Vueling oferece 100 mil lugares a 20 Euros! Adeus TAP... |
O livro negro da Ota e o fim da TAP...
Flash madrilenoEstive os últimos dez dias em Espanha, onde pude observar algumas realidades interessantes, nomeadamente para nós, portugueses. Em primeiro lugar, o primeiro ministro espanhol, José Luis Zapatero, a propósito da trapalhada nacionalista e da violenta ETA, mas também da ligação AV entre Madrid e Barcelona (quase pronta), anunciava candidamente que a nova rede ferroviária espanhola (nomeadamente a de Alta Velocidade) era o verdadeiro segredo para garantir a unidade da Espanha. Em segundo lugar, a EasyJet inaugurou em Madrid, no passado dia 15 de Fevereiro, pela mão de Esperanza Aguirre (tão liberal quanto promissora política do Partido Popular), a sua primeira base ibérica de operações, com um investimento de 170 milhões de euros na Comunidade de Madrid, que recebeu naturalmente a notícia de braços abertos. Em terceiro lugar, não consegui reservar um bilhete de AVE para ir de Madrid a Toledo no Sábado passado, pois estava esgotado. Em quarto lugar, a luta contra a corrupção, nomeadamente autárquica, é uma coisa séria, com vários alcaides na prisão e a percepção pública de que o "cachondeo" tem os dias contados. Talvez por isto, os debates mediáticos em Espanha se têm vindo a transformar em dramas de faca e alguidar, reality shows e espectáculos de wrestling incríveis! Em quinto lugar, ao visitar a Arco, conhecida feira de arte de Madrid, a que todo o apreciador de arte ibérico (portugueses incluídos) acorre, percebi que a mesma iniciou uma viragem estratégica radical. Sob a nova direcção de Lourdes Fernández, com a ajuda da ambiciosa crítica de arte, Angela Molina (1), a feira de arte de Madrid deixará em breve de ser um fenómeno cultural de massas, onde as várias comunidades ibéricas de artistas, galeristas, directores de museus e centros culturais, professores e alunos se reviam anualmente numa grande festa e numa grande e tumultuosa cidadela das artes, para se transformar numa elitista e corrupta bolsa de valores especulativos da criação estética domesticada pelo capitalismo liberal mais desesperadamente competitivo. Em sexto lugar, a companhia de baixo custo catalã, Vueling, adiantou a Primavera turística europeia oferecendo 100 mil lugares a 20 euros (tudo incluído!) Finalmente, a minha filha, que já não sabe como regressar a Portugal (a não ser em breves incursões, para provar os meus cozinhados), conduziu-me, desta vez, pela Madrid profunda e humana, "pueblerina" e cosmopolita, do bairro da Malazaña. Uma Madrid deliciosa, jovem e de todas as idades e cores, barata e amigável. Um dos grandes corações da capital espanhola. O segredo para amar Madrid é evitar, sempre que possível, a Gan Via, a Castellana e a cidade financeira do grupo Santander, não deixando nunca de rever os jardins do Retiro e o Museu do Prado, e de sorver religiosamente ao fim da manhã o consomé da casa Lardy, venerando templo gastronómico situado junto à Puerta del Sol.
O livro negro da Ota
Como se não bastasse a teimosia governamental na questão escandalosa da Ota (uma indústria de estudos inúteis) e do absurdo e jamais rentável TGV Lisboa-Porto, temos um ministro politicamente avariado que em cada semana que passa lança pela boca fora uma nova e estridente baboseira sobre o aeródromo da Ota. A última tontice (desta vez pela voz da sua secretária de estado, Ana Paula Vitorino), e que o Expresso desta semana divulgou, afiança que o improvável TGV Lisboa-Porto vai ter um apeadeiro no dito projecto fantasma. Claro que ninguém explicou como, nem para quê. Haverá TGV de 15 em 15 minutos entre a Ota e Lisboa? E se não houver, para que servirá tal dispêndio (um aeroporto e uma interface ferroviária entalados em acanhados leitos de rios e ribeiras sob densos e quotidianos nevoeiros, a 52 Km de Lisboa) nas horas de ponta?! Por outro lado, se o malfadado TGV viesse a estar pronto em 2015, como iria tal veículo atravessar o estaleiro da Ota, ainda a dois anos (pelos menos!) de ver concluído o sebastiânico aeroporto?
