o Gato, o Rato e o fim do extremo-centrismo
A actual maioria tinha um pequeno problema mediático de fim-de-semana: o congresso do Partido Socialista.
A abertura do conclave dera o tom, e o tom não era nada bonito para a actual coligação ilegítima que cavalga o País. Havia, por conseguinte, que roubar a cacha ao PS nos principais mass media dos indígenas. E assim se fez, sob a batuta do mais descafeínado dos pasquins oficiais: o Expresso.
Paulo Portas e Santana Lopes, ou alguém solícito por ambos, encarregou-se de deixar cair a dica num bitoque do Snob. A nódoa alastrou até Paço d'Arcos, e ei-la replicando-se e triplicando-se por tudo quanto é câmara mediática da mais imbecil imprensa do mundo. Como a coisa não tinha nenhum fundamento, a não ser o da necessidade de esfregar as nossas trombinhas atávicas com um pouco de emoção cor-de-rosa, e roubar espaço e tempo à pedrada no charco atirada pelo actual congresso do PS, logo chegaram os desmentidos da praxe. Enfim, somos todos parvos, não é verdade?
Mas já agora... duas ideias para treinar a mioleira embatucada de muitos de nós.
Ao contrário do que o toque a reunir da burocracia do PS tenta fazer crer, a verdade é que o PS extremo-centrista morreu. E morreu pela mesma razão que o Soarismo morreu: o Muro de Berlim caíu em 1989 e já não há fundos comunitários para alimentar a endogamia, o cabotinismo e a irresponsabilidade que imperaram nesta praia Lusitana ao longo dos últimos vinte anos. Como se isto não bastasse, não há nem vai haver nenhuma retoma da economia mundial nos tempos mais próximos, e quando ela vier, se vier, será uma retoma anémica e passageira (como as muitas recentemente anunciadas). Em suma, o desastre do Iraque e o modo como o Ocidente enfeudado a Bush pretende enfrentar o tema do Terrorismo (podemos lançar a ARTE CONTRA O TERRORISMO, mas não podemos lançar e propagandear uma GUERRA CONTRA O TERRORISMO), apenas irá piorar os cenários já de si muito graves da crise energética, ecológica e humanitária em que estamos metidos até ao pescoço. Abreviando razões, o PS só pode mesmo caminhar num sentido: o da defesa inteligente dos mais fracos, que em breve serão milhões, e o da defesa de uma reimposição estratégica do Estado no jogo das necessidades e das vontades do conjunto da população que aqui vive, trabalha, ou simplesmente sobrevive. Resta apenas saber se esta viragem do PS para a realidade será operada por Sócrates, ou directamente por Guterres (cujo silêncio parece augurar um exercício de penitência e humildade genuíno...) Cá estaremos para dar uma ajudinha! Preconceitos para trás! Precisamos de um pragmatismo de tipo novo, i.e de emergência.
Por outro lado, na banda direitinha do espectro partidário, o panorama caminha na direcção diametralmente oposta: quando o centro eleitoral estoirar, o PP sairá finalmente do interior do seu cavalo de Tróia (i.e. a coligação governamental, sabiamente cavalgada por Paulo Portas) para fundar um novo Partido, verdadeiramente populista e verdadeiramente de direita. O PSD já começou o seu processo de desagregação, sob o impacto insistente do núcelo duro do PP, extraordinariamente potenciado e acelerado pela inépcia caricata de Santana Lopes esse génio de telenovela que os jornalistas da nossa imprensa tradicional tanto adoram e adulam. Paulo Portas tem-no efectivamente agarrado pelos c... Nada separará, tão cedo, estes siameses. Salvo Jorge Sampaio, se deixar de ser o verbo de encher que tem sido ultimamente e, por uma vez, assumir as suas responsabilidades institucionais com inteligência histórica. Só nessa eventualidade improvável, os planos de Portas sofreriam algum atraso. Até lá, o Paulinho continuará a brincar com o Pedrinho, como os gatos brincam com os ratos... antes de os comerem.
O-A-M # 52 03 Outubro 2004
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