sexta-feira, dezembro 31, 2004

Europa

Rapto de Europa, fresco, Palacio de Cnossos, 1700 AC

Lisboa está bem mais perto de Istambul do que parece.


Religião e autoritarismo caminharam de mãos dadas em ambas as culturas ao longo dos séculos. O nosso Catolicismo contra-Reformista e o Islamismo deles não são assim tão diferentes. O sangue Fenício e o sangue mourisco correm há muito nas nossas veias (e nas deles). A predominância cultural céltica que marca, ao longo dos tempos, o desenho da identidade Lusitana, Galega e finalmente Portuguesa, nomeadamente contra a expansão Maometana, não ignora nem renega a brisa de civilização e poesia trazida até à Península pelo Islão. Cairíamos, infelizmente, num grande logro, se não víssemos as semelhanças que há entre uma boa parte da Turquia e Portugal. Espero que o PS, o PSD, o PP e o Bloco de Esquerda entendam estes factos elementares, e não percamos todos, enquanto País, a oportunidade de patrocinar a lógica e necessária integração da Turquia na Comunidade Europeia.
Faço igualmente votos para que venhamos a ter brevemente uma Constituição Europeia, cuja redacção e conteúdo se devem restringir ao essencial. E o essencial é: definir a Europa como uma poderosa comunidade de cidadania livre e democrática, racional, sustentável, solidária e defensora da utopia humana.

O-A-M #65 31 Dezembro 2004

quarta-feira, dezembro 29, 2004

Embaixador arredio

Ilha Phuket

Quem já alguma vez passou pela desagrável experiência de precisar do seu Embaixador, Encarregado de Negócios ou simples Cônsul, sabe que eles nunca estão... Nem sei mesmo para que lhes pagamos. Não seria melhor acabar de vez com mais esta fantasia de Estado?


A SIC já lá está, a TVI e a RTP também, tal como a AMI e outras organizações de apoio e solidariedade, mas o Embaixador Português na Tailândia, que dá pelo nome de João Lima de Pimentel, não. Pior ainda, ouvimo-lo fazer declarações radiofónicas (não sei se televisivas também), sobre a evolução da tragédia provocada pelo maremoto que atingiu mais de sete países asiáticos, entre os quais a Tailândia, onde por sinal, se registavam já informações sobre turistas portugueses mortos e desaparecidos. O senhor embaixador estava, ao que parece, de férias. Mas não é precisamente nas épocas de maior afluência de portugueses à Tailândia que o diplomata lá deve estar?! Pelos vistos, não. E além do mais, ao senhor Embaixador não lhe apetecia passar o ano novo em Banguequoque, no meio daquela trapalhada toda.

Fiquei estupefacto com a displicência do homem. E mais ainda com a eufórica “célula de crise” capitaneada, muito tu cá tu lá, pelo jornalista assessor Carneiro Jacinto (enquanto o atendedor de chamadas em Banguecoque revelava em litania atroz a incompetência do próprio serviço). A fantástica “máquina” do MNE, anunciada em prime time televisivo pelo Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros poderia ter sido uma ideia hilariante dos plagiaristas do Herman, mas infelizmente foi apenas mais uma demonstração da imbecilidade terminal do actual Governo. Seria difícil uma encenação mais caricata em volta de um Embaixador tão imprudente (preguiçoso e inconsciente!). Será que o intocável ouviu alguma vez falar da dimensão simbólica das representações e dos gestos diplomáticos? Passar-lhe-à pela mente vaga que os portugueses atingidos pela catástrofe, os seus familiares em Portugal e todos nós que vivemos vicariamente a tragédia alheia, esperavamos algo mais dos diplomatas — e sobretudo do seu sentido de Estado — do que um pequenino encolher de ombros?

Foram precisas 48 longas horas, ou mais, para que alguém deste Governo indigesto acordasse do turpor em que se encontra e, abanado insistentemente pelos média, lá tomasse a decisão de despachar o diplomata temeroso para a região. Que vergonha! Que inépcia! E as palavrinhas do PM! Coitado, também ele ficou sem férias... como se alguém tivesse direito a férias antes de cumprir um ano de contrato!

