sábado, outubro 16, 2004

Petroleo 1

Out., 14, 2003: 1 barril de crude OPEP = 30 dll
Out., 14, 2004: 1 barril de crude OPEP = 54 dll

“Em 1979, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) tinha um excesso de capacidade produtiva de 47.5 milhões de barris de petróleo por dia. Vinte anos mais tarde, em 1999, essa capacidade sobressalente tinha sido reduzida para 400 mil barris/ dia e a procura global subira para 77 milhões de barris/ dia. Hoje a OPEP não tem praticamente nenhuma nova torneira que possa abrir e a procura está nos 84 milhões de barris/dia — um salto de quase 10%.”
Kris Axtman, Why the rude oil prices?; The Christian Science Monitor, 15 Out. 2004

Observadores atentos e independentes afirmaram há já algum tempo que o barril de crude da OPEP pode chegar aos 60 dll antes do fim deste ano. Mesmo que depois regresse aos 40 dll por barril, tal inversão de tendência será passageira, dando lugar a novos ciclos altistas. A verdade é que este recurso energético, no qual repousou o essencial da segunda revolução industrial (1930 em diante) e a chamada sociedade de consumo, se aproxima a passos muito rápidos do chamado “peak of oil production”, isto é, do ponto a partir do qual todo o petróleo disponível será, para todos os efeitos, o último! Os Estados Unidos atingiram este ponto crítico na década de 70, e por isso têm que assassinar Presidentes na América Latina, financiar e armar o Estado de Israel, corromper e alimentar ditaduras no mundo árabe e desencadear guerras preventivas contra toda e qualquer ameaça às fontes petrolíferas onde se abastecem (salvaguardando o mais possível a sua própria Reserva Estratégica de Petróleo).

A produção de petróleo per capita começou a declinar de forma consistente em 1979, e o início da queda absoluta da produção a nível global começará, segundo Richard C. Duncan, em 2006 (a uma taxa de 2.45% ao ano, durante 34 anos!). Quer dizer, daqui a um ano e meio, poderemos estar já a lidar com preços de crude na ordem dos 100 dll/barril. Em 2008, ainda segundo as previsões de Duncan, as reservas de países como os EUA, México, Noruega, Angola, Rússia, Afeganistão, Urzebequistão, Azerbeijão, etc., começarão a decair mais depressa que as reservas da OPEC (Venezuela, Nigéria, Líbia, Argélia, Arábia Saudita, Emiratos Árabes Unidos, Qatar, Kwait, Irão, Iraque e Indonésia), colocando estes países numa clara posição de supremacia energética, mas também no centro de gigantescas disputas estratégicas. Pior do que isso, como nada de substancial se fez quanto ao crescimento populacional, à poluição e à devastação dos recursos naturais não-renováveis desde que Donella H. Meadows e a sua equipa publicaram “The Limits to Growth”, em 1972, 2006 poderá ser também o primeiro ano do fim da presente era antropológica. As crises energéticas suceder-se-ão a um ritmo imparável e tendencialmente catastrófico. Com elas sobrevirão todo o estilo de guerras e conflitos: guerras mini-nucleares, guerras hiper-tecnológicas, guerras assimétricas aterradoras, golpes de Estado, Estados de Emergência, e um longo etc que qualquer um de nós pode ir começando a imaginar. Ponderando as várias previsões sérias existentes, podemos esperar com razoável probabilidade que a grande implosão civilizacional inicie o seu movimento de não-retorno entre 2020 e 2030.

Como se imaginará, as presentes disputas políticas, nomeadamente em Portugal, embora reflictam já o estado de pânico que subrepticiamente vai tomando conta de quem pensa e de quem tem que decidir, estão a anos-luz do discurso informado que é necessário elaborar para nos prepararmos para a hecatombe que aí vem. O mundo não se desboroará de modo homogéneo. Uns cairão estrondosamente e depressa, outros conseguirão adiar a tragédia por mais umas décadas, ou mesmo sobreviver e adaptar-se. Mas para redesenhar a civilização por vir, temos que conhecer a verdade sobre o presente. E se os partidos políticos forem incapazes de o fazer, outras formas de organização e acção política poderão e deverão fazê-lo, em nome da sustentabilidade, da sobrevivência civilizacional e da vida.

Post-scriptum

As Moai da Ilha de Páscoa — A população desta pequena ilha (descoberta pelos holandeses em 1722) ultrapassou o seu pico de sustentabilidade por volta dos 10 mil habitantes. Os recursos tornaram-se escassos e as outrora luxuriantes florestas de palmeiras foram destruídas, para uso como fonte de energia e para dar lugar a terrenos de cultivo. A avançada ordem social de que gozavam começou então a declinar rapidamente, dando lugar a guerras civis e ao canibalismo. Supõe-se que todas as grandes e impressionantes estátuas da ilha (as Moai) foram derrubadas pelos próprios ilhéus no decurso da prolongada crise que acabou com o seu equilibrado modelo civilizacional. A população, por efeito da exaustão dos recursos disponíveis (e das doenças e escravatura trazidas pelos colonizadores europeus), viria a reduzir-se até pouco mais do que uma centena de habitantes. O mais curioso desta história é que os sobreviventes desconheciam a profunda crise que os levara até à situação em que estavam...


