Se o actual presidente da república se confessa impotente para atalhar casos de corrupção no seu quintal e os três presidentes que o antecederam hesitam em dar sinais de preocupação pela manutenção em funções de um primeiro ministro protagonizado por uma personagem sobre a qual se acumulam suspeições públicas documentadas de corrupção, então talvez os monárquicos tenham razão e esteja na hora de referendar o regresso à monarquia — uma monarquia constitucional e democrática, claro, como sucede em 12 estados europeus.
Eu não sou doido. Se ler esta nota até ao fim perceberá porquê.
Nenhum país pode endividar-se continuamente por largos períodos sem ver o regime que permite e fomenta tal endividamento colapsar ou ser fortemente abalado por convulsões, guerras civis e revoluções. Há quem diga que 50 anos de bloqueio estratégico, endividamento compulsivo, irresponsabilidade e corrupção são suficientes para deitar abaixo qualquer regime político, por mais democrático que seja.
A transferência da hegemonia económica mundial da Europa para a Ásia tem sobretudo que ver com este fenómeno. A deterioração crescente dos termos de troca entre os Estados Unidos e o resto do mundo, sobretudo Ásia e Médio Oriente, acentua-se de forma irremediável a partir do início da década de 1970, daqui resultando a previsão de o poder imperial ainda residente em Washington ter começado ontem formalmente a sua deslocação acelerada em direcção a Pequim, onde deverá chegar antes de 2020.
Vejamos o caso português. A queda da monarquia deu-se na sequência de uma crise agrícola interna muito grande e prolongada, provocada por vários factores conjugados: fim da protecção britânica à importação de vinhos portugueses; pragas do oídio e da filoxera (1852, 1867); e ainda a estagnação internacional do mercado do vinho.
Esta crise levou centenas de milhar de portugueses a emigrar para o Brasil: 332 312, entre 1856-1900; 754 147, de 1900 a 1930, decaindo depois abruptamente: 148 699 entre 1931 e 1950... (in Wikipedia).
Esta emigração que, como se vê, cresceu brutalmente com a crise do vinho, e mais ainda durante a primeira república, funcionou como uma verdadeira exportação de mão de obra, na medida em que a maioria dos novos "brasileiros" enviava dinheiro para Portugal. No entanto, a implantação da república no Brasil (1890-1907) quase destruiu a moeda brasileira que os portugueses emigrados enviavam para as suas aldeias via Londres, daí resultando a desvalorização da própria moeda portuguesa e o consequente agravamento da nossa balança de pagamentos (1).
Resumindo e concluindo, o endividamento português induzido pelo abandono dos campos e pela deterioração da moeda conduziu à queda sucessiva da monarquia e da primeira república. O que a ditadura basicamente fez depois foi poupar e recompor as reservas do país, permitindo um primeiro período longo de recuperação (1931-1960), e depois uma verdadeira expansão económica (1961-1974), em grande medida potenciada pela guerra colonial e pelas receitas da nova emigração para a França e Alemanha. A ditadura caiu, ironicamente, em plena fase de expansão económica, por causa de uma guerra injusta, condenada a ser perdida, e porque o desenvolvimento económico e intelectual do país já não suportavam o colete da ditadura, mesmo amaciada durante o consulado de Marcelo Caetano.
O monarquia tombou porque não resistiu a 58 anos seguidos de sub-produção e endividamento. A primeira república colapsou porque não soube inverter este ciclo negativo e o agravou. O regime de 48 anos de ditadura republicana morreu do seu próprio êxito económico e por óbvias causas políticas. E agora?
Desde 1974, apesar da liberdade e democracia que temos, Portugal tem vindo a recair no ciclo negro da desertificação dos campos, da destruição da sua infraestrutura industrial, do desemprego, do endividamento excessivo e de uma nova e entranhada corrupção do Estado. Já lá vão 35 anos. Pelas minhas estimativas, este ciclo negativo não deverá durar mais quinze anos. 2024 é, como muito, o limite a partir do qual ocorrerá o colapso do actual regime.
É pois necessário agir já, se quisermos evitar o catastrófico cenário desenhado. Sem hesitação, nem complacências. Mas para isso precisamos, ao menos, que o poder supostamente moderador da presidência da república funcione! Ora não tem dado mostras de funcionar. Cavaco parece um pau e os presidentes que o antecederam estão resignados às suas próprias culpas no cartório.
Se assim é, talvez tenha chegado a hora de repensar a república e de levá-la a referendo.
