sexta-feira, julho 13, 2007

Petroleo 7

Luton suspende construção de nova pista

A Abertis Airports, (empresa espanhola formada pelo grupo Abertis, com 90% do capital, e pela AENA Internacional, com 10%), proprietária do aeroporto londrino de Lutton, que opera através da sua associada TBI, decidiu não construir uma nova pista e instalações conexas (terminal) previstas no plano de crescimento do aeroporto até 2015. A decisão, anunciada na manhã de 10 de Julho de 2007, apanhou de surpresa o mercado. A TBI disse que novos planos para aquele aeroporto serão anunciados no fim do ano, e que para já, o foco da actividade estará na optimização da actual infraestrutura.

O Presidente da TBI afirmou (1):
"We are committed to the delivery of facilities to meet the needs of our customers and at the same time fulfill our shareholder expectations.

"Therefore, we have decided that our proposals should focus on making the most of the existing airport site.

"As a result we have withdrawn the current Master Plan (issued for consultation in October 2005)."
Esta notícia pode ser o sinal de que algo começa a ser percebido pelos investidores, de quem afinal dependem cada vez mais as actuais indústrias aeronáutica e de transportes aéreos. A incapacidade da produção petrolífera de suprir as estimadas necessidades de Jet fuel para o anunciado crescimento do transporte aéreo de mercadorias e de passageiros até 2030, factor omisso em todos os estudos optimistas sobre o tráfego aéreo mundial, parece estar agora a ser considerado nas decisões estratégicas de médio e longo prazo. Segundo o artigo Flight-Path Britain, de John Busby, publicado em 27 de Março de 2007, a procura e a oferta do Jet fuel para os aviões de todo o mundo começará a divergir irreversivelmente a partir de 2010.

Estas duas citações (2) dão conta de dois problemas insolúveis e que parecem começar agora a influenciar as decisões do dinheiro:

Disponibilidade do Jet fuel

"Em 2015 a produção de "todos os petróleos" terá caído de um pico, em 2010, de 33 Gb, para 31 Gb;
Em 2015, a projectada exigência de Jet fuel será de 2,6 Gb, ou seja, uns ainda alcançáveis 8,4% da produção petrolífera global.
Mas em 2030, a produção de petróleo terá caído para 23,5 Gb, ao mesmo tempo que a necessidade de Jet fuel terá chegado aos 3,9 Gb, ou seja, 17% da produção petrolífera mundial.

"A procura dos demais derivados petrolíferos tornará então impossível destinar 17% da produção de petróleo ao Jet fuel.

"Uma taxa de crescimento exponencial de 4,5% no tráfego de passageiros e de 5,9% no tráfego de carga (de acordo com as previsões da Airbus) exigiria, mesmo com as proclamadas eficiências no uso do combustível, uma quantidade de Jet fuel impossível de conseguir."

Pistas de aviação

"Isto, com efeito, implica que entre 2005 e 2030, apenas cerca de 60% das expectativas do mercado de passageiros, e 45% das de carga, poderão ser cumpridas, embora o défice de combustível só venha a tornar-se mais evidente no fim deste período. Muito antes de isto acontecer, porém, as encomendas de aviões serão canceladas e as acrescidas eficiências de combustível actualmente previstas não poderão concretizar-se, pois o aumento da proporção de aviões velhos acentuará as faltas de provisão de combustível.

"As estimativas do Departamento de Transportes do Reino Unido e da Airbus não consideram as implicações do recurso combustível inerentes à sua projectada expansão do tráfego aéreo. A falta de consideração deste factor leva a que o crescimento previsto do tráfego não possa ser concretizado, já que a produção de Jet fuel será incapaz de atender à procura. Quanto mais alta for a taxa de esgotamento das limitadas reservas de petróleo, mais cedo ocorrerá o colapso do transporte aéreo comercial.

"A construção de pistas adicionais, a fim de satisfazer o crescimento estimado das viagens aéreas, suscita expectativas que não poderão ser cumpridas. As pistas em Stansted e Heathrow, se chegarem a ser construídas, servirão como zonas de estacionamento para um número crescente de aeronaves redundantes.