Nestes tempos de penúria orçamental, visto e revisto o panorama das nossas Embaixadas e Consulados por esse planeta fora, talvez não fosse má ideia privatizar o MNE, abrindo às leis da concorrência a prestação do inestimável serviço público implícito na necessária representação diplomática do nosso País. Os nossos impostos não podem ser desperdiçados com a decadente e inepta aristocracia que há tempo demais se acantona no Palácio das Necessidades.

O-A-M #64 29 Dezembro 2004

quarta-feira, dezembro 15, 2004

Instituto das Artes 1

dollarStrip

“Dêem-lhe bifes!” — terá sugerido alguém um dia, para calar a pena nervosa dum jovem crítico de arte. Deste memorável lampejo de lucidez mecenática à subsidiodependência e à subsidiomania resta um historial de 30 anos. Entretanto, esta borbulha está prestes a rebentar. Não há outra alternativa que não passe pelo domínio do famoso monstro da dívida pública.


Recebi ontem um e-mail muito irritado contra os critérios de atribuição de subsídios por parte do Instituto das Artes (caricatura terminológica do famoso ICA de sua Majestade britânica). Remeti a denúncia, como me era pedido, para as minhas listas de correio, não sem antes lançar algumas achas para a fogueira que consome inexoravelmente a amostra de Estado providencial que nos tocou viver. Assim, quando no dito mail se pedia a extinção do IA, por causa da bagunça que parece ter acompanhado a selecção de projectos a subsidiar este ano, eu acrescentei: já que estão com a mão na massa, o melhor seria editar um livro branco sobre o assunto. E que alguém o faça deixando em paz as desgraçadas artes plásticas e afins, que por junto receberam este ano menos 90 mil Euros do que o Teatro da Cornucópia (o qual só para si, servindo uma produtividade absolutamente exígua e ideologicamente cansada, receberá a módica quantia de 598.557,48 Euros! )
Um tal livro, fruto de tese inconvenientíssima dum doutorando de história de arte, deveria incidir, isso sim, no teatro e no cinema, e dar à coisa um ar sério, de quem não fez aquilo para ir parar à Culturgest ou ao CCB. Como todos sabem, o mercado vem impondo, pelos menos desde 2000, restrições orçamentais sérias em toda a vida económica do País. Qualquer produtor ou prestador de serviços (designer, arquitecto, banda de rock ou DJ) sabe como teve que reduzir os seus orçamentos e honorários para se manter dentro do mercado. Sabê-lo-ão os agentes do nosso teatro e do nosso cinema? Alguém terá muito brevemente que ter a coragem de levar a verdade a este limbo bem-pensante e melhor vivente da sociedade portuguesa. As regras duras (e injustas...) do mercado têm que começar a valer para todos. Se um galerista de arte vender menos pintura, ganhará menos, e logo não poderá trocar de carro. Se o director de uma companhia de teatro, ou um realizador de cinema, não vendem nada, deveriam adiar a construção da nova casa em Maceió! E por aí adiante...
Depois, ou de caminho, e muito antes de atacar os pobres artistas plásticos, galeristas e comissários, haveria que começar por poupar no CCB, em Serralves e no Museu do Chiado. Desde logo, sujeitando os respectivos cargos directivos e executivos especializados a concurso público internacional (no mínimo eurocomunitário). Depois, exigindo-lhes resultados. E finalmente, se não conseguissem melhorar as suas performances, operando uma reestruturação radical do sistema de museus e centros equiparados dependentes do erário público. Em tempos sugeri uma solução (ver Blog n.8), creio que razoável: concentrar todo o sistema museológico e de gestão das artes em dois departamentos: o da cultura analógica (metendo pré-históricos, medievais, modernos e contemporâneos no mesmo saco analítico) e o da cultura digital (dedicado à metamorfose da cultura e das artes nas sociedades democráticas, pós-industriais e tecnológicas). Podem ter a certeza que pouparíamos muito dinheiro e criaríamos finalmente um corpo vertebrado de funções, expectativas, ideias e resultados. Os pagadores de impostos, aturdidos pelo desemprego e pelos desvarios governamentais, agradeceriam o esforço de humildade e inteligência.