O-A-M #59 16 Outubro 2004

terça-feira, outubro 12, 2004

Professores mal colocados

“Para terminar, informo V. Exªs que o David Justino tem uma participação de 30 por cento na Compta através da holding International Financial Investments PLC' com sede nas ilhas Cayman.”

O Primeiro-Ministro e a Ministra da Educação prometeram apurar responsabilidades...
Será tal promessa mais uma das cortinas de fumo com que a actual coligação entretém a pouco curiosa e dependente Comunicação Social que temos? Ou será que vamos mesmo saber o que se passou?
Recebi um mail com um curioso relato sobre a aparente sensibilidade deste caso...

Ao que parece, e não tenho neste momento maneira de o confirmar, o que se segue foi publicado no Forum (online) do Jornal Expresso, que curiosamente parece dar pouca importância a esta extensão pública da sua publicação. De facto, começa a ser evidente que, perante a censura interna que grassa nos média tradicionais, e os vários equilíbrios empresariais e políticos que a condicionam de modo cada vez mais apertado, apenas as redes de internautas têm poder suficiente para re-equilibrar a balança da liberdade de expressão e comunicação nos tempos que correm e mais ainda nos que aí vêm. Mas para que esta finalidade seja plenamente conseguida seria bom criar um anel de sites e blogues convergentes, e desenhar o respectivo mapa!

Aqui vai o sumo (re-editado) do que me veio parar hoje à caixa de correio (já agora, se alguém puder confirmar o que me venderam sobre o papel desempenhado por informáticos do Min da Ed. do Porto na resolução do problema informático, força...)

“ Trata-se da Compta, cujo presidente é o meu amigo Vitor Magalhães, pelo que sei o que se passa.

— Em primeiro lugar o Vitor é padrinho do filho mais velho do Bagão Félix.
— Em segundo lugar, o anterior ministro (David Justino) encomendou o programa e testou-o, tendo verificado que funcionava muito bem.
— Em terceiro lugar, a nova ministra resolveu mudar a matriz inicial 3 dias antes do arranque do concurso. Quem cumpriu a sua decisão criou um código especial, o qual, desde o momento que fosse anexado a um professor, atribuir-lhe-ia automaticamente a escola da 1ª preferência. Uma espécie de cunha informática, percebem? Só que a alteração à última hora deu cabo do algoritmo central e bye-bye programa!

Os comentadores deste Forúm apelaram para que eu dissesse algo mais acerca da negociata Compta/PSDPP, mas pouco mais se pode acrescentar, excepto:

— Verifiquem as colocações da Escola EB 2+3 da Murtosa.
— Verifiquem as colocações da Escola Secundária Rodrigues de Freitas, no Porto
— Verifiquem as colocações na escola Renato Amorim, em Setubal.

Ou então,
— Verifiquem os pagamento no valor de 325.652,00 à Compta em Maio de 2004, mais um pagamento de 658.321,00 em Julho de 2004, e mais aberrante ainda, o pagamento da última tranche do contrato de desenvolvimento de 987.325,00 no dia 20 (VINTE) de Setembro de 2004.

Mais informo que o contrato de assistência no valor de 250.000,00 euros anuais tem a duração de 15 anos.
Para terminar, informo V. Exªs que o David Justino tem uma participação de 30 por cento na Compta através da holding
International Financial Investments PLC' com sede nas ilhas Cayman.”


O-A-M #58 12 Outubro 2004

sábado, outubro 09, 2004

Moniz recua

Na minha opinião Marcelo Rebelo de Sousa deveria reclamar uma clarificação política definitiva no próximo Congresso do seu partido. E deveria mais: deveria anunciar estar disposto a formar um novo partido, caso a deriva populista e liberal do actual PSD se revele como uma metamorfose irreversível, provocada pelo enlace institucional entre Pedro Santana Lopes e Paulo Portas.
Spider Girl - in RTL siteMarcelo Rebelo de Sousa percebeu a tempo e horas que a entrada da RTL na Media Capital prenunciava a integração a prazo do negócio de Miguel Paes do Amaral no maior grupo televisivo europeu: 26 canais de televisão, 24 estações de rádio (em 9 países), 260 programas televisivos (em 39 países), 19 mil horas de direitos de transmissão (em 150 países) e 250 milhões de espectadores. Os 11,6% de capital social adquiridos pela RTL fazem imediatamente deste grupo um parceiro estratégico com direito e capacidade para influenciar o futuro da Media Capital. Ora, apesar das peculiaridades do “caso português” tudo leva a crer que o formato comunicacional da RTL acabará por impor-se, retirando este canal da zona de influência dos jogos político-mediáticos tão ao gosto da amálgama promíscua e terceiro-mundista que compõe as instâncias de poder no nosso País. A prazo, que não será longo, ninguém está a ver na futura TVI, nem os comentários de Marcelo Rebelo de Sousa, nem as truculentas opiniões de Miguel Sousa Tavares, nem os tais paineis politicamente correctos que a custo procuram remediar a manifesta falta de audiência do Parlamento, do Governo e dos políticos em geral. A partir do caso Marcelo Rebelo de Sousa, o que se insinua no panorama mediático lusitano mais próximo, é a luxemburguização da TVI, o controlo político cerrado dos canais estatais (pelos governos que lá estiverem) e a emergência da SIC como principal fonte de informação independente (e diversificada em matéria de públicos-alvo) do nosso xadrez audiovisual.

