sábado, janeiro 22, 2011

Não voto

Para quê eleger mentirosos?
Estas eleições estão viciadas e são um insulto à inteligência democrática

A imprensa tradicional que ainda não se livrou das teias políticas do dinheiro continuam a dar amplo espaço de propaganda aos políticos e respectivos comentadores, para estes defenderem, como o pão que comem, o presente e arruinado status quo da democracia.

Só que a democracia, ou pelo menos boa parte das democracias ocidentais, envelheceu, burocratizou-se, corrompeu-se, deixou de ter uma base eleitoral maioritária e, em muitos casos, transformou-se numa espécie de película anti-conceptual cuja função primordial, mas inconfessável, é legitimar as minocracias que nas últimas décadas têm vindo a colonizar e arrasar os princípios elementares e fundadores da democracia.

Quando tomamos conhecimento da corrupção entranhada, e já considerada normal, das nomenclaturas político-partidárias que governam uma larga maioria dos estados europeus, sobra a pergunta: a que distância estão estas democracias dos regimes cleptocratas conhecidos em tantas partes do mundo?

Se as democracias degeneram em minocracias capturadas por partidos intelectualmente miseráveis e corruptos e pela mais escandalosa promiscuidade entre interesse público e especulação privada, que obrigação temos nós de alimentar semelhante caricatura civilizacional?

E se ainda por cima as democracias europeias, e a nossa também, se perverteram ao ponto de substituir a transparência e variedade democráticas por uma monocultura rotativista, de que os micro partidos com assento parlamentar são a mais insidiosa e castradora ilusão, de que valerá ao futuro dos nossos filhos e filhas legitimar pelo voto o que não pode deixar de ser uma tragédia anunciada?

Não. Tem que existir outro caminho!

As eleições presidenciais em curso são o exemplo descarado de uma falsificação democrática.

Alegre é um aborto político sem nome nem futuro, que nenhum rasto deixou da sua passagem de trinta anos pelo regime saído da queda da ditadura, e que à boca destas urnas, por causa do recebimento duns direitos de autor a que deveria ter renunciado (ainda por cima vindos de onde vinham — o covil de piratas financeiros chamado BPP), negou a realidade e os seus actos três vezes num só dia, qual Pedro renunciando Cristo. Serve para presidente da república? Não serve!

Cavaco é um falso economista e um falso político, mas quer ser presidente, precisamente, em nome destas duas qualidades. Como primeiro ministro que foi, depois de despedir um bom economista, Miguel Cadilhe, arquitectou e foi o inegável autor do monstro burocrático em que se transformou o Estado português. Com o vento comunitário e a inércia económica positiva a favor, apareceu aos olhos dos distraídos como um bom economista. Mas mal os ventos mudaram, tivemos todos que assistir àquela cena lamentável do Bolo Rei, às cenas indecorosas na Ponte 25 de Abril, ao colapso eleitoral, e ao ataque epiléptico que lhe percorreu o corpo ao passar a António Guterres o testemunho de um cargo de governação afinal falhado. Depois foi presidente, vencendo os improváveis candidatos do PS, e até eu (pasme-se!) defendi a sua utilidade como contra-peso ao novo e perigoso regime "socialista" entretanto instalado e que tomara o freio da corrupção nos dentes. Qual rainha de Inglaterra (neste caso, de Boliquieme), o presidente que tivemos nos últimos cinco anos, salvo os episódios em volta do estatuto de autonomia dos Açores (onde lhe dei razão), e o caricato tema das escutas em Belém, esteve literalmente a dormir na formatura. Como ex-primeiro ministro ("experiente", disse ele) não pressentiu nada; e como economista, nada previu, nem viu, até que Portugal se revelou, ao contrário do que afirmara repetidamente, um buraco negro de dívidas comparável ao da Grécia, da Irlanda e da Espanha. Leu certamente o Financial Times de 1 de Setembro de 2008 ("Pigs in muck"), que apontou os PIGS como elo fraco da cadeia do euro, mas preferiu olhar para o chão, e ouvir como um qualquer adolescente, ou mau aluno, o puxão de orelhas do seu colega economista, e presidente da República Checa, sobre o descalabro das contas públicas portuguesas, durante uma visita presidencial àquele país. Fez alguma coisa quando a crise escancarou a bancarrota do país? Não, ou melhor, preferiu continuar a elogiar a excelência do nosso sistema financeiro. Et pour cause! Quando o caso BPN surgiu, revelando ser a maior fraude financeira desde Alves dos Reis, Cavaco ficou em estado de choque, emudeceu, e, na minha opinião, degenerou numa espécie de vivo-morto presidencial comandado por uma difusa conspiração negra de vontades e interesses criminosos dissimulados. Deste sinistro caso de polícia, até aos pecadilhos indecorosos e inaceitáveis num ex-primeiro ministro com ambições presidenciais (refiro-me à mágica metamorfose da Vivenda Mariani em Vivenda Gaivota Azul), sobram sinais mais do que evidentes da nódoa, não apenas política, mas também ética, que Cavaco Silva é para uma qualquer verdadeira democracia.

