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terça-feira, março 15, 2016

Querida Mariana



Há um grande problema, sim. Chama-se buraco negro dos derivados OTC. E não se resolve com mais caricaturas de Keynes


O problema é que as economias estão deprimidas pela austeridade, sobre-endividadas e sem capacidade de investimento (sobretudo público). 
[...] 
Draghi está preso àquilo a que Keynes chamava a “armadilha da liquidez”, sem admitir que a solução, mais que monetária, está na capacidade de estímulo orçamental e na reorientação estratégica do papel da Banca. 
in “É uma armadilha, Draghi”, por Mariana Mortágua (DN)

Querida Mariana, estímulo orçamental (e bolhas) foi o que não faltou desde final do século 20, e o resultado está à vista! Bolha dot.com, bolha imobiliária do Subprime, bolha estudantil nos Estados Unidos, bolha soberana na Europa, todas elas, como saberá, associadas a estímulos orçamentais e especulação financeira. Em Portugal, basta somar as faturas da EXPO '98, das PPP rodoviárias, das PPP das novas barragens, das PPP hospitalares, das PPP das águas e tratamento de resíduos, das ditas empresas municipais, do forrobodó e SWAPs no setor público dos transportes, da submissão da banca privada ao Estado crava que temos e, finalmente, da corrupção, para já todos sabermos que a receita de mais envolvimento público não só não resolve nada, como piora tudo, nomeadamente pelo fascismo fiscal e monetário que se anuncia. Que tal uma visita aos Grundrisse, do nosso amigo comum Karl Marx? É que o Capitalismo está a mudar, mas não por mérito das esquerdas.

terça-feira, setembro 08, 2015

A reestruturação da dívida ucraniana

Anarquistas russos na guerra civil da Ucrânia (Autonomous Action, Moscow)

Será que Louçã recomenda o desastre, já não grego, mas ucraniano, como atalho para a reestruturação da dívida portuguesa? O homem perdeu a cabeça!


Sim, é possivel: a reestruturação da dívida da Ucrânia
8 de Setembro de 2015, 09:18
Por Francisco Louçã, Público

Creio que só o Jornal de Negócios se referiu em Portugal à notícia: depois de cinco meses de negociações, o governo de Ucrânia chegou a acordo com os seus credores, excepto a Rússia, para uma reestruturação da sua dívida pública que levará ao corte de 20% do seu valor nominal (de 18 mil milhões de dólares, cerca de 4 serão apagados).

O trotsquista Francisco Louçã é um velho político quadrado. E 'burro velho não ganha andadadura'.

Como todos sabemos, a reestruturação da dívida portuguesa, pela via da destruição das taxas de juro, da troca de dívida cara por dívida menos cara, e ainda pela via do aumento dos prazos das maturidades, tem vindo a ser realizada. Louçã, porém, omite a verdade, ou recalca-a no seu recôndito e ortodoxo crânio, como um dos muitos lapsos conceptuais de que necessita para manter a sua inabalável fé marxista.

O melhor mesmo é deixarmos de entregar a gestão do país a um ARCO PARLAMENTAR que, em quarenta anos apenas, conseguiu três pré-bancarrotas e a maior vaga de emigração desde os anos 60 do século passado.

Para esta gente, 'reestruturar' só significa uma coisa: não pagar, para assim manter a democracia neocorporativista e populista que temos, e o regabofe! Acontece que este status quo morreu. Ou superamos a crise e substituímos a democracia populista, corrupta e falida, que temos, por uma democracia adulta, responsável e participada, ou a sombra de uma nova ditadura provinciana acabará por ressuscitar os velhos demónios do atavismo autoritário indígena.

Já agora, a pergunta milionária a que todos os políticos e candidatos às eleições de 4 de outubro deveriam responder: como iremos pagar 10 mil milhões de euros/ano (serviço da dívida pública + rendas das PPP), durante a próxima Legislatura?

Resposta:
  1. renegociando de alto abaixo as rendas das 120 PPP
  2. fundindo os governos e assembleias municipais das regiões metropolitanas de Lisboa e Porto
  3. eliminando 50% das isenções fiscais a que têm direito inúmeras entidades e pessoas, publicitando todas as isenções que vierem a ser cabalmente justificadas
  4. estabelecendo um limite de 2000 euros para todas as pensões de reforma, sem exceção, suportadas pela Segurança Social
  5. diminuindo drasticamente o peso fiscal das IPSS no Orçamento de Estado
  6. implementando um Rendimento Básico Garantido universal
  7. restringindo drasticamente as mordomias dos políticos e altos cargos da Função Pública
  8. acabando com o negócio dos manuais escolares (na escola obrigatória, os livros e manuais serão obrigatoriamente gratuitos, e sempre que possível desmaterializados)
  9. introduzindo em toda a Administração Pública a gestão por objetivos
  10. responsabilizando os agentes políticos pelas instituições que tutelam, aumentando concomitantemente a transparência de todos os processos administrativos.
  11. Acabando de vez com a promiscuidade entre política e negócios, nomeadamente através da eliminação automática dos conflitos de interesses económicos, profissionais e intelectuais.

É disto que o senhor Costa, o senhor Jerónimo e a senhora Catarina, deveriam falar, e não das mil e uma maneiras de não pagar o que devemos.

Já agora, que tal dedicar menos tempo de antena ao 'reality show' do senhor Pinóquio Pinto de Sousa?

segunda-feira, fevereiro 16, 2015

Os limites do otimismo

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Não haverá milagre na Grécia, mas destruir as classes médias não é solução


O notável artigo de Michael Pettis, que abordámos em post anterior, dedicado ao pensamento efeverscente e maniqueísta sobre as responsabilidades pelas crises grega, cipriota, portuguesa, espanhola, italiana, e em geral da maioria dos países europeus, demonstrando que o capitalismo global é um sistema de vasos comunicantes onde as crises financeiras tendem a assumir natureza sistémica, exigindo, por esta razão, remédios permanentemente concertados, precisa talvez de uma contextualização económica mais ampla.

Recomendo, por isso, a leitura de um outro artigo recente, não menos notável, de Gail Tverberg, analista de risco, editora do extinto e célebre The Oil Drum, e autora do blogue Our Finite World.

Gail Tverberg considera, como eu e um número crescente de observadores, que nos aproximamos ou estamos já no quadro energético previsto por M. King Hubbert [1956, “Nuclear Energy and the Fossil Fuels”—pdf], conhecido como Pico do Petróleo. Este quadro casa, aliás, com um outro mais recente, traçado em 1972 pela equipa do relatório The Limits to Growth, que analisa os limites do paradigma de crescimento em que ainda vivemos, do qual temos que sair, mas ninguém sabe como.

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Os quadros estatísitcos têm vindo a confluir na perceção de que estamos no fim de uma longa era de prosperidade e crescimento explosivo, único na história humana, cujos motores principais foram o carvão mineral, o petróleo e o gás natural, a par de descobertas e invenções tão extraordinárias quando a eletricidade, a energia nuclear, a higiene e o saneamento básico, ou as vacinas e os antibióticos.

Sem energia abundante e barata o paradigma civilizacional em que nascemos e nos habituámos a perceber como natural há três coisas que desaparecerão depois de sucessivas e dolorosas crises:
  • taxas de crescimento demográfico e económico acima dos 2%
  • crescimento baseado na utilização de capital intensivo e em endividamento
  • boa parte da atividade discricionária não produtiva, nomeadamente o consumo conspícuo de massas.

Esta versão inesperada de The Tragedy of the Commons [Garrett Hardin, 1968] parece já estar, de facto, em cena num qualquer smartphone, ou televisão perto de si. O aparente triunfo argumentativo de Yanis Varoufakis face à inércia burocrática de Bruxelas e Berlim, e face ao defensismo atávico do BCE e do sistema financeiro em geral, espelha bem que o problema que temos entre mãos é um daqueles problemas a que Hardin chamou “a no technical solution problem”.

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Recomendando desde já a leitura integral do artigo em três partes de Gail Tverberg reproduzi a modo de convite alguns extratos e alguns gráficos esclarecedores. Quem quer que seja que pretenda chegar ao poder, nomeadamente para mtigar a contínua má direção que temos seguido, deverá, antes de mais, ler atentamente os três artigos aqui citados—o de Gail Tverberg, o de Michael Pettis, e o célebre artigo de Garrett Hardin, publicado pela Science em 1968.

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A new theory of energy and the economy, Part 1
Generating economic growth
By Gail Tverberg
Posted on January 21, 2015

[...]

