Telegramas diplomáticos confidenciais divulgados pelo WikiLeaks revelam a incapacidade da Arábia Saudita de impedir a subida dos preços do petróleo, e o declínio a curto prazo da sua produção.
WikiLeaks cables: Saudi Arabia cannot pump enough oil to keep a lid on prices
US diplomat convinced by Saudi expert that reserves of world's biggest oil exporter have been overstated by nearly 40%
(…) According to the cables, which date between 2007-09, Husseini said Saudi Arabia might reach an output of 12m barrels a day in 10 years but before then – possibly as early as 2012 – global oil production would have hit its highest point. This crunch point is known as "peak oil".
Husseini said that at that point Aramco would not be able to stop the rise of global oil prices because the Saudi energy industry had overstated its recoverable reserves to spur foreign investment. He argued that Aramco had badly underestimated the time needed to bring new oil on tap.
"(…) Aramco's reserves are overstated by as much as 300bn barrels. In his view once 50% of original proven reserves has been reached … a steady output in decline will ensue and no amount of effort will be able to stop it. He believes that what will result is a plateau in total output that will last approximately 15 years followed by decreasing output" — Guardian, Tueaday 8 Feburary 2011.
Uma das consequências da revolução democrática que varre a margem sul do Mediterrâneo, com fortes possibilidades de se estender à Arábia Saudita, Iémen e vários outros países africanos populosos e jovens, será um maior consumo mundial de petróleo e gás natural. António Costa Silva adianta em artigo publicado no Expresso desta semana que este acréscimo será da ordem dos 30% nas próximas três décadas — se houver disponibilidade de produto, e quem possa pagar por ele, claro (acrescento eu). Ou seja, à pressão exercida pelo crescimento dos chamados países emergentes, entre os quais se incluem o Brasil, a Índia, a China e a Rússia, mas também a Turquia, o Vietname, a Tailândia e a Argentina, que crescem três a quatro vezes mais depressa do que os Estados Unidos e a União Europeia (ver quadro), virão somar-se ao longo desta e da próxima década uma série de vizinhos de longa data da Europa, onde o passado de colónias submissas poderá ter sido definitivamente enterrado no dia em que Hosni Mubarak foi apeado do poder.
Esta tendência para o equilíbrio mundial irá, no entanto, provocar uma tensão enorme nos mercados de matérias primas, dos alimentos básicos, e da energia. Pão, arroz, mas também todos os produtos industriais e serviços serão apanhados por uma onda prolongada e crescente de inflação, cuja origem primordial é, precisamente, a escassez progressiva do petróleo e a correspondente e imparável subida de preço. Nada do que se conhece tem o poder e a dimensão suficientes para substituir o petróleo e o gás natural na alimentação do estilo de vida e bem-estar criados pelo homem nos últimos duzentos anos.
As consequências deste facto, que um número crescente de indícios diplomáticos, relatórios oficiais e estatísticas comprovam, são praticamente inimagináveis. Desde 1972 que o relatório The Limits to Growth, encomendado aos cientistas Donella H. Meadows, Dennis L. Meadows, Jørgen Randers e William W. Behrens III, pelo Clube de Roma, previu o iminente colapso da civilização humana moderna em resultado de uma confluência galopante entre crescimento demográfico e exaustão das reservas potenciais de matérias-primas e alimentos. No vários cenários de The Limits to Growth, tal como no estudo pioneiro de 1956, desenvolvido por Hubbert M. King, "Nuclear Energy and the Fossil Fuels 'Drilling and Production Practice'" (PDF), o período compreendido entre 2030 e 2050 é apresentado como a barreira inultrapassável do actual paradigma energético do nosso crescimento como espécie. Sabe-se hoje que a energia nuclear não pode ser a salvação. E sabe-se que a única grande reserva energética disponível cuja capacidade de resposta se aproxima do petróleo e do gás natural é o carvão — depois de liquefeito. Acontece, porém, que esta operação é muito cara. Conclusão: o actual paradigma de desenvolvimento da espécie humana está irremediavelmente condenado — e a curto prazo! Se soubermos decrescer com graça, talvez nos safemos. Se não... a extinção parcial da espécie será a funesta herança que deixaremos aos nossos netos.
