segunda-feira, abril 03, 2017

O fim da democracia

Manuel Casimiro
Serigrafia, 1972

Imaginação crítica e salvação


Nesta peça de Manuel Casimiro, de 1972 —curiosamente o mesmo ano em que Donella H. Meadows, Dennis L. Meadows, Jørgen Randers, e William W. Behrens III publicaram The Limits to Growth, e um ano antes da primeira grande crise petrolífera mundial— a metrópole moderna surge simbolicamente descrita como uma arquitetura e uma ideologia consumistas: cada arranha-céus é, nesta representação, uma embalagem do cabaz de compras típico de uma sociedade de consumo.

A intuição crítica do artista não poderia ter sido mais certeira, pois ocorreu naquele já longínquo ano de 1972 o fim da explosão económica que esteve na origem da ilusão do crescimento e da prosperidade perpétuas. A taxa de crescimento demográfico mundial atingira o pico em 1962. Metade das melhores reservas de petróleo americano (o puro e barato sweet crude oil) tinham já sido consumidas em 1970, pelo que seria a partir daquela data necessário poupar o petróleo remanescente e procurar satisfazer as futuras necessidades da voraz economia americana noutras paragens: Canadá, Irão, Iraque, Arábia Saudita, Líbia, Venezuela, Angola, etc. A primeria grande crise do petróleo ocorreria em 1973.

Recall from chapter 15 the four domains that I argued are the sources of deep satisfactions: family, vocation, community, and faith. In each of those domains, responsibility for the desired outcome is inseparable from the satisfaction. 
— in Charles Murray, Coming Apart.

Acabei de ler um livro de Charles Murray, publicado em 2012 sob o título Coming Apart—The State of White America, 1960-2010, onde se demonstra como o início do fim do Sonho Americano se fez acompanhar pelo declínio imparável das tão proclamadas quanto excecionais virtudes fundadoras da América: Industriousness, Honesty, Marriage, Religiosity. Este declínio atingiu sobretudo o que o autor chama new lower class, por oposição à new upper class, onde tais virtudes declinaram menos ou se mantiveram. Hoje existe uma elite económica, financeira e cultural que é sobretudo uma elite cognitiva, que se reproduz nos campus das grandes universidades e se aglomera em manchas urbanas e suburbanas muito bem delimitadas e homogéneas. Murray chama as estas manchas geográficas de poder económico, social e cultural, Super Zips. No extremo oposto desta novidade sociológica cresce a indigência económica, social e cultural, a uma velocidade tal que ameaça hoje claramente a estabilidade política da América—Yuval Noah Arari chama-lhe useless class. O populismo, de que Trump é o mais recente epifenómeno, é a face negra de uma moeda a caminho de uma desvalorização radical.

Quer na América, quer na Europa, este fenómeno alastra e põe em causa a nossa ideia de sociedade justa, e de democracia. Quem não viu até agora o perigo aproximar-se pertence, em geral, aos 1% dessa nova elite cognitiva protegida no interior de bolhas culturais que, mais cedo ou mais tarde, poderão implodir sob a pressão da mole hostil em que as maiorias democráticas se transformaram—deixando de se rever nas instituições políticas tradicionais e na dicotomia feliz esquerda/direita, que percebem como imprestáveis quimeras ou, pior ainda, como origens do mal.

Será que os artistas e os filósofos bem sucedidos serão ainda capazes de promover uma criatividade inclusiva? E se não forem, que poderemos esperar do resto da elite cognitiva: gestores, empresários, economistas, médicos, advogados, biólogos, engenheiros informáticos, funcionários públicos de topo, deputados, produtores, realizadores, atores e atrizes de teatro, cinema e televisão, jornalistas, etc?

Seria trágico continuarmos a meter a cabeça na areia, ou andar de óculos escuros pela vida que se deteriora à nossa volta. Ignorar a doença social que se vai transformando numa pandemia não a extingue. Pelo contrário, permite que se torne cada vez mais incurável e letal.