What if oil prices are artificially low, on a temporary basis? The catch is that not all costs of oil producing companies can be paid at such low prices. Perhaps the cost of operating oil fields still in existence will be fine, and the day-to-day expenses of extracting Middle Eastern oil can be covered. The parts of the chain that get squeezed first seem to be least essential on a day to day basis–taxes to governments, funds for new exploration, funds for debt repayments, and funds for dividends to policyholders.

Unfortunately, we cannot run the oil business on such a partial system. Businesses need to cover both their direct and indirect costs. Low oil prices create a system ready to crash, as oil production drops and the ability to leverage human labor with cheaper sources of energy decreases. Raising oil prices back to the full required level is likely to be a problem in the future, because oil companies require debt to finance new oil production. (This new production is required to offset declines in existing fields.) With low oil prices–or even with highly variable oil prices–the amount that can be borrowed drops and interest costs rise. This combination makes new investment impossible.

If the rising cost of energy products, due to diminishing returns, tends to eliminate economic growth, how do we work around the problem? In order to produce economic growth, it is necessary to produce goods in such a way that goods become cheaper and cheaper over time, relative to wages. Clearly this has not been happening recently.

The temptation businesses face in trying to produce this effect is to eliminate workers completely–just automate the process. This doesn’t work, because it is workers who need to be able to buy the products. Governments need to become huge, to manage transfer payments to all of the unemployed workers. And who will pay all of these taxes?

The popular answer to our diminishing returns problem is more efficiency, but efficiency rarely adds more than 1% to 2% to economic growth. We have been working hard on efficiency in recent years, but overall economic growth results have not been very good in the US, Europe, and Japan.

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A new theory of energy and the economy, Part 2
Charts showing the long-term GDP-energy tie
By Gail Tverberg
Posted on February 5, 2015

The high oil prices–around $100 per barrel–continued until United States QE was tapered down and stopped in 2014. About the same time, China made changes that made debt more difficult to obtain. Both of these factors, as well as the long-term adverse impact of $100 per barrel oil prices on the economy, brought oil price down to its current level, which is around $50 per barrel (Figure 10). The $50 per barrel price is still very high relative to the cost of oil when our infrastructure was built, but low relative to the current cost of oil production.

[...]

Where Does the World Economy Go From Here?

In Part 1, I described the world’s economy as one that is based on energy. The design of the system is such that the economy can only grow; shrinkage tends to cause collapse. If my view of the situation is correct, then we need an ever-rising amount of  inexpensive energy to keep the system going. We have gone from trying to grow the world economy on oil, to trying to grow the world economy on coal. Both of these approaches have “hit walls”. There are other low-income countries that might increase industrial production, such as in Africa, but they are lacking coal or other cheap fuels to fuel their production.

Now we have practically nowhere to go. Natural gas cannot be scaled up quickly enough, or to large enough quantities. If such a large scale up were done, natural gas would be expensive as well. Part of the high cost is the cost of the change-over in infrastructure, including huge amounts of new natural gas pipeline and new natural gas powered vehicles.

New renewables, such as wind and solar photovoltaic panels, aren’t solutions either. They tend to be high cost when indirect costs, such as the cost of long distance transmission and the cost of mitigating intermittency, are considered. It is hard to create large enough quantities of new renewables: China has been rapidly adding wind capacity, but the impact of these additions can barely can be seen at the top of Figure 14. Without supporting systems, such as roads and electricity transmission lines (which depend on oil), we cannot operate the electric systems that these devices are part of for the long term, either.

We truly live in interesting times.

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A new theory of energy and the economy, Part 3
The Problem of Debt as We Reach Oil Limits
By Gail Tverberg
Posted on February 11, 2015

Many readers have asked me to explain debt. They also wonder, “Why can’t we just cancel debt and start over?” if we are reaching oil limits, and these limits threaten to destabilize the system. To answer these questions, I need to talk about the subject of promises in general, not just what we would call debt.

In some sense, debt and other promises are what hold together our networked economy. Debt and other promises allow division of labor, because each person can “pay” the others in the group for their labor with a promise of some sort, rather than with an immediate payment in goods. The existence of debt allows us to have many convenient forms of payment, such as dollar bills, credit cards, and checks. Indirectly, the many convenient forms of payment allow trade and even international trade.

Each debt, and in fact each promise of any sort, involves two parties. From the point of view of one party, the commitment is to pay a certain amount (or certain amount plus interest). From the point of view of the other party, it is a future benefit–an amount available in a bank account, or a paycheck, or a commitment from a government to pay unemployment benefits. The two parties are in a sense bound together by these commitments, in a way similar to the way atoms are bound together into molecules. We can’t get rid of debt without getting rid of the benefits that debt provides–something that is a huge problem.

There has been much written about past debt bubbles and collapses. The situation we are facing today is different. In the past, the world economy was growing, even if a particular area was reaching limits, such as too much population relative to agricultural land. Even if a local area collapsed, the rest of the world could go on without them. Now, the world economy is much more networked, so a collapse in one area affects other areas as well. There is much more danger of a widespread collapse.

Our economy is built on economic growth. If the amount of goods and services produced each year starts falling, then we have a huge problem. Repaying loans becomes much more difficult.

In fact, in an economic contraction, promises that aren’t debt, such as promises to pay pensions and medical costs of the elderly as part of our taxes, become harder to pay as well. The amount we have left over for discretionary expenditures becomes much less. These pressures tend to push an economy further toward contraction, and make new promises even harder to repay.

[...]

Governments of “advanced” countries now have debt levels that are high by historical standards. If there is another major financial crisis, the plan seems to be to use Cyprus-like bail-ins of banks, instead of bailing out banks using government debt. In a bail-in, bank deposits are exchanged for equity in the failing bank. For example, in Cyprus, 37.5% of deposits in excess of 100,000 euros were converted to Class A shares in the bank.

[...)

The economy, as it exists today, has been made possible by countries working together. With sanctions against Iran and Russia, we are already moving away from this situation. Low oil prices are now putting the economies of oil exporters at risk. As countries try different approaches on interest rates, this adds yet another force, pulling economies apart.

[...]

Conclusion

If the current economic system crashes and it becomes necessary to create a new one, the new system will have to deal with having an ever-smaller amount of goods and services available for a fairly long transition time. This is one chart I have shown in the past of how the growth in energy products, and thus growth in goods and services, might look.

Because of this, the new system will have to be very different from the current one. Most promises will need to be of short duration.  Transfers among people living in a particular area might still be facilitated by a financial system, but it would be hard to have long-term or long-distance contracts. As a result, the new economy will likely need to be much simpler than our current economy. It is doubtful it could include fossil fuels.

Many people ask why we can’t just cancel all debt, and start over again. To do so would probably mean canceling all bank accounts as well. Most of our current jobs would probably disappear. We would probably be without grid electricity and without oil for cars. It would be very difficult to start over from such a situation. We would truly have to start over from scratch.

I have not talked about a distinction between “borrowed funds” and “accumulated equity”. Such a distinction is important in terms of the rate of return investors expect, but it is not as important in a crash situation. Similarly, the difference between stocks, bonds, pension plans, and insurance contracts becomes less important as well. If there are real problems, anything that is not physical ends up in the general category of “paper wealth”.

We cannot count on paper wealth (or for that matter, any wealth) for the long term. Each year, the amount of goods and services the economy can produce is limited by how the economy is performing, given limits we are reaching. If the quantity of these goods and services starts falling rapidly, governments may fail in addition to our problems with debts defaulting. Those holding paper wealth can’t count on getting very much. Workers producing whatever goods and services are actually being produced will likely need to be paid first.

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sexta-feira, fevereiro 13, 2015

Que tal resgatar as PPP?

As autoestradas para lugar nenhum do Bloco Central da Corrupção

Das 120 PPP existentes —que representam qualquer coisa como 35% do PIB, algumas deveriam ir imediatamente à vida, e outras renegociadas duramente.


Nota: incluir este tema no debate eleitoral em curso

Que tal resgatar as PPP? Que tal incluir as suas responsabilidades, depois de refinanciadas no mercado, a juros de 2,0...%, em vez dos 6% que os rendeiros da Brisa e quejandos usuram, na dívida pública (reciclada)?

Que tal denunciar todas as cláusulas de indemnizações compensatórias abusivas, apertando a sério a fiscalização dos contratos das PPP, indemnizando os rendeiros só e apenas na justa medida da Justiça, usando para tal uma emissão de dívida pública dedicada?

Seria possível remunerar os futuros tomadores desta dívida dedicada e desarmar a bomba-relógio das PPP— contratos especulativos congeminados e armadilhados pelo Bloco Central da Corrupção.