Enquanto o ruído surdo do fim dos tempos parece aproximar-se da nossa espécie, mas nos dá ainda algum tempo de análise e acção, a prioridade das prioridades chama-se eficiência energética — um bem que escasseia flagrantemente no nosso país. Se não pusermos rapidamente na ordem os piratas que nos levaram à falência, seremos dos primeiros povos a sucumbir!
A produção mundial de petróleo convencional estagnou em 2004. Por sua vez os autores da Teoria de Olduvai (The Olduvai Theory -- Energy, Population, and Industrial Civilization, by Richard C. Duncan ) defendem que em 1970 terminou o período de crescimento exponencial da produção de energia à escala mundial, daí decorrendo uma estagnação do valor médio da produção de energia per capita, a qual se terá estendido até 2008, ano que marca o princípio do fim da era industrial, bem como do crescimento demográfico, alimentado desde 1830 pelo uso intensivo de energia barata. Esta teoria, secundada por várias previsões desde finais do século 19 (Henry Adams em 1893, Frederick Ackerman em 1932, e King Hubbert em 1949), estima uma quebra da população humana mundial, de 6,9 mil milhões em 2015, para 2,0 mil milhões em 2050.
Segundo a Teoria de Olduvai (1), mais cedo ou mais tarde as redes eléctricas irão colapsar sob a forma de uma cascata global de cortes de energia irreversíveis (2)(3).
Desde 2004 que a produção petrolífera não vai além dos 85 milhões de barris por dia (85 MM bpd). É o chamado "plateau" (planalto) que assinala o fim de um crescimento exponencial. Ao mesmo tempo, 54 dos 65 mais importantes países produtores de petróleo (ou seja, 83%) já ultrapassarem o pico de produção. Em breve (2011...) o planalto em que se encontra actualmente a oferta mundial de petróleo dará passo ao declínio contínuo da produção, a uma taxa estimada entre 4,5% e 8% ao ano (Robert Hirsch.)
Mas se a produção quiser responder à pressão estimada da procura mundial, e atingir em dez anos (2010-2020) os almejados 112 MM bpd, então será necessário compensar o declínio produtivo já instalado com a extracção de mais 75 MM bpd de jazidas que todavia não foram descobertas. Ou seja, seria necessário acrescentar às reservas conhecidas, no decurso da próxima década, novas reservas, por descobrir, equivalentes a 8 Arábias Sauditas — quer dizer, a oito vezes o petróleo explorado e existente em todas as jazidas daquele deserto de excêntricos. Seria pois preciso descobrir e explorar um novo poço gigante em cada 15 meses ao longo dos próximos dez anos. Uma missão claramente impossível! Entre 2000 e 2007 o ritmo de descobertas de poços gigantes decaiu para uma média de 9 poços por década, quando na década de 1980 foi de 24, e nos anos 60, de 120.
Mas o mais aterrador é que, ao contrário do que se pensa, as chamadas energias alternativas jamais poderão restabelecer os extraordinários níveis de produção de energia per capita (e) que permitiram a aceleração histórica da modernidade. De facto, o declínio exponencial da produção petrolífera que começará a sentir-se de forma catastrófica em todo mundo por volta de 2011-2012, arrastará consigo o colapso do paradigma eléctrico desenvolvido entre 1880 e 1930. Não há petróleo sem electricidade... e não haverá electricidade (4) sem petróleo!
De algum modo poderá dizer-se que todos os problemas de sobre-população humana, alterações climáticas e destruição de recursos naturais e formas de vida induzidas pelo homem, serão em breve atalhados por um regresso catastrófico à agricultura e à dispersão corpuscular da humanidade. O sobressalto, até chegar a nova Idade Média, será muito mais drástico, mortal e aterrador do que o que decorreu da queda do Império Romano.
A actual implosão dos sistemas político-partidários (com o respectivo cortejo de corrupção, traições e populismo geral), o ciclo de depressão económica duradoura em que o mundo acaba de entrar e as guerras regionais, mundiais e civis que espreitam no horizonte, quando não estão já em curso, permitem-nos confirmar que a hora da nossa querida e louca civilização de prazer e consumo chegou ao fim.
