Maioria à vista!
Com alguma sorte pelo caminho, José Sócrates ainda consegue renovar a actual maioria.
As condições objectivas favorecem neste momento o governo Sócrates. Bastou-lhe virar um ou dois parafusos à esquerda para desbaratar completamente as oposições — quer à direita, quer à esquerda. O panorama partidário escancarado no Prós & Contras realizado logo a seguir à prestação do primeiro-ministro é confrangedor. Em suma: José Sócrates = 4, SIC (R. Costa-J.G. Ferreira) = 2; Augusto Santos Silva = 10, figurantes do Prós&Contras = 0.
A menos que haja uma crise de pagamentos, ou sucessivos fracassos na angariação de financiamentos externos, temos renovação da actual maioria à vista!
O Manuel Alegre lá teve as suas razões para meter a viola no saco.
E Cavaco Silva lá sabe porque resolveu mandar as querelas inoportunas às urtigas.
Se há coisa que político velho tem, é instinto de sobrevivência.
Mudam-se os tempos...
Post scriptum — como o ano que agora começa é eleitoral, não podemos esperar grande criatividade no debate político que aí vem. E no entanto, precisamos, como de pão para a boca, de decisões acertadas no uso do dinheiro que vamos pedir emprestado, ou do que irá ser retirado dos bolsos dos contribuintes. O assunto é tanto mais sério quanto a deflação já visível no horizonte irá ter um impacto muito negativo sobre as dívidas públicas, pessoais, familiares e empresariais.
Os preços baixam, baixando nomeadamente os valores dos activos, sejam estes casas, empresas, batatas ou acções. Esta deflação conduzirá a um agravamento sério da recessão mundial em curso. Daqui resultará um arrefecimento muito grande da economia, centenas de milhar de falências nos sectores industrial, financeiro e comercial, e como consequência social inevitável desta crise, um aumento muito acentuado do desemprego mundial. Ou seja, haverá menos actividade económica, menos dinheiro, menos impostos e portanto mais endividamento, ou pior ainda, falências empresariais, públicas e pessoais em catadupa.
No entanto, as dívidas contraídas e os respectivos juros (de médio e longo prazo, mas também as dívidas rolantes contraídas através dos cartões de crédito) continuarão a pesar, mesmo se as taxas de referência do BCE, da LIBOR, da EURIBOR, bem como o Baltic Dry Index continuarem a baixar, tornando-se até negativos. Basta pensar no exemplo das casas compradas durante o pico da especulação imobiliária e creditícia. Muitas pessoas e fundos de investimento compraram propriedades imobiliárias a preços especulativos, obtendo para tal, financiamentos bancários entre 80-90% dos preços de transacção. O preço dos prédios começou entretanto a cair. Em Portugal, só nos últimos 12 meses, a queda de valor terá andado pelos 10% (ler notícia de hoje no Diário Económico). Como a deflação do imobiliário está longe de ter batido no fundo, é muito provável que no fim deste ano, e mais ainda no fim de 2010, boa parte das hipotecas fortemente alavancadas contraídas nos últimos quatro anos, superem o valor comercial das propriedades hipotecadas. Podemos facilmente imaginar que um andar comprado, por exemplo, em 2004, possa valer em 2010 menos 30% do que o preço por que foi comprado. Ou seja, muita gente e muitos fundos imobiliários estarão a pagar então pelas propriedades adquiridas mais do que elas efectivamente valem! A baixa da EURIBOR será assim uma fraca consolação!
No plano público, os efeitos de uma deflação grave serão, sobretudo no caso de países já altamente endividados, como Portugal, potencialmente catastróficos. O Estado sofrerá um corte brutal na massa tributável (menos empresas e mais desemprego), o valor dos activos públicos, dados em garantia, ou collateral dos empréstimos necessários à estabilidade das instituições e responsabilidades orçamentais contraídas, decairá, tornando mais difícil obter o tão crucial financiamento externo. Em suma, a célebre folga orçamental anunciada por José Sócrates é uma gota de água no mar de necessidades que aí vem! Daí que a definição de prioridades dos investimentos públicos anunciados deva merecer um enérgico e rigoroso debate público.
Temo porém que apenas a blogosfera esteja em condições de o promover com independência e sentido de responsabilidade cívica. Os partidos andarão entretidos em bailaricos e jogos florais — como sempre!
OAM 508 06-01-2009 02:32
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