Que tal atacar de vez e a sério o escândalo das rendas excessivas com que o Bloco Central da Corrupção atirou o país ao lixo?

O mote está lançado:
IVO GONÇALVES: “Há entretanto uma possibilidade de reestruturação do nosso orçamento, já em  tempos aventada, que poderia ser também seguida, em alternativa ou cumulativamente ao pagamento antecipado ao FMI – o resgate das PPP (parcerias público privadas) sobretudo as das vias de comunicação, articulada ou não com a nacionalização das respectivas sociedades veículo.

A troika deu uma no cravo e outra na ferradura, falando na necessidade de diminuir as rendas mas respeitando as expectativas, bla, bla….As negociações do actual Governo conseguiram cortar  algumas dezenas de km de construção nova (nuns casos bem, noutros mal) , a conservação e pouco mais.

Fazer passar as infraestruturas para o Estado ou para sociedades de capitais exclusivamente públicos,  que renegociariam com o Estado os contratos, reduzindo as rentabilidades exageradas, seria acompanhado pela  emissão de dívida pública para compensar os actuais parceiros. Hoje em dia a nova dívida pública portuguesa colocada em mercado primário tem taxas a 10 e a 30 anos que poderiam servir pacificamente de referência.

No conjunto teríamos uma dívida pública acrescida, mas com reembolso a longo prazo, e aumentaria o valor total dos juros pagos anualmente. Mas em contrapartida as despesas do Estado com as “rendas” das PPP ficariam substancialmente reduzidas.”

in Comunicar

Atualização: 14/2/2015 17:44 WET

segunda-feira, fevereiro 02, 2015

Obama apoia Syriza

President Barack Obama, shown in December, said there are limits to how far European creditors can press Greece as the country tries to restructure its economy.

E Angela Merkel? Pedirá aos alemães para regresssarem ao marco?


Obama diz, sobre a Grécia, que não se pode continuar a espremer um país quando está no meio duma depressão. O jogo geoestratégico entre os EUA, Rússia e China soma e segue. Merkel e o resto dos lémures europeus limitam-se a guinchar, de vez em quando.
President Barack Obama expressed sympathy for the new Greek government as it seeks to rollback its strict bailout regime, saying there are limits to how far its European creditors can press Athens to repay its debts while restructuring the economy.

“You cannot keep on squeezing countries that are in the midst of depression. At some point there has to be a growth strategy in order for them to pay off their debts to eliminate some of their deficits,” Mr. Obama said in an interview with CNN’s Fareed Zakaria aired Sunday.

He said Athens needs to restructure its economy to boost its competitiveness, “but it’s very hard to initiate those changes if people’s standards of livings are dropping by 25%. Over time, eventually the political system, the society can’t sustain it.”

Mr. Obama expressed hope that an agreement would be reached so Greece can stay in the eurozone, saying, “I think that will require compromise on all sides.”

Mas há mais...


Hollande também apoia a Grécia, e Matthieu Pigasse —antigo administrador do ministério da economia francês e diretor-geral delegado do banco Lazard, entretanto contratado por Yanis Varoufakis— sugere a possibilidade de um corte de cabelo na dívida pública grega na casa dos 50%!  O dominó do euro parece cada vez mais inevitável. Convém começar a poupar feijões, pois talvez venham a servir como moeda pós-euro!

France Open to Easing Greek Debt Burden: Finance Minister

Bloomberg
by Helene Fouquet
1:44 PM WET
February 1, 2015

[...]

Varoufakis appointed Lazard Ltd. as adviser on issues related to public debt and fiscal management on Saturday.

“There is a range of possible solutions: extending the maturities, lowering interests rates, and the much more radical solution, the haircut,” Matthieu Pigasse, the head of Lazard’s Paris office who has advised Greece in the past, said in a Jan. 30 interview on BFM Business television. “If we could cut the debt by 50 percent” he said, “it would allow Greece to return to a reasonable debt to GDP ratio.”

He said Greece’s debt to public creditors was about 200 billion euros.

Sapin and Varoufakis plan to make a joint statement in Paris on Sunday evening.

Artigos relacionados:
  • O nó grego. Alemanha isolada? — O António Maria
  • The Tide Is Turning: Obama "Expresses Sympathy" For Greece; Lazard Says 50% Greek Haircut "Reasonable"— Zero Hedge.

terça-feira, setembro 02, 2014

Crescimento zero e enterro da dívida



O risco de crédito baixou à medida que os governos entraram dentro dos bancos

Baixa inflação e deflação, baixo crescimento, baixos salários e reestruturação global das dívidas a caminho... O resto é propaganda!


Enquanto a França vende dívida pública a juros negativos (e vende!), a Espanha lançou esta semana uma emissão de dívida pública de 1mM€ a 50 anos com um cupão de 4%. Talvez seja esta a notícia mais importante da silly season no que toca à tendência de fundo da economia mundial e do respetivo sistema financeiro. Este é mais um sinal de que os ajustamentos orçamentais não irão ser realizados pela via da reflação, pois não haverá nem crescimento nem especulação que cheguem para tal, e portanto o que aí vem é uma guerra de classes entre espoliação fiscal e reestruturação das dívidas públicas e privadas por via dos cortes: cortes nas pensões, cortes nos salários, cortes nos juros e cortes nos dividendos esperados, com muitos especuladores a perderem dinheiro, e muitos aforradores a perderem as suas poupanças mal aplicadas....

NOTA IMPORTANTE: é precisamente por isto que 1) as brigadas do reumático cor-de-rosa e laranja andam desesperadas por retomar o poder, e 2) Passos Coelho ganhará as próximas eleições legislativas, com maioria absoluta, se a malta socratina enfraldada pelo Costa conseguir dar o golpe de estado que planeou contra António José Seguro e contra o PS.


O fim de um ciclo longo à vista...

One of the more interesting stories of yesterday was a €1bn 50 year private placement bond issued by the Spanish Government with a 4% coupon. It’s a measure of how far things have come in a couple of years that such a deal could be launched. It was also a day when 2 year French yields traded below zero for the first time ever. We still live in remarkable financial times. Back to the Spanish deal, although current low levels of inflation make this deal look optically attractive on a real yield basis we thought we'd look at the rolling average 50 year level of inflation in Spain to highlight what real returns might potentially be over the lifetime of the bond. I hope I survive to see it mature but I hope I won't be writing about it then. Anyway the average annual inflation over the last 50 years in Spain is 7.0% and as the graph in today's pdf shows the last time the 50-year rolling average was below 4% was in 1956. Clearly prior to this the average rate of inflation was constantly below this level as inflation has been a modern day (last 100 years) phenomenon tied to the evolution of central banks (the Fed started in 1913) and the gradual demise of precious metal currency systems. So it’s a measure of how buoyant fixed income markets are that investors are prepared to ignore that last half century's inflation record and the current fiat currency world when pricing long-term bonds. This is not a Spain-specific issue but on a slow news day the story stood out. The same would be true for most countries issuing similar long-dated debt today. Indeed yields elsewhere would likely be even lower.

in ZeroHedge

Quatro novos gráficos sobre Portugal

Estes quatro gráficos sobre Portugal dizem quase tudo, mostram que, em geral, temos seguido as tendências económicas do Ocidente. Só que em registo quase sempre medíocre e indigente.



 Todos os gráficos (exceto o último) in: Desvio Colossal, de Pedro Serrano (grazia tanta ;) 

Última atualização: 6-9-2014, 15:59 WET 

sexta-feira, agosto 08, 2014

Será a resolução bancária sistémica uma alternativa?

Queimar as dívidas? Não é fácil, mas está a suceder!

Bail-out—Bail-in à moda de Louçã e do Instituto de Políticas Públicas Thomas Jefferson-Correia da Serra 


“...esta é a minha proposta”, escreve o antigo líder do Bloco de Esquerda, não se sabe bem se na qualidade de co-autor, ou se reclamando para si a exclusividade da ideia de uma ‘resolução bancária sistémica’ alternativa ao Mecanismo Único de Resolução (SRM) aprovado pelo parlamento europeu em maio-julho de 2014, e posto claramente à prova no resgate punitivo do BES levado a cabo pelo BCE e pelo Banco de Portugal, em evidente articulação com a Comissão Europeia e o governo português, e que, como se sabe, levou ao repúdio parcial das responsabilidades do terceiro maior banco português para com os seus acionistas, clientes, credores e especuladores, em nome da salvação dos depósitos, da carteira de clientes não financeiros, e da estabilidade do sistema financeiro em Portugal e na Eurolândia.