É possível pensar em cenários e estratégias de mitigação da tragédia. Mas quererá alguém pô-los em prática?
POST SCRIPTUM
A propósito do desmiolado debate parlamentar em volta do surrealista programa de governo de José Sócrates (ainda sob o império corrupto e obtuso da Tríade de Macau), duas observações:
o lamentável espectáculo oferecido a todos nós pela Oposição (salvaguardando, diga-se em abono da verdade, a inflexibilidade lúcida de Manuela Ferreira Leite) é o exemplo acabado da exaustão do actual sistema partidário; desconhece o que se passa no mundo real, compraz-se com jogos florais populistas e não propõe uma única medida séria de mitigação para a actual crise sistémica;
não se podendo esperar nada de bom do actual regime político, teremos que começar urgentemente a estimular uma reorganização social a partir do zero. Ou melhor, a partir dos agrupamentos sociais elementares: famílias genéticas, profissionais e culturais, bairros, freguesias, aldeias, vilas e redes electrónicas de cidadania e inteligência colectiva (as grandes cidades terão que ser reestruturadas em redes de freguesias e bairros, e em redes electrónicas, enquanto puderem...) O exercício proposto é este: que precisa Portugal para aguentar o impacto do colapso energético em curso; que infraestrutura técnica e que tipo de organização do território precisará o país num cenário demográfico reduzido a 6 milhões de habitantes, com um PIB equivalente a 40-50% dos actuais 170 mil milhões de euros, num contexto internacional marcado pelo colapso sucessivo da Globalização e da União Europeia, e de uma mais do que provável e violenta fragmentação do reino de Espanha. Se não formos capazes de realizar este exercício de prospectiva estaremos certamente condenados a um triste fim.
2009 Commemorative Lecture : Dr. Dennis L. Meadows
NOTAS
A designação desta teoria provém da Garganta de Olduvai, uma região de desfiladeiros no Norte da Tanzânia, onde se crê que os primeiros hominídeos, antecedentes do homem actual, surgiram. Ver imagem da Olduvai Gorge.
"Peak Cheap Oil Update - Part I: The glass is half empty" (iTulip)
...Gasoline and diesel, distillates of crude oil, are unique as a liquid fuel. The amount of work a gallon of these fuels can do when by volume burned simply defies imagination. Consider the most mundane act of the automobile owner, stopping off at a gasoline station to refuel. A mere ten gallons of gasoline propels a two-ton vehicle hundreds of miles up and down hills at speed in excess of 60 miles per hour. Try pushing your car ten feet on a flat driveway and you will begin to appreciate how much work the gasoline in your tank is doing. The amount of work a liquid fuel can do by volume is referred to as its energy density. Liquid hydrogen, by comparison, has less than one third of the energy density of gasoline. That means that you need three times as much by volume to travel the same distance, assuming both the gasoline and hydrogen powered engines deliver the same number of miles per gallon.
You can pour the gasoline into your tank on a hot summer’s day or in winter when the temperature is well below zero. Crude oil can be shipped through pipes over long distances in a wide range of temperatures and climates.
Crude oil, and its distillates, is the one and only substance like this. No other liquid that humans can dig out of the ground, refine, and pour into a tank at any climate on earth even comes close. Every other liquid fuel, such as liquid hydrogen, has to be manufactured out of something else, then compressed, and if stored as a liquid kept at temperatures hundreds of degrees below zero. You cannot transport any other fuel through hundreds of miles of pipelines. Crude oil and its distillates can be piped over long distances at a wide range of naturally occurring temperatures, and stored cheaply in unpressurized tanks.
We are using up this unique and irreplaceable liquid fuel source several million times faster than it was created by nature hundreds of millions of years ago. In a little more than two human life spans can we have used up half of all of the oil that took several million human life spans to accumulate.
... [Robert] Hirsh says that the only practical solutions [for oil depletion mitigation] are: conservation and rationing, wider use of heavy oils, more intensive oil recovery from existing fields, and conversion of natural gas to liquids and coal to liquids.
Yet by Hirsh’s calculations, even if all of these methods of oil depletion mitigation are applied, assuming the optimistic 5% median annual global oil production decline rate, the world will still experience an oil shortage of 30% compared to current consumption rates.
...
