em 2007 e cujos episódios não cessam de se multiplicar e de aproximar o fim da sistémica instabilidade do capitalismo cujo início remonta, segundo David Hackett Fischer, ao Jubileu da Rainha Vitória, em 1896. Todo o século 20 e ainda os primeiros dez, quinze ou vinte anos deste século, correspondem a um dos longos ciclos de crescimento inflacionista detetado no provocador e de leitura obrigatória livro de Fischer, The Great Wave (1996).

Eleger a Grécia, ou Portugal, como bodes expiatórios de algo que culmina o colapso de um ciclo longo de crescimento mundial é, desde logo, uma armadilha que devemos evitar, sem prejuízo da consciência que teremos que desenvolver sobre a necessidade absoluta de corrigir os excessos de endividamento sistémico e de corrupção que levaram as democracias ocidentais à beira da implosão.

Antes de passarmos ao estudo do FMI, uma referência breve a dois países do norte europeu que são duas verdadeiras bombas-relógio: o Reino Unido e a Holanda.

THE DUTCH TRAGEDY: The country’s current worrying situation, disturbingly resembles that of Ireland and Spain, as it addresses an extremely large private dept, a tremendous real estate bubble, and huge bank mortgage loan defaults – problems for which nothing has been done.

[...] The total mortgage debt of the Dutch is around 640 billion euro’s (when Greece’s public debt is around 290 billion euro’s) – against which the private deposits of the Dutch are just 332 billion euro’s.

This means that the Dutch banks must finance the difference (308 billion euro’s) from abroad – resulting in enormous dependence on the international financial markets. With the country’s GDP at around 650 billion euro’s, the total (mortgage) debt of households is scary; nearly 100% of GDP — Vassilis Viliardos, Cass, 26 out 2012.

Se na Holanda o colapso, nomeadamente de vários bancos, poderá ocorrer a qualquer momento, em resultado da explosiva bolha imobiliária que ali cresceu e é mais grave ainda do que a bolha espanhola, no caso britânico, os territórios autónomos da finança sediados na City de Londres e nos paraísos fiscais alojados nomeadamente em ilhas que são propriedade pessoal da rainha de Inglaterra, as chamadas Crown dependencies (Jersey, Guernsey e Isle of Man), estão no centro de um furacão de corrupção financeira sem precedentes na Europa dos últimos dois séculos. A Dona Branca montada em volta da taxa Libor, a chamada re-hipoteca não autorizada dos colaterais dados por clientes em operações de investimento (shadow rehypothecation), a falência iminente do seu fundo público de pensões e, finalmente, o extraordinário endividamento do Reino Unido, 492% do PIB em novembro de 2011 (BBC/Robert Peston) colocam, afinal, o centro da Europa (as revelações alemãs seguem dentro de momentos...), no centro do colapso financeiro de todo o continente. Os PIIGS, coitados, andavam aos restos do festim quando o mesmo já tinha chegado à sobremesa.

O Plano de Chicago: substituir os bancos privados pelos bancos públicos na criação de dinheiro sem que este se transforme automaticamente, nem em dívida privada usurária, nem em deboche público ao serviço de bacanais de corrupção político-partidária

O ponto de partida do estudo do FMI, para o qual Ambrose Evans-Pritchard chamou a nossa atenção no Telegraph online, é simples: ao contrário do que pensa o Totó inSeguro, e ao contrário do que a desmiolada esquerda que temos exige, não há crescimento no horizonte mais próximo. O que se percebe nos sinais evidentes da economia é a aproximação de uma enorme frente de decrescimento sistémico e de deflação. Logo, ou se descobre uma solução financeira para mitigar os impactos catastróficos do desendividamento e do desenmerdamento das economias públicas e privadas, ou a destruição dos excessos de produção industrial, de emprego economicamente inútil e da procura agregada desembocará em inevitáveis revoluções sociais e desagregações políticas em cadeia.

IMF’s epic plan to conjure away debt and dethrone bankers
By Ambrose Evans-Pritchard 2:31PM BST 21 Oct 2012

So there is a magic wand after all. A revolutionary paper by the International Monetary Fund claims that one could eliminate the net public debt of the US at a stroke, and by implication do the same for Britain, Germany, Italy, or Japan.

