segunda-feira, outubro 13, 2014

Para 2035 faltam só vinte anos

Na berma. Encontrado por Carlos Gomes nos caminhos insondáveis da Net

 

Vamos ter que mudar quase tudo em menos de uma geração


Mais do que continuarmos imersos na interminável guerra de palavras em volta das causas e efeitos que trouxeram a humanidade à presente crise financeira, económica, social, humanitária e cultural de que têm resultado epifenómenos conhecidos, como a proliferação do caos institucional e social, a instabilidade crescente dos sistemas políticos, as guerras civis e a crescente fricção bélica mundial, chegou o momento de olharmos para a geografia dos problemas, percebendo que há tendências objetivas de fundo, e que todos ganharemos em partilhar conhecimentos e soluções, pondo de lado o maniqueísmo social e os divisionismos locais e regionais. Estes, por melhores que sejam as razões, face à dimensão estrutural dos problemas em causa, não nos levarão a lado algum, salvo ao agravamento e extensão da tragédia coletiva que aflige já milhões de pessoas, se persistirmos na cegueira das causas imediatas do natural egoísmo de cada um e de cada grupo de interesses.

Sem percebermos a crise do paradigma energético não entenderemos nada do que se passa.

World primary energy consumption is projected to peak in 2035, when the world primary energy consumption rises to 15,914 million metric tons of oil-equivalent. By 2050, world primary energy consumption is projected to fall to 14,906 million metric tons of oil-equivalent. Peak Oil Barrel.

World carbon dioxide emissions from fossil fuels burning are projected to peak in 2027, with total emissions rising to 39,385 metric tons. Total carbon dioxide emissions are projected to fall to 29,309 million metric tons by 2050 and to 8,371 million metric tons by 2100. Peak Oil Barrel.

Não vale a pena irmos muito longe, nem sobretudo demasiado perto, procurar as causas da austeridade que caiu repentinamente sobre a maioria das pessoas. A população humana cresceu para lá da capacidade de satisfazer as suas necessidades materiais e culturais, e por isso envelhece agora como modo de adaptação à insustentabilidade coletiva, em vez de continuar a reproduzir-se exponencialmente.

A origem deste fenómeno encontra-se no esgotamento do próprio modelo de crescimento demográfico que assentou ao longo dos últimos duzentos anos no uso de técnicas de produção revolucionárias baseadas em fontes de energia que até então o homem não conhecia, ou conhecia mal, ou não dominava suficientemente:
  • o carvão usado nas locomotivas, barcos e outras máquinas alimentadas a vapor de água sob pressão, e ainda na produção da eletricidade aplicada à iluminação, alimentação de máquinas e exploração dos invisíveis, etéreos e virtualmente inesgotáveis campos eletromagnéticos; 
  • o petróleo necessário aos motores de ignição/explosão de vapores, que tornaram possível a expansão da indústria automóvel, náutica, aeronáutica e espacial, mas de onde sairia também a vasta e complexa indústria petroquímica imbuída no fabrico de quase tudo o que hoje usamos e consumimos; 
  • a energia hidroelétrica oriunda de centenas de grandes barragens; 
  • mais tarde a energia nuclear, 
  • e ainda os geradores eólicos, 
  • a energia fotovoltaica, etc. 

Sem carvão, sem petróleo e sem gás natural, porém, não haveria petroquímica, nem mais de 70% da energia elétrica hoje produzida e da qual depende criticamente o funcionamento das sociedades industriais e tecnológicas contemporâneas.

Pois bem, é este paradigma de energia abundante, transportável, armazenável e relativamente barata que tem vindo, desde 1973, a aproximar-se rapidamente do auge e do subsequente período de declínio. A observação dos quatro gráficos seguintes poupa muita retórica!

O peso do petróleo no PIB mundial cresce há mais de 40 anos


O consumo aumenta mais depressa do que a produção

Os produtores de petróleo precisam de vender cada vez mais caro...

Este mapa, em conjunção com os anteriores, mostra os limites temporais objetivos da globalização equitativa

No primeiro gráfico é clara a tendência para o encarecimento no petróleo e para a fatia crescente do PIB mundial dedicado à sua produção.

No segundo gráfico mostra-se que o mundo consome neste momento mais petróleo do que produz, ou seja, que a despensa das reservas começa a encolher.

No terceiro gráfico mostra-se até que ponto os principais países produtores de petróleo dependem cada vez mais dos elevados preços do mesmo para manterem os seus orçamentos públicos equilibrados. Na realidade, o chamado fiscal break-even oil price variava, em 2012, entre os 53,6USD por barril (no Kwait) e os 153,1USD pb (na Venezuela). Mesmo no caso da Arábia Saudita, o valor mínimo a que têm que vender o crude, para não afetar a respetiva estabilidade orçamental (e polítics!), encontra-se, desde 2012, acima dos 90USD. Ou seja, abaixo dos 80 dólares o barril, a maiorira dos países produtores de petróleo colapsa, e acima dos 120 dólares, é a economia mundial que estagna ou entra em recessão.