O “Professor Marcelo” viu a tempo e horas o que o esperava. Miguel Sousa Tavares, pelos vistos, não! E José Eduardo Moniz, que tem apesar de tudo (embora por escassos meses) o poder de desferir um golpe de coelho na TVI, forçando uma reviravolta no grupo Media Capital, decidiu esperar para ver. Tê-lo-à feito por necessidade táctica? Para avaliar se há sinais financeiros suficientemente credíveis que lhe permitam equacionar uma resposta à altura do desafio? Ou será que, pelo contrário, já decidiu não entrar nesta guerra... admitindo que o mundo cor-de-rosa que o espera até lhe fará muito bem à andropausa?

Esta tempestade, ao contrário do que escreve o director do Expresso, não é “um número de circo”. De facto, trata-se de uma tempestade com duas faces: a face do dinheiro, que se move inexoravelmente para fora, e a face da política, cujo principal desfecho aponta para o fim triste do actual Governo, e sobretudo para a necessária cisão do PPD/PSD. O silêncio da Marcelo Rebelo de Sousa tem sobretudo a ver com esta última questão. Vejo-o, a este silêncio ensurdecedor, como um apelo dramático aos sentimentos social-democratas, para que tenham a coragem de se libertarem momentaneamente das dependências mais rasteiras do poder, e para que confluam num movimento de separação profiláctica da vertente populista e liberal que tomou conta do PSD. O PSD (social-democrata) tem que romper com o PPD (populista e liberal) se quiser sobreviver como um interlocutor válido da democracia Portuguesa. E tem que fazê-lo quanto antes! Caso contrário, as moléculas que compõem essa tão importante sensibilidade do partido fundado por Sá Carneiro, serão cruelmente pulverizadas por Paulo Portas, ainda que com os sobressaltos provocados pelo afã trapalhão de Santana Lopes. Na primeira hipótese, a democracia ganhará um novo partido democrático, e a direita populista de Paulo Portas formará finalmente um partido com mais de 6% do eleitorado. Na segunda, a sensibilidade social-democrata do PSD morrerá sem glória, à medida que os seus porta-vozes se retirarem paulatinamente da cena pública. Resta esperar pelo discurso do actual Primeiro Ministro na próxima Segunda-Feira, e sobretudo pela resposta que Marcelo Rebelo de Sousa terá que dar às provocações que lhe serão servidas na bandeja primo-ministerial. Na minha opinião, Marcelo Rebelo de Sousa deveria reclamar uma clarificação política definitiva no próximo Congresso do seu partido. E deveria mais: deveria anunciar estar disposto a formar um novo partido, caso a deriva populista e liberal do actual PSD se revele como uma metamorfose irreversível, provocada pelo enlace institucional entre Pedro Santana Lopes e Paulo Portas. Só um tal acto de coragem poderá desatar o nó górdio da actual situação política. Porque só um tal acto de coragem criará os pressupostos constitucionais que obrigarão o Presidente da República a dissolver a Assembleia da República e a convocar eleições.
Como se vê, o comentador do Expresso bem podia ter escrito outra coisa!

O-A-M #57 09 Outubro 2004

sexta-feira, outubro 08, 2004

Marcelo 2

Demissão encomendada


Desejo a Marcelo Rebelo de Sousa a inspiração, a força e o apoio de que necessita para tirar todas as conclusões da iniciativa tomada ao responder como respondeu à manobra entrista do PP (consolidada definitivamente a partir do momento em que Santana Lopes e Paulo Portas deram o nó da governação.)