O aumento da transparência administrativa no que diz respeito à atribuição de subsídios é uma coisa boa, pois serve para moderar excessos e criar regras democráticas de acesso aos apoios do Estado. Permite, por exemplo, que se discutam publicamente os critérios de selecção empregues pelos júris, e permite também discutir os próprios critérios de selecção dos jurados. Neste particular, creio que ainda há muito por fazer. A formação de um júri, por exemplo, deve ter uma lógica representativa, e a repetição de personalidades nestes postos de decisão deve ser regulada de forma muito cuidada e transparente, de modo a não parecer que há uns jurados com assinatura vitalícia (a que correspondem, depois, uns eleitos sistemáticos que parecem também andar como um passe para subsídios no bolso.) A transparência democrática tem pois o mérito de permitir, a prazo, maior equidade e menos abusos.

O estado precário das nossas artes decorre, porém, menos da falta de subsídios, do que da sua má administração. A tendência de fundo em toda a Europa (em todo o Mundo!) é para o encolhimento do Estado providencial onde exista. Assim sendo, devemos exigir uma melhor administração, menos cabotinismo, menos clientelismo e menos endogamia. Finalmente, parece óbvio que o actual Estado providencial lisboeta ainda se não deu conta das minorias urbanas, suburbanas e étnicas que fazem hoje parte integrante e produtiva da nossa sociedade e da nossa cultura. O multiculturalismo tem que deixar de ser uma moda afectada para passar a ser um estado de activismo social e cultural efectivo. No campo cultural, como nos outros, o Estado tem que saber gastar os dinheiros de forma estratégica, e deixar, de uma vez por todas, de usar as artes como vitrina e écrã da sua vaidade politiqueira.
Esperemos que o futuro governo PS saiba mudar de agulha.

Link: Instituto das Artes


O-A-M #63 14 Dezembro 2004

quarta-feira, dezembro 08, 2004

PP na corda bamba

Enola Gay

Paulo Portas também tem uma ‘bomba atómica’ e prepara-se para a lançar... sobre o epicentro do PSD: Santana Lopes.



Conjecturemos então um pouco sobre a actual crise política... O PP de Paulo Portas sopra para os meios de comunicação social que por menos de 14 deputados não aceita levar Santana Lopes ao colo até às urnas de Fevereiro. Suspeita que a procissão vai tresandar a incenso e quer beliscar o menos possível, se não mesmo recompensar, a sua excelente performance ao longo dos dois últimos governos, papando aos pontos tanto José Manuel Barroso, como Pedro Santana Lopes. Como? Pois mantendo a sua quota parlamentar, sabendo que se o PPD de Santana Lopes aceitar tal condição, o fará mordendo a sua própria cauda (até onde, ninguém sabe...) Ou então, se a isso for levado, concorrendo sozinho, fazendo tudo por tudo para não perder votos. É aqui que está o busilis da presente crise!

Santana Lopes vai inevitavelmente perder milhares de votos, dezenas de mandatos e muito provavelmente a sua própria cabeça política. Não deixará o lugar sem esbracejar, mas será concerteza empurrado para fora do núcleo duro da PSD pelo próximo congresso extraordinário do partido laranja. Nessa altura, Paulo Portas poderia captar para a sua banda boa parte dos populistas e ultra-liberais do PSD e avançar na consolidação do seu projecto partidário. Todavia tal passo é muito arriscado, pois uma derrota pesada da tal plataforma esvaziaria de conteúdo e alcance as manobras do PP. Muito melhor estratégia, tendo em conta os objectivos determinados de Paulo Portas, seria, na realidade, avançar sozinho, em nome do trabalho feito nos governos de coligação, demarcando-se da desorientação profunda que afecta o PSD actual, mas também em nome (e esta é a segunda bomba atómica desta crise) de uma reforma estratégica da Direita portuguesa. Apostar claramente na cisão do PPD/PSD é a única via que permitirá a Paulo Portas levar a cabo o ambicionado upgrade do PP no sistema de forças partidárias português. Eu se estivesse no lugar dele não hesitava.

Post Scriptum (15.12.04) — Para não desaparecer o PP terá agora que mostrar as suas verdadeiras intenções em termos de reestruturação do campo democrático da Direita.