O artigo publicado hoje (8/8/2014) por Francisco Louçã na sua habitual coluna no Público, não deixa de ser um desafio oportuno, até por nos ter conduzido ao documento do IPP, “Um programa sustentável para a reestruturação da dívida portuguesa”. Do artigo citado destaco dois momentos extraordinários, um pela flagrante contradição do ideário do trotsquita-bloquista com o seu pensamento mais recente, e o outro, pelo escusado narcisismo autoral.

Escreve Louçã:

“...a nossa proposta cumpre a lei sem artifícios (ao contrário do que se estará a passar agora com o BES) e evita o custo de uma nacionalização directa (que é sempre o último recurso legal, mas que tem o inconveniente de passar todo o passivo para o Estado). Essa resolução bancária sistémica [que Louçã e o IPP propõem...] segue o modelo utilizado nos Estados Unidos pela instituição responsável, o FDIC, que o aplicou entre 2007 e 2013 em 505 bancos.”

E conclui:

“Precisamos mesmo de uma solução. O controlo público do sistema financeiro é a alternativa que dá o poder e a responsabilidade à democracia. Como é preciso correr o risco da resposta concreta no debate nacional, aqui está, esta é a minha proposta.” 

in Francisco Louçã, “Faltam respostas no debate sobre a crise bancária. A solução alternativa concreta é o controlo público”. Público, 8 de Agosto de 2014, 10:05 WET.

“Um programa sustentável para a reestruturação da dívida portuguesa” (8 Jul 2014) é um importante documento estratégico da autoria coletiva de Ricardo Cabral, Francisco Louçã, Eugénia Pires e Pedro Nuno Santos, cuja publicação esteve a cargo do Instituto de Políticas Públicas Thomas Jefferson-Correia da Serra (IPP), um think-tank presidido por Paulo Trigo Pereira.

Apenas tivemos tempo de o ler na diagonal. O bastante, porém, para recomendá-lo como um contributo relevante e oportuno no preciso momento em que uma proposta diferente, mas nem por isso menos restruturacionista, passou da teoria à prática. Refiro-me, claro está, ao golpe de coelho dado ao BES com o sado-masoquista Mecanismo Único de Resolução.

A demonstração da insustentabilidade da dívida portuguesa, que é como todos sabemos, pública e privada, interna e sobretudo externa, é elegante e vale a pena segui-la. No entanto, falta sublinhar que a realidade não é apenas indígena, mas praticamente universal, ainda que com maior gravidade nos países maduros e sobreendividados do Ocidente — aqueles que há décadas consomem mais do que produzem, e geram mais dívida, economia virtual e especulação do que poupança e bons hábitos.

A medida do sobreendividamento dos Estados Unidos, do Reino Unido e da União Europeia, por exemplo, pode ser imaginada apenas a partir de um dado: a exposição da Goldman Sachs aos derivados financeiros OTC, onde boa parte dos contratos de especulação com as dívidas privadas e públicas residem: $44.192.000.000.000 (44,192 biliões de dólares). O PIB mundial anda nos 73 biliões... Mas o valor nocional global destes contratos era, no fim de 2013, de acordo com o BIS, qualquer coisa como 693 biliões de dólares, ou seja, mais de 9x o PIB mundial.

Não há alternativa a um Jubileu assimétrico e brutal do sobreendividamento do Ocidente. Resta saber quem irá ficar na situação dos acionsitas do BES, dos obrigacionistas do BES, dos hospitais do BES, dos incautos do BES, dos especuladores do BES.

Pensar que é a riqueza pública que está ou que vai resgatar o BES é um embuste teórico. O que vai resolver o BES será tão só mais uma dose de liquidez gerada pelo Banco Central Europeu, a qual estacionará durante algum tempo na dívida soberana portuguesa, até que o empréstimo desta dívida ao Fundo e Resolução que financiará o Novo Banco seja cobrado com juros suficientes para os credores públicos e privados que intervierem na operação.

É desta forma que o mecanismo de reestruturação da dívida pública e privada vai fazendo o caminho das pedras, forçando os bancos a processos de reestruturação implícitos, que conduzem a menos financiamento da economia que, por sua vez, provoca mais falências de empresas e pessoas, mais desemprego, menos procura, menos salários, em suma, mais dívidas incobráveis, imparidades e a extinção forçada das mesmas. No éter das transações digitais serão então perdidos alguns milhares de milhões de euros dessa mesma dívida pública que alimentou o BES, os donos do BES e a especulação bolsista em geral naquilo que tem sido a ilusão do crescimento diariamente vendida pelas bolsas mundiais. Na realidade, o que o colapso do BES nos revela é que o capitalismo está de novo sob a pata da economia-política, de que os bancos centrais são a ferramenta técnica.

A crise financeira não é o resultado apenas da ganância dos especuladores e dos banqueiros, mas a consequência de um modelo social de acumulação e distribuição capitalistas de valor cujos pressupostos energéticos, materiais e demográficos desapareceram, ou estão em vias de extinção.

Poderá haver uma resolução bancária sistémica em Portugal?
Não.
Porquê?
Porque Portugal não tem a dimensão dos Estados Unidos, da China, da Índia, ou da Rússia.
Porque já não tem dimensão, nem economia que lhe permitam ser autónomo.
Porque faz parte de um sistema monetário com mais dezassete estados.
Porque não tem nem pode ter moeda própria sem afogar-se de vez na sua dependência face aos demais países, a começar pela Espanha.
Porque não pode impor ao resto da Europa o que acabou de impor ao BES. E neste particular é preciso dizer que o Banco de Portugal e o governo português apenas puderam impor ao BES a solução que já todos conhecemos porque a mesma foi desenhada e em última instância aplicada pelo BCE e demais instâncias comunitárias.

Seja como for, vale a pensa ler com tempo a proposta elaborada por Ricardo Cabral, Francisco Louçã, Eugénia Pires e Pedro Nuno Santos, sobre uma possível, mas improvável, estratégia de repúdio ordenado e parcial da nossa descomunal dívida. Até porque o tema será cada vez mais atual e premente!

Aqui ficam alguns extratos para abrir o apetite ;)
[...]

7. Para o concretizar, atuando nas duas componentes mais importantes, propomos a reestruturação da dívida bruta não consolidada das administrações públicas e um processo de resolução bancária, que resultarão na redução de dívida necessária para assegurar a auto-sustentabilidade (financeira) do país.

8. Um programa desta natureza pode recorrer a vários tipos de instrumentos para alcançar o mesmo objetivo: nomeadamente, pode incluir um corte elevado no stock da dívida e uma redução menor dos juros, ou uma combinação de um adiamento da amortização da dívida com uma redução mais substancial dos juros. Neste exercício é apresentada a simulação do segundo processo. Note-se que para assegurar que o país seja capaz de se autofinanciar autonomamente o fundamental é reduzir a despesa com juros e alongar as maturidades da dívida existente.

9. As principais medidas deste programa são então: (i) a negociação para a redução do valor presente da dívida (reestruturação de dívida), através da alteração de juros e prazos; (ii) o saneamento dos passivos bancários, para garantir a solvabilidade e estabilidade da banca; e (iii) a modernização fiscal para pôr as contas do Estado em ordem e tornar sustentável, numa perspetiva macroeconómica, a recuperação económica e o crescimento económico futuro.

10. Através da redução de juros e da extensão de prazos da dívida das Administrações Públicas e da reestruturação do passivo do sector bancário, seria possível conseguir uma diminuição anual do défice da balança de rendimentos que se estima em cerca de 4,7 mM€, traduzindo-se num efeito equivalente a uma redução do valor presente da dívida externa líquida de 103% no final de 2013 para cerca de 24% do PIB. De facto, o nível de dívida externa do país é tal que uma reestruturação de dívida de dimensão inferior não conseguiria assegurar que a dívida externa de Portugal se tornaria sustentável.

11. A proposta apresenta as seguintes condições para a troca da dívida bruta não consolidada das Administrações Públicas e do Sector Empresarial do Estado por Novas Obrigações do Tesouro (NOT) com o mesmo valor facial: (1) esses títulos terão um cupão de 1%, e (2) vencerão, em parcelas idênticas, entre 2045 e 2054, havendo um período de carência de juros em 2015. Com estas condições, o valor presente da dívida pública na óptica de Maastricht passaria a ser de 74% do PIB (63% do PIB, líquida de depósitos),3 já após a recapitalização da Segurança Social e de diversos fundos do Estado. O valor presente da dívida bruta não consolidada das Administrações Públicas passaria a representar 82% do PIB (face aos atuais 173% do PIB).