Não sei se a Media Capital anda bem ou não. Mas parece-me que a entrada anunciada da RTL no núcleo duro do negócio de Paes do Amaral prenuncia, no mínimo, alguma ânsia de liquidez, ou de estratégia... Olhando retrospectivamente para a aventura mediática deste empresário mal conhecido, e do obscuro grupo que lidera — a Media Capital [1] —, reparamos que em tempos teve, e depois vendeu, uma porrada de publicações de papel, cuja heroína se chamara, durante uma década, O Independente. Escrevi no Indy mais de 500 críticas de índole sobretudo artística e cultural, sem uma vez sequer pairar sobre o meu laptop a mais leve pressão editorial. Obtive sempre a máxima cooperação e cordialidade do director Paulo Portas (uma figura bem mais complexa do que parece.) Depois, quando menos se esperava, a porrada de revistas esfumou-se na decadência editorial, no colapso do cash flow, e finalmente na cessação informal de contratos e encerramento ou venda das publicações a terceiros. Pouco tempo depois, nascia a nova aventura de Miguel Paes do Amaral: a TVI. O grupo Media Capital, nasceria de jure apenas este ano! Mas sob designação diversa, o grupo de média de Paes do Amaral começou de facto a operar em 1992, adquirindo ou lançando um leque renovado de revistas, estações de rádio e o mais irritante, inútil e boçal projecto Web made in Portugal, chamado IOL. O negócio da publicidade em outdoors (e em indoors!) — uma vergonha nacional e uma deriva da maior estupidez [2] — tornou-se entretanto outra ambicionada galinha dos ovos de ouro para Paes do Amaral.

Se repararmos com atenção, o sucesso deste grupo adveio e advem dos seus directores de conteúdos, em particular de Paulo Portas, quando era director de O Independente, e depois de José Eduardo Moniz, quando assumiu a direcção de programas da TVI. Sem eles, o grupo nunca teria existido, ou esfumar-se-ia rapidamente. O caso da pressão governamental exercida sobre a Media Capital, e que esta, por sua vez, induziu sem demora na direcção de Marcelo Rebelo de Sousa, adquire assim contornos picantes!
Marcelo Rebelo de Sousa, mesmo que esteja a apostar na cisão do PPD/PSD (separando as duas componentes cada vez mais radicalizadas deste mini-bloco central), e por conseguinte, na única condição contitucionalmente válida para a demissão do actual governo e consequente convocação de eleições gerais antecipadas, a verdade é que o desastrado Santana Lopes e a equipa de mentecaptos e acólitos que o rodeia lhe deu completamente o flanco. A verdade é que o actual Governo, pela cabeça do seu Primeiro Ministro (qual Salomé despeitada), veio pedir publicamente e em todos os órgãos de comunicação social, a cabeça de Marcelo Rebelo de Sousa. Se dúvida houvesse, a Media Capital, através do seu maior accionista, desvaneceu-a, antes mesmo que o comentador tivesse oportunidade de se defender na edição do seu programa previsto para depois de amanhã, e passando indecorasamente por cima do director de programas e principal responsável pelo êxito da TVI, José Eduardo Moniz.
Miguel Sousa Tavares diz que vai falar com José Eduardo Moniz e com Marcelo Rebelo de Sousa, antes de tomar uma decisão pessoal sobre o imbróglio criado. Os jornalistas da TVI fizeram circular um abaixo-assinado exigindo explicações ao principal accionista da empresa. José Eduardo Moniz, ainda em Cannes (creio) proclama que não admite ingerências na programação da TVI, que quer Marcelo Rebelo de Sousa de volta, e que quando chegar a Lisboa vai tirar tudo a limpo... e tirar também as devidas consequências do ocorrido... Numa palavra: o director de programas da TVI tem o preocupado grupo Media Capital e respectivos parceiros presos pelos c...!
Como vai acabar este Big Brother dos poderosos? Tudo depende das reais intenções de Marcelo Rebelo de Sousa, e da maturidade dos militantes do PSD para uma cisão (de resto, inevitável) do PPD, com vista a uma necessária recomposição do espectro partidário português. O País já entrou numa das mais dramáticas décadas da sua história. E como tal, não se compadece nem com o adiamento oportunista da crise do actual sistema político, nem com o prolongamento sofrido da actual situação social. Precisamos todos de falar claro, e de poder experimentar soluções políticas efectivamente alternativas. O Cozido à Portguesa, o Social-Porreirismo, a endogamia cabotina e a chulice comunitária chegaram ao fim. Precisamos todos de trabalhar. E precisamos que o poder caia nas mãos de quem pensa, e não de quem rouba, nada fazendo, ou fazendo tudo mal, o nosso futuro colectivo. Desejo a Marcelo Rebelo de Sousa a inspiração, a força e o apoio de que necessita para tirar todas as conclusões da iniciativa tomada ao responder como respondeu à manobra entrista do PP (consolidada definitivamente a partir do momento em que Santana Lopes e Paulo Portas deram o nó da governação.)

Quanto ao que Moniz irá fazer, ninguém, nem ele, o sabe ainda. Mas uma coisa é certa: se bater com a porta, o grupo Media Capital morrerá e outra televisão, quem sabe, outro grupo mediático, fortemente financiado pelos nossos vizinhos espanhóis, sob a liderança reforçada de José Eduardo Moniz, nascerá, para bem da liberdade e do pluralismo que tanto preocupam este Governo desgraçado.


Notas:
1. Li atentamente o prospecto lançado em Março de 2004 para a mais recente operação de venda de acções da Media Capital, publicado pela CMVM. Fiquei com dúvidas, nomeadamente sobre a particular juventude e carácter enigmático das empresas que formam o grupo:

Accionistas da sociedade Grupo Media Capital,SGPS, S.A.

