Levianamente pró-Ota
Comentário de um Anónimo: (...)Onde se situa maioritariamente a população portuguesa, a Sul do Tejo ou a Norte? Se o aeroporto se situar longe do centro de gravidade populacional isso não irá obrigar a um maior número de deslocações, isto é, não perderemos todos, não teremos maiores custos de deslocação, mais gastos de combustível, maiores impactos ambientais?
Sendo impensável nos dias de hoje construir um aeroporto que não seja servido por um transporte de massas de tipo ferroviário, não será rentabilizador que o shuttle do aeroporto utilize a mesma infraestrutura do TGV, o qual deverá obrigatoriamente (...) ligar as duas maiores concentrações urbanas portuguesas, Lisboa e Porto?
Claro que um aeroporto situado na Ota vai tornar absurdo que se voe entre Lisboa e o Porto, mas isso não será uma vantagem decorrente da própria existência do TGV? O TGV foi criado precisamente para substituir o avião nas ligações de curta/média distância. O ambiente ganhará com isso, a comodidade dos utilizadores também (...)
RESPOSTA
Talvez alguém queira responder a estas objecções. Seja como for, creio que a presumível existência de um lobby pró-Rio Frio, com interesses instalados na região, não desculpa os fundos de investimento imobiliário que presumivelmente realizaram já avultadas apostas na Ota (pressionando presumivelmente os governos de turno para a consumação da prometida aventura). Aliás, o modo ligeiro como José Sócrates tem vindo ultimamente a abordar o binómio Ota TGV pode muito bem vir a custar-lhe caro no futuro. Os erros da Administração, quando se devem à teimosia irresponsável e leviana dos governantes (sobretudo quando foram atempadamente avisados), devem ser pagos por quem os comete, e não pelo consumidor anónimo. Cá estaremos para contabilizar os dividendos e as perdas — no momento próprio.
A mim parece-me evidente que na hipótese, que todos parecem partilhar pacificamente, de o tráfego aéreo continuar a crescer de forma sustentada ao longo desta e da próxima década (do que duvido seriamente), então um novo aeroporto na margem Sul do Tejo faria todo o sentido, por contraposição à hipótese da Ota. Vejamos porquê:
1. A opção da Ota reduzirá o aeroporto Sá Carneiro a um aeródromo local. Pelo contrário, um aeroporto na margem Sul do Tejo, permitiria elevar o aeroporto da Maia à condição de verdadeira interface aérea regional do Noroeste peninsular.
2. A opção da Ota é tecnicamente arriscada devido às características climáticas da zona (nevoeiros intensos e quase permanentes nos períodos de maior tráfego aéreo). Implica correções topográficas de grande envergadura, caríssimas e obviamente atentatórias do ambiente. A margem Sul, de Lisboa a Setúbal, pelo contrário, oferece alternativas mais amenas, menos caras e menos conflituosas com o meio ambiente.
3. A opção da Ota inviabiliza uma ligação ferroviária rápida e limpa (bitola europeia) entre Lisboa e Madrid. Hoje em dia continuamos a precisar de oito horas para chegar a Madrid por via férrea, e as mesmas oito horas, se optarmos pelos autocarros que saiem da Gare do Oriente! Ora nada poderá acelerar melhor as sinergias económicas entre os dois países do que o fortalecimento da conectividade entre as duas capitais ibéricas. Mas para tal precisamos de garantir uma ligação ferroviária rápida entre as duas cidades, quer dizer, entre a Atocha (ou a Estación del Norte) e a Gare do Oriente. Uma ligação que transporte de hora a hora pessoas e mercadorias entre uma Comunidad de Madrid, com cinco milhões de habitantes, e a Grande Área Metropolitana de Lisboa, a caminho dos três milhões. O TGV entre Lisboa e Madrid, e uma linha férrea para transporte de petróleo (cada vez mais caro) de Sines para a nova refinaria da Extremadura espanhola (já decidida pelo Governo Espanhol e aceite pela Junta de Extremadura), são duas condições básicas para o desenvolvimento fluído das novas relações entre Portugal e Espanha. E seguramente também um bom seguro de vida para a ameaçada unidade interna do Estado Espanhol.
4. O fortalecimento do eixo Porto-Vigo, como espinha dorsal do projecto perfeitamente alcançável, de elevar o Grande Porto à condição de capital estratégica do Noroeste Peninsular, só poderá ter pernas para andar se, entretanto, for claramente fortalecida a ligação entre as duas capitais ibéricas.
5. Finalmente, por ser cada vez mais evidente a aproximação de um cenário global de crise económica, política e militar, provocado sobretudo pelo pico da produção petrolífera mundial, parece-me que a própria hipótese de se vir a construir um novo aeroporto internacional com as ambições da Ota (ou de Rio Frio) está, irremediavelmente, em causa. Uma ligação ferroviária rápida entre Lisboa e Madrid, para passageiros e carga, e uma linha férrea eficiente entre Sines e a futura refinaria na Extremadura espanhola, associadas a uma estratégia de ampliação/actualização dos aeroportos da Portela, Alverca, Montijo e Tires, são opções mais do que suficientes para as nossas reais necessidades num horizonte de 20-30 anos.
O País terá que se adaptar rapidamente a uma estratégia de mitigação dos efeitos catastróficos do encarecimento exponencial das energias fósseis como o petróleo, o gás natural e o carvão. As boas ligações a Espanha e à Europa são importantes. Mas ainda mais importante, será lançarmos ao longo da presente década um verdadeiro plano de emergência energética e alimentar, e acautelarmos sem hesitações o controlo apertado das nossas águas territoriais e espaços aéreos, protegendo os respectivos recursos marítimos, monitorizando rigorosamente o tráfego civil e militar.
Por estas razões, que são fortes, a opção da Ota não passa de uma imbecilidade estratégica, contra a qual esperemos que não seja necessário organizar um levantamento cívico nacional!
Actualização: ver a propósito o artigo publicado por Rui Rodrigues no Público de 14 Nov.
Última hora!
O-A-M #97 12 Nov 2005
1 comentário:
Os engenheiros que andaram a comprar terrenos na OTA em antecipação,agora fodem-se. C'est la vie. Deus não perdoa opurtunistas que se aproveitam por trabalharem dentro do sistema , para tentar enriquecer a custa das decisoes de localização de infraestruturas do país.
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