12. Garante-se assim uma margem de manobra suficiente para relançar o investimento e a criação de emprego, bem como para estimular a procura interna fazendo funcionar os estabilizadores automáticos e assegurando a proteção dos salários, pensões e prestações sociais contra a pobreza.

13. A sustentabilidade da dívida externa portuguesa exigirá ainda um processo de resolução bancária especial, que deve proteger a estabilidade do sistema bancário, salvaguardando os seus rácios de capital e solvabilidade, seguindo as melhores práticas internacionais (e.g., FDIC). Esse processo conduzirá a uma redução da dívida bancária de cerca de 24% dos passivos bancários (excluindo capitais próprios) no final de 2013, de que resultará uma redução da dívida externa líquida do sector (direta) estimada em cerca de 30% do PIB.

14. A negociação da reestruturação da dívida externa portuguesa deveria ser conduzida de modo a que a Lei do Orçamento de Estado para 2015 consagrasse todos os instrumentos jurídicos necessários para a viabilidade destas medidas.

sexta-feira, março 28, 2014

A grande sangria

Até South Park dedicou um episódio ao jubileu da dívida

Não pagamos?


A reestruturação das dívidas está em curso, ainda que na forma criminosa de uma expropriação fiscal sem precedentes das classes médias, a favor das burocracias instaladas e dos especuladores financeiros. Resta saber se a sangria vai ser ainda mais sangrenta e se atingirá, por fim, os banqueiros, credores e especuladores, como ocorrerá se houver um Jubileu Urbi et Orbi das dívidas públicas e privadas indexadas às rendas e aos empréstimos leoninos e especulativos.

François Morin (1), ex-membro do conselho geral do Banco de França é mais um defensor de um Jubileu das dívidas soberanas à escala global. A anulação das dívidas soberanas poderia começar, como alguns propõem, pela anulação pura e simples dos contratos (não ‘performativos’) de derivados OTC que incidam na especulação sobre taxas de juro, câmbios de moedas e dívidas soberanas.

É possível que os bancos centrais enveredem por esta via no dia em que perceberem que as dívidas soberanas são impagáveis e que a sua própria existência de banqueiros e especuladores desmandados será inexoravelmente ameaçada pelas multidões em fúria se, entretanto, os governos nada fizerem para atalhar a tragédia em curso.

É possível. Mas nada disto arruma a casa insustentável da economia/demografia mundial, no quadro da exaustão irreversível da energia, água, terra arável e matérias primas baratas.

A procura agregada global entrou em conflito irreversível com a oferta agregada global por volta de 1973. A 'revolução de preços' entre 1896-1914 e 1970-1974, referida por David H. Fischer em The Great Wave (1996), terminou. Desde 1970 que os salários reais não têm parado de descer nos Estados Unidos. Caminhamos, pois, para um modelo de crescimento moderado (entre 0 e 2%), que pressupõe uma destruição prévia do trabalho não produtivo remunerado, e uma destruição, portanto, do emprego e do consumo numa escala nunca vista.

Resta, porém, responder a esta pergunta: quantos milhões de vítimas esta mudança de paradigma custará à Humanidade. É bem possível que ocorram suicídios em massa nas sociedades urbanas onde o narcisismo alastrou como uma mancha social de inadaptabilidade às dificuldades que já chegaram e continuarão a agravar-se nas próximas décadas. É bem possível que proliferem guerras internacionais, guerras civis e revoluções.

Alguém quer discutir estes problemas sérios, em vez de continuar entretido no mercado da propaganda e dos jogos palacianos da indigência, da corrupção e do poder?




La grande saignée

À plusieurs reprises entre le XIVe et le XIXe siècle, les rois de France n’ont pas hésité à employer la méthode forte pour soulager l’État de ses dettes : l’incarcération ou la mise à mort pure et simple de ses créanciers. De telles mesures étaient appelées des ­« saignées ».

Selon François Morin, il faudrait retenir ces leçons du passé pour avoir une chance de surmonter le désastre financier à venir. Que se passera-t-il lorsque la bulle obligataire mondiale éclatera ? On peut craindre, entre mille maux, des explosions sociales massives et un délitement instantané des tissus économiques. Ni l’inflation ni la croissance ne réduiront l’endettement mondial. L’effacement de la dette publique ne manquera pas, alors, d’advenir, soit comme une retombée de cette formidable secousse financière, soit comme le résultat d’un nouveau système de financement de l’économie ­mondiale.

Notre seule planche de salut est de mettre en place ce nouveau système dès maintenant : il faut saigner la ­finance avant qu’elle ne nous saigne !

Professeur émérite de sciences économiques à l’Université de Toulouse, François Morin a été membre du conseil général de la Banque de France et du Conseil d’analyse économique. Il a notamment publié Le nouveau mur de l’argent. Essai sur la finance globalisée (Seuil, 2006), Autopsie d’une crise annoncée (Le Pérégrinateur, 2010), Un monde sans Wall Street (Seuil, 2011).

Lux Éditeur

NOTAS
  1. François Morin tem um texto seu “Finança global, Europa e cenários para a saída da crise”— publicado em Perspetivas para uma Outra Zona Euro, coletânea organizada por de Margarida Antunes, Júlio Mota, Vários, Luís Lopes, editada pela Coimbra Editora (ISBN: 9789723222173).

terça-feira, março 11, 2014

Manifesto de 70 personalidades apela à reestruturação da dívida

Criaram a dívida, e agora não querem pagar, ou seja, querem que o povo morra à fome para que os seus privilégios de casta burocrática se mantenham intactos.

Não deixa de ser caricato ver um antigo ministro estratégico de Salazar, Adriano Moreira, ao lado do quadrado Louçã assinando o mesmo papelucho indigente.

Numa reestruturação de dívidas públicas há sempre a imposição de uma hierarquia entre os credores (‘seniority’), o que no caso indígena significará, por exemplo, que se paga ao BCE em primeiro lugar, mas só se pagará à Caixa Geral de Aposentações, que foi obrigada pela corja partidária (último despacho de Vitor Gaspar) a empenhar 90% das suas reservas financeiras na compra de dívida pública, se ainda houver com quê. Ou seja, o perdão da dívida tem muito que se lhe diga, sobretudo num país de gente corrupta e rendeiros agarrados ao Orçamento...

Expresso:

O manifesto, hoje noticiado pelo jornal Público, é assinado por figuras da política de esquerda e de direita, como os ex-ministros das Finanças Manuela Ferreira Leite e Bagão Félix, Francisco Louçã, António Saraiva, Carvalho da Silva, Gomes Canotilho, Sampaio da Nóvoa, além de empresários e economistas, e pretende ser "um apelo de cidadãos para cidadãos", explicou João Cravinho.

"Trata-se de um apelo que se dirige a uma questão absolutamente decisiva para o nosso futuro que é preparar a reestruturação responsável da dívida para crescer sustentadamente com respeito pelas normas constitucionais com responsabilidade social e com democracia", avançou.

Manifesto de 70 personalidades apela à reestruturação da dívida - Expresso.pt

segunda-feira, fevereiro 24, 2014

A tatuagem da crise

Imagem enviada para a web por uma fã de tatuagens.

Declínio económico, envelhecimento demográfico, tatuagens e obesidade

The number of women with tattoos quadrupled between 1960 and 1980. While no one listed in People magazine’s 1980 “Who is the most beautiful woman?” survey had a tattoo, seven of the ten women listed by the international men’s monthly FHM as “sexiest women in the world” in 2008 did.

[...] Among American adults between twenty-four and seventy, the percentage of those who are overweight jumped from 44.8 percent in 1960 to 66 percent in 2004, with those being obese increasing from 13.3 percent to 32.1 percent during the same period. By 2012, 35.7 percent of US adults and 10.9 percent of children qualified as obese.

[...] ... obesity is a consequence of a lifestyle while tattoos are an advertisement of it, but the phenomenon at heart is the same.

—Brandon Adams, Setting Sun, the end of U.S. economic dominance
© 2013 Brandon Adams
Em 2010 a taxa de poupança da China, segundo o EconStats (FMI), era de 52,89%, nesse mesmo ano a taxa bruta de poupança da Alemanha era de 23,72%, a da Espanha, 18,7%, a dos Estados Unidos andava nos 12,53%, a do Reino Unido, pelos 12,06%, e a de Portugal, que em 1980 era de 31,01% caiu para 19,81% em 1999, ano da entrada no euro, e para 9,945% em 2010, tendo começado a recuperar apenas em 2011, encontrando-se em 2013, segundo o IGCP (Sol), nos 13,6%, depois de toda a recessão e desvalorização fiscal sofridas.