— Vertix, SGPS, SA, com sede na Rua Silva Carvalho, 347, 1º Dto., Lisboa, com o capital social de 50.000 Euros, pessoa colectiva n.º 503 664 499, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa sob o número 6714;
— HMTF Madeira Cayman, L.P., uma sociedade com sede em Cayman Islands, The Huntlaw building, Fort Street, George Town, Grand Cayman, Cayman Islands;
— Hercules Enterprises, Inc, uma sociedade com sede na República do Panamá, Ficha
n.º 336763, Rolo 56674, Imagem 64, Apartado Aéreo no. 614, Panamá 94-A;
— Alvor 2004, SGPS, S.A., com sede na Rua da Páscoa, n.º 62 ? B, Lisboa, com o capital social de 50.000 Euros, dos quais 15.000 Euros se encontram realizados, pessoa colectiva n.º P-506886379, que se encontra em processo de registo na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa;
— Heisamore, SGPS, S.A., com sede na Rua da Páscoa, n.º 62 ? B, Lisboa, com o capital social de 50.000 Euros, dos quais 15.000 Euros se encontram realizados, pessoa colectiva n.º P-506886352, que se encontra em processo de registo na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa;
— Partrouge, SGPS, S.A., com sede na Rua da Páscoa, n.º 62 ? B, Lisboa, com o capital social de 50.000 Euros, dos quais 15.000 Euros se encontram realizados, pessoa colectiva n.º P-506886387, que se encontra em processo de registo na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa;
— Fredter, SGPS, S.A., com sede na Rua da Páscoa, n.º 62 ? B, Lisboa, com o capital social de 50.000 Euros, dos quais 15.000 Euros se encontram realizados, pessoa colectiva n.º P-506889874, que se encontra em processo de registo na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa.

............


Os membros do Conselho de Administração da Vertix, SGPS, S.A.:
Presidente: Miguel Maria Sá Paes do Amaral (1)
Vogais: Jared Scott Bluestein (1)
Eduardo Gonzalo Fernandez - Espinar Fernandez (1)
(1) O registo da sua eleição encontra-se pendente na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa.

— Os membros do órgão de administração da HMTF Madeira GP Ltd, General Partner da
HMTF Madeira Cayman, L.P.:
Administrador Único: Thomas O. Hicks

— Os membros do órgão de administração da Hercules Enterprises, Inc:
- Rodolfo Ramon Chiari Correa
- Roberto Ramon Aleman Healy
- Alvaro Antonio Aleman Healy.

— Os membros do órgão de administração da Alvor 2004, SGPS, S.A.:
Administrador Único: José Firmino Vieira de Meirelles Corte-Real (1)
(1) O registo da sua nomeação encontra-se pendente na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa.

— Os membros do órgão de administração da Partrouge, SGPS, S.A.:
Administrador Único: José Firmino Vieira de Meirelles Corte-Real (1)
(1) O registo da sua nomeação encontra-se pendente na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa.

— Os membros do órgão de administração da Fredter, SGPS, S.A.:
Administrador Único: José Firmino Vieira de Meirelles Corte-Real (1)
(1) O registo da sua nomeação encontra-se pendente na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa.

— Os membros do órgão de administração da Heisamore, SGPS, S.A.:
Administrador Único: José Firmino Vieira de Meirelles Corte-Real (1)
(1) O registo da sua nomeação encontra-se pendente na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa.


[2] É tempo de a cidadania verberar contra a violentação comercial do espaço público pelos conglomerados de média. Contra toda a legislação sobre segurança, e contra todo o bom senso que deve existir em matéria de salubridade estética do espaço comum, estas ditas empresas de meios não sossegam enquanto não enfiarem a sua repetitiva e quase sempre desmiolada e manipulativa publicidade nos mais ínfimos interstícios da esfera pública, privada e mesmo íntima dos cidadãos. A sociedade consumo acabou e temos que nos preparar para esta realidade... A reconversão ideológica vai ser terrível, mas tem que começar, e quanto mais cedo melhor. Por razões óbvias (a penúria orçamental de governos e municípios), nenhum político se atreve a encarar este problema de frente e com vontade de agir. Tanto faz que venham do PP, como do PPD ou do PS (não é, caro António José Seguro?) Mas o problema tem que começar a ser resolvido, e creio que começará a partir da acção cidadã. São os munícipes, com ou sem apoio das ONGs, que mais cedo ou mais tarde irão reagir contra a presente pornografia publicitária. E quanto mais tarde, pior — claro está.

O-A-M #56 08 Outubro 2004

quinta-feira, outubro 07, 2004

Marcelo 1

Santana e a liberdade de opinião


Se ninguém no interior do PSD tomar a iniciativa de declarar uma cisão ideológica e organizacional da deriva populista e autoritária que tomou conta do partido e da governação, Jorge Sampaio não encontrará motivo suficiente, à luz da actual Constituição, para demitir o actual Governo, dissolver a Assembleia da República e convocar Eleições Legislativas antecipadas.