REFERÊNCIAS


  • Charles Murray. Losing Ground: American Social Policy, 1950–1980, Basic Books, 1984.
  • Charles Murray. The Bell Curve: Intelligence and Class Structure in American Life (with Richard J. Herrnstein), Free Press, 1994.
  • Charles Murray. Coming Apart: The State of White America, 1960–2010, Crown Forum, 2012.
  • David Hackett Fischer. The Great Wave: Price Revolutions and the Rhythm of History, 2000.
  • Donella H. Meadows, Dennis L. Meadows, Jørgen Randers, e William W. Behrens III. The Limits to Growth, 1972.
  • Jeremy Rifkin. The End of Work: The Decline of the Global Labor Force and the Dawn of the Post-Market Era, 1995.
  • Yuval Noah Arari. Sapiens: A Brief History of Humankind, London: Harvill Secker, 2014.
  • Yuval Noah Arari. Homo Deus: A Brief History of Tomorrow, London: Harvill Secker, 2016.


Atualização: 19 abril 2017 21:32 WET

sábado, abril 01, 2017

Aeroporto Cristiano Ronaldo


Quem será o último a rir?


O grande choque causado pelo busto alegre e bastante cinematográfico de Cristiano Ronaldo, que desde 29 de março de 2017 dá o seu nome ao aeroporto do Funchal, comprova apenas o sucesso do ícone escultórico criado por Emanuel Santos, antigo funcionário de limpezas do mesmo aeroporto, desempregado há três meses, 40 anos de idade, escultor autodidata como tantos. Só por si, esta descrição daria um bom documentário.

Os bustos que vemos pelas praças, jardins e rotundas portuguesas são em geral insuportavelmente académicos, mais parecendo máscaras mortuárias que celebrações da vida. Já alguma vez viram a galeria de horrores que dá pelo nome de Parque dos Poetas, em Oeiras? Pior, só mesmo a dita 'arte moderna' que infesta rotundas, estradas e auto-estradas por esse país fora. Ou ainda a mais recente corrida autárquica das estrelas cadentes do firmamento artístico contemporâneo indígena, como se o que ontem não prestava agora evita um precipitada descida de divisão social.

O insuspeito artista madeirense modelou um flagrante honesto do futebolista mais famoso do país e do mundo. Cristiano é assim, e não como o foto_pintam, nas campanhas da Armani e similares.




É certo que há um Cristiano Ronaldo que faz lembrar Marlon Brando, sobre tudo depois de ter sido encenado e fotografado por Mario Testino, Scott Frances ou Johan Renck, para a capa da Vogue, ou para a roupa interior da Armani. Há em ambos os ícones fisionomias bem desenhadas pelos genes, mais sensuais no olhar de Marlon Brando, mas a que a melhor simetria facial de Cristiano e a sua sobre-exposição mundial como ator e personagem dele próprio confere a sensualidade irresistível da realidade em ação. Quando ri, quando grita, quando chora.

Daqui a confusão de géneros que motivou o tumulto de opiniões. Um tumulto que só aumentou a popularidade do futebolista que hoje dá o seu nome a um importente aeroporto turístico, bem como ao ignorado desempregado que sem o prever saltou do anonimato mais absoluto para as redes sociais, imprensa e televisões de todo o mundo. Terá Emanuel Santos, ao menos, assegurado os seus direitos de autor? É que se o tiver feito, não precisará tão cedo de limpar o chão do Aeroporto Cristiano Ronaldo.

Serviço Público?


Um caso de violência sexual entre crianças não é um caso de pedofilia


Há que distinguir a 'investigação jornalística', do populismo tablóide que domina hoje boa parte dos meios de comunicação social. A RTP deveria, creio, ser uma guardiã do jornalismo útil, prudente, sério e de esclarecimento, deixando a exposição fácil e oportunista dos escândalos para a TVI e o Correio da Manhã. No caso que viria a resultar ontem de manhã na agressão criminosa contra um operador de câmara da RTP exigem-se todos os esclarecimentos possíveis. Evitar este escrutínio seria abrir a porta a uma espécie de terra de ninguém, nada saudável para uma democracia já ameaçada por perigos vários, de que uma deriva de regresso ao passado mental da censura não está totalmente excluída.