"O canto do cisne da aviação comercial será assinalado pelo estacionamento progressivo das frotas nas pistas, tal como a redução na oferta de Jet fuel será o primeiro indicador do fim da era petrolífera." (3)
É por estas e outras que a ideia de construir um novo aeroporto internacional com características de plataforma intercontinental, ou de cidade aeroportuária, na região de Lisboa, é uma miragem. A atitude prudente e responsável é ampliar e optimizar o pessimamente gerido aeroporto da Portela (4); abandonar a ideia de construir novas infra-estruturas, como a Ota ou Alcochete (5), e adaptar a base aérea do Montijo para aeroporto complementar da Portela. Por outro lado, a prioridade absoluta no sector dos transportes deve passar pelo abandono estratégico dos motores de combustão e, em contrapartida, pela opção por tudo o que se possa mover a energia eléctrica e animal: combóios, "trolleys", eléctricos, people movers, ascensores, Segways, bicicletas tecnologicamente avançadas, etc. Por outro lado, substituir a bitola ibérica em toda a rede ferroviária nacional, pela bitola europeia, é, por si só, um mega-projecto absolutamente necessário, mas irrealizável sem o apoio da União Europeia. É aqui que os esforços e as negociações devem insistir. Não na eternização do negócio dos estudos (que alimenta as principais máquinas partidárias do país, além dos boys e das girls do Bloco Central), nem nas obras de Santa Ingrácia, que todos pagamos, mas de cujo fracasso ninguém é responsabilizado.



1 - Ver notícia original na Sanders Research Associates
2 - Recuperadas de uma tradução realizada por Resistir.info
3 - O fim da era petrolífera não significa o fim da exploração petrolífera, mas sim o fim da afluência de petróleo barato para queimar estupidamente, como tem sido feito nos últimos 93 anos (mais precisamente desde o início da Primeira Grande Guerra Mundial). O reconhecimento de que o "peak oil" está mesmo ao virar da esquina chega-nos, entretanto, no último relatório da Agência Internacional de Energia, publicado no passado dia 9 de Julho. Aqui fica um extracto da respectiva introdução:

"Despite four years of high oil prices, this report sees increasing market tightness beyond 2010, with OPEC spare capacity declining to minimal levels by 2012. A stronger demand outlook, together with project slippage and geopolitical problems has led to downward revisions of OPEC spare capacity by 2 mb/d in 2009. Despite an increase in biofuels production and a bunching of supply projects over the next few years, OPEC spare capacity is expected to remain relatively constrained before 2009 when slowing upstream capacity growth and accelerating non-OECD demand once more pull it down to uncomfortably low levels." - International Energy Agency - Medium-Term Oil Market Report, July 2007. (PDF)
4 - A já famosa falta de Slots, que justificaria a urgência de um novo aeroporto na região de Lisboa, não passa, de facto, da mais pura contra-informação ao serviço da manipulação governamental em torno da Ota, como se pode comprovar no certeiro PDF de Rui Rodrigues sobre esta obscura miudeza, que políticos e opinocratas de serviço têm grande dificuldade de entender.

5 - A menos que a investigação tecnológica em curso consiga desenvolver rapidamente novas aeronaves, menos ruidosas e menos dependentes do petróleo, como pode ser o caso, do Silent Aircraft eXperimental SAX-40, não vejo como evitar uma rápida estabilização, ou mesmo retrocesso, do actual boom da aviação comercial de passageiros.

OAM #222 13 JUL 2007

6 comentários:

Diogo disse...

Não concordo com o artigo. Considero o transporte aéreo (não, obviamente, para cargas pesadas) o mais eficiente em termos energéticos de todos os tempos. Um avião de carreira normal, gasta dez litros de combustível por km. Em linha recta e sem infra-estruturas – estradas ou carris – que necessitem de manutenção.

Com o desenvolvimento dos computadores e das telecomunicações, o teletrabalho irá expandir-se. As deslocações casa-emprego-casa, que consomem diariamente quantidades incomensuráveis de combustível, vão desaparecer. O transporte rodoviário tenderá a diminuir. O transporte aéreo prosperará.


PS) Você tem um excelente blog. É pena que tenha tão poucas visitas.

António Maria disse...

Os aviões mais recentes gastam entre 5 e 10 litros de QAV (Jet fuel) por cada 100 Km de voo e por cada passageiro, i.e. 5-10L/Km/PAX (ver PDF). Um pouco mais, portanto, do que o valor excessivamente optimista anunciado pelo Diogo.

Por outro lado, embora se prevejam melhorias substanciais no consumo e nas emissões de CO2, a verdade é que o crescimento da procura, por um lado, e o pico petrolífero, por outro, formam uma tesoura inescapável. Mais tarde ou mais cedo. O que o meu artigo faz é chamar a atenção para este problema, dando dois exemplos compilados pelo artigo de John Busby: o volte-face na decisão de construir uma nova pista no aeroporto de Lutton, e, para citar o mesmo artigo, as inflexões estratégicas da Boeing e da BAe, da aviação comercial para as indústrias de defesa:

"Aircraft manufacturing is dominated by two giants, Boeing and Airbus. If it is clear to those most affected by oil depletion, are there signs of concern in their planning?