Eu nunca votei no PPD/PSD. Quando era trotskysta votava na LCI e depois dessa inesquecível aventura juvenil votei consecutivamente no Partido Socialista, mesmo desconfiando frequentemente de alguns dos seus protagonistas. Ora esta circunstância nunca diminuiu o prazer com que sempre escutei e vi o comentário semanal de Marcelo Rebelo de Sousa ao longo dos últimos quatro anos e meio.
Todos conhecíamos o seu credo político e religioso, todos sabíamos por que clube de futebol torcia, mas precisamente por serem transparentes as suas convicções, mais valor adquiriam semanalmente os seus exercícios críticos sobre a situação do País. Fino na observação, arguto nos argumentos, claro nas palavras e sibilino quanto baste nas estocadas que regularmente enfiava nas suas vítimas circunstanciais, o comentário do “Professor Marcelo” chegava a milhões de Portugueses como um breve mas verdadeiro acto de consciência sobre a nossa condição colectiva. Mesmo quando percebíamos que tomava de ponta algum político em particular, aquele sermão de Domingo era um verdadeiro tónico para o começo de cada semana de trabalho. A sua voz valia mais do que o latim farisaico de toda a corja de cortesãos que louvam chefias, traficam influências e acautelam reformas. A isenção de Marcelo Rebelo de Sousa é sobretudo uma isenção autoral, baseada no respeito intrínseco da lógica dos argumentos e na ética dos factos a que se aplicam. Num País democrático e livre, o contraditório a exercer sobre as opiniões que expendia sempre teve (e terá!) o seu lugar próprio. Esse lugar chama-se liberdade de opinião e de imprensa. Não se chama tempo de antena governamental ou para-governamental, nem arreganhar o dente do autoritarismo, como sucedeu com o recado que Santana Lopes encomendou a Paes do Amaral e ao seu Ministro dos Assuntos Parlamentares (cujo nome desconheço, e não pretendo recordar).

Para saber o que está por detrás da pressão intolerável exercida pelo enigmático e pardo Sr. Paes do Amaral sobre Marcelo Rebelo de Sousa (uma pressão aliás ilegítima, ilegal e suficiente para retirar ao Sr Paes do Amaral a faculdade de empresariar negócios de comunicação) recomendo que se siga a pista do dinheiro. Como sempre sucede nestes casos de promiscuidade entre governantes e empresários, o segredo está quase sempre aí. Por exemplo, não é verdade que a Media Capital se encontra neste momento no meio de uma operação com o Metro de Lisboa, cujo fim é alastrar mais ainda a nódoa da publicidade que encharca o quotidiano de todos nós? Não se esperaria, ao invés, que o Metro de Lisboa, equilibrasse o uso de um espaço público exclusivamente pago com os impostos dos Portugueses e com Fundos Comunitários (igualmente pagos com os impostos de todos os Europeus) entre zonas reservadas à publicidade comercial e zonas reservadas a suportes de comunicação comunitária (por exemplo, de associações do pequeno comércio tradicional, Câmara Municipal de Lisboa, Associações Culturais da Cidade, Organizações Não Governamentais, etc.)? E já agora, pode o Metro de Lisboa negociar, sem recorrer a consulta pública, a cedência do espaço que ocupa (mas não é seu) a uma qualquer empresa com que resolva privilegiar relações de interesse? E se pode, deveria poder?

O caso da censura a Marcelo Rebelo de Sousa releva, todavia, de uma guerra mais profunda e que pode rebentar a qualquer momento. Trata-se do futuro do actual PPD/PSD. O Cavalo de Tróia chamado Paulo Portas encontra-se bem aninhado no âmago do velho Partido fundado, entre outros, por Francisco Sá Carneiro e Pinto Balsemão. Paulo Portas, depois de já ter atrelado o futuro político de Santana Lopes ao seu próprio calendário desconstrutivo, sabe que se for a eleições sózinho mostrará ao mundo que o seu PP, na realidade, não existe (e que portanto não passa dum parasita do PSD). Assim sendo, Paulo Portas tem que gizar um de dois cenários até 2006: ou garantir que o PP vai coligado com o PSD às próximas Legislativas, ou provocar a aparição de uma nova força partidária, sempre depois do prazo legal de dissolução da Assembleia da República, mas a tempo de constituir uma nova força partidária com capacidade de triplicar o ridículo score eleitoral do PP. Num caso e noutro, a sensibilidade social-democrata mais genuína do PPD/PSD está tramada!

Creio que é esta realidade profunda que, em última análise, explica a reacção de Marcelo Rebelo de Sousa, e as reacções solidárias para com ele de Marques Mendes e Pacheco Pereira. Não se pode fingir por muito mais tempo o facto de que a aliança entre Santana Lopes e Paulo Portas visa redefinir profundamente o actual espectro partidário. Ou muito me engano, ou teremos dois novos partidos nas eleições de 2006: o PSD, por um lado, liderado por Marques Mendes; e o PPD, por outro, com Paulo Portas na respectiva liderança (e Santana Lopes na corrida para a Presidência da República). Vai ser uma balbúrdia? Pois vai! Mas há alternativa? Não creio. As cartas deste jogo já foram jogadas...