Estes números são uma radiografia da nossa situação e, em geral, da situação dos chamados países desenvolvidos do Ocidente quando comparados com a China. Esta, não só cresce a mais de 7% ao ano, não só tem uma balança comercial e de pagamentos excedentária, não só acumula reservas cambiais e de ouro a um ritmo sem paralelo no resto do planeta, como a sua dívida pública atingiu um pico de 33,54% do PIB em 2010, tendo começado a descer desde então. Qual é a principal explicação para este fenómeno?

Segundo Brandon Adams a grande vantagem da China sobre o resto da concorrência é a sua aposta num gigantesco, e aparentemente inesgotável, fundo (soberano) de poupança para acudir a contingências futuras.
China's human rights record and its failure to provide income or health care support is not just a moral issue; it's a political stability issue. Op. cit., p.55.
Vale a pena ler o livrinho deste académico de Harvard. São 115 páginas de pura fruta, com o estímulo de entrar também no terreno sempre espinhoso das causas culturais do colapso orçamental em curso, quer do American way of life, quer, em geral, das sociedades viciadas na proteção social, no consumo, no espetáculo, nos empregos faz de conta (nomeadamente de boa parte das burocracias), na formação sem fim, e no ócio. O Capitalismo industrial, urbano e financeiro produziu um ser inconsciente, desamparado, sem qualidades, viciado na gratificação imediata dos desejos, egoísta, sem saber que há um nexo causal e filosófico na grande tapeçaria que a vida tece há milhares de milhões de anos, raramente solidário, aturdido.

A civilização moderna é uma civilização recente e acelerada, que precisa de liberdade e de alguma democracia para funcionar, mas que depende, como do pão para a boca, de tecnologia, dum sistema financeiro sofisticado, de energia barata, e de recursos naturais abundantes associados à crescente sobre exploração do trabalho humano. As liberdades estão a recuar no Ocidente e já não chegarão a impregnar as culturas das suas antigas colónias. A democracia moderna, racional e humanista, que só existia na América do norte e na Europa ocidental, entrou em declínio e tem vindo a ser substituída por uma espécie de super estado sombra que, na realidade, manda nas democracias, incluindo a suíça! A tecnologia, apesar da propaganda, começou a desacelerar o ritmo das invenções úteis. O sistema financeiro especulativo estourou e será provavelmente substituído por algo diferente nos próximos anos. Energia barata e recursos abundantes foi chão que deu uvas. E quanto à sobre exploração de quem até agora nos tem plantado o café e as bananas, colhido o algodão e o linho, ou fabricado quase tudo o que levamos vestido, nos pés, e pendurado, já para não mencionar o computador e o rato que estou neste momento a usar, ou os maravilhosos smartphones a que milhões de pessoas se agarraram como lapas, sem se perceber muito bem porquê, ou para quê, está também por um fio. Quem quer trabalhar, se puder não trabalhar, ou trabalhar menos, ou viver de subsídios e da segurança social ou, pelo contrário, chegar à conclusão que, afinal, a exploração asiática, que já desembarcou nos Estados Unidos e na Europa, mata e não traz qualquer felicidade?

A procura agregada supera a oferta agregada, e numa sociedade onde abunda a informação, quem é escravizado pelo trabalho, seja nas maquiladoras mexicanas, ou nos escritórios financeiros da City londrina, tende a pensar se, ou até que ponto, valerá a pena continuar. Numa sociedade filosoficamente sem futuro, apenas contam o dia de hoje, as pipocas e a Coca Cola antes de mais um filme, a próxima sessão de tatuagem...

A procura empurra os preços para cima, mas o aumento paulatino dos preços da energia e das matérias primas —que exigem cada vez mais trabalho e investimento para serem conseguidos— a par da desvalorização do trabalho humano, por compensação negativa da subida dos restantes fatores de produção (em que também entram cada vez mais criticamente os custos fiscais, legais e de segurança das operações), acaba por induzir um abrandamento da procura e a subsequente acumulação ruinosa dos stocks, das matérias primas e dos produtos transformados ou semi-transformados, levando à ruína milhões de empresas, a mais desemprego, a maior pressão sobre os salários, a menor poder de compra per capita e, por fim, a uma menor diversidade e qualidade dos produtos lançados no comércio mundial.

Este pára-arranca é um círculo vicioso destrutivo, do qual decorre uma pressão suplementar e brutal sobre os orçamentos públicos das sociedades dotadas de fortes mecanismos de segurança social.

É por esta falta de competitividade aparentemente sem saída airosa que as dívidas públicas, quer nos Estados Unidos, quer na Europa, e noutras partes do mundo, continuam fora de controlo.

Cyniconomics — “Reviving the ‘Real World’ Scenario That’s Disappeared from Government Reports”

A dívida pública americana em 2013 não foi de 72% do PIB como rezam os documentos do Congresso, mas andou perto dos 101%. Por sua vez, a projeção fiável para daqui a 10 anos (2024) também não são 79%, nem 92% do PIB, mas 133%. Resta saber quem irá financiar tamanho buraco negro.

Começamos a perceber agora claramente que os PIIGS têm sido afinal uma espécie de laboratórios onde se têm vindo a realizar experiências financeiras, sociais e políticas, simulando as grandes tempestades que se vislumbram no horizonte.

Brandon Adams sobre a insustentável dívida pública americana, a que se somam não menos gigantescas dívidas domésticas e empresariaias, é taxativo:
For Peter Warburton, there are only “four resolutions to unmanageable debt.” These are: clemency, or to beg forgiveness; bankrupcy, to default on one’s obligations; paternalism/socialism, finding a benefactor, who will carry the debt for you; and, finally, inflation/debauchery/theft, the debasement the currency in which the debt is measured. It’s often better for all parties except the lender to find a resolution to the debt. Op. cit., p. 107, 108.
E vaticina uma solução, a qual levará décadas a desenrolar-se: pagamento parcial da dívida, acompanhado de um perdão parcial, de uma bancarrota parcial, de um fiador que leve parte da dívida às costas, e, por fim, de uma desvalorização da moeda em que está subscrita a dívida. O que parece fora de causa é mesmo o pagamento integral e com juros da dívida!

Será possível corrigir a tragédia resultante de décadas de incontinência orçamental, egoísmo democrático e corrupção, através de uma espécie de Jubileu mitigado das impagáveis dívidas soberanas europeias e americana? Será possível fazê-lo sem uma reestruturação que penalize os credores? Há quem diga que sim, e proponha soluções. O plano PADRE é um deles, e aponta para o papel decisivo do BCE na acomodação/reestruturação das dívidas públicas europeias que jamais serão integralmente pagas se seguirmos apenas os procedimentos até agora utilizados.

E sobre os efeitos potencialmente perniciosos do alívio causado pelo PADRE junto dos pecadores da dívida, a proposta previu uma cavilha de segurança:
Then comes the crucial issue of moral hazard. If debt restructuring can be painless, will that not become an incentive for governments to accumulate again and again unsustainable public debts? Moral hazard can be contained, indeed eliminated, if implementation is subject to some conditions. The first condition is a tight and precise covenant. The PADRE plan specifies that, should a country accumulate debt again, the ECB is obligated to swap the zero-interest national perpetuities back into interest-yielding bonds. Such an action, which is bound to trigger strong market reactions, should deter governments from sliding again into fiscal indiscipline.

The PADRE plan: Politically Acceptable Debt Restructuring in the Eurozone
Pierre Pâris, Charles Wyplosz, 28 January 2014 | Vox

Portugal tem um sério problema pela frente, atingida que foi a fadiga fiscal do país: ou redefine rapidamente as funções do estado, retirando-o de tudo o que não for essencial proteger em sede dos direitos, liberdades e garantias fundamentais das pessoas e das atividades económicas e culturais, levando a cabo uma revisão profunda da Constituição; ou limita drasticamente o peso dos setores neo-corporativos e rentistas aninhados no Orçamento de Estado e alapados nas secretarias do poder; ou reduz claramente a burocracia e o peso dos partidos na sociedade, ou sofreremos todos a breve trecho uma surpresa terrível quando todos percebermos que não há sequer dinheiro para pagar os juros da imparável dívida pública e privada em que deixámos cair o país.

