quinta-feira, novembro 15, 2012

A bolha da fome

Quem ganha afinal com a dita fome?

O alarido sobre a fome portuguesa cheira-me a fartura!

Bispos católicos preocupados com fome em Portugal

por Lusa, publicado por Luís Manuel Cabral, DN 10 novembro 2012.

Manuel Morujão, porta-voz da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP): "Já não se trata de nível de vida com dignidade, mas de questões de subsistência, de matar a fome", salientou o padre, sublinhando que a Igreja Católica "está no terreno para evitar ou reatar ruturas, sobretudo através dos seus múltiplos centros sociais, das Conferências de São Vicente Paulo, das Cáritas, das Misericórdias, que têm uma enorme capacidade de serviço social".

Os Bancos Alimentares em actividade recolhem e distribuem várias dezenas de milhares de toneladas de produtos e apoiam ao longo de todo o ano, a acção de mais de 1.800 instituições em Portugal. Por sua vez, estas distribuem refeições confeccionadas e cabazes de alimentos a pessoas comprovadamente carenciadas, abrangendo já a distribuição total mais de 275.000 pessoas —  in sítio do Banco Alimentar.

Aponta-se o número redondo de 280 mil pessoas que em Portugal passarão fome. Fome não passam, pois são estas mesmas pessoas carenciadas que o Banco Alimentar, as Misericórdias e outras Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS), já para não falar das câmaras municipais, supostamente cuidam com os víveres e apoios de vária natureza, incluindo pecuniários, que recebem, quer por via de subsídios do estado, quer por doações e dádivas particulares, nomeadamente de empresas, bem como de reconhecidas receitas próprias.

Mas vamos por partes...

Em março deste ano, 2012, a situação relativa ao programa conhecido por Rendimento Social de Inserção (RSI), oficialmente comunicado pelo governo, através do Gabinete de Estratégia e Planeamento (GEP) do Ministério da Solidariedade e Segurança Social (MSSS), era a seguinte:
  • Beneficiários individuais: 329.274
  • Valor médio mensal do rendimento por beneficiário: 91,7 euros
  • Famílias beneficiárias: 123.948
  • Valor médio mensal do rendimento por família: 245,4 euros
  • Estimativa do dispêndio anual de acordo com este dados: 362.333.109 euros
Existem neste momento mais de 5.079 IPSS segundo a listagem da Segurança Social. Estes números conferem com algumas contas que fizemos para um post anterior:
  • As transferências do estado previstas para a administração local em 2013 são de: 2.121.207.562€
  • Os encargos do estado previstos com o RSI em 2013 são de: 303.900.000€
  • Os subsídios e outras transferências do estado previstos para as organizações sem fins lucrativos em 2013 são de: 2.008.768.424€
  • Cada IPSS deverá abarcar em media 55 pessoas (estimativa)
  • As pessoas atendidas pelas IPSS rondarão os 279.345 (estimativa)
  • O apoio médio do estado por IPSS andará pelos 395.504,7€/ano (atenção: esta média é meramente teórica, pois há IPSS que recebem milhões, e outras nicles!)
Resumindo: as transferências correntes, subsídios e transferências de capital para as instituições sem fins lucrativos (IPSS) que o Orçamento de Estado para 2013 prevê é da ordem dos dois mil milhões de euros. Se somarmos a este valor as verbas previstas para o RSI (303.900.000€) teremos um resultado de despesa orçamental de natureza social na ordem dos 2.303.900.000€ — ou seja, mais do que a totalidade das transferências do orçamento de 2013 para o poder local!

Se o valor apurado for distribuído pelas 280 mil pessoas que supostamente passam fome, o seu rendimento mensal instantâneo seria de 685,68€. Alguém me explica como pode esta gente passar fome?!

Se há zonas de penumbra na sociedade portuguesa são as fundações mendicantes, as fundações que ajudam os seus beneméritos a fugir ao fisco, e a Caridade!

46% das receitas das IPSS provêm de transferências do estado: ou seja, este terceiro sector já vale no nosso país mais de 4.000 milhões de euros, e praticamente não paga impostos, nomeadamente em sede de IMI, IMT, IRS e IVA.

A enorme falta de transparência na ação do Banco Alimentar e da generalidade das IPSS, que recebem uma fatia muito apreciável do orçamento de estado, paga pelos nossos impostos e pelo défice público que anualmente cresce em volume e juros, é porventura responsável pela indignação geral face às palavras televisivas de Isabel Jonet.