O-A-M #62 08 Dezembro 2004

segunda-feira, dezembro 06, 2004

Plataforma PPD


Santana sai da quinta e dentro em breve sairá de cena, para dar lugar ao verdadeiro estratega da direita portuguesa, esse mesmo: o Paulinho das feiras!


Há três protagonistas decisivos na política portuguesa actual: Cavaco Silva, Paulo Portas e António Guterres. Para além destes atractores estratégicos, vemos outros protagonistas de peso, cujas palavras e acções pesam na consciência crítica de todos nós: Mário Soares, Vítor Constâncio, Francisco Louçã, Belmiro de Azevedo, Marcelo Rebelo de Sousa e o recém chegado António Vitorino (brilhante na entrevista dada ontem a Maria João Avilez). Fora deste núcleo decisivo, as demais vozes começam a confundir-se com o ruído dos habituais comentaristas de serviço, de quem já não esperamos nada senão opiniões avulsas, pouco documentadas e expeditas, apesar de estimulantes no caso de Vasco Pulido Valente, por causa da sua incorrigível extravagância literária.

Para além disto, temos os episódios confrangedores da expulsão da Cinha, o esbracejar aflito do Primeiro Ministro na incubadora, o Senhor Barroso tirando água do seu capote de responsabilidades e a cáfila de barrosistas à beira da debandada. Ah, e o Presidente da República, que não só existe, como foi capaz de deflagrar a tal ‘bomba atómica’. Depois desta dissolução da Assembleia da República fica, por fim, aberto o caminho para o semi-presidencialismo, que Cavaco Silva aprova e saberá seguramente consolidar. Não acho mal para os tempos que aí vêm...

Paulo Portas, ao exigir 14 deputados a um Santana Lopes ainda tonto com o gancho presidencial, garante, sem ir a votos, o seu actual peso parlamentar e mantem intacta a sua estratégia de reestruturação da Direita. Para muitos, sobretudo num cenário de implosão santanista, o PP começa a ser uma verdadeira opção de vida. O que me pareceu em Junho passado parece-me agora mais evidente ainda: o PSD, sobretudo no cenário previsível duma derrota eleitoral, vai cair no regaço de Paulo Portas, que a seu tempo saberá tratar do astral de Santana com a mesma limpeza e crueldade com que outrora esborrachou Manuel Monteiro. Falta saber o que vai acontecer aos restos do PSD, uma vez renascido o velho PPD. Haverá alguém com a coragem e a autoridade suficientes para atalhar o óbvio, provocando uma cisão clarificadora entre o PPD e o PSD antes da limpeza étnica que Santana Lopes sem dúvida iniciará depois da sua derrota eleitoral?

Pensemos nas alternativas.

Em primeiro lugar, Marcelo Rebelo de Sousa. Sim, poderia ser uma alternativa de recurso, preciosa durante a primeira fase de reconstituição do PSD como futura força pendular da vida política portuguesa. Se tiver a coragem de avançar, mais tarde poderá passar a bola a Marques Mendes, que daria um bom chefe de partido e, daqui a alguns anos, um Primeiro Ministro decente.

Em segundo lugar, Marques Mendes. Sim, poderia avançar, mas estaria a queimar a possibilidade de voos futuros mais profícuos, o que para um político ainda jovem como ele, seria uma precipitação desnecessária.

Em terceiro lugar, António Borges. Não, não é sequer uma possibilidade partidária. O seu papel, caso o PS se espalhe, será suceder a José Sócrates com o beneplácito de Cavaco Silva.

Falta saber como tudo se irá passar...

Vamos muito provavelmente assistir a uma lenta agonia do PPD/PSD, com a probabilidade de um congresso extraordinário provocar a cisão do partido. Resta saber quem sairá: se o PPD do PSD, se o PSD do PPD. Uma coisa é certa: Cavaco Silva planeou e continua a planear cuidadosamente a sua estratégia presidencial, agora mais verosímil que nunca. Para a mesma ter sucesso necessita, porém, dum partido competente que o apoie. Nas eleições, terá pela frente o farrapo de Pedro Santana Lopes (prestes a sucumbir inconscientemente ao golpe de misericórdia preparado por Paulo Portas), um personagem circunstancial do PS, um candidato do PCP, outro do Bloco de Esquerda e os Ena Pá 2000!