O que foi o repórter lá fazer?  
Vai e Vem. Publicado em Março 30, 2017 por estrelaserrano@gmail.com 
A RTP não adiantou quais os motivos da agressão nem explicou qual era o objectivo da reportagem. Tratando-se de duas crianças uma das quais alegadamente vítima de “agressão sexual” certamente a RTP não estaria à espera de filmar as crianças envolvidas ou os seus familiares. Pelo que não se ficou a saber que tipo de reportagem a RTP esperava fazer. 
(...) 
É evidente que qualquer violência sobre jornalistas é deplorável ainda mais quando se encontram no exercício de funções. Certamente o repórter agredido não fez mais do que recolher imagens de quem por ali se encontrava. 
Mas tratando-se de assunto tão grave e delicado, como a agressão sexual envolvendo  crianças, a recolha de imagens era absolutamente interdita. A lei de protecção de menores proíbe a exibição de imagens de vítimas de agressões sexuais e a RTP não desconhece as restrições impostas em situações envolvendo menores. 
+ 
Ainda a reportagem da RTP sobre distúrbios numa escola 
Vai e Vem. Publicado em Março 31, 2017 por estrelaserrano@gmail.com 
Deslocar a discussão para a agressão à equipa da RTP em vez de a centrar na substância do ocorrido na escola e nos procedimentos que devem ser adoptados na cobertura televisiva de crimes sexuais envolvendo crianças é fazer da RTP o centro da notícia coisa que, ela sim, é contrária às melhores práticas jornalísticas. 
O repúdio da agressão a um jornalista no exercício de funções não pode camuflar eventuais erros cometidos numa situação em que o jornalista se tornou ele próprio numa vítima. 
+

O assunto da reportagem abortada, motivada por um suposto caso de agressão sexual exercida por um miúdo de doze anos sobre uma criança de nove, azedou ao longo do dia de ontem, acabando os comentários de Estrela Serrano por suscitar a ira de 100 jornalistas da RTP, numa empresa que conta com 1100 funcionários. Estes jornalistas exigiram hoje a demissão de Estrela Serrano do Conselho de Opinião, o que não deixa de ser um péssimo augúrio.

Comentei ontem este incidente. Hoje acrescento, em defesa de Estrela Serrano, mais algumas palavras.

Um serviço público de televisão não deve andar atrás das audiências, nem querer competir com a TVI e o Correio da Manhã.

A RTP não é uma instituição intocável, mas continua a parecer impossível dar-lhe um perfil de verdadeiro serviço público, como a BBC ou a PBS americana, ou a Euronews, ou seja, onde não se transforme a informação desportiva numa diarreia perpétua de futebolismo infumável, onde não haja concursos desmiolados, nem telenovelas de cordel. Ou seja, um serviço capaz de elevar, em vez de perpetuar a inércia cultural de uma população pouco instruída e mal paga.

Dum serviço público espera-se e paga-se para ter informação criteriosa, esclarecimento crítico, diáspora, lusofonia, pedagogia e cultura em sentido amplo. Parece-me, no entanto, que o 'trade-off' deste híbrido, onde a esquina tablóide ocupa cada vez mais tempo de emissão, é escancarar 'ad nauseam' a janela hertziana paga por todos nós ao exercício da propaganda narcisista do poder e das suas oposições.

Colaborei com muito gosto num programa de televisão, na RTP3. Foi sobretudo um programa não contaminado pelos partidos. Talvez por isso tenha morrido tão cedo, apesar do bon share.

Por fim, a reação dos 100 jornalistas ofendidos com a opinião educada e objetiva de Estrela Serrano faz-me temer o pior de uma instituição que continua a resistir à mudança.

Porque não exigiram um inquérito interno ao sucedido, em vez de um saneamento?




quarta-feira, março 29, 2017

Brexit, a primeira vítima do novo populismo

Political Cartoon Gallery

A voz autoritária do senhor Schäuble e a rigidez alemã empurraram a Inglaterra para fora da União Europeia.


Até março de 2019 iremos perceber melhor as causas profundas do novo populismo que se tem vindo a impor no discurso, na ação política e na comunicação social, à esquerda (populismo vermelho), à direita (populismo racista) e ao centro (populismo gelatina). Hoje ficámos a saber que a arrogância alemã sofreu mais uma dura e prolongada derrota.

Portugal, como sempre, por estar onde está, deve tornar o inglês a sua segunda língua oficial, com aprendizagem da escola primária em diante, e uso obrigatório em todos os documentos oficiais e comerciais. Deve reforçar as suas relações diplomáticas, comerciais e culturais com os continentes americano e africano, e ainda com o resto do mundo, começando pela Rússia e a China. Até 2019 tem a gigantesca tarefa de ser um honest broker nas difíceis negociações que hoje começaram entre Londres, Bruxelas e Frankfurt. Seria bom que PSD e PS se unissem neste sensível dossier. Confio, apesar de tudo, em Augusto Santos Silva para dirigir tão empolgante missão.

