sábado, junho 02, 2012

Portugal, pagar até morrer


Só podemos saldar a dívida e crescer, com trabalho, poupança e equidade

Sem renegociar as PPP, sem privatizar a TAP e a exploração dos transportes ferroviários, e sem uma reforma profunda da administração pública e do Estado ficaremos escravos da dívida e da indecorosa nomenclatura que levou o país à ruína, pelo menos, até 2020!

Portugal é neste momento atravessado por três grandes dilemas:
  1. O nosso insustentável endividamento fechou as portas ao investimento externo e interno, forçando o Estado a submeter-se a um programa de resgate, sem o qual há muito teria deixado de pagar aos seus funcionários, não sendo por esta razão possível crescer significativamente, na medida em que tal crescimento, pedido pela retórica populista da Oposição (1), implicaria agravar o sobre-endividamento público e privado do país, por sua vez um cenário inaceitável para o único credor ainda disposto a ajudar-nos a sair desta situação: a Troika.
  2. Só uma parte, 50% a 62%, da dívida total do país, é passível de um PSI, também conhecido por haircut; e para piorar as coisas, dado que boa parte da dívida pública reestruturável está nas mãos dos principais bancos portugueses, nomeadamente a colossal dívida das PPP, uma renegociação da mesma, com vista a um desconto privado, corre o risco de rebentar simultaneamente com os principais bancos e grupos económicos portugueses, dada a exposição destes às tetas orçamentais da escanzelada República que uma nomenclatura de piratas sem freio conduziu à posição de refém indefesa dos credores de última instância;
  3. Não conseguiremos libertar-nos da colossal dívida acumulada, sem impormos uma racionalização drástica e urgente do aparelho de estado, das instituições democráticas e do setor empresarial público, exigindo frontalmente o fim da apropriação parasitária do bem comum pela nomenclatura financeira e partidária, e sem causar por outro lado uma redução dramática dos recursos humanos que constam da folha de pagamentos da administração pública.
Estes dilemas terão no entanto e de uma forma ou doutra que ser resolvidos, sob pena de o país inteiro ficar numa situação sem saída, caminhando rapidamente para a alienação progressiva da sua riqueza, e para o advento de uma instabilidade social de consequências imprevisíveis.

Cabe aos partidos em primeiro lugar (para isso vos pagamos) estudar e encontrar com urgência as soluções mais justas e equilibradas para estes dilemas. E cabe ao resto da sociedade participar neste debate. Caímos no poço da dívida. Teremos que saber e conseguir sair dele quanto antes!

Os recentes números da execução orçamental e do desemprego são dramáticos. Veremos o que nos espera na próxima Segunda Feira, ao tomarmos conhecimento do mais recente relatório da Troika.

Até lá será muito instrutivo ler três artigos recentes e interligados sobre Portugal, escritos sucessivamente por Dimitris Drakopoulos e Lefteris Farmakis, do Nomura's Research, Joseph Cotterill, do FT Alphaville, e Claus Vistesen, do Alpha.Sources.CV.

“The math here is very clear. With only about 50 to 62 percent of the debt outstanding liable to restructuring the idea that Portugal may return to the market under “normal” conditions is ridiculous, especially if we assume that this includes the prospect of international creditors doing the bid.

However, there is an important difference between Portugal and Greece. Where Greece had a substantial part of its debt outstanding held by foreign creditors the restructurable debt in Portugal is mainly held by domestic corporates and banks. This is due to the increasing re-nationalisation of sovereign risk on the back of the crisis and specifically the ECB’s LTROs which have incited banks to buy their respective sovereign’s debt. This adds another layer to the Portuguese case in the sense that if the private sector gets hosed, it will mean domestic banking and corporate defaults. The ensuing re-capitalisation would be impossible for Portugal to deal with without EU/IMF help.”

— in Alpha.Sources.CV, “Time Unlikely to be a Healer for Portugal’s Economy”, April 2, 2012

“If you don’t see what Nomura are getting at here, Portugal could burn bondholders, but increasingly those are its own banks. On the Greek pattern, it would then need a eurozone loan to recap those banks, making any debt relief a mirage. And any private bondholders remaining, all the more subordinated.”

— in “If you thought Greek bondholders were subordinated…”, Joseph Cotterill, FT Alphaville, Mar 29 2012 09:03

“In this report we discuss whether a PSI operation similar to that undertaken in Greece will be repeated in Portugal in the near future. Our view is that in the short term momentum has shifted towards the extension of a new financing package to Portugal for a few years (potentially covering its financing needs until 2015) without a PSI operation being set as a prerequisite. Over the medium term, however, we see a fairly high probability of a debt management operation going ahead in Portugal given the country’s significant macroeconomic imbalances and fiscal risks that are likely to significantly delay its return to financial markets.”

— in “Portugal: To PSI or not to PSI?”, by Dimitris Drakopoulos and Lefteris Farmakis, Nomura, 27 march 2012.

NOTAS
  1. A sustentabilidade da economia portuguesa sofre de quatro constrangimentos fatais: a sua aflitiva dependência do petróleo/gás natural; a sua escandalosa intensidade e concomitante ineficiência energética; a sua inaceitável dependência de capital, o qual financia basicamente o consumo mas não o trabalho propriamente produtivo, nem a suficiente produção de bens transacionáveis; e, finalmente, o envelhecimento e encolhimento demográficos que destruirão inexoravelmente a sustentabilidade do estado social que conhecemos nos últimos trinta anos, ficando o setor das exportações, o turismo e, uma vez mais, a emigração, como únicos travões ao empobrecimento em espiral do país. Os quadros e gráficos do estudo promovido pelo banco japonês Nomura são a este título elucidativos.

Última atualização: 2 jun 2012 10:52

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