Ao senhor Duarte de Bragança faço uma recomendação séria: esteja caladinho e prepare os seus filhos com a mais esmerada educação possível. Pode vir a ser necessário!
NOTAS
Então tudo o que se passava no Brasil tinha reflexos imediatos no valor da moeda face á libra. Isto foi verdade na guerra do Paraguai (1868-71) e particularmente grave na implantação da republica do Brasil (1890-1907).
A desvalorização da moeda face ao exterior provocava o imediato aumento da Dívida Pública, e de facto o crescente endividamento que se verifica desde 1890 não advém de um endividamento real, mas do menor valor da moeda.
Na altura todos queriam ver culpados no Fontes ou numa conspiração inglesa. Foi num estudo de 1915 ( "O Ágio", Salazar) por um académico de nome Oliveira Salazar, que se provou o que já era sugerido por alguns... Foi o câmbio da moeda brasileira que determinou o câmbio da moeda nacional até 1907.
Tudo estava bem se tudo estivesse bem no Brasil (e Dom Carlos sabia-o), mas desde Novembro de 1889, com o fim da monarquia no Brasil que este país descambou num Carnaval de golpes de Estado, sendo que em 1891 já as praças internacionais previam a bancarrota, com o cambio da moeda portuguesa a cair 25% e as transferências do Brasil a passarem de 4355 contos (1888) para 800 contos em 1891, uma queda de 80%. — in 1ª república e economia, Ricardo Gomes da Silva, SomosPortugueses.com.
OAM 569 03-04-2009 19:25
4 comentários:
Há muitos portugueses que consideram a democracia uma balda, que confundem democracia com cada um fazer aquilo que quer, e que consideram a ditadura o único sistema político realista para Portugal.
Para eles as democracias são curtos períodos de descontrolo e de desregramento num país que tem que ser governado por regimes autoritários, inquisições e outros sistemas repressores, e de que esperam aproveitar também um pouco.
Este grupo de portugueses são um grupo esquivo, recalcitrante, pouco ambicioso e com problemas de autoridade que, ou aceitam viver em ditadura ou consentem que a democracia seja um abuso permanente, da qual aspiram também a retirar um bocado.
A moderna democracia portuguesa, por exemplo, amordaçou a justiça, e as leis permitem uma corrupção permanente.
A melhoria da administração e dos serviços públicos em Portugal só se fará com a reversão deste conceito. Por exemplo com auditorias sistemáticas e permanentes a todos os locais de trabalho, a qualquer hora do dia ou da noite, que reponham a funcionar um sistema podre, corrupto e caduco.
Realmente, ou isto ou a ditadura.
Caro António Maria,
bom texto!
Apesar de não concordar com o paralelo entre a deterioração dos termos de troca e a depreciação da moeda (a Balança Comercial da época era residual e quase inexistente no sector agricola, apesar de exportarmos muitos de 2 ou 3 produtos de grande qualidade) para apontar uma grande causa (a crise agricola)....existem muitos autores que referem uma "crise agricola" na época....eu penso que Portugal está em crise agricola desde as descobertas (inicio das emigrações em massa que despovoaram os campos)
Como afirmei, apesar de discordar neste pequeno ponto concordo com tudo em geral e especialmente com a conclusão (tirando a parte de D. Duarte em silêncio, porque acho que SAR faz um esforço consideravel para perceber as dinâmicas do Pais sem os mais de 40 consultores que todos os PR têm) Iremos precisar da Monarquia !
De facto estamos hoje a atravessar uma crise quase fotocopiada desta altura (final do sec XIX)
bem haja, caro OAM
Caro Ricardo,
A minha referência ao herdeiro da casa real traz água no bico. Ou seja, o que eu proponho é que os monárquicos comecem a trabalhar a sério numa estratégia de longo prazo. E mais não digo ;-)
Caro António Cerveira Pinto
Gostei do texto, mas não do último parágrafo...
A estratégia não vai ser de longo prazo, espero, porque estamos a trabalhar muito e sentar S.A.R., O Senhor Dom Duarte no Trono de Portugal que está vazio há 100 anos!
Chega de república porque Portugal não tem origens republicanas e é por isso que também estamos há 100 anos na cauda da Europa!
Tenho um blogue dedicado à Família Real Portuguesa e tenho muito gosto que o visite - http://realfamiliaportuguesa.blogspot.com
Bem haja e sucesso para o seu blogue
Maria
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