Sobre a Ota não existe sequer um estudo meteorológico actualizado, como se pode ler no último artigo de Rui Rodrigues (PDF 4,7Mb), nem estudo de impacto ambiental, nem, verdadeiramente, qualquer estudo prévio tecnicamente fundamentado (2), conclusivo e aceitável, sobre a utilidade e viabilidade económica do projecto. A única coisa que existe é uma escandalosa indústria de consultorias e de pareceres que, às custas do herário público, vem engordando a nomenclatura democrática lusitana. Pergunto: quantos milhões de euros foram até agora gastos, directa e subrepticiamente, na telenovela da Ota? Vamos todos querer saber, mais cedo ou mais tarde...
Há duas ou três semanas atrás, Augusto Mateus confessou que também andava a fazer estudos sobre a Ota, revelando-nos que a sua ideia iluminada sobre aeroportos do século 21 era muito parecida com a explanada num artigo do Expresso (por sua vez, uma localização mal amanhada de um artigo estrangeiro) sobre cidades-aeroportos! Primeiro, já pensou este distinto economista porque carga de água é que Lisboa nunca se expandiu para aquelas bandas, remetendo-as para o acolhimento de lixeiras, cimenteiras, depósitos de combustíveis e outras coisas feias? Segundo, já viu com olhos de ver a Ota e o Carregado? Terceiro, conhece alguma coisa mais parecida com uma cidade aeroporto do que a Grande Lisboa, com as suas várias pistas disponíveis (Portela, Montijo, Tires, Sintra) e a sua rede consolidada de transportes e serviços? Parece que andamos todos a dormir!
Em Abril o actual governo diz que vai pôr à discussão pública um estudo de impacte ambiental sobre o putativo aeroporto da Ota. Ou seja, chegou o momento de compilar o livro negro sobre esta aventura governamental. Esperar que algum partido do sistema o faça seria pedir muito aos aburguesados deputados que elegemos. O PS parlamentar não existe, o PSD está bloqueado por um líder impagável, o CDS não não passa de um apêndice parlamentar, o PCP e o Bloco de Esquerda devem pensar que são empregos que aí vêm, e portanto não é assunto em que se queiram molhar. Com esta velha política não vamos a parte nenhuma. Essa é que é essa!
O fim da TAP
O ultra-liberal Economist, que há duas semanas considerou a parvoíce da Ota, isso mesmo, uma parvoíce, escreve um interessante artigo na edição de 17-23/2/07 sobre um arrasador fenómeno chamado Low Cost. O artigo entitula-se sintomaticamente "Fare Game" e pode resumir-se numa frase: as companhias de voos de baixo custo chegaram, viram e venceram. Para já, venceram no mercado das curtas e médias distâncias aéreas (sobretudo nas chamadas "ligações ponto a ponto"). Resta agora saber o estrago que provocarão nas linhas de longo curso, nomeadamente intercontinentais. As experiências já começaram, nomeadamente na Ásia, onde, por exemplo a Oasis Hong Kong Airlines iniciou no passado mês de Outubro um serviço diário de baixo custo entre Hong Kong e Londres (um trajecto de ida custa, na classe turística, 145 euros!) Segundo um especialista da Universidade de Westminster citado pelo Economist (Nigel Dennis), o desafio do paradigma Low Cost, que terá seguramente mais dificuldades de implantar-se nos voos intercontinentais, irá mesmo assim provocar uma queda nos preços nos voos de longo curso na ordem dos 20%.