In economic terms, higher oil prices means that the global economy will shrink.
Hirsh’s 2008 analysis of the impact of rising oil prices on economic growth revealed an approximate 1% decline in GDP per 1% decline in the oil supply. The 30% decline in oil supply in ten years following the end of the plateau in oil production at 5% per year, implies a 30% drop in GDP in a decade. During the first three years of The Great Depression, between 1930 and 1934, U.S. GDP declined 24%. Peak Oil implies a per-capita economic decline even more severe than The Great Depression, although the economic decline may be more gradual. -- inPeak Cheap Oil Update - Part I: The glass is half empty.
Hirsch (2008) quantified how historic declines in world oil supply caused proportionate declines in world GDP. He provides a framework for mitigation planning including:
"(1) a Best Case where maximum world oil production is followed by a multi-year plateau before the onset of a monatomic decline rate of 2-5% per year; (2) A Middling Case, where world oil production reaches a maximum, after which it drops into a long-term, 2-5% monotonic annual decline; and finally (3) a Worst Case, where the sharp peak of the Middling Case is degraded by oil exporter withholding, leading to world oil shortages growing potentially more rapidly than 2-5% per year, creating the most dire world economic impacts." -- in Wikipedia.
The Olduvai Theory -- Energy, Population, and Industrial Civilization, by Richard C. Duncan (PDF)
[...] The International Energy Agency (lEA, 2004) estimates that the cumulative worldwide energy investment funds required from 2003 to 2030 would be about $15.32 trillion (T, US 2000 $) allocated as follows: 1. Coal: $0.29T (1.9% of the total), 2. Oil: $2.69T (17.6%), 3. Gas: $2.69T (17.6%), 4. Electricity: $9.66T (63.1%). Thus the lEA projects that the worldwide investment funds essential for electricity will be 3.7 times the amount needed for oil alone, and much greater than all of that required for oil, gas, and coal combined. The OT says that the already debt-ridden nations, cities, and corporations will not be able to raise the $15.32 trillion in investment funds required by 2030 for world energy. (Not to mention the vastly greater investment funds required for agriculture, roads, streets, schools, railroads, water resources, sewer systems, and so forth.)
--
During the last two centuries we have known nothing but exponential growth and in parallel we have evolved what amounts to an exponential-growth culture, a culture so heavily dependent upon the continuance of exponential growth for its stability that it is incapable of reckoning with problems of no growth. (M. King Hubbert, 1976, p. 84)
1. Coal grew exponentially for 209 years: 1700- 1909. 2. Oil grew exponentially for 137 years: 1833-1970. 3. Natural gas grew exponentially for 90 years: 1880-1970. 4. Hydroelectric energy grew exponentially for 82 years: 1890-1972. 5. Nuclear-electric energy grew exponentially for 20 years: 1955-1975. Note well that none of the five sources of primary energy production grew exponentially after 1975.
World total energy production grew exponentially at about 4.6%/y from 1700 to 1909. Next it grew linearly at 2.2%/y from 1909 to 1930 and 1.5%/y from 1930 to 1945. Subsequently it surged exponentially at 5.5%/y from 1945 to 1970. This was followed by linear growth at 3.5%/y from 1970 to 1979. Thereafter world total energy production slowed to linear growth of about 1.5%/y from 1979 to 2003.
World population grew linearly at an average of 0.5%/y from 1850 to 1909; 0.8%/y from 1909 to 1930; 1.0%/y from 1930 to 1945; 1.7%/y from 1945 to 1970; 1.8%/y from 1970 to 1979; and 1.5%/y from 1979 to 2003 (UN, 2004; USCB, 2004).
Comparing the foregoing numbers: World total energy production easily outpaced world population growth from 1700 to 1979, but then from 1979 through 2003 total energy production and population growth went dead even at 1.5%/y each. World total energy production per capita, e, grew exponentially at 3.9%/y from 1700 to 1909. Thereafter it grew at linear rates of 1.4%/y from 1909 to 1930; 0.5%/y from 1930 to 1945; 3.7%/y from 1945 to 1970; 1.7%/y from 1970 to 1979; and 0.0%/y (i.e., zero net growth, called the ‘Plateau') from 1979 to 2003.