Vamos assistir a um longo período de ajustamento das economias, finanças e regimes constitucionais de um número indeterminado de países, com resgates e reestruturações inevitáveis das dívidas públicas e privadas. Com crescimentos negativos em tantos países, com um crescimento mundial que dificilmente superará de modo consistente os 3% (apesar da dança de gráficos do FMI), a alternativa à paciente e negociada reestruturação e perdão parcial das dívidas dos países é o seu colapso violento, de que as tragédias grega, islandesa, cipriota ou ucraniana são claras demonstrações.

sexta-feira, fevereiro 07, 2014

Hedge Fund Slams Portuguese Bonds With 64 Page Slideshow | Zero Hedge

Fundo financeiro que aposta na quebra financeira de Portugal desanca, com razão, o foguetório ilusório com que começámos 2014.

  • The EIB Has Lent More Funds to Portugal than to Any Other Country Relative to GDP
  • The European Rescue Funds EFSF and EFSM Represent 22% of Portugal’s Sovereign Debt
  • The IMF Already Represents 12% of Portugal’s Sovereign Debt
  • Europe Has Already Given Portugal an OSI Without Asking for Concessions From the Private Sector
Common Misconceptions
  • Misconception #1: Portuguese Growth Has Turned the Corner
  • Misconception #2: Exports Can Save Portugal
  • Misconception #3: Portugal’s Bond Exchange Was A Success
  • Misconception #4: A Portuguese PSI (1) Would Lead to Portuguese Bank Recapitalizations
  • Misconception #5: A Portuguese PSI Would Create Contagion Risk
  • Misconception #6: Portugal Is Not Hiding Debt
  • Misconception #7: The Greek Sovereign Restructuring (PSI) Was a Mistake
Hedge Fund Slams Portuguese Bonds With 64 Page Slideshow | Zero Hedge

NOTAS
  1. PSI—Private Sector Involvement designa a participação do setor privado, por exemplo, num 'haircut', assumindo parte das perdas numa reestruturação parcial de uma dada dívida pública.

terça-feira, janeiro 08, 2013

Hipocrisia constitucional

Marcel Duchamp, Eau & gaz à tous les étages. 1958, Paris. (1)

A Constituição não pode castrar a liberdade e o futuro

“We all know what to do, we just don’t know how to get re-elected after we have done it.” — Jean-Claude Juncker, primeiro ministro do Luxemburgo e presidente do Euro Grupo.

Basta ler o preâmbulo da nossa Constituição para percebermos que a mesma tem mais olhos que barriga. Ou seja, que promete o que não pode, em si mesma, assegurar: “...abrir caminho para uma sociedade socialista” (2).

Uma constituição consubstancia, ou deve consubstanciar, os princípios civilizacionais e culturais que um dado povo pretende assumir e fazer respeitar tendo em vista atingir determinados patamares de liberdade, bem estar, justiça e felicidade. No entanto, deve-se ter o cuidado de não forçar um texto constitucional a prometer algo cuja realização dependa mais do trabalho, da boa administração, da cooperação e dos recursos disponíveis, do que do mero respeito pelos princípios e regras morais. As constituições definem limites à prepotência e traduzem pactos de utopia, mas não podem decretar o progresso dos povos. Este depende do que estes forem capazes de realizar no dia a dia, mas também de circunstâncias que nem sempre conseguem ou podem controlar.

Vem isto a propósito da frente oportunista que de repente se ergueu para travar a inevitável austeridade decorrente da bancarrota do país. Os credores condicionam os seus empréstimos e as suas ajudas in extremis ao cumprimento de um memorando destinado a reduzir no mais curto prazo possível o excesso de endividamento público e privado, interno e externo. A dívida soberana, empresarial e doméstica dos portugueses não deveria nunca ultrapassar os 180% do PIB. Mas o facto é que está bem acima dos 300%. Logo, sob pena de termos que entregar o país aos credores, é nossa obrigação inalienável tudo fazer para corrigir no mais curto prazo possível décadas de irresponsabilidade, populismo e cleptocracia. A Constituição não o permite? Não é verdade, mas se fosse, então haveria que suspendê-la, ou suspender temporariamente a aplicação de algumas das suas normas, até que a situação excepcional em que nos encontramos fosse ultrapassada.

A Constituição prevê emergências graves cujo efeito pode ser a suspensão parcial dos direitos constitucionais (3). Em caso de guerra ou ameaça grave iminente ao regular funcionamento das instituições democráticas pode haver lugar a uma limitação de alguns dos direitos constitucionais. Ora bem, uma insolvência soberana, ou o perigo visível de deixar o país resvalar para um período de graves convulsões sociais e luta política sem quartel, são emergências mais do que evidentes desde que o governo de José Sócrates se viu sem dinheiro para pagar aos funcionários públicos e teve, em tal contingência humilhante, previsível e anunciada, que submeter o país a uma espécie de protetorado. Os argumentos da corja devorista que em fila indiana se juntou à porta do Tribunal Constitucional com o único fito de travar a extensão da austeridade aos seus próprios privilégios indecorosos não colhem, pois, para nada!


Quanto mais depressa nos livramos da canga da dívida, melhor para todos

“Since the Second Wold War, debt levels in the developed economies have continually risen, with a notable increase since 1990. According to a study by the Bank for International Settlements (BIS), the combined debt of governments, private households, and non financial companies in the 18 core countries of the OECD rose from 160 percent of GDP in 1980 to 321 percent in 2010. In real terms, after inflation is taken into account, governments have more than four times, private households more than six times, and non financial companies more than three times the debt they had in 1980.” […]
“Today the developed world looks for a “next buyer” to take over its excessive debt load. Unfortunately, there is no such buyer in sight. The Ponzi scheme will have to be unwound.”
—  Daniel Stelter, Ending the Era of Ponzi Finance. BCG, january 2013 (4).

Entre 2005 e 2010 os países da OCDE reduziram as suas importações de petróleo em 15%. Se esta tendência se mantiver, em 2020 a redução das importações chegará aos 50%. Entretanto, países que foram grandes exportadores de petróleo passaram a importar este recurso precioso: Estados Unidos, Reino Unido, Indonésia, Austrália, ou o próprio Dubai. Nos EUA, 2/3 do petróleo consumido vai para o transporte automóvel, 60% na OCDE. Por outro lado, 98% dos transportes continuam a depender do petróleo. Como se isto não bastasse, o aquecimento global é mesmo uma realidade, e os fenómenos climáticos extremos agravam-se em número e dimensão catastrófica das ocorrências. Os Estados Unidos, por exemplo, estão ainda a braços com os efeitos de duas grandes calamidades: a devastação provocada, nomeadamente no estado de Nova Iorque, pelo Furacão Sandy, e a seca extrema que tem vindo a destruir as colheitas de cereais em vários estados americanos, nomeadamente no Iowa, no Minnesota e Wisconsin. A cereja em cima deste bolo estragado é o gigantesco movimento das placas tectónicas da economia mundial...


Para onde vão as classes médias?Global Trends 2030: Alternative Worlds.

Os países industriais mais desenvolvidos (o gráfico do Economist protege os cenários sombrios do mundo anglo-saxónico) encolhem visivelmente, enquanto países e regiões emergentes sul americanos, africanos e sobretudo asiáticos atravessam momentos de euforia expansionista. No entanto, para um número crescente de investigadores, além do gravíssimo problema das alterações climáticas, a humanidade enfrenta o fim de 250 anos de um longo e porventura único período de crescimento económico e desenvolvimento tecnológico. Na realidade, desde 1956 que os avisos têm vindo a ser feitos: M. King Hubbert (Nuclear Energy and the Fossil Fuels, 1956), Donella H. Meadows, Dennis L. Meadows, Jørgen Randers, e William W. Behrens III (The Limits to Growth, 1972), David Hackett Fischer (The Great Wave—Price Revolutions and the Rhythm of History, 1996), Jared Diamond (Collapse: How Societies Choose to Fail or Succeed, 2005), Robert Hirsh (Peaking of World Oil Production: Impacts, Mitigation, and Risk Management, 2005), etc. No ano passado, um paper escrito por Robert J. Gordon —Is U.S. Economic Growth Over? Faltering Innovation Confronts the Six Headwinds; NBER Working Paper 18315, August 2012— veio reavivar a discussão sempre reprimida do declínio de um modelo de civilização e tecnologia único e porventura sem herdeiros. A civilização industrial baseia-se em três combustíveis fósseis de grande poder energético, formados ao longo de milhares ou milhões de anos, mas cuja existência a baixo custo é limitada: o carvão, o petróleo e o gás natural.