A conhecida fórmula das Low Cost --utilizar um ou dois tipos de aeronaves de última geração, silenciosas, com custos de manutenção uniformizados e com rendimentos de combustível até 40%; utilização de aeroportos secundários, sempre que os principais não ofereçam condições vantajosas; sub-contratação de tudo o que puder ser sub-contratado; tripulações reduzidas; serviços complementares de baixo custo (hoteis, veículos de aluguer, etc.) e uma sofisticada utilização de plataformas electrónicas online (sistema de reservas de voos e alojamento, etc.)-- fez o seu caminho. Às tradicionais companhias de bandeira, a braços com os efeitos nefastos desta avassaladora concorrência não lhes resta outra alternativa que não seja adaptar-se ou morrer! Os espanhóis acordaram tarde, mas acordaram. A resposta chama-se Vueling, Click Air e ainda abrir as portas de Madrid-Barajas à EasyJet e demais players dominantes deste mercado emergente, assegurando que o grande hub aeroportuário da capital espanhola sairá a ganhar, e não a perder, com o novo fenómeno. Os russos e até os romenos já lançaram as suas companhias aéreas de baixo custo: SkyExpress e Blue Air. Em Portugal, pelo contrário, assistimos à morte súbita da Air Luxor, à morte anunciada e muito obscura da Portugália Airlines --a qual passa pela sua venda a uma TAP que, em vez de comprar aviões novos, vai comprar sucata e excedentes de pessoal!-- e, finalmente, a uma crise previsível sem precedentes na transportadora aérea nacional. O manto de silêncio comprometedor que sobre esta crise se abateu, com a cumplicidade da generalidade dos média, revela tão só o atavismo triste e suicida que se apoderou das pobres elites nacionais.
Talvez a carnavalesca demissão de Alberto João Jardim, a quem lhe foi recentemente oferecida (oferecida?!; mas então aquilo não é uma Região Autónoma?) a possibilidade de ter as Low Cost no Funchal e em Porto Santo, desencadeie um debate institucional mais alargado do que o previsto. Já não seria mau.
Notas
1. Num artigo especialmente mordaz no El País de 16/02/07 (Elocuente invitación al optimismo) Angela Molina, escreve:
"Por las intenciones de Lourdes Fernández, decidida a acabar con la deficiente contribución de los espacios institucionales, se puede predecir un futuro amable para Arco. Mientras tanto, el provincianismo y el mal gusto permanecen, intelecualmente vandalizados por políticos --podrían ser los pasmados tiburones disecados dentro de una urna, de Damien Hirst-- que se mueven en la etiqueta de la cultura antepasada."
(...)
" Pero hay más, los stands de la Comunidad de Andalucia, Extremadura, Cantabria o de la Diputación de Málaga son los resultados reales de la cortedad mental de los gobiernos autónomos y similares, que pudiendo exponer sus pinturas en los casinos municipales, prefieren ganarse el derecho a remover el ponche costumbrista de la feria".
O efeito desta dinâmica poderá comprometer ainda mais o futuro dos museus de arte contemporânea, já hoje com extremas dificuldades de captação da atenção e vontade dos poderes políticos. Não me admiraria nada que o liberalismo e a insensibilidade da dupla Lourdes Fernández-Angela Molina viesse a provocar um inesperado efeito de boomerang contra a própria viabilidade da Arco.
2. Vale a pena ler o PDF de Rui Rodrigues. A argumentação é meticulosa e demonstra sem margem para dúvidas duas coias: que o argumento de João Cravinho sobre a perigosidade da Portela não colhe quando se tem a Ota como opção alternativa, e que a decisão de avançar para o atoleiro da Ota (que custou o cargo ao primeiro ministro das finanças do governo Sócrates) não teve nenhum fundamento técnico, nomeadamente no ponto crucial da avaliação das condições meteorológicas do local, sendo por isso uma decisão meramente política. Falta, assim, explicar o que está por trás de tal política. Para mim, são duas coisas: a ignorância estratégica militante do actual governo e os poderosos sindicatos financeiros de que o mesmo parece estar refém.
OAM #174 25 FEV 07
1 comentário:
É uma vergonha o silêncio de quase todos os políticos e de quase todos os media sobre este escândalo da Ota e dos TGVS. Os sindicatos financeiros, com os bancos por trás, têm-nos todos nas mãos.
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