Em conclusão, os dois principais candidatos presidenciais espelham bem a condição terminal do actual regime minocrático. Votar em qualquer deles significaria apenas um acto de masoquismo político, e um clamoroso erro de cidadania democrática. Se a democracia foi capturada por piratas, a nossa obrigação é resgatá-la, e não atirar-lhe pérolas.

Por fim, os candidatos "anti-sistema", censurados ou vituperados pela generalidade dos opinocratas pagos, directa (RTP,1 RTP-N, RTP2) ou indirectamente (TVI, SIC, TSF, DN, JN, etc.), com os nossos impostos, embora configurando soluções improváveis, terão certamente o mérito de expor as feridas da nossa aprisionada democracia. Se chegarem aos dez, ou mesmo aos quinze por cento da votação, num cenário fortemente marcado pela abstenção, o sinal de partida para uma refundação do regime ficará dado. Outros protestantes lhes seguirão os passos. Se forem um pouco mais jovens, e conseguirem arrastar para a causa pública os jovens que num futuro próximo deixarão de ter lugar para onde emigrar, a esperança de uma democracia mais representativa, ágil, transparente e menos corrupta do que a actual ganhará força. De momento impera o desânimo — e isso é a maior derrota que um regime pode sofrer.

quinta-feira, janeiro 20, 2011

Estado e liberdade

Alemanha, um exemplo a seguir...

Francisco de Goya - "Saturno devorando a un hijo", 1819-1823.

 Os países emergentes não são neoliberais, e os países governados por elites neoliberais são, aparentemente, responsáveis pela decadência do Ocidente, pela maior crise financeira desde 1929, e por uma vaga de destruição de riqueza (de empresas e de empregos) sem precedentes.

Esta é uma constatação a que não se consegue escapar. O mundo anglo-saxónico do dólar e da libra procuram resolver a actual crise financeira mundial insistindo estupidamente no abuso das práticas especulativas (Subprime; mais recentemente, a tentativa de criar um mercado mundial especulativo de emissões de carbono, etc.) e inflacionistas (Quantitative Easing; desvalorização competitiva das taxas de juro dos bancos centrais —Japão, EUA, UE; emissão imoderada de dívida pública; criação de moeda sob a forma de activos ficcionais, i.e. dívida pública, etc.) A Alemanha de centro-direita, pelo contrário, insiste na necessidade inadiável de impor uma maior disciplina orçamental aos governos e suas clientelas, e uma maior racionalidade nos negócios, insistindo também na necessidade de manter e potenciar elevados níveis de criação e produção efectiva de bens transaccionáveis, renovando as indústrias, com melhores tecnologias, mas também mais eficientes métodos de gestão e partilha social dos benefícios da produtividade e da competitividade. São duas visões que, curiosamente, continuam por debater — nos adequados termos que suscitam e merecem.

