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Estação de Castanheira do Ribatejo, às moscas desde 2006. Responsabilidade: Refer; construtor: Somague. |
Nunca um congresso do PS pareceu tanto uma convenção mafiosa
Há um ambiente estranho no congresso antecipado do Partido Socialista. António José Seguro não diz nada de jeito, olha para o lado, e o lado move-se como uma sombra inquieta pelos corredores e ruelas de Santa Maria da Feira, fazendo uma marcação cerrada às suas palavras, inibindo-o de decidir seja o que for que surja imprevistamente e fora da pauta dos trabalhos de um conclave sem disputa aparente. Cavaco falou, mas António José Seguro teve que esperar pelo congresso para balbuciar umas frases ininteligíveis sobre o assunto, enquanto que, entre o discurso do presidente da república no dia 25 de abril e o congresso, a sombra desmultiplicou-se em declarações bombásticas sobre a criatura de Belém e o novo governo de iniciativa presidencial. Apareceu, entretanto, a notícia de uma carta do novo ministro Miguel Poiares Maduro ao PS solicitando uma reunião. A sombra travou uma vez mais Seguro e acusou imediatamente o Governo de “encenar diálogo” (
Expresso, 27 abr 2013), deixando a este último a tarefa humilhante de balbuciar aos jornalistas que a sua resposta (do PS, diz) será entregue na próxima terça-feira (
TVI 24). A cereja assassina em cima do bolo dinamitado desta farsa foi oferecida por Sérgio Sousa Pinto:
“[...] o nosso principal problema é de credibilidade. Enquanto não o reconhecermos e não o enfrentarmos enquanto não nos apresentarmos neste país com protagonistas credíveis de mudança e de ruptura estaremos a falhar ao povo português” (i online, 27 abr 2013)
Este congresso Kim Il-sunguiano do PS, que apregoa mais democracia e abertura à sociedade, mas onde apenas vemos um candidato tolhido (os outros dois que tentaram, nem sequer conseguiram ultrapassar a barreira burocrática do partido), não é só uma encenação, mas uma conspiração. As sombras dos idos de março coligaram-se para atar António José Seguro de mãos e pés e deixar espaço livre a José Sócrates. O pobre secretário-geral a prazo está assustado!
O rodopio mediático das tropas de Sócrates e de Soares no congresso do PS contrasta com os discursos medíocres e sem alma dos fracos turcos que escreveram a tal carta aberta ridícula a António José Seguro. E contrasta ainda com a apatia de seita estampada no semblante indigente dos congressistas.
Foi enternecedor ver o jovem Tiago Silveira falar dos desempregados e dos pobres — em nome da tal carta-aberta. Talvez pudesse levar os pobres de espírito deste pais, congressistas incluídos, a passear no Gianzo, um iate topo de gama que comprou ao dono da Tecnovia com empréstimo da CGD (
Correio da Manhã, 17 out 2012).
Sinais contraditórios
Ao juntar as peças deste labirinto de sombras ouvimos o coro repetir a cada hora que passa o fim do diálogo com o governo, a necessidade de deitar o governo abaixo, e a radiosa alternativa de esquerda que o PS tem pela frente: “Edite Estrela defende alianças à esquerda para alcançar governo maioritário” (
i online, 27 abr 2013). Mas a mesma Edite, madrinha omnisciente do partido cor-de-rosa, afirma no mesmo dia, desta vez ao semanário dum aliado na fronda criada contra o governo de coligação, que “Portas é o político mais poderoso do país” (
Expresso, 27 abr 2013), sugerindo que é sua a chave que abre ou fecha a porta à sobrevivência de Passos Coelho. Há aqui uma contradição, pelo menos aparente: afinal com que diabo está o Partido Socialista disposto a coligar-se: Louçã, ou Portas?
Edite Estrela, na realidade, está a defender um futuro governo PS+CDS, mas embrulhado com uma prata populista de esquerda (virtual, claro), para enganar os jovens tolos do PS que devem a sua vida míope a José Sócrates, mas escrevem cartas-abertas a António José Seguro.
Enigma
Tudo isto parece-me lógico. Não entendo, porém, a tensão e a pressa. Qual é a pressa?
Recebi hoje um
álbum de fotografias sobre mais um deserto deixado por aí por José Sócrates, à semelhança do
aeromoscas de Beja. Trata-se da estação de caminho de ferro, mandada construir pela Refer em Castanheira do Ribatejo, que custou 30 milhões de euros, sumptuosa, inaugurada ainda em obras, que está às moscas desde 2005, e que se tornou por isso um problema de segurança, caminhando para uma rápida deterioração (ler notícias do Mirante
aqui, e
aqui).
Talvez comece agora a entender o que move a sombra neste soturno congresso do PS. Talvez seja a entrada em ação da parte do Memorando da Troika que até agora foi boicotada, e que por não ter sido cumprida induziu o conhecido exagero nas doses de austeridade. Refiro-me ao ataque às rendas excessivas da corja rendeira, e à renegociação das ditas parcerias público-privadas (PPP). É que depois de Cavaco Silva ter fechado a porta a uma dissolução do parlamento (salvo se o PP abandonar o governo), começou a caça ao legado catastrófico e potencialmente explosivo dos governos de José Sócrates. O regresso de Paris pode ter sido, afinal, apressado e com consequências imprevisíveis.
A procissão dos
swaps ainda vai no adro, mas já deu para perceber duas coisas: é um buracão colossal, recheado de má administração e de mais do que prováveis operações ilícitas ou até criminosas.
Vamos ver quem é que no PS, no PCP ou no Bloco quererá investigar o ‘swapgate’. Com tanto namoro hipócrita à esquerda por parte das tropas socratinas e soaristas, vai ser difícil...
As operações
swap realizadas pelo Santander-Totta com o governo de José Sócrates começaram em 2005 (
Sol, 27 abr 2013). António Vitorino é Presidente da Mesa da Assembleia-geral do Banco Santander Portugal (1998 - 1999) e do Banco Santander Totta desde 2005. Parece-me razoável perguntar-lhe o que tem a dizer sobre este negócio entre o Estado, através de um governo liderado por um colega de partido, e um gigante financeiro privado, onde desempenha uma função de topo. Soube dos
swaps?
Esperam-se, pois, muitas cenas e muitos capítulos nesta telenovela de Sopranos. Nada de ilusões: António Costa não passa de uma manobra de distração.