Out., 14, 2003: 1 barril de crude OPEP = 30 dll
Out., 14, 2004: 1 barril de crude OPEP = 54 dll
“Em 1979, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) tinha um excesso de capacidade produtiva de 47.5 milhões de barris de petróleo por dia. Vinte anos mais tarde, em 1999, essa capacidade sobressalente tinha sido reduzida para 400 mil barris/ dia e a procura global subira para 77 milhões de barris/ dia. Hoje a OPEP não tem praticamente nenhuma nova torneira que possa abrir e a procura está nos 84 milhões de barris/dia — um salto de quase 10%.”
— Kris Axtman, Why the rude oil prices?; The Christian Science Monitor, 15 Out. 2004
Observadores atentos e independentes afirmaram há já algum tempo que o barril de crude da OPEP pode chegar aos 60 dll antes do fim deste ano. Mesmo que depois regresse aos 40 dll por barril, tal inversão de tendência será passageira, dando lugar a novos ciclos altistas. A verdade é que este recurso energético, no qual repousou o essencial da segunda revolução industrial (1930 em diante) e a chamada sociedade de consumo, se aproxima a passos muito rápidos do chamado “peak of oil production”, isto é, do ponto a partir do qual todo o petróleo disponível será, para todos os efeitos, o último! Os Estados Unidos atingiram este ponto crítico na década de 70, e por isso têm que assassinar Presidentes na América Latina, financiar e armar o Estado de Israel, corromper e alimentar ditaduras no mundo árabe e desencadear guerras preventivas contra toda e qualquer ameaça às fontes petrolíferas onde se abastecem (salvaguardando o mais possível a sua própria Reserva Estratégica de Petróleo).
A produção de petróleo per capita começou a declinar de forma consistente em 1979, e o início da queda absoluta da produção a nível global começará, segundo Richard C. Duncan, em 2006 (a uma taxa de 2.45% ao ano, durante 34 anos!). Quer dizer, daqui a um ano e meio, poderemos estar já a lidar com preços de crude na ordem dos 100 dll/barril. Em 2008, ainda segundo as previsões de Duncan, as reservas de países como os EUA, México, Noruega, Angola, Rússia, Afeganistão, Urzebequistão, Azerbeijão, etc., começarão a decair mais depressa que as reservas da OPEC (Venezuela, Nigéria, Líbia, Argélia, Arábia Saudita, Emiratos Árabes Unidos, Qatar, Kwait, Irão, Iraque e Indonésia), colocando estes países numa clara posição de supremacia energética, mas também no centro de gigantescas disputas estratégicas. Pior do que isso, como nada de substancial se fez quanto ao crescimento populacional, à poluição e à devastação dos recursos naturais não-renováveis desde que Donella H. Meadows e a sua equipa publicaram “The Limits to Growth”, em 1972, 2006 poderá ser também o primeiro ano do fim da presente era antropológica. As crises energéticas suceder-se-ão a um ritmo imparável e tendencialmente catastrófico. Com elas sobrevirão todo o estilo de guerras e conflitos: guerras mini-nucleares, guerras hiper-tecnológicas, guerras assimétricas aterradoras, golpes de Estado, Estados de Emergência, e um longo etc que qualquer um de nós pode ir começando a imaginar. Ponderando as várias previsões sérias existentes, podemos esperar com razoável probabilidade que a grande implosão civilizacional inicie o seu movimento de não-retorno entre 2020 e 2030.
Como se imaginará, as presentes disputas políticas, nomeadamente em Portugal, embora reflictam já o estado de pânico que subrepticiamente vai tomando conta de quem pensa e de quem tem que decidir, estão a anos-luz do discurso informado que é necessário elaborar para nos prepararmos para a hecatombe que aí vem. O mundo não se desboroará de modo homogéneo. Uns cairão estrondosamente e depressa, outros conseguirão adiar a tragédia por mais umas décadas, ou mesmo sobreviver e adaptar-se. Mas para redesenhar a civilização por vir, temos que conhecer a verdade sobre o presente. E se os partidos políticos forem incapazes de o fazer, outras formas de organização e acção política poderão e deverão fazê-lo, em nome da sustentabilidade, da sobrevivência civilizacional e da vida.
Post-scriptum
As Moai da Ilha de Páscoa — A população desta pequena ilha (descoberta pelos holandeses em 1722) ultrapassou o seu pico de sustentabilidade por volta dos 10 mil habitantes. Os recursos tornaram-se escassos e as outrora luxuriantes florestas de palmeiras foram destruídas, para uso como fonte de energia e para dar lugar a terrenos de cultivo. A avançada ordem social de que gozavam começou então a declinar rapidamente, dando lugar a guerras civis e ao canibalismo. Supõe-se que todas as grandes e impressionantes estátuas da ilha (as Moai) foram derrubadas pelos próprios ilhéus no decurso da prolongada crise que acabou com o seu equilibrado modelo civilizacional. A população, por efeito da exaustão dos recursos disponíveis (e das doenças e escravatura trazidas pelos colonizadores europeus), viria a reduzir-se até pouco mais do que uma centena de habitantes. O mais curioso desta história é que os sobreviventes desconheciam a profunda crise que os levara até à situação em que estavam...
O-A-M #59 16 Outubro 2004