Finalmente, no quarto quadro, um mapa-mundo da distribuição do consumo do petróleo per capita em 2013, ficamos a saber que a tendência para um consumo geograficamente mais equilibrado e equitativo do petróleo está definitivamente comprometido, suscitando uma situação extremamente perigosoa no mundo, pois a expansão económica acelerada de países como a China, Rússia, Índia, Indonésia, Brasil, África do Sul, Angola, etc., pode ter chegado ao fim, pois a produção petrolífera em todos estes países já atingiu o pico. A China é agora o primeiro importador mundial de petróleo, tendo ultrapassado os Estados Unidos, e a Índia o terceiro. É pois difícil imaginar como o movimento de equalização económica que o fenómeno dos chamados países emergentes permitiu antever chegará a bom porto, sendo certo que tal aproximação é de todo impossível sem exportações maciças de petróleo do Médio Oriente e da Rússia para a Ásia. Mesmo a África e a América do Sul não tardarão a ver os limites dos gigantescos recursos de que ainda dispõem e que exportam já para lá do limiar da sustentação futura das suas economias.

Este mapa permite ainda perceber claramente porque motivo a Europa de Leste e o Médio Oriente se transformaram ao longo das últimas duas décadas nas duas zonas militarmente mais explosivas do planeta. O aumento de tensão e a probabilidade de guerras nos mares da China, Amarelo, do Japão e das Filipinas decorre da dependência crescente dos países do Oriente e Extremo Oriente (Índia, Indonésia, Filipinas, China, Coreia e Japão) dos recursos energéticos do Médio Oriente, África e América do Sul.

As soluções não estão à vista, mas é provável que as situações na China, no Japão e na Índia, cada vez mais dependentes de recursos essenciais que são forçados a importar em larga escala, venha a complicar-se num futuro relativamente próximo. A Revolução dos Guarda-chuvas, em Hong Kong, tal como as revoltas no Brasil, a Primavera Árabe, a nova crise na Crimeia e na Ucrânia, a guerra pela fragmentação da Síria e o cerco ao Irão depois da destruição do Iraque, são sinais mais do que evidentes da crise aguda de crescimento instalada à escala global.

Vamos ter que consumir menos energia e mudar radicalmente os paradigmas valorativos da prosperidade e do desenvolvimento. Tal como a economia digital caminhou rapidamente para modelos de consumo gratuito e garantido, tirando o máximo partido das economias de escala e das mais valias proporcionadas por serviços de valor acrescentado, também a economia tradicional, sobretudo aquela que diz respeito ao acesso básico à água, alimentação, energia e mobilidade e transportes terá que passar em breve por uma verdadeira revolução económica e social.

Mas para que esta metamorfose possa ocorrer de forma ordenada precisaremos de abrir as janelas da razão, da criatividade, da ética e do amor, e desligar os perigosos motores do maniqueísmo.


REFERÊNCIAS

  1. Fiscal break-even oil prices for major OPEC members
    April 3, 2014
    Dr Abhishek Deshpande and Nic Brown
    Oil&Gas Financial Journal


    Estimates point to a reduction of 200,000 barrels per day (b/d) in oil output and exports during 2014, which will sharply increase Saudi Arabia’s fiscal break-even oil price to approximately $97 per barrel (bbl). Coupled with mounting domestic fiscal pressure, tensions among OPEC members could be amplified as the debate over individual country output quotas is put in the spotlight.
    [...]
    Lower forecasts for 2014
    Collectively, these five key OPEC crude oil producers [Saudi Arabia, Iran, Iraq, Kuwait, UAE] have an output-weighted fiscal break-even oil price of around $93.3/bbl for 2014. Kuwait and the UAE have the lowest fiscal break-even oil prices, owing to high levels of oil production and exports relative to the size of their population.
  2. Deutsche Bank AG
    Commodities Outlook

    Supply momentum, supply curtailments and supply shock
    July 2014
     
  3. What is Fiscal Breakeven for Oil States?
    Posted on 19 April, 2014    by alfin2101
    When a national government depends upon income from oil & gas to balance its budget, the prices of oil & gas become very important to the economic health of that country. When oil-state governments grow financially over-extended through greed, corruption, ambition, or desperation, fiscal breakeven oil prices rise — even if market oil prices fall.
  4. BP Statistical Review of World Energy, June 2014
    BP-pdf

Atualização: 13/10/2015, 11:23 WET

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