Antes disso, lá para Março de 2005, teremos de novo o PS no Governo. Desejo-lhe sorte e ofereço-lhe alguns conselhos: +estratégia, +informação, +ideias, +flexibilidade, +mobilidade, +transparência, +coragem, +rigor, +justiça, +ousadia, +sustentabilidade, melhor educação, melhor crescimento; -ministérios, -endogamia, - compadrio, -nepotismo, -clientelismo, -elitismo, -retórica, -desperdício, -formalismo, -burocracia, -menos crescimento, -pessimismo.

Até lá, muito cuidadinho com os dois incendiários, agora à solta...

Feliz Natal para todos.





O-A-M #61 06 Dezembro 2004

segunda-feira, novembro 29, 2004

Santana Lopes 3


Cinha, porque me abandonaste?!


Quando todos pensavam que o actual Primeiro Ministro era a sério, soube-se ontem que não. Para espanto de todos os basbaques televisivos como eu, ele próprio confessou que o homúnculo de governante que porta o seu nome nasceu antes de tempo e encontra-se ainda em estado de gestação. Muito frágil, dentro de uma incubadora situada numa maternidade de que não fixei o nome, o Pedrinho Santana Lopes, futuro Primeiro Ministro de Portugal (aquilo que julgamos serem os factos, como já todos perceberam, não passa de uma ilusão televisiva) tem merecido o melhor dos tratamentos por parte do Partido Socialista. Naturalmente tolerante, o PS compreende o melindre ecológico que rodeia aquele corpinho engelhado, mas cheio de graça. Espera até que o seu exemplo de caridade se multiplique no regaço presidencial. — "Sr. Presidente, temos que salvar o menino, não acha?" O avatar dele diz cada vez mais disparates e alucina sobre cartas astrológicas, é certo. Mas temos que dar tempo ao tempo. O super-homem que lateja na incubadora está prestes a sair da bolha. E, além do mais, o Governo é dele, porra! Que nasça e que se amanhe, porra!
Entretanto, fora da incubadora, pululam os amigos, os ministros e os correlegionários do menino, todos aos pontapés na máquina! A Oposição, estupefacta. O Presidente, aflito. O Povo, rindo-se às gargalhadas (para não chorar). E o menino, cheio de nódoas negras, balbucia um murmúrio: "Cinha, porque me abandonaste?"
Entretanto, o lobo mau (Aníbal Cavaco Silva), vendo o seu partido prestes a cair nas garras de uma hiena desgraçada (Paulo Portas), uiva aos quatro ventos: imbecis para o lixo! Gente séria toca a trabalhar! Com o PS de Sócrates isto não vai lá! Temos que retomar o PSD nas nas nossas mãos. Ou então... Ou então... Se me chatearem muito faço outro partido, e pronto!
Coitado do Pedrinho, agora que parecia pronto a sair da maternidade, com o Partido Socialista a cuidar-lhe das nódoas negras, veio o lobo mau e estragou-lhe a festa. Nem a pulseira lhe valeu. Que pena. Aquele sorriso terno prometia. Mas os astros é que mandam. Essa é que é essa.

O-A-M #60 29 Novembro 2004

sábado, outubro 16, 2004

Petroleo 1

Out., 14, 2003: 1 barril de crude OPEP = 30 dll
Out., 14, 2004: 1 barril de crude OPEP = 54 dll

“Em 1979, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) tinha um excesso de capacidade produtiva de 47.5 milhões de barris de petróleo por dia. Vinte anos mais tarde, em 1999, essa capacidade sobressalente tinha sido reduzida para 400 mil barris/ dia e a procura global subira para 77 milhões de barris/ dia. Hoje a OPEP não tem praticamente nenhuma nova torneira que possa abrir e a procura está nos 84 milhões de barris/dia — um salto de quase 10%.”
Kris Axtman, Why the rude oil prices?; The Christian Science Monitor, 15 Out. 2004

Observadores atentos e independentes afirmaram há já algum tempo que o barril de crude da OPEP pode chegar aos 60 dll antes do fim deste ano. Mesmo que depois regresse aos 40 dll por barril, tal inversão de tendência será passageira, dando lugar a novos ciclos altistas. A verdade é que este recurso energético, no qual repousou o essencial da segunda revolução industrial (1930 em diante) e a chamada sociedade de consumo, se aproxima a passos muito rápidos do chamado “peak of oil production”, isto é, do ponto a partir do qual todo o petróleo disponível será, para todos os efeitos, o último! Os Estados Unidos atingiram este ponto crítico na década de 70, e por isso têm que assassinar Presidentes na América Latina, financiar e armar o Estado de Israel, corromper e alimentar ditaduras no mundo árabe e desencadear guerras preventivas contra toda e qualquer ameaça às fontes petrolíferas onde se abastecem (salvaguardando o mais possível a sua própria Reserva Estratégica de Petróleo).