"Boeing took the first initiative by reducing its reliance on commercial airplanes manufacture in favour of 'integrated defence systems'. In 1993 Boeing's commercial airplane manufacture comprised 80% of the turnover and integrated defence systems 20%. In 2005 this changed to 41% and 59% respectively. The diversification was achieved mainly by acquisition of defence supply companies. National priorities will always ensure that defence equipment is adequately fuelled, so the change of emphasis hedges Boeing's business against the inevitable demise of the commercial airplane sector.

"A similar policy has belatedly been adopted by the UK's BAe, which has recently sold its participating shares in Airbus to the holding company, the EADS Group, and it intends to concentrate on defence systems." - in Flight-Path Britain, by John Bushby.

PS: O António Maria tem vindo a subir paulatinamente de audiência, tendo actualmente uma média mensal de 6000 leitores (boa parte deles, assíduos :-)

Diogo disse...

António: «Os aviões mais recentes gastam entre 5 e 10 litros de QAV (Jet fuel) por cada 100 Km de voo e por cada passageiro, i.e. 5-10L/Km/PAX (ver PDF). Um pouco mais, portanto, do que o valor excessivamente optimista anunciado pelo Diogo.»

Se considerarmos que um avião normal leva 100 passageiros, teremos então que os aviões gastam (na pior hipótese dos dez litros), mil (1000) litros por cada 100 quilómetros. Ou seja, 1 litro por cada dez quilómetros. Relembrando o meu comentário: « Um avião de carreira normal, gasta dez litros de combustível por km». Não fui, portanto, excessivamente optimista, mas ainda mais pessimista que o meu amigo. E procurando ao acaso na Internet:

The A380, which burns about four litres of fuel per passenger every 80 miles and can fly some 8,000 nautical miles, can seat as many as 550 passengers.

The current rule of thumb on fuel consumption is that an intercontinental flight consumes fuel in the region of 3 litres/passenger/100 km, if the plane is full. On shorter flights, a jet passenger plane consumes fuel in the region of 3–5 litres/passenger/100 km, if the plane is full.

Em suma: o transporte aéreo (não, obviamente, para cargas pesadas) é o mais eficiente em termos energéticos de todos os tempos. Não há estradas a construir nem carris e catenárias a montar. E o ar (a infra-estrutura onde o avião se desloca) não precisa de manutenção.

De que outra forma as «low cost» poderiam oferecer viagens a 10, 20 ou 30 euros para qualquer ponto da Europa? Comparem-se estes preços com as viagens de carro (cheio) ou de comboio.

De qualquer forma, os grandes consumidores de petróleo nos transportes são os automóveis – na, cada dia mais estúpida, viagem casa-emprego-casa. O teletrabalho pode reduzir esse consumo para valores infinitamente mais baixos. Ou seja, o pico petrolífero poderá não acontecer nas próximas décadas. Mas se acontecer, o avião continuará a ser o meio de transporte mais racional para «longas» distâncias.


Quanto ao número de leitores deste blogue fico satisfeito que tenha vindo a aumentar porque, de facto, este é um bom blogue com muita informação relevante. Eu sou um dos assíduos de que fala.

Um abraço.

Diogo disse...

António, peço-lhe um favor, desligue o «comment moderation».

O «comment moderation» tira o prazer ao comentarista de ver o seu comentário publicado de imediato. Por outro lado, impede que sujam diálogos entre comentaristas, o que necessariamente reduz o número de comentários e o número de visitas ao blogue.

Se publicarem um comentário que considere indecente, tem a liberdade de apagá-lo.

Se começar a aparecer «spam» (já me aconteceu), ligue o «Word Verification».

Um abraço.

António Maria disse...

Já desliguei :-)

António Maria disse...

Diogo,

As suas contas estão certas. Erro meu! No entanto, precisamos de pensar no seguinte: a rentabilidade do negócio dos automóveis, como dos aviões, tem que ver com as chamadas economias de escala, i.e., se não houver um numero suficiente de clientes, o meio de transporte pára! Assim, uma vez que a viagem casa-emprego e as pequenas distâncias da distribuição de mercadorias (até aos 300Km) são inevitáveis nos tempos mais próximos, ao contrário das viagens de avião, em grande parte motivadas pelo laser, continuo a pensar que os aviões comerciais de passageiros (exceptuando talvez os Corporate Jets) poderão vir a parar antes dos automóveis...