domingo, março 05, 2017

O Assalto ao Banco de Portugal (novos episódios)

Sede do Banco de Portugal
Foto ©desconhecido

Saberá Carlos Costa demasiado para continuar onde está?


A reportagem da SIC é uma espécie de embuste mediático destinado a facilitar o assalto da Geringonça ao Banco de Portugal. Oculta, por um lado, o histórico do BES desde 2006, e por outro também oculta o simples facto de os principais bancos portugueses estarem sob supervisão direta do Banco Central Europeu, e não de Carlos Costa, desde 4 de novembro de 2014. Por fim, o que é evidente foi ter existido um triângulo político-financeiro inexpugnável montado por José Sócrates, Ricardo Salgado e os capturados BES (imparidades de, pelo menos, 6 mil milhões de euros), BCP (imparidades de, pelo menos, 7 mil milhões de euros) e Caixa Geral de Depósitos (imparidades de, pelo menos, 5 mil milhões de euros).
Fuentes próximas a la investigación han explicado que la investigación, que se inició hace dos años, se dirige hacia un entramado de empresas tipo trust que tiene su origen en una filial del banco portugués Espírito Santo en Madeira y que habría utilizado a Cahispa para efectuar inversiones sin pagar al fisco. 
— in Bloqueados más 1.500 millones de euros de cuentas de los bancos Espírito Santo y BNP, El País, 2/11/2006.
Nessa palestra sobre a estratégia de Pequim em África, citada numa publicação ligada ao Departamento de Estado dos EUA, o analista sul-africano apenas aflorou as "ligações estratégicas" entre Pequim e companhias e bancos portugueses com influência em países como Angola. 
Ontem por telefone, Davies-Webb salientou ao PÚBLICO o caso da Eskom (1), empresa do Grupo Espírito Santo, com um papel preponderante de ligação entre Pequim e o poder em Luanda, junto do qual a instituição portuguesa tem influência. 
(1) Davies-Webb referia-se certamente à ESCOM. 
— in Portugal "ajudou a aproximar" China e Palop, Público, 12/12/2006.

Carlos Costa talvez tivesse tido razões ponderosas para não provocar uma corrida ao BES e ao resto dos bancos instalados no nosso país. Há muito, pelo menos desde quando Vitor Constâncio pontificava no Banco de Portugal, e José Sócrates no país, que o Grupo BES deveria ter merecido outra atenção dos reguladores e do poder político. São por isso muitos os co-responsáveis pelos danos causados ao país pelo colapso do BES. Encurralar agora Carlos Costa como um bode expiatório do desgraçado estado financeiro em que Portugal se encontra, quando nem José Sócrates, nem Ricardo Salgado, nem vários outros arguidos foram ainda acusados pelo que supostamente fizeram, diz bem da degradação a que chegámos.

Desde novembro e dezembro de 2006 (buscas nas sucursais do BES em Espanha e alerta sobre papel do BES em Angola), tal como desde maio de 2013 (relatório do BPI sobre o BES), e sobretudo depois de 22 de maio de 2014 (notícia da Reuters sobre investigações no Luxemburgo sobre o GES), ou ainda desde a revelação da SIC, feita por José Gomes Ferreira a 20 de junho de 2014, sobre o pedido de ajuda de Ricardo Salgado a Pedro Passos Coelho (recusado), que as campainhas de alarme sobre o Grupo Espírito Santo soavam sem cessar.

Durante todos este tempo, e sobretudo depois do alerta do BPI de janeiro-maio de 2013, dado a conhecer ao Banco de Portugal em agosto do mesmo ano, e até 21 de julho de 2014, não apenas os socialistas, mas também Cavaco Silva, Marcelo Rebelo de Sousa, Marques Mendes e a imprensa económica em geral asseguravam publicamente a saúde do BES.

A resolução do BES foi anunciada por Carlos Silva no domingo, dia 3 de agosto, às 23:15 minutos. 

Ou seja, segunda-feira, 00:15 da madrugada do dia 4 de agosto em Bruxelas e Frankfurt. 

Por incrível que pareça, até hoje nenhum órgão de comunicação, jornalista, ou analista se deteve sobre este pormenor. Porquê este dia e esta hora? Completava-se a 4 de agosto de 2014 os vinte dias mínimos necessários à entrada em vigor do mecanismo de resolução bancária aprovado pelo Parlamento Europeu no dia 15 de julho de 2014. Antes desta data teria sido impossível, ou ilegal, resolver o BES, cuja sangria era já imparável.

Até à data e hora em que ocorreu a resolução do BES o governador do Banco de Portugal não tinha nenhum instrumento que impedisse a falência descontrolada do BES em caso de uma denúncia explícita da situação real do universo Espírito Santo. Ações de persuasão sobre Ricardo Salgado não tiveram qualquer efeito. Mas acima de tudo, não podia decidir nada de essencial sem a aprovação do BCE.

Carlos Costa não teve outra alternativa que não fosse esperar pelo mecanismo de resolução bancária e pelo BCE. Ou seja, foi o BCE quem determinou o curso dos acontecimentos, em linha, aliás, com o futuro mecanismo único de supervisão bancária que entraria em vigor a 4 de novembro de 2014.

Em junho de 2014 Pedro Passos Coelho disse não a Ricardo Salgado, em primeiro lugar porque os bancos portugueses já se encontravam sob controlo do BCE, e depois porque sabia que um empréstimo de 2500 milhões de euros ao GES através de um sindicato bancário patrocinado pela Caixa Geral de Depósitos seria transformar o suicídio do BES/GES num genocídio bancário.