A produção de petróleo per capita começou a declinar de forma consistente em 1979, e o início da queda absoluta da produção a nível global começará, segundo Richard C. Duncan, em 2006 (a uma taxa de 2.45% ao ano, durante 34 anos!). Quer dizer, daqui a um ano e meio, poderemos estar já a lidar com preços de crude na ordem dos 100 dll/barril. Em 2008, ainda segundo as previsões de Duncan, as reservas de países como os EUA, México, Noruega, Angola, Rússia, Afeganistão, Urzebequistão, Azerbeijão, etc., começarão a decair mais depressa que as reservas da OPEC (Venezuela, Nigéria, Líbia, Argélia, Arábia Saudita, Emiratos Árabes Unidos, Qatar, Kwait, Irão, Iraque e Indonésia), colocando estes países numa clara posição de supremacia energética, mas também no centro de gigantescas disputas estratégicas. Pior do que isso, como nada de substancial se fez quanto ao crescimento populacional, à poluição e à devastação dos recursos naturais não-renováveis desde que Donella H. Meadows e a sua equipa publicaram “The Limits to Growth”, em 1972, 2006 poderá ser também o primeiro ano do fim da presente era antropológica. As crises energéticas suceder-se-ão a um ritmo imparável e tendencialmente catastrófico. Com elas sobrevirão todo o estilo de guerras e conflitos: guerras mini-nucleares, guerras hiper-tecnológicas, guerras assimétricas aterradoras, golpes de Estado, Estados de Emergência, e um longo etc que qualquer um de nós pode ir começando a imaginar. Ponderando as várias previsões sérias existentes, podemos esperar com razoável probabilidade que a grande implosão civilizacional inicie o seu movimento de não-retorno entre 2020 e 2030.

Como se imaginará, as presentes disputas políticas, nomeadamente em Portugal, embora reflictam já o estado de pânico que subrepticiamente vai tomando conta de quem pensa e de quem tem que decidir, estão a anos-luz do discurso informado que é necessário elaborar para nos prepararmos para a hecatombe que aí vem. O mundo não se desboroará de modo homogéneo. Uns cairão estrondosamente e depressa, outros conseguirão adiar a tragédia por mais umas décadas, ou mesmo sobreviver e adaptar-se. Mas para redesenhar a civilização por vir, temos que conhecer a verdade sobre o presente. E se os partidos políticos forem incapazes de o fazer, outras formas de organização e acção política poderão e deverão fazê-lo, em nome da sustentabilidade, da sobrevivência civilizacional e da vida.

Post-scriptum

As Moai da Ilha de Páscoa — A população desta pequena ilha (descoberta pelos holandeses em 1722) ultrapassou o seu pico de sustentabilidade por volta dos 10 mil habitantes. Os recursos tornaram-se escassos e as outrora luxuriantes florestas de palmeiras foram destruídas, para uso como fonte de energia e para dar lugar a terrenos de cultivo. A avançada ordem social de que gozavam começou então a declinar rapidamente, dando lugar a guerras civis e ao canibalismo. Supõe-se que todas as grandes e impressionantes estátuas da ilha (as Moai) foram derrubadas pelos próprios ilhéus no decurso da prolongada crise que acabou com o seu equilibrado modelo civilizacional. A população, por efeito da exaustão dos recursos disponíveis (e das doenças e escravatura trazidas pelos colonizadores europeus), viria a reduzir-se até pouco mais do que uma centena de habitantes. O mais curioso desta história é que os sobreviventes desconheciam a profunda crise que os levara até à situação em que estavam...


O-A-M #59 16 Outubro 2004