One could slash private debt by 100pc of GDP, boost growth, stabilize prices, and dethrone bankers all at the same time. It could be done cleanly and painlessly, by legislative command, far more quickly than anybody imagined.

The conjuring trick is to replace our system of private bank-created money -- roughly 97pc of the money supply -- with state-created money. We return to the historical norm, before Charles II placed control of the money supply in private hands with the English Free Coinage Act of 1666.

Specifically, it means an assault on “fractional reserve banking”. If lenders are forced to put up 100pc reserve backing for deposits, they lose the exorbitant privilege of creating money out of thin air.

Mas vale mesmo a pena ler o original desenvolvido por Jaromir Benes e Michael Kumhof (2), de que aqui deixo citações esclarecedoras do respetivo abstract e conclusões:

Abstract

At the height of the Great Depression a number of leading U.S. economists advanced a proposal for monetary reform that became known as the Chicago Plan. It envisaged the separation of the monetary and credit functions of the banking system, by requiring 100% reserve backing for deposits. Irving Fisher (1936) claimed the following advantages for this plan: (1) Much better control of a major source of business cycle fluctuations, sudden increases and contractions of bank credit and of the supply of bank-created money. (2) Complete elimination of bank runs. (3) Dramatic reduction of the (net) public debt. (4) Dramatic reduction of private debt, as money creation no longer requires simultaneous debt creation. We study these claims by embedding a comprehensive and carefully calibrated model of the banking system in a DSGE model of the U.S. economy. We find support for all four of Fisher’s claims. Furthermore, output gains approach 10 percent, and steady state inflation can drop to zero without posing problems for the conduct of monetary policy.

[...]

VIII. Conclusion

This paper revisits the Chicago Plan, a proposal for fundamental monetary reform that was put forward by many leading U.S. economists at the height of the Great Depression. Fisher (1936), in his brilliant summary of the Chicago Plan, claimed that it had four major advantages, ranging from greater macroeconomic stability to much lower debt levels throughout the economy. In this paper we are able to rigorously evaluate his claims, by applying the recommendations of the Chicago Plan to a state-of-the-art monetary DSGE model that contains a fully microfounded and carefully calibrated model of the current U.S. financial system. The critical feature of this model is that the economy’s money supply is created by banks, through debt, rather than being created debt-free by the government.

Our analytical and simulation results fully validate Fisher’s (1936) claims. The Chicago Plan could significantly reduce business cycle volatility caused by rapid changes in banks’ attitudes towards credit risk, it would eliminate bank runs, and it would lead to an instantaneous and large reduction in the levels of both government and private debt. It would accomplish the latter by making government-issued money, which represents equity in the commonwealth rather than debt, the central liquid asset of the economy, while banks concentrate on their strength, the extension of credit to investment projects that require monitoring and risk management expertise. We find that the advantages of the Chicago Plan go even beyond those claimed by Fisher. One additional advantage is large steady state output gains due to the removal or reduction of multiple distortions, including interest rate risk spreads, distortionary taxes, and costly monitoring of macroeconomically unnecessary credit risks. Another advantage is the ability to drive steady state inflation to zero in an environment where liquidity traps do not exist, and where monetarism becomes feasible and desirable because the government does in fact control broad monetary aggregates. This ability to generate and live with zero steady state inflation is an important result, because it answers the somewhat confused claim of opponents of an exclusive government monopoly on money issuance, namely that such a monetary system would be highly inflationary. There is nothing in our theoretical framework to support this claim. And as discussed in Section II, there is very little in the monetary history of ancient societies and Western nations to support it either.

in IMF
Working Paper
Research Department
The Chicago Plan Revisited
Prepared by Jaromir Benes and Michael Kumhof
Authorized for distribution by Douglas Laxton
August 2012
(PDF)

NOTAS
  1. Sobre a foto que acompanha este post: “A line of people waiting outside a soup kitchen during the Great Depression. “Soup kitchens” provided the only meals some unemployed Americans had. This particular soup kitchen was sponsored by the Chicago gangster Al Capone.” LearnNC.
  2. Para uma leitura crítica deste polémico estudo nada melhor do que o artigo de Steve Keen, “The IMF gets radical?”, in Business Spectator, 7:26 AM, 5 Nov 2012.

Última atualização: 16 nov 2012 20:03