Finalmente. como irá agir o PR?
Se ninguém no interior do PSD, tomar a iniciativa de declarar uma cisão ideológica e organizacional da deriva populista e autoritária que tomou conta do partido e da governação por efeito da sólida ligadura estabelecida entre Santana Lopes e Paulo Portas, separando assim o PSD do PPD, através de um Congresso fundacional que crie um novo Partido, Jorge Sampaio não encontrará motivo suficiente, à luz da actual Constituição, para demitir o actual Governo, dissolver a Assembleia da República e convocar Eleições Legislativas antecipadas.

Eu diria, portanto, que o futuro está nas mãos de Marcelo Rebelo de Sousa, Marques Mendes, Pacheco Pereira, em suma, de todos os verdadeiros social-democratas do partido que Pedro Santana Lopes herdou sem nenhuma legitimidade.

O-A-M #55 07 Outubro 2004

domingo, outubro 03, 2004

Socrates 4

John F. Kennedy

A sombra de Kennedy?


Aparentemente temos o PS de volta.
Em primeiro lugar, porque o Congresso marcou um ponto de viragem nos hábitos de opacidade das múltiplas organizações da nossa democracia. Não apenas o PSD e o PP, mas também o Bloco de Esquerda e o PC, a CGTP e a UGT, as associações profissionais e as ditas organizações não governamentais, a partir de agora, terão que pensar muito seriamente no refrescamento dos esquemas de escolha e validação daqueles que em seu nome falam e decidem. Este foi sobretudo o mérito da mediatização da campanha eleitoral que precedeu o Congresso, e da emergência de uma verdadeira ala esquerda dentro do PS, protagonizada por Manuel Alegre.
Em segundo lugar, porque o tele-ponto que guiou as intervenções de José Sócrates permitiu emitir para todos nós um conjunto de mensagens meticulosamente estudadas. E estudadas, não para ecoarem como simples efeitos de retórica populista (à maneira de tudo o que Santana Lopes diz e desdiz), mas para perdurarem como pistas de um ideário de acção e de governo em plena formação. O PS de José Sócrates quer retomar o caminho prudente de António Guterres, mas ambiciona aprofundar um contrato político sério com os mais atentos da nossa sociedade, propondo, por assim dizer, uma exigente partilha de responsabilidades. A tal chamou “Novas Fronteiras”: Conhecimento, Tecnologia, Decisão, Competitividade, Ambiente. Faltou apenas um tema crucial: Sustentabilidade...
Em terceiro lugar, porque a esmagadora maioria obtida por José Sócrates (que não retira nenhuma importância, antes pelo contrário, ao peso político daqueles que se reuniram em volta de Manuel Alegre), lhe permitirá congregar o PS nas principais batalhas eleitorais que se avizinham, as quais, se correrem bem, poderão garantir o regresso do Partido Socialista ao Governo já em 2006.
Até aqui, tudo bem...
Falta agora descortinar o enigma da convocação dos mortos!

José Sócrates resolveu chamar John F. Kennedy do além, ao que parece, para patrocinar o “new deal” que pretende propor, desde já, aos Portugueses. Longe vá o agoiro! E Porquê? Porque Kennedy, e todos os que antes e depois dele tentaram recuperar o famoso New Deal de Franklin Roosevelt, falharam! Kennedy, que se propôs levar os norte-americanos até uma New Frontier (que Eisenhower, antes dele anunciara, e não conseguiu alcançar), apenas atingiu um dos objectivos desse seu famoso programa: ultrapassar a União Soviética na corrida espacial. Todos os restantes objectivos, de natureza sobretudo social e económica, falharam! Como falharam mais tarde os programas semelhantes ao New Deal, de Lyndon B. Johnson (a Great Society) e de Bill Clinton (o New Covenant).
A receita Keynesiana de Roosevelt para a primeira Grande Recessão que atingiu os Estados Unidos em 1929 acabaria por dar excelentes resultados, quer nos cuidados intensivos prestados a uma economia e a uma sociedade apanhada pela espiral negra das falências empresariais e do desemprego, quer na aura imensa deixada pelo New Deal na História do Capitalismo do século 20. A verdade, porém, é que a mesma receita parece impossível de aplicar nas sociedades capitalistas actuais, por um conjunto de razões basicamente dependentes de três gandes fenómenos implosivos:
— a crise energética mundial (que nada parece ser capaz de inverter);
— a crise ecológica global provocada, entre outros factores, pelo aquecimento do planeta, pela falta de água, pela destruição das florestas e pela contaminação dos mares e grandes lagos;
— a reificação financeira do sistema económico mundial, cujos processos de globalização impedem qualquer eficácia duradoura nas políticas económicas nacionais, ou mesmo regionais (Comunidade Europeia, etc.)

