Cavaco-Sócrates: depois do arrufo, a reconciliação
Bloco Central soma e segue
Escrevi antes de a tempestade atingir o seu clímax que a razão e os interesses de ambos chamaria Aníbal Cavaco Silva e José Sócrates Pinto de Sousa à renovação dos votos de uma cooperação institucional reforçada. A telenovela das escutas não passou, pois, de uma encenação canalha destinada a travar uma vitória escassa —que a ser escassa seria muito inoportuna—, de Manuela Ferreira Leite nas eleições do passado dia 27 de Setembro.
De facto, o actual Presidente da República ajudou o PS a ganhar/perder as eleições, para com este resultado evitar levar ao colo o PSD até a uma mais do que previsível derrota de Cavaco nas próximas eleições presidenciais. Quer dizer, a simples hipótese de uma maioria relativa de Manuela Ferreira Leite, acompanhada de uma maioria de esquerda parlamentar, foi o grande pesadelo que afligiu Cavaco Silva até ao Domingo passado. E daí que, por incrível que pareça, o actual presidente da república talvez tivesse mesmo tido necessidade de prejudicar um bocadinho o PSD!
De facto, um governo PS sem maioria parlamentar, dependente do PSD para evitar ter que se aliar ao CDS (o que engrossaria as fileiras do Bloco), ou pior ainda, ao BE e ao PCP (o que rebentaria de vez com as possibilidades de reeleição de Cavaco Silva) foi a lotaria desejada no sonho cor-de-rosa do homem de Boliqueime. E saiu-lhe! Daí os beijinhos discretos soprados depois do encontro de reconciliação entre o actual e afinal futuro primeiro ministro, e o actual e possível futuro presidente da república latino-indigente que somos.
Como dizia alguém no Expresso desta Meia-Noite, o Presidente já não precisará de vetar com tanta frequência. A nova Oposição parlamentar encarregar-se-à de travar —à esquerda e à direita— o que manifestamente for excessivo, caprichoso, sem sentido ou simplesmente mal amanhado. Ou seja, Cavaco pode ir tratando paulatinamente da sua reeleição enquanto Sócrates tenta navegar à vista e salva a pele dos casos judiciais sob investigação.
O PSD procurará colaborar, para não dar pretextos ao CDS. O BE procurará colaborar, para não desbaratar o extraordinário acréscimo de votos (muitos deles emprestados) recolhidos nestas eleições. O PCP evitará ocupar as ruas para além do estritamente necessário, para não perder votos para um Bloco de Esquerda tendencialmente respeitável. O CDS está metido numa camisa de sete varas, ou melhor num submarino muito apertado e claustrofóbico! Em suma, salvo a muita retórica parlamentar e mediática, prevejo uma multiplicidade de tácticas de cooperação entre os rivais. Pelo menos até às eleições presidenciais.
Todos precisam de tempo. E ninguém quer ficar com o ónus de não atender com a imprescindível responsabilidade política, e mesmo competência técnica, aos tremendos desafios que temos pela frente, até às presidenciais, mas também até ao fim da legislatura que em breve terá início.
OAM 631 02-10-2009 01:01
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