As medidas determinantes desenhadas para impedir que o colapso do GES-BES se transformasse numa derrocada completa do sistema financeiro português foram desenhadas e lançadas pelo Banco Central Europeu. Não pelo Banco de Portugal. Logo...

A caravana do populismo prefere agora, porém, usar a confusão para eleger um bode expiatório e, assim, tentar tomar de assalto o Banco de Portugal, peça essencial para proteger a Caixa Geral de Depósitos recauchutada das suas próximas avarias.

PS1: Cheguei a pedir no Facebok e no Twitter a demissão de Carlos Costa logo após a reportagem da SIC, mas bastaram 48 horas para rever os meus próprios posts neste blogue e perceber que estava errado. Carlos Costa pode muito menos do que a sua circunstância. E o Governo de Portugal, em matéria de bancos, já não manda nada, ou muito pouco. Por um lado, porque mais de 60% dos bancos portugueses foram desbaratados por um regime corrupto e incompetente (BPN, BCP, BPI, Banif), e por outro, porque quem manda no Banco de Portugal é o BCE.

PS2: Se alguém puxar por um fio da meada Caixa Geral de Depósitos, chamado ARTLAND, saberemos a razão de tanto nervosismo no seio da Geringonça a propósito do Banco de Portugal e da Caixa. Mas para que tal aconteça é preciso que uma fonte mistério se sente ao colo de um jornalista, não é?


A DECISÃO DO BCE E OS ÚLTIMOS DIAS DO BES

2014

30 junho
Termina Programa Assistência Económica e Financeira (PAEF), acordado em maio de 2011 entre as autoridades portuguesas, a União Europeia e o FMI. Segue-se uma fase de monitorização pós-programa – Post-Programme Surveillance, no âmbito da supervisão das instituições europeias; Post-Program Monitoring, no âmbito da supervisão do Fundo Monetário Internacional (FMI). Estima-se que este programa de vigilância/monitorização se manterá até 2035, com visitas semestrais ao país.

15 julho
—Parlamento Europeu aprova regulamento do resolução bancária (entra oficialmente em vigor passados 20 dias da data da sua publicação no Jornal Oficial da União Europeia).
—Goldman Sachs: compra 2,27% do BES.

21 julho
—Cavaco Silva afirmou que os portugueses podiam confiar no BES de acordo com informações que recebia do Banco de Portugal.

22 julho
—BES revela à CMVM que a Goldman Sachs comprou 127,6 milhões de ações a que então correspondia 2,27% do capital.

23 julho
—Imprensa portuguesa entusiasma-se com o apetite da Goldman pelo BES
—Citi recomenda a compra de ações do BES...
—Muitos idiotas dão ordem de compra, e muitos ingénuos adiam a sua saída do buraco chamado BES...
—Goldman vende neste mesmo dia 4,4 milhões de acções, ficando fora da participação qualificada.

29 julho
— A-G do BES é adiada sine die a pedido da ESFG depois de ver aceite por parte das autoridades luxemburguesas o seu pedido de protecção contra credores.

30 julho
—Publicação no Jornal Oficial da União Europeia do regulamento da resolução bancária (entra em vigor 20 dias após esta data: 19/8/2014.

01 de agosto, sexta-feira
—BCE retirou o estatuto de contraparte ao BES, suspendendo assim o acesso do banco às operações de política monetária.
—BCE exige ao BES a devolução, até dia 4 de agosto, dos 10 mil milhões de euros emprestados.
—A imprensa anuncia, oito dias depois do sucedido, que a Goldman Sachs deixou de ter uma participação qualificada no capital do BES após vender mais de 4,4 milhões de ações, ficando com menos de 2% da instituição. Esta alienação da posição ocorreu, recorde-se, no dia 23 de julho!
Ou seja, a Goldman vendeu, não dia 30 de julho, o que comprara no dia 15. No dia em que os brokers e a imprensa económica recomendaram a compra de mais lixo ao BES, a Goldman Sachs vendeu o dito lixo!

03 de agosto, domingo, 23:15/ ; 04 de agosto, segunda-feira, 00:15, em Bruxelas e Frankfurt
-Resolução do BES

04 de novembro
—Os principais bancos portugueses—BCP, Novo Banco, BPI, CGD— passam a estar sob controlo direto do BCE.

2016

03 de agosto
O Banco Central Europeu revogou a autorização do Banco Espírito Santo para o exercício da atividade de instituição de crédito. A decisão de revogação da autorização do BES implicou a dissolução e a entrada em liquidação do banco.



DESENVOLVIMENTO DO TEMA NOS MÉDIA

Assalto ao Castelo, que caíu no colo do jornalista Pedro Coelho, é apenas mais uma árvore da floresta que ninguém quer mostrar, nem ver. Desde logo, e a começar, Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa.
Expresso, 06.03.2017 às 11h06 WET 
Carlos Costa enviou esta segunda-feira uma carta à presidente da Comissão parlamentar de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa (COFAP), Teresa Leal Coelho, pedindo para ser ouvido para prestar esclarecimentos sobre o seu papel e o do Banco de Portugal no caso BES, depois de na reportagem da SIC, "Assalto ao Castelo", ter-se admitido que o governador ignorou informações que lhe teriam permitido afastar mais cedo Ricardo Salgado da liderança do banco da família Espírito Santo.

Publicado: 05/03/2017, 02:46 WET
Atualização: 06/03/2017, 12:47 WET

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