As duas citações que se seguem são bem sintomáticas do universo traçado por Christoph Schwennicke no excelente artigo publicado pelo Spiegel online. Que grande parte das pressões neoliberais na Alemanha tenha sido fruto, entretanto apodrecido, do SPD de Gerhard Schröder, é toda uma ironia política que o senhor Manuel Alegre, mas sobretudo quem no PS estuda a possibilidade de suceder a José Sócrates, deveriam estudar a fundo. Pois desse estudo poderá nascer um programa eleitoral que faça sentido e possa realmente prometer futuro a Portugal.

Tomás Correia: suspende pagamento
O Montepio (...) cessou as modalidade de reforma com juros de 4 a 6% por causa da crise e do aumento da esperança de vida. Já registava prejuízo de 30 milhões. — Correio da Manhã, 2011-01-19.

Central Bank steps up its cash support to Irish banks financed by institution printing own money

The Irish Independent learnt last night that the Central Bank of Ireland is financing €51bn of an emergency loan programme by printing its own money.
(…)
However, the figures also provide the latest evidence that responsibility for funding Ireland's broken banks is being pushed increasingly back on to Irish taxpayers. The loans are recorded by the Irish Central Bank under the heading "other assets". — Independent 2011-01-15.
 Germany and Europe Must Defy Political Trends
A commentary by Christoph Schwennicke

Germany's economy is in good shape because it resisted the fashion of neoliberalism. Europe should show the same defiance in the face of self-serving predictions that the euro is doomed. The financial and debt crises have highlighted the need for strong governments -- and for more Europe, not less.

(…)

The term "capital cover" was misleading in three ways. First, it covered up the fact that contributors must contribute fresh money of their own. Second, there was the risk inherent in the capital market. Finally, there was the question of who consistently benefits from this new system.

The risks have since caught up with the new system and, in the course of the financial crisis, brought down its apologists along with the economy. Hans Martin Bury, after serving as Schröder's right-hand man at the Chancellery, worked as an investment banker at Lehman Brothers, the firm whose bankruptcy triggered the financial crisis. Private health insurance companies face precisely the same problems -- obsolescence and financial difficulties -- as their competitors in the statutory health insurance system because, on the one hand, their hand-picked, young, healthy and dynamic clientele has become older and more susceptible to illness and, on the other hand, the return on their reserves is stagnating.

(…)
The Right Investment

The lesson to be drawn from the current experience should be not less Europe, but more Europe, a more integrated Europe, with weatherproof institutions like a European monetary fund, a common economic and social policy and -- if need be -- common bonds. Europe has more to offer and more to lose than just a common currency. It is more than a large trading zone. Continental Europe is a cultural zone with the world's most exemplary political value system. Anyone who attacks it or derides it is pursuing an interest, one that is economic or hegemonic. We should be aware of this. Even if Germany always supposedly pays more than everyone else, it's the right investment. — SPIEGEL online, 2011-01-18.
O nosso regime está no fim de um longuíssimo ciclo histórico. Um ciclo de seiscentos anos! Desde 1415, ano que levou Portugal a Ceuta, e daí a uma expansão marítima colonial sem precedentes, que duraria até à devolução de Macau à China, em 1999, vivemos uma situação privilegiada, apesar dos muitos que nunca lucraram nada com isso. Para esta reflexão, porém, importa reter um facto: o Estado foi sempre o centro do nosso universo económico e cultural. Todos dependemos dele até ao momento em que as suas inúmeras tetas coloniais secaram. À medida que foram secando, fomos caindo aos trambolhões, do Brasil para uma guerra civil e mais endividamento; do Mapa Cor-de-rosa para a ditadura de João Franco, o regicídio e a balbúrdia republicana que nos conduziria às ditaduras de Sidónio Pais e de Salazar; do 25 de Abril, aos solavancos de um regime cuja bancarrota só não foi ainda declarada porque a União Europeia nos tem posto a mão por baixo. As três últimas grandes tetas —emigração, turismo e fundos comunitários— estão em fim de ciclo, e vão provavelmente mirrar de vez até 2015. E depois de 2015, como vai ser? Ou melhor, e agora, que será feito de nós? O Estado? Qual Estado? Que novo Estado vamos querer e poder? O Estado alemão, que nunca foi outra coisa que não um think tank estratégico; ou o Estado português, tradicionalmente cabotino, arrogante, manhoso, preguiçoso, pejado de clientelas e carraças orçamentais, autoritário com os fracos e corrupto com os ricos e poderosos, em suma, faustoso, paquiderme, ignorante e cobarde? Só de ouvir o Pinóquio arranhar o seu inglês de fax, todo o meu patriotismo vacila!

