Santana sai da quinta e dentro em breve sairá de cena, para dar lugar ao verdadeiro estratega da direita portuguesa, esse mesmo: o Paulinho das feiras!
Há três protagonistas decisivos na política portuguesa actual: Cavaco Silva, Paulo Portas e António Guterres. Para além destes atractores estratégicos, vemos outros protagonistas de peso, cujas palavras e acções pesam na consciência crítica de todos nós: Mário Soares, Vítor Constâncio, Francisco Louçã, Belmiro de Azevedo, Marcelo Rebelo de Sousa e o recém chegado António Vitorino (brilhante na entrevista dada ontem a Maria João Avilez). Fora deste núcleo decisivo, as demais vozes começam a confundir-se com o ruído dos habituais comentaristas de serviço, de quem já não esperamos nada senão opiniões avulsas, pouco documentadas e expeditas, apesar de estimulantes no caso de Vasco Pulido Valente, por causa da sua incorrigível extravagância literária.
Para além disto, temos os episódios confrangedores da expulsão da Cinha, o esbracejar aflito do Primeiro Ministro na incubadora, o Senhor Barroso tirando água do seu capote de responsabilidades e a cáfila de barrosistas à beira da debandada. Ah, e o Presidente da República, que não só existe, como foi capaz de deflagrar a tal bomba atómica. Depois desta dissolução da Assembleia da República fica, por fim, aberto o caminho para o semi-presidencialismo, que Cavaco Silva aprova e saberá seguramente consolidar. Não acho mal para os tempos que aí vêm...
Paulo Portas, ao exigir 14 deputados a um Santana Lopes ainda tonto com o gancho presidencial, garante, sem ir a votos, o seu actual peso parlamentar e mantem intacta a sua estratégia de reestruturação da Direita. Para muitos, sobretudo num cenário de implosão
santanista, o PP começa a ser uma verdadeira opção de vida. O que me pareceu em Junho passado parece-me agora mais evidente ainda: o PSD, sobretudo no cenário previsível duma derrota eleitoral, vai cair no regaço de Paulo Portas, que a seu tempo saberá tratar do astral de Santana com a mesma limpeza e crueldade com que outrora esborrachou Manuel Monteiro. Falta saber o que vai acontecer aos restos do PSD, uma vez renascido o velho PPD. Haverá alguém com a coragem e a autoridade suficientes para atalhar o óbvio, provocando uma cisão clarificadora entre o PPD e o PSD antes da limpeza étnica que Santana Lopes sem dúvida iniciará depois da sua derrota eleitoral?
Pensemos nas alternativas.
Em primeiro lugar, Marcelo Rebelo de Sousa. Sim, poderia ser uma alternativa de recurso, preciosa durante a primeira fase de reconstituição do PSD como futura força pendular da vida política portuguesa. Se tiver a coragem de avançar, mais tarde poderá passar a bola a Marques Mendes, que daria um bom chefe de partido e, daqui a alguns anos, um Primeiro Ministro decente.
Em segundo lugar, Marques Mendes. Sim, poderia avançar, mas estaria a queimar a possibilidade de voos futuros mais profícuos, o que para um político ainda jovem como ele, seria uma precipitação desnecessária.
Em terceiro lugar, António Borges. Não, não é sequer uma possibilidade partidária. O seu papel, caso o PS se espalhe, será suceder a José Sócrates com o beneplácito de Cavaco Silva.
Falta saber como tudo se irá passar...
Vamos muito provavelmente assistir a uma lenta agonia do PPD/PSD, com a probabilidade de um congresso extraordinário provocar a cisão do partido. Resta saber quem sairá: se o PPD do PSD, se o PSD do PPD. Uma coisa é certa: Cavaco Silva planeou e continua a planear cuidadosamente a sua estratégia presidencial, agora mais verosímil que nunca. Para a mesma ter sucesso necessita, porém, dum partido competente que o apoie. Nas eleições, terá pela frente o farrapo de Pedro Santana Lopes (prestes a sucumbir inconscientemente ao golpe de misericórdia preparado por Paulo Portas), um personagem circunstancial do PS, um candidato do PCP, outro do Bloco de Esquerda e os Ena Pá 2000!
Antes disso, lá para Março de 2005, teremos de novo o PS no Governo. Desejo-lhe sorte e ofereço-lhe alguns conselhos: +estratégia, +informação, +ideias, +flexibilidade, +mobilidade, +transparência, +coragem, +rigor, +justiça, +ousadia, +sustentabilidade, melhor educação, melhor crescimento; -ministérios, -endogamia, - compadrio, -nepotismo, -clientelismo, -elitismo, -retórica, -desperdício, -formalismo, -burocracia, -menos crescimento, -pessimismo.
Até lá, muito cuidadinho com os dois incendiários, agora à solta...
Feliz Natal para todos.
O-A-M #61 06 Dezembro 2004