Finalmente, há que desmascarar a corja nacionalista indígena, do senhor Louçã, ao senhor João Ferreira do Amaral. Se querem um referendo, peçam-no!

Quando a União Soviética implodiu era um império insolvente e desacreditado. Não podemos, pois, assumir como favas contadas a sobrevivência da União Europeia a este enorme tiro num dos seus porta-aviões. Em suma, temos que nos preparar para todas as eventualidades.



sexta-feira, março 24, 2017

EDP—um gigante com pés de barro


O terramoto bancário mundial é apenas o aviso de que uma verdadeira erupção vulcânica de largas proporções vem a caminho. Chama-se energia!


The neoliberal era, with its policies of extreme deregulation, debt-money expansionism and harsh national austerity, is thus a direct product of the changing dynamics of the global energy system and the transition into a world of more expensive, lower quality, and environmentally more destructive fossil fuels (N.M. Ahmed, 2017).

O gigante EDP tem pés de barro. A sua dívida total ultrapassa os 18 mil milhões de euros (15,9x10E9 de euros em dívida de longo prazo), perdeu quase 4,6% do seu valor em bolsa nos últimos 365 dias, e os dividendos por ação (EPS) cairam 1,59% em 2016. Não há, pois, motivos para mimosear o CEO da alienada empresa, com mulheres e álcool.

Sendo este problema um problema sistémico (a Exxon Mobile, a Shell, a BP e a Chevron tinham no final de 2016 um dívida conjunta de 184 mil milhões de dólares, o dobro da que somavam em 2014 (Wiiliams and Olson 2016), basta um acidente, ou uma evolução inesperada na tecnologia, na economia ou no comportamento dos consumidores (mapas comparativos de preços e cartografia política organizada), para que os sorrisos do senhor Mexia e do gestor chinês que o supervisiona esmoreçam.

Já algum deputado perguntou ao senhor Mexia porque não paga os impostos da EDP a tempo e horas? O que a EDP beneficiou com o perdão fiscal (19,4 milhões de euros—Expresso) a que a Geringonça recorreu, para atamancar o défice, terá chegado para compensar os descontos feitos aos consumidores com baixos recursos? Que falta faz uma verdadeira esquerda no parlamento!

Este artigo da McKinsey é um bom alerta para o que aí vem. Já agora, para além deste artigo, recomendo ao deep state um ensaio recém publicado pela Spinger. Chama-se Failing States, Collapsing Systems, Biophysical Triggers of Political Violence, e foi escrito pr Nafeez Mosaddeq Ahmed.
From scenario planning to stress testing: The next step for energy companies
By Sven Heiligtag, Susanne Maurenbrecher, and Niklas Niemann
McKinsey&Company

What ‘extreme’ means

Companies need to be bold as they imagine extreme scenarios; almost nothing is too strange or ridiculous to consider. To show the range of ideas that energy firms might contemplate, we offer five extreme scenarios covering several kinds of risk, from compliance and legal risk to business-model disruption to full-bore crisis.

Energy for free

Real-time energy-consumption data are increasingly seen as crucial for a knowledge of customers and their behavior patterns. Smart meters can identify the appliances in operation. Combining data sets on electricity use, heating use, and mobility could provide even more detailed insights. Data-driven companies such as Amazon might challenge incumbent utilities by offering “energy for free” in exchange for personal data. In this scenario, utilities lose the customer relationship and are reduced to mere suppliers of commoditized power. Given the negotiating power, agility, and customer-centricity of digital giants, margins erode significantly.
Que tal um livro branco sobre a energia em Portugal?

Atualização: 25 mar 2017, 11:59 WET

Drinks, joints and coca lines

Anúncio da Super Bock sobre o incidente Dijsselbloem

Os donos e as donas do gado ficaram ofendidos e ofendidas.


A malta amocha quando um ministro dos negócios estrangeiros indígena saúda o seu colega do trabalho e da segurança social como um negociador de gado (o gado a que se refere são os trabalhadores e os patrões portugueses), mas entra em histeria moralista quando um holandês socialista nos recomenda que não gastemos tudo o que pedimos à União Europeia em putas e vinho verde.