Vamos precisar de Estado, dum Estado. Mas qual? Esta é a discussão de que dependerá a nossa continuidade histórica, ou o nosso desaparecimento (sim, as nações e os países aparecem e desaparecem.) Não percamos, pois, mais tempo com a tragicomédia mediática que entra pelas nossas casas dentro à hora de jantar!

quarta-feira, janeiro 19, 2011

Bolha fatal

Comissão Europeia aposta no gás de xisto
Shale gas is the subprime mortgage of the energy sector” — Jeff Rubin.



Protests spread over first European shale gas well

While the EU is looking at ways to diversify its energy supply, a new report has called for a moratorium on shale gas operations in the UK, just a month before mining company Cuadrilla hopes to launch its first “flare”.

(…) “With shale gas exploration you need to crack the rock underground using special chemicals and drill horizontally and continuously. Parts of the chemicals could get into underground drinking water sources,” he said.

(…) A European Commission representative gave a broadly positive reaction to the news.

“We believe that shale gas is an opportunity,” Marlene Holzner, spokesperson for EU Energy Commissioner Günther Oettinger, told EurActiv. “We need gas and gas demand will increase over the years so if we’re able to extract this gas, it will help us to rely less on imports.” — in EurActiv, 2011-01-18.

Compreende-se o desespero do Reino Unido e da Noruega depois de se ter tornado público e notório o declínio rápido das suas reservas de petróleo. Compreende-se o desespero dos países frios da União Europeia à medida que vão percebendo a sua dramática dependência do gás natural russo para se aquecerem em Invernos cada vez mais gélidos e intempestivos. O petróleo de Brent chegou hoje aos 97,09 USD.

Os países e as pessoas estão cada vez mais endividados, numa conjuntura de crise sistémica do Capitalismo, numa conjuntura de verdadeiro saque fiscal das populações europeias, e numa conjuntura de destruição de emprego e empobrecimento como não se via na Europa há décadas. Como se isto não bastasse, os grandes piratas da economia ocidental, que atraíram milhões de pessoas, centenas de milhar de empresas, centenas de cidades e dezenas de estados para falência, tentam agora desesperadamente colocar em marcha mais uma bolha especulativa.

A primeira tentativa falhada, depois do colapso imobiliário, foi a do nado-morto mercado mundial de créditos de carbono, que se havia pendurado habilmente nos movimentos anti aquecimento global. A segunda, foi e continua a ser a especulação em volta das dívidas soberanas, colocadas “no mercado” (para citar as palavras do nosso Pinóquio das arábias), como mais um produto de especulação financeira. Esta bolha vai esvaziar em breve, seja pela acção preventiva e ajuizada de Angela Merkel, seja pelo abandono progressivo do dólar, por parte dos principais países produtores de matérias primas e produtos manufacturados. Perante horizonte tão negro, o especulador dos especuladores, e criador do veneno chamado Credit Default Swap, J. P. Morgan & Co., acaba de fazer ressuscitar uma história com barbas, de que já se ouvira falar por cá em 2009: a suposta riqueza da Europa em gás de xisto (ou shale gas). Este milagre da especulação que algum corrupto lobby de Bruxelas acaba de lançar para o ar, além de consumir quantidades criminosas de água, de ameaçar com infiltrações potencialmente fatais terrenos, aquíferos e as próprias instalações urbanas existentes, sabe-se de ciência feita que é uma não solução, economicamente ruinosa, e com uma taxa de declínio duas vezes mais rápida do que a do gás natural convencional. Tal como o petróleo betuminoso, e o petróleo de profundidade, das ditas camadas pré-sal (com que a GALP e a Petrobras gostam de empolar as suas cotações em bolsa), o gás de xisto não dá para o que custa produzi-lo. Logo, é mais uma lebre para nos distrair, enquanto o Titanic da prosperidade económica, social e cultural do Ocidente caminha para uma irremediável decadência.
Unconventional Gas in Europe - Opportunities and Risks
By Alexandros Petersen, 6th January 2011