O que é que nós podemos fazer por Portugal? O que é que todos poderão fazer pelo mundo? — perguntam os espíritos angustiados de hoje. Bom, algo mais do muito que se fez no tempo de Roosevelt, e certamente muitíssimo mais do que foi feito durante a breve e trágica passagem do jovem Kennedy pela Casa Branca. A evocação de Sócrates evidencia, todavia, uma preocupação profunda. Será seguramente precisa muita imaginação, muito estudo e muitíssima coragem para definir a estratégia de eutanásia que teremos necessariamente que administrar à exangue Sociedade de Consumo. Resta saber se o novo candidato a Primeiro-Ministro conseguirá galvanizar a sociedade para a penosa tarefa de abrir os olhos para a realidade que nos espera. Lembrem-se só que a carnificina do Iraque e do Médio Oriente é apenas o começo de uma luta fratricida por um recurso energético sem o qual ainda ninguém sabe como sobreviver: o petróleo.

O-A-M #54 03 Outubro 2004

Livros escolares

Deputados, professores, editores e sindicalistas (apenas parte deles, claro) instalaram no País uma rede de cumplicidades altamente duvidosa, cujo resultado é o inacreditável negócio dos livros escolares. Cada escola decide como quer os livros que impõe aos seus alunos. Os livros, por sua vez, são “actualizados” praticamente todos os anos. Como se não bastassem estes manuais, os empresários do sector (os editores) inventaram e convenceram os profs que seria muito interessante juntar aos ditos, uns cadernozitos de exercícios, e fazer uns lindos pacotes (“bundles”, como dizem os anglo-saxões), de que os pais não conseguem safar-se, mesmo que achem tais apêndices um substituto indecente da própria actividade esperada dos docentes. Como o peso dos custos assumidos pelas famílias com este negócio indecente não pára de crescer, os generosos bancos deste País matraqueiam os média com publicidade enganosa sobre a solução milagrosa dos seus créditos à compra de livros escolares — compre agora, e pague depois! Concluindo: o negócio do livro escolar, tal como está, precisa urgentemente de ser objecto de um inquérito implacável, pois tudo leva a crer que o mesmo se transformou nos últimos anos (com o beneplácito do PS e do PSD) numa ilegítima, irracional, inadmissível, escandalosa e pouco menos que mafiosa actividade. O País é pobre, os políticos são os primeiros a sabê-lo, e alguém anda a roubar as famílias portuguesas à pala do direito à educação!

Se há um ensino obrigatório, universal e gratuito para os primeiros doze anos de vida de cada cidadão, é óbvio que tal gratuitidade deve abranger os manuais escolares, e assim sendo, a produção destes e a sua utilização devem obedecer a uma gestão de recursos inteligente e rigorosa. Isto significa, por exemplo, que para cada disciplina devrá haver apenas um ou dois modelos disponíveis, sendo que ambos terão que obedecer aos conteúdos pedagógicos e respectiva metodologia expositiva decididos em sede governamental (seja esta o Ministério da Educação, ou outra instância reguladora, por exemplo, um Conselho Nacional de Educação, onde tenham assento as várias partes envolvidas no préstimo e recepção do bem educativo). A actualização objectiva das matérias pedagógicas a transmitir aos alunos deve ser produzida com conta, peso e medida, e sobretudo com um enorme sentido de responsabilidade científica, pedagógica e orçamental. Como pode aliás ser doutra maneira, quando todos os exames de fim de curso, ou ainda de acesso a graus subsequentes de ensino, são, como devem ser, exames nacionais? Como pode co-existir a actual bandalheira dos manuais escolares com a norma dos exames nacionais?! Cheira demais a negócio sórdido e a cumplicidade de interesses, para que não se exija de imediato a mudança radical do actual regime.
Para os que argumentam contra a gratuitidade dos livros escolares necessários ao cumprimento da escolaridade obrigatória, com base no peso desta medida no OGE, a resposta é simples: se o ensino é obrigatório, por fazer parte de uma assunção constitucional, e sobretudo estratégica, da nossa identidade cultural, então as ferramentas básicas do mesmo devem ser facultadas gratuitamente. Refiro-me, naturalmente, aos livros escolares, ao transporte escolar, ao desporto e outras actividades extra-curriculares realizadas no interior do recinto escolar e ainda aos apoios pedagógicos especiais. Tudo isto é óbvio, mas não necessariamente insuportável em termos orçamentais. Um exemplo: já alguém pensou na poupança que poderíamos ganhar imediatamente com a distribuição gratuita dos manuais escolares se os mesmos fossem distribuidos via Internet, em formato PDF, deixando-se aos alunos a opção de imprimir ou não, em cada momento, as páginas necessárias ao seu trabalho?

Pois aqui está uma “nova fronteira” a ultrapassar pelas novas energias convocadas por José Sócrates.

O-A-M #53 03 Outubro 2004