A metáfora referia-se, como todos sabemos, às PPP, suas barragens inúteis, autoestradas e aeroportos às moscas (Beja), às rendas do senhor Mexia, ao excesso de deputados do nosso parlamento, às perdizes e aos pombos torcazes do menu do seu restaurante, ao saque pornográfico das nossas poupanças e fundos comunitários através do assalto ao sistema financeiro e bancário que (já não) temos. Quem irá realmente pagar os 10,75% de juros pelas obrigações perpétuas a emitir pela Caixa Geral de Depósitos? Não serão seguramente os prejuízos constantes e acumulados do saco azul do regime.

Quanto muito, o presidente do Eurogrupo não foi politicamente correto.

Em vez de ter dito (foi isto que Jeroen Dijsselbloem disse):
“As a Social Democrat, I attribute exceptional importance to solidarity. (But) you also have obligations. You cannot spend all the money on drinks and women and then ask for help.”
deveria ter dito:
“As a Social Democrat, I attribute exceptional importance to solidarity. (But) you also have obligations. You cannot spend all the money on drinks, joints, coca lines, callboys and women and then ask for help.

Post scriptum

Portanto, o socialista holandês tem razão! Será que que vai haver algum sobressalto nas bancadas da impoluta e mui politicamente correta Assembleia da República?

José Magalhães: Há pagamentos a deputados que são feitos sem controlo 
Negócios jng@negocios.pt
24 de março de 2017 às 09:37 
À pergunta sobre quanto ganha um deputado, José Magalhães, ele próprio ex-deputado eleito pelo PS, responde apenas: "há 230 remunerações". Tantas, portanto, quantos os parlamentares eleitos para o Parlamento. As remunerações, explica, variam de acordo com muitos factores, desde o círculo pelo qual cada um é eleito, a despesas de deslocação que façam, entre outras coisas.

Numa entrevista publicada esta sexta-feira, 24 de Março, no jornal "i", José Magalhães explica que há falta de controlo no pagamento nomeadamente de subsídios. "Em relação a um conjunto muito importante de remunerações, que são os abonos complementares para trabalho de círculo ou para trabalho nacional, é feito o pagamento não sujeito a qualquer comprovação", refere, lembrando que esta espécie de "segundo salário" para os parlamentares tem a vantagem de não estar sujeito a impostos. Na prática, diz, é feito o pagamento sem ser verificado se os deputados fazem o trabalho.

Atualização: 24 mar 2017, 10:43 WET 

quinta-feira, março 23, 2017

É o Diabo!



Caixa paga 10,75% pela dívida perpétua emitida!


Com esta remuneração, todos gostaríamos de ter um bocadinho da Caixa Geral de Depósitos, mesmo sabendo que o casamento seria indissolúvel. Deixar lá 100 mil euros até à eternidade e receber mensalmente 895 euros até que o nosso último trisneto se esquecesse que era um dos capitalistas da Caixa, quem é que rejeitaria tal perspetiva? O nosso investimento, em vez de obter uma rentabilidade negativa, ou seja, em vez de diminuir a cada dia que passa, como hoje sucede, estaria a engordar a 10,75% ao ano, numa era longa de crescimento efetivo abaixo dos 2%, juros assimétricos, e inflação escondida. É claro que as coisas não serão assim tão lineares, mas o que resulta evidente desta desmesurada rentabilidade prometida pela Caixa aos investidores institucionais é a extrema fragilidade, ou mesmo quase insolvência, em que o banco público se encontra. A confiança na sua viabilidade é tão baixa, tão baixa, tão baixa, que os tomadores da dita dívida exigem mais do dobro do que o país paga pela dívida pública a 10 anos, e quase 26x mais do que os mesmos investidores ganham com a dívida alemã a 10 anos (0,414% no dia de hoje). Vale o risco!

Esta operação terá curiosamente lugar num dos paraísos fiscais da União Europeia: o Luxemburgo. Ouviram o Bloco, ou o PCP, piar?

No mesmo dia em que somos surpreendidos com mais este escândalo financeiro que o governo e os média se encarregarão de cobrir com creme pasteleiro, o IGCP anuncia aos indígenas uma remuneração de 1,708% (1,90% + a negativa Euribor a 6 meses) para as suas famosas Obrigações do Tesouro de Rendimento Variável (OTRV), a lançar na próxima semana. Ou seja, menos 6x do que o bodo aos ricos da Caixa.