Procurei, mas não encontrei, em parte nenhuma, algo que deveria ser de lei: relatórios de contas públicos de quem sendo entidade pública recebe dinheiros públicos e de empresas.

Agradeço, pois, ao Banco Alimentar que me indique onde poderei obter respostas às seguintes perguntas:

Que recebeu, desde 1999, o Banco Alimentar,  nomeadamente em:

Dádivas de materiais e equipamentos (valores estimados): ? 
Donativos:  ?
Subsídios:  ?
Quotas de associados:  ?
Toneladas de alimentos (valor económico estimado): ?

O esclarecimento destas cifras, certamente apreciáveis, deixar-nos-ia muito mais tranquilos.

E quanto ao desnorteado governo em funções, uma recomendação: porque não negoceia com a UNICRE a emissão de um cartão eletrónico de solidariedade destinado a facultar aos 280 mil portugueses carenciados um crédito para aquisição de alimentação na ordem dos 200 euros mensais? Em vez de uma sopa dos pobres humilhante teríamos a liberdade de escolha individual e familiar, acomodando-se à crise, mas estimulando também de forma saudável a produção e o comércio alimentares. Teríamos talvez menos caridade interessada, e menos escândalo (um pecado, creio), mas mais dignidade e uma enorme poupança orçamental.

Este cartão custaria ao orçamento entre 672.000.000€  e 772.800.000€ (neste caso, contando já com mais 15% de custos de implementação), sabendo-se exatamente de onde vem e para onde vai o dinheiro, ao invés dos 2.303.900.000€ inscritos no OE2013, que, salvo o RSI, não sabemos como se gasta.

Os intermediários, ou seja as IPSS, encharcam os média indigentes que temos com soundbytes sobre a fome. É caso para lhes exigir, desde já, que dêem explicações públicas detalhadas sobre o que fazem ao muito dinheiro que recebem dos bolsos dos contribuintes.


POST SCRIPTUM

Por 200 euros/mês

Bananas africanas do meu jardim - Carcavelos, Portugal.

Eu gasto pouco mais de 200 euros por mês em alimentação e bebidas, e como diariamente em casa.

A minha dieta é rica em vitaminas, hidratos de carbono e muito variada, sobretudo na construção intuitiva das ementas. Os alimentos são geralmente confeccionados por mim. Raramente ingiro pizzas ou hamburguers, e não toco em comida pré-cozinhada. Os únicos enlatados que consumo são: atum, tomate, coco, grão e feijão. Quanto a alimentos congelados, compro-os raramente e são quase sempre, ou espinafres, ou gelados. Das gorduras disponíveis, uso sobretudo azeite virgem extra, manteiga e banha de porco biológico. Não me lembro da última vez que ingeri refrigerantes. Prefiro sempre água, vinho, café, leite e uma grande variedade de chás e infusões.

Procuro sempre consumir produtos frescos da época, e tanto quanto possível locais. Faço regularmente as minhas compras na feira semanal de Carcavelos, na loja da herdade do Freixo do Meio situada no Mercado da Ribeira, no Celeiro de Rossio, no Centro Comercial da Mouraria, no Pingo Doce de Carcavelos e no Pão de Açúcar de Cascais.

Se pensar no que mais consumo ao longo do ano, a lista seria esta: leite fresco, iogurte feito em casa a partir de leite Vigor e um iogurte Activa da Danone, pão branco e escuro de vários cereais, fruta (com predominância de maçãs, laranjas, bananas e abacaxis), carne biológica, peixe fresco variado (com predominância de pescada, atum, raia, carapau e safio), queijos variados, fiambre de perna de porco e presunto, ovos, arroz branco e integral de qualidade superior (Basmati, etc.), massas variadas, couscous, batata, batata doce, farinha de pau (mandioca), cebola, alho, alho porro, abóbora, courgette, beringela, nabo, nabiça, cenoura, tomate, grelos, couve portuguesa, bróculos, cogumelos variados, algas, alface, gengibre, coco, vagens de piri-piri, curcuma, caril, salsa&coentros, frutos secos (nozes, caju, amendoim, amêndoas, avelãs, pinhões).

Admitindo que as pessoas carenciadas poderiam ter acesso a esta mesma dieta, e admitindo que são 280 mil, o custo anual para os cofres do estado seria aproximadamente de 672 milhões de euros, pouco mais do dobro do que a desnecessária RTP custa aos contribuintes que pagam impostos. Não me venham, pois, falar de fome em Portugal. Alguém mama os nossos impostos, aumenta a dívida e encharca a comunicação social com homilias sobre a pobreza e a fome!

Última atualização: 17 nov 2012, 16:49

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