Bullish predictions are being made about a revolution in unconventional gas in Europe; yet, Europe’s threshold for larger-scale shale gas development still remains uncertain, with a range of obstacles – from environmental concerns to economic viability - balancing out the various incentives to move forward.  Unconventional gas, such as shale and tight gas, has had a dramatic impact on the US gas market, increasing energy security and steering prices downward as production and resources have headed in the opposite direction.  By 2008, shale alone accounted for 9.5% of all US gas production and by 2009, according to some estimates, 20% of US gas supply came from this source. Following these successes, Europe is now being aggressively explored for its suitability in terms of unconventional gas production as it hopes to follow in the footsteps of its transatlantic partner.  There has been a significant uptick in activity and dealmaking focusing on European shale in just the last six months. However, the picture in Europe is very different from the United States and, from an economic perspective, the play may not bear fruit.

É o gás de xisto a tal bala de prata que levará os Estados Unidos e a Europa a superar a profunda e longa crise em que se encontra? “If shale gas is a game changer, then why are all the major producers looking for oil??” — pergunta e responde Jeff Rubin. Vale a pena ouvi-lo na entrevista que deu no passado dia 13 de Janeiro ao canal BNN video.


POST SCRIPTUM
Para quem estiver interessado em colocar este tema na agenda da cidadania pró-activa, recomendo o portal web Gasland, de Josh Fox. E ainda a consulta deste insidioso PDF da Statoil (companhia norueguesa estatal de petróleos) sobre o futuro radiante do shale gas.

segunda-feira, janeiro 17, 2011

Tunísia, Argélia... Irlanda?

A Europa que abra os olhos!



Tunísia: O desempregado que derrubou um ditador

Na Tunísia, como em outros tantos países, não são as qualificações ou o mérito que determinam o sucesso. É antes o nome, o casamento ou a filiação partidária.

No desemprego, Bouazizi viu-se forçado a vender frutas e legumes nas ruas da sua cidade natal do centro-oeste, Sidi Bouzid, para alimentar a família. Mas não tinha a necessária licença de comércio, difícil de obter no labirinto da burocracia e corrupção tunisina. A 17 de Dezembro de 2010, a polícia confiscou-lhe a banca e a balança. Segundo testemunhos locais, terá sido agredido e humilhado pelas autoridades.

Nessa mesma sexta-feira, Bouazizi deslocou-se à autarquia de Sidi Bouzid para tentar regularizar a situação. Não conseguiu. Com o dinheiro que restava, comprou um litro de gasolina. Despejou o combustível sobre a cabeça e imolou-se pelo fogo.  — pedro.guerreiro{arroba}sol{ponto}pt . Sol, 2011-01-15.