Em suma, sem a mão do BCE por baixo, já vimos o que valem as promissórias indígenas. Nada, ou quase nada. E, portanto, assim que o BCE fechar a bica do Quantitative Easing (na versão LTRO e TLTRO), Portugal entrará de novo numa zona de elevado risco. O risco de um novo resgate!

Teodora avisou, Schäuble avisou, o BCE quer multar Portugal, e o maior e um dos maiores fundos de investimento em dívida soberana, linchados pelo Banco de Portugal ao verem as suas compras de títulos do BES reduzidos a lixo, disseram que os elevados juros pagos por Portugal são o resultado da falta de confiança dos mercados nos nossos governantes e governadores...

Ou seja, o Diabo pode mesmo estar ao virar da esquina. Basta que o barril de petróleo suba para valores próximos dos 75-80 dólares (por enquanto continua a cair), ou que os juros americanos e europeus respondam à inflação emergente com uma subida consistente das taxas, para que o baralho de cartas da Geringonça se precipite para umas eleições antecipadas. Marcelo Rebelo de Sousa não tem sangue frio para aguentar uma pressão a sério.


POST SCRIPTUM

Um dia depois deste post, Mariana Mortágua veio contestar o mérito da operação da Caixa, reconhecendo que a mesma “põe em causa o balanço” do banco público. Pois põe! É que a pipa de massa a pagar em juros dificultará e muito o regresso do mesmo aos lucros. É caso para dizer que o que o Banco de Portugal roubou aos edge funds que foram convencidos a meter dinheiro no buraco negro do BES vai agora devolver pela mão estendida da Caixa, ou seja, farinha do mesmo saco que o sistema financeiro obrigará, uma vez mais, o pobre contribuinte a pagar. Chama-se a isto austeridade de esquerda, e não devolução de direitos, ou de rendimentos, como propagandeia a Geringonça.

Bloco defende que nova emissão de dívida da Caixa deve ser travada
Marta Moitinho Oliveira martaoliveira@negocios.pt
Negócios, 24 de março de 2017 às 12:26 
O Bloco de Esquerda defende que a emissão de dívida que a Caixa Geral de Depósitos (CGD) realizou esta quinta-feira, no valor de 500 milhões de euros, põe em causa o balanço do banco e aconteceu por imposição da Comissão Europeia, que teve de aprovar o plano de recapitalização da Caixa. O partido liderado por Catarina Martins quer que o banco público já não faça a segunda emissão, de 430 milhões de euros, que tem de ser feita nos próximos 18 meses. 
“A recapitalização [do banco público] não pode ser feita à custa do equilíbrio financeiro da Caixa”, disse a deputada Mariana Mortágua, aos jornalistas, no Parlamento.


REFERÊNCIAS

"Hedge funds" ficaram com mais de 40% das obrigações da Caixa

Nuno Carregueiro nc@negocios.pt
Negócios, 23 de março de 2017 às 20:31

A Caixa Geral de Depósitos concluiu esta quinta-feira a emissão de 500 milhões de euros em dívida subordinada que conta como capital (AT1), numa emissão que constou com uma forte participação de "hedge funds".

De acordo com um comunicado do banco do Estado colocado na CMVM, os títulos de dívida foram subscritos por mais de 160 investidores, com as ordens a totalizarem mais de 2 mil milhões de euros, o que superou em mais de quatro vezes o montante da emissão, de 500 milhões de euros.

A Caixa revelou também a distribuição da colocação dos títulos, quer por tipo de investidores, quer por geografia. As gestoras de activos ficaram com praticamente metade dos títulos, sendo que os "hedge funds" compraram 41%. Uma distribuição explicada pelo risco elevado dos títulos colocados, que atraem os investidores mais propensos ao risco, como é o caso dos "hedge funds".

Os investidores do Reino Unido compraram mais de metade dos títulos (59%), sendo que os portugueses ficaram apenas com 14%.