Como disse recentemente Richard Heinberg, numa palestra em Sydney (5):
“Our economy is based on a model of constant growth - growth in production, consumption and population. Economic growth has provided rising standards of living in the West and seen millions in China and India lifted out of poverty. This model has been disrupted in many countries by the global financial crisis, which is now seeing another round of casualties, particularly in Europe. Will things settle down with growth resuming, or will our economies bump up against a wall of finite resources? And if they do, what will this mean the global balance of power?”

Por sua vez, Robert J. Gordon resume assim a sua hipótese:
“This paper raises basic questions about the process of economic growth. It questions the assumption, nearly universal since Solow’s seminal contributions of the 1950s, that economic growth is a continuous process that will persist forever. There was virtually no growth before 1750, and thus there is no guarantee that growth will continue indefinitely. Rather, the paper suggests that the rapid progress made over the past 250 years could well turn out to be a unique episode in human history.”

Os desafios imediatos, ao longo de toda esta década, e depois dela, não poderiam ser mais radicais.

A crise portuguesa, apesar de localmente agravada e precipitada por quem capturou o regime para benefício de uns tantos piratas e banksters, é tão só um dos vários epifenómenos de um grande terramoto económico, social e financeiro global preste a eclodir. Daí que a nossa resposta precise urgentemente de evoluir para um outro patamar de discussão e decisão!


Gráfico do BCG sobre as alternativas de resposta à crise das dívidas

O artigo de Daniel Stelter publicado este mês por The Boston Consulting Group é uma resposta construtiva à bazuca analítica de Robert J. Gordon. Se a hipótese deste último se confirmar, em linha, embora por via diversa, com as hipóteses de M. King Hubbert, Donella Meadows, Jared M. Diamond, Robert Hirsch, e outros, a metamorfose que nos espera será muito dolorosa. Na melhor das hipóteses, entraremos num longo período de deflação, depressão económica e colapso social, ao qual se seguirá eventualmente um novo renascimento. Mas para que esta hipótese, por assim dizer, positiva, seja viável, teremos que conservar boa parte das tecnologias e sistemas energéticos conhecidos, o que implicará forçosamente, no que ao petróleo se refere, uma redução drástica do seu consumo. Bastaria talvez, para atingirmos este objetivo verdadeiramente estratégico, que metade ou mesmo 2/3 da frota automóvel mundial passasse a usar gás natural liquefeito (GPL) em vez de gasolina ou gasóleo. Que implicações logísticas envolveria uma tal operação? É bem possível que alguém anda a estudar este assunto.

Robert J. Gordon — Um gráfico que perturba muitas ideias feitas.

Há, no entanto, problemas urgentes que precisam de ser atalhados com inteligência, precisão e coragem. O primeiro destes problemas é o sobre-endividamento associado ao populismo democrático e à explosão dos casinos financeiros do Ocidente. Os contratos de derivados financeiros não transparentes e não regulados (ditos OTC—over the counter), envolvendo sobretudo a especulação com taxas de juro e com o mercado cambial, equivalem a uma bomba-relógio dez vezes maior do que PIB mundial. A somar a esta bomba temos as ações desesperadas dos governos, as quais conduziram, por exemplo, em Espanha, a enterrar 90% dos seus fundos públicos de pensões na compra de dívida governamental, boa parte da qual seria por sua vez aplicada na compra de ativos tóxicos do sobre-endividado e corrompido sistema bancário espanhol. Esta gangrena tem que ser estancada rapidamente, sob pena de lançar países como a Espanha, Portugal, Irlanda, Grécia, Chipre, etc., em um de dois cenários catastróficos: ou o colapso irreparável seguido de uma desorganização económica, social e política gravíssima, ou a estagnação — que não é menos triste.

The Wall Street Journal—Spain Drains Fund Backing Pensions Jan, 2013)

A alternativa ao colapso, segundo o artigo publicado este mês pelo BCG, passa por fazer duas coisas: pagar as dívidas —assegurando um plano credível, transparente, verificável e publicamente partilhado com os credores— e realizar, sem mais demoras, todas as reformas estruturais necessárias.

Curiosamente, as dez medidas propostas por Daniel Stelter são um mix de austeridade, proteção das camadas mais desfavorecidas e reformas estruturais que não anda muito longe do que tem sido feito em Portugal, apesar dos protestos naturais de quem está submetido a tão violento tratamento de choque. Resumindo, eis o que propõe o BCG:
  1. Atacar imediatamente o fardo da dívida, tendo em conta que há dívidas incobráveis.
  2. Reduzir compromissos que não disponham do necessário financiamento.
  3. Aumentar a eficiência da governação e diminuir a percentagem do PIB consumido pelo Estado.
  4. Mitigar a escassez progressiva de recursos humanos (atacar a recessão demográfica).
  5. Desenvolver uma política de imigração inteligente (atacar a recessão demográfica).
  6. Investir na Educação (proteger e aumentar o PIB per capita).
  7. Reinvestir na manutenção e melhoria de eficiência das infraestruturas; promover o investimento privado, nomeadamente pela via fiscal — estimulando o investimento, por um lado, penalizando a distribuição de rendimentos, por outro.
  8. Incrementar a eficiência no uso dos recursos: baixar a intensidade energética da economia; potenciar as energias renováveis; apostar na eficiência dos materiais.
  9. Cooperar, além de competir (aposta em diplomacias económicas positivas).
  10. Lançamento da próxima onda Kondratiev.

O desafio deste artigo é claro:
“...the developed world needs to prove Robert Gordon wrong. By investing in a growing and hghly productive workforce and making it easier for engineers and technologists to innovate and for entrepreneurs to start new businesses, the developed economies need to unleash a new Kondratiev wave of global economic development.”

Não tardaremos a saber quem tem razão. Na opinião de Robert J. Gordon, a instalação de água e luz nas nossas casas foi uma revolução tecnológica infinitamente mais importante e duradoura do que a invenção do iPhone, ou do Facebook (7). Em que ficamos?


NOTAS
  1. Marcel Duchamp, Water and Gas on All Floors (Eau et gaz à tous les étages), June-Sept. 1958, Paria. Imitated ready-made: white lettering on blue enamel plate (15x20cm), facsimile of the plates affixed to apartment houses in France in the early 1890s.
    in toutfait.com
  2. “A Assembleia Constituinte afirma a decisão do povo português de defender a independência nacional, de garantir os direitos fundamentais dos cidadãos, de estabelecer os princípios basilares da democracia, de assegurar o primado do Estado de Direito democrático e de abrir caminho para uma sociedade socialista, no respeito da vontade do povo português, tendo em vista a construção de um país mais livre, mais justo e mais fraterno.”
    —in Constituição da República Portuguesa, AR.
  3. “Os órgãos de soberania não podem, conjunta ou separadamente, suspender o exercício dos direitos, liberdades e garantias, salvo em caso de estado de sítio ou de estado de emergência, declarados na forma prevista na Constituição.” (Suspensão do exercício de direitos — Artigo 19.º, 1).
    —in Constituição da República Portuguesa, AR.
  4. BCG—The Boston Consulting Group
    Collateral Damage; Ending the Era of Ponzi Finance; Ten Steps Developed Economies Must Take. By Daniel Stelter, January 2013. (PDF)
  5. Richard Heinberg, The End of Growth, Festival of Dangerous Ideas, Sydney Opera House, Australia, 26/10/2012 (vídeo).
  6. Robert J. Gordon, Is U.S. Economic Growth Over? Faltering Innovation Confronts the Six Headwinds; NBER Working Paper 18315, August 2012.
  7. “A thought experiment helps to illustrate the fundamental importance of the inventions of IR #2 compared to the subset of IR #3 inventions that have occurred since 2002. You are required to make a choice between option A and option B. With option A you are allowed to keep 2002 electronic technology, including your Windows 98 laptop accessing Amazon, and you can keep running water and indoor toilets; but you can’t use anything invented since 2002.

    Option B is that you get everything invented in the past decade right up to Facebook, Twitter, and the iPad, but you have to give up running water and indoor toilets. You have to haul the water into your dwelling and carry out the waste. Even at 3am on a rainy night, your only toilet option is a wet and perhaps muddy walk to the outhouse. Which option do you choose?
    I have posed this imaginary choice to several audiences in speeches, and the usual reaction is a guffaw, a chuckle, because the preference for Option A is so obvious. The audience realizes that it has been trapped into recognition that just one of the many late 19th century inventions is more important than the portable electronic devices of the past decade on which they have become so dependent.”— in Robert J. Gordon, Is U.S. Economic Growth Over? Faltering Innovation Confronts the Six Headwinds; NBER Working Paper 18315, August 2012.

Última atualização: 12 jan 2013, 10:55 WET