Feliz ou infelizmente, a Europa envelheceu muito nas últimas décadas, e por esta única razão é altamente improvável que as suas crises venham a ser resolvidas por meio de revoluções sociais violentas. Com a possível excepção da Irlanda, onde a juventude poderia assumir ainda algum protagonismo (se não emigrasse tanto...), o resto da Europa, e mais ainda a Rússia, mas também a China, o Canadá e os Estados Unidos, ou a Austrália e a África do Sul, a Namíbia, o Botswana e o Zimbabué, exibem demografias praticamente estagnadas ou a caminho da estagnação. Pelo contrário, países como a Índia, Paquistão, Afeganistão e repúblicas do Mar Cáspio, à excepção do Casaquistão, o Sudeste Asiático e quase todo o continente africano, e ainda o México e toda a América Central e do Sul, à excepção de Cuba, da Guiana Francesa e do Uruguai, apresentam demografias pujantes, apesar da miséria material da esmagadora maioria das suas populações. Sem olharmos bem para este mapa demográfico da humanidade, dificilmente perceberemos as tendências de longo prazo, e até as modalidades prováveis de evolução histórica dos acontecimentos.

O que está neste momento a desenrolar-se na solarenga Tunísia, e que alastrou já à Argélia, Marrocos, Jordânia, Líbano e Egipto, e em breve poderá chegar à Arábia Saudita, é uma resposta social à crise energética mundial e suas consequências nefastas em toda a cadeia económica. Mas é também um despertar de energias revolucionárias que poderá deixar para trás o programa ideológico limitado e as tácticas terroristas de Bin Laden. A Al Jazeera escreve: “Tunisians have sent a message to the Arab world, warning leaders they are no longer immune to popular anger” — inTo the tyrants of the Arab world...” E no boletim deste mês do GEAB lê-se:
The downfall of pro-Western Arab regimes

Tunisia and Algeria were rocked by riots and Jordan, Egypt and Lebanon are experiencing serious problems. Beyond the reactions to higher prices for basic necessities, it is the first political shock of the "fall of the Dollar Wall". The regimes in question are typically powers supported at arm's length by Western money, that’s to say basically the US Dollar. The rapid erosion of Western credibility and financial resources especially US is already beginning to make itself felt, just like European impotence outside its borders. These countries’ elite are accustomed to feel "untouchable" thanks to their US and European protectors: their fall will be brutal as they realize only now that the "West" can’t really protect them. At least Mikhail Gorbachev warned Eastern European leaders that the Red Army would no longer intervene to support them! 2011 will, therefore, be the year when the "Western-Arab dominoes" start to fall. — in GEAB nr 51 - January 16, 2011.

De cada vez que é mais caro extrair um barril de petróleo, e de cada vez que a procura mundial de petróleo aumenta, por efeito do crescimento demográfico exponencial da humanidade, da expansão económica mundial, ainda que abaixo dos 4% (como se prevê para 2011), ou de um mero ciclo expansivo da produção industrial (como o que actualmente regista a Alemanha), acontece uma coisa inevitável: o preço real da alimentação sobe! E porquê?

Porque só é possível alimentar os actuais 6.900 milhões de seres humanos recorrendo ao auxílio de fertilizantes, pesticidas e sistemas de transporte dependentes do petróleo e do gás natural. Sem estes dois hidrocarbonetos, mesmo juntando ao carvão e ao nuclear todas as outras formas de energia em uso, incluindo todas as renováveis existentes e por existir, não há pão, nem água para todos. O pão que houver, e a água potável que houver, à medida que formos tendo consciência do fim do petróleo barato, serão cada vez mais caros e racionados.

O que está a suceder na Tunísia é o resultado de uma crise de recursos global. Subida insustentável dos preços do pão, água e energia, falta de dinheiro, falência das actividades empresariais, das cidades e dos governos, desemprego em larga escala, e uma corrupção cada vez mais descarada e insultuosa, são os mesmíssimos fenómenos que actualmente afligem as sociedades portuguesa, espanhola, grega, ou norte-americana. Há, porém, duas diferenças importantes: por um lado, as moedas fortes europeia e americana disfarçam, por enquanto, a especial gravidade da situação nos respectivos territórios económicos; por outro, a probabilidade revolucionária é mais elevada em países com demografias expansivas, onde corre o sangue jovem da rebelião, do que nos países envelhecidos (onde o tempo dos golpes palacianos, como na antiga Roma decadente, voltará a estar na moda.)