Caixa paga 10,75% pela emissão de dívida perpétua
André Veríssimo averissimo@negocios.pt | Rui Barroso ruibarroso@negocios.pt
Negócios, 23 de março de 2017 às 13:08

O banco liderado por Paulo Macedo fechou a taxa final para emitir dívida subordinada que conta como capital (AT1). Para convencer os investidores a apostar nestes títulos perpétuos, a Caixa Geral de Depósitos vai pagar 10,75%, segundo dados avançados pela Bloomberg. O valor indicado inicial era de entre 11% e 11,5%. No entanto, o juro elevado atraiu um nível e procura que triplica o montante em oferta. A liquidação da operação está prevista para 30 de Março.


IGCP lança nova emissão de Obrigações do Tesouro na próxima semana
Agência Lusa/ Observador, 23/3/2017, 11:13

A Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública (IGCP) vai emitir a partir da próxima semana uma nova série de Obrigações do Tesouro de Rendimento Variável (OTRV), com um montante indicativo de 500 milhões de euros. De acordo com o aviso do IGCP, publicado na quarta-feira em Diário da República, este montante poderá ser aumentado, por opção do emitente, até ao dia 31 de março de 2017, inclusive.

De acordo com uma nota publicada no ‘site’ do IGCP, as OTRV serão colocadas através de oferta pública de subscrição dirigida ao público em geral a decorrer entre o dia 27 de março e 7 de abril 2017, com pagamento de juros, semestral e postecipadamente, em 12 de abril e 12 de outubro de cada ano, calculados a uma taxa de juro variável e igual à Euribor 6 meses acrescida de 1,90%, ocorrendo o reembolso do capital em 12 de abril de 2022.


Grandes investidores internacionais fazem aviso a Portugal
Elisabete Tavares
Expresso, 22.03.2017 às 13h42

O grupo de grandes investidores a nível mundial que sofreu perdas com obrigações do Novo Banco alerta que o país continua a ser penalizado pela decisão do Banco de Portugal, e refere que um acordo seria benéfico para Portugal.

Este grupo, liderado pela BlackRock, a maior gestora de ativos do mundo, e pela PIMCO, uma das maiores investidoras em títulos de dívida, faz parte do conjunto de instituições que perdeu 2,2 mil milhões de euros com a transferência de cinco séries de obrigações do Novo Banco para o banco tóxico que sobrou do antigo BES.

O aviso surge numa altura em que a Caixa Geral de Depósitos procura angariar investidores para a sua emissão de obrigações perpétuas de 500 milhões de euros, no âmbito do projeto de capitalização do banco público.


Quase 500 bancos aproveitaram a última ronda de dinheiro grátis do BCE
Rui Barroso ruibarroso@negocios.pt
Negócios, 23 de março de 2017 às 12:41

Os bancos da Zona Euro acorreram em força à última operação de refinanciamento de prazo alargado direccionadas do BCE (TLTRO). Para estimular a concessão de crédito na Zona Euro, o banco central fez várias operações deste tipo, com juros de 0% ou mesmo negativos e um prazo de quatro anos, sendo que a cedência de liquidez desta quarta-feira é a última agendada.

Houve 474 bancos a participar na operação, segundo dados da Bloomberg e foram alocados 233,5 mil milhões de euros. O valor é bem superior aos 110 mil milhões de euros estimados pelos analistas, o que sinaliza que as entidades financeiras da Zona Euro quiseram aproveitar esta provável última oportunidade para assegurarem liquidez.


Dívida perpétua
Nota da Caixa Geral de Depósitos (PDF)


BCE quer ultimato a Portugal: mais reformas ou sanções
Rui Peres Jorge rpjorge@negocios.pt
Negócios, 20 de março de 2017 às 21:10

Portugal está há três anos com desequilíbrios macroeconómicos excessivos e não tem adoptado as medidas necessárias para os corrigir apesar de várias recomendações europeias, o que de acordo com as regras do Procedimento relativo de Desequilíbrios Macroeconómicos (PDM) deveria implicar uma multa de quase 190 milhões de euros (0,1% do PIB ao ano). Esta é a posição do BCE, avançada a 20 de Março, numa análise à avaliação realizada em Fevereiro pela Comissão Europeia aos desequilíbrios na UE, na qual o banco central repete críticas à mão leve que Bruxelas tem revelado na gestão deste mecanismo de coordenação, mostrando-se "especialmente surpreendido" com o comportamento de Portugal, cujo governo prometeu muito e fez pouco em 2016.

Atualização: 24 mar 2017, 16:39 WET