A guerra contra o Afeganistão, levada a cabo pela decadente civilização ocidental, é uma guerra de velhos, tecnologicamente assistidos por próteses sofisticadas e traiçoeiras, contra populações jovens que aspiram, como todos nós, ao bem-estar e à felicidade. O desfecho parece inexorável. Acabaremos por perder!

ÚLTIMA ACTUALIZAÇÃO : 2011-01-18 0:56

BP: Bolshoi Petroleum

Sem especulação, o capitalismo actual afunda-se como um Titanic
The Kremlin is about to become the biggest shareholder in BP

BP is set to do a $16bn share swap with Rosneft, Russia’s biggest oil producer. Rosneft – which is state-owned, hence the Kremlin connection – will own 5% of BP. BP’s stake in Rosneft will rise to near 11%.
So what’s behind the deal? It’s all about access to new reserves. BP is going to explore the Russian Arctic with Rosneft. This is a complicated, risky region. That’s why Rosneft needs BP’s expertise. The payoff could be huge – the region has been described as a new North Sea, in terms of its potential. — Money Week, 2011-01-17.
Para lá de toda a esperança em novas jazidas de petróleo escondidas pelo gelo do Árctico, o que está em causa nestes movimentos são três coisas distintas:
  1. negociar parcerias estratégicas onde o poder das armas deixou de funcionar — este cruzamento de participações poderá significar, em breve, impensáveis aproximações da BP ao Irão.
  2. aumentar os activos estratégicos das empresas, por forma a apreciar as respectivas cotações em bolsa, sem o que as gigantescas necessidades de capital fresco para investir, e sobretudo para pagar dívidas, não afluirá facilmente (por cá, insisto na observação atenta dos casos EDP e GALP, ambas presas apetecíveis e cada vez mais indefesas!)
  3. reparar o motor de arranque da economia capitalista mundial, i.e. as bolsas, para o que se procuram desesperadamente novas bolhas especulativas, que possam reparar o colapso da bolha imobiliária que antecedeu o colapso à vista da bolha soberana; e substituir as tentativas falhadas de criar duas bolhas verdes, uma a partir do mercado de emissões de carbono, e outra em volta das energias eólicas e solar. Há presentemente duas bolhas em formação, que poderão rebentar antes do tempo, mas ainda assim estão aí: a bolha do gás de xisto (shale gas), e a bolha do que poderíamos chamar a GLOBALIZAÇÃO IMPROVÁVEL —i.e. o cruzamento de participações entre gigantes económico-financeiros politicamente inimigos!

REFERÊNCIAS

domingo, janeiro 16, 2011

O Aviso

Tragédia dos Comuns
mais importante do que uma tempestade solar




Ver todo o documentário no sítio da Frontline.

O custo estimado da prevista grande tempestade solar de 2013 — 1 a 2 biliões de USD (o Furaccão Katrina terá custado entre 80 a 125 mil milhões) — é ainda assim insignificante quando comparado com o buraco negro dos derivados financeiros OTC, cujo valor nocional era, em Junho de 2010, segundo o BIS, de US$582.655.000.000.000 (10x o PIB mundial), e a que corresponderá, segundo o mesmo "banco dos bancos centrais", um valor bruto de mercado na ordem dos 24,673 biliões de USD.

Estamos pois a caminho de uma inimaginável tragédia com uma origem estrutural única: a exaustão dos recursos energéticos e naturais do planeta, que é, por sua vez, consequência paradoxal da insustentável demografia humana tornada possível pela qualidade do nosso desenvolvimento. É isto a Tragédia dos Comuns.

A crise mundial do endividamento, a que deram livre curso a desregulação da era Greenspan (de Clinton a Bush) e os instrumentos de especulação financeira, engendrados em 1987 por Drexel Burnham Lambert (os catastróficos CDO — Credit Default Obligation), ou em 1994, pelo J.P. Morgan & Co. (os catastróficos CDS — Credit Default Swaps), significa não só uma clara fuga em frente perante as dificuldades estruturais do Capitalismo, mas sobretudo a ocultação criminosa do que a crise petrolífera de 1972 significara: o fim próximo de um concentrado de energia e de materiais químicos acumulados ao longo de centenas de milhões de anos, cuja descoberta tornou possível as sociedades industriais afluentes dos últimos duzentos anos e a insustentável explosão demográfica da humanidade. Não vale a pena perdermos demasiado tempo com o jogo da culpa. Estamos perante uma emergência sem precedentes. É preciso pensar nas suas consequências, bem como nas respostas e custos das acções radicais que em breve seremos todos forçados a tomar.

A segurança e eficiência energéticas, e a autonomia e segurança alimentares, são as duas prioridades absolutas para qualquer país, ou grupo de países, que queira e possa agir desde já. Tudo o mais pode esperar.

É importante perceber as causas da actual crise sistémica do Capitalismo, contornando ao mesmo tempo a irresponsabilidade dormente dos bangsters e do seus spin doctors, e as orações cada vez mais ininteligíveis dos herdeiros oportunistas e burocráticos da esquerda marxista.

J20

Caça furtivo chinês chega uma década antes do previsto

China Flexes Its Muscles with Stealth Fighter Test

For a stealth fighter, it was a remarkably obvious flight, but perhaps that was the point. On a day when U.S. Defense Secretary Robert Gates was in Beijing meeting with Chinese President Hu Jintao, China's new stealth fighter took what is believed to be its maiden test flight, according to a defense analyst.

(…) While en route to Beijing, Gates told reporters that the U.S. had been tracking the development of China's stealth fighter but that the earlier tests had come as something of a surprise. "They may be somewhat further ahead in the development of that aircraft than our intelligence had earlier predicted," he said. — Read more in TIME.




As imagens captadas pelos planespotters chineses, que as autoridades de Pequim deixaram passar, revelam um facto muito importante: a China está adiantada no plano que traçou para a expansão da sua influência no mundo. A explicação deste adiantamento pode residir na própria crise sistémica do Capitalismo. O colapso precipitado e aparentemente incontrolável do Ocidente, sobretudo depois de rebentar a bolha incomensurável do mercado de derivados financeiros, não pára de fazer vítimas —mercado imobiliário, bancos, e agora as dívidas soberanas. O nervosismo, a impaciência e as explosões súbitas de violência, nomeadamente contra os poderes instituídos, começaram já a fazer as suas vítimas. Como se isto não bastasse, temos pela frente a confluência de duas crises anunciadas: a crise das alterações climáticas, e a crise energética global induzida pelo fim do petróleo barato. A inflação dos preços alimentares e o colapso, em breve, do sistema de transportes de pessoas e bens que há décadas usamos e consideramos uma trivialidade insubstituível, ameaçam já de forma grave —para lá de toda a retórica e impotência dos últimos dez anos— a segurança mundial.



Não é possível uma acumulação de riqueza e poupança, rápida e em grande escala, sem pelo menos uma de duas condições prévias: a sobre-exploração do trabalho humano, ou o acesso não limitado a abundantes recursos materiais, energéticos e alimentares. Pior ainda, nas actuais condições demográficas e de esgotamento das fontes de energia barata, de escassez de água potável, e de exaustão dos solos, ainda que regressássemos à escravatura, seria impossível alimentar a actual população mundial para lá de 2030, ou 2050. Desde 1972 que se prevê um colapso demográfico sem precedentes como desenlace possível da insustentabilidade do actual crescimento exponencial da humanidade e consequente decréscimo, igualmente exponencial, dos recursos disponíveis. Sem percebermos isto, não saberemos como, nem porquê, os poderes do mundo iniciaram a contagem decrescente de uma nova guerra mundial.