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terça-feira, janeiro 31, 2012

Colapso energético em 2014?

O petróleo acabou!

O desastre da plataforma de perfuração Deepwater Horizon, Golfo do México, 2010.

Medina Carreira parece já ter percebido o essencial:
  1. O Ocidente, a começar pelos Estados Unidos, desde meados da década de 1970, começou a exportar as suas indústrias para Oriente, substituindo uma economia material, produtiva e de crescimento endógeno, por uma economia de serviços, de consumo e de endividamento, cada vez mais virtual — a qual viria a ser replicada, uma década mais tarde, na Europa;
  2. As democracias ocidentais (as únicas que, na realidade, existem e são dignas do conceito que exibem para o resto do mundo) degeneraram em regimes burocráticos de representação partidária, populistas e corruptos, vivendo em simbiose oportunista com um sistema financeiro essencialmente especulativo e cada vez mais assente na fraude internacional organizada;
  3. A superioridade tecnológica, militar e diplomática permitiu, durante os últimos quarenta anos, aos Estados Unidos e à Europa ocidental, um endividamento público e privado sem precedentes, do qual viria a resultar o nosso declínio demográfico (envelhecimento populacional e perda de população) e a presente crise sistémica — financeira, económica, social e política;
  4. Na base mais profunda da crise do actual modelo de civilização encontra-se um fenómeno de que só muito recentemente Medina Carreira parece ter-se dado conta: sem petróleo barato a economia do consumo e do estado social não só não pode funcionar, como entra rapidamente em colapso assim que o preço da energia ultrapassa um certo patamar; acima dos 100 dólares, situação que tem vindo a consolidar-se (ver cotações), temos recessão em largas dezenas de países; e acima dos 150-200 dólares a economia muito provavelmente entrará num colapso irreversível, isto é, do qual não será mais possível sair, se não através da instauração de um novo modelo de economia e de sociedade!




No programa Olhos nos Olhos (TVI 24) dedicado à crise petrolífera apareceu um tal “Agostinho Pereira de Miranda, advogado, [e] um dos maiores especialistas portugueses em assessoria jurídica e fiscal na área da exploração petrolífera.” Disse coisas acertadas durante uma parte do programa, mas parece ter reservado para o fim duas mensagens contraditórias e desastrosas (certamente sintonizada com o frenesim da caça ao último atum!):
  1. que o Pico do Petróleo seria uma fantasia do passado, em que ele mesmo chegou a crer;
  2. e que a energia nuclear seria certamente uma alternativa, ou um elemento da "diversidade" a ter em conta no futuro do sector energético.
Se temos petróleo para dar e vender, então não se justifica o risco e o preço do nuclear. Se, pelo contrário, o futuro do petróleo é incerto, então o nuclear será sempre insuficiente para substituí-lo, dada a magnitude da presença do petróleo nas nossas vidas; e também não justifica, nem o preço, nem o risco de insistir na sua problemática utilização, depois de mais uma tragédia tão incomensurável como a de Fukushima, ou face à permanente instabilidade internacional decorrente de qualquer tentativa de alargar o clube nuclear!

Menos mal que Medina Carreira se não deixou levar pelas palavras confusas do seu convidado, e atalhou as contradições do tal assessor dizendo simplesmente que não vai haver tempo suficiente para substituir o petróleo leve e barato por petróleo pesado e caro!

Há certamente muito petróleo pesado e extra pesado a cinco e a seis mil metros de profundidade; e muito petróleo misturado nas lamas venezuelanas e nas areias betuminosas do Canadá, e ainda o chamado gás de xisto. O problema, porém, desta abundância, é que a mesma é ilusória, pois custa muito dinheiro obter tais formas impuras de petróleo e gás, e correm-se riscos tremendos na sua extração, como ficou provado no desastre da Plataforma Deepwater Horizon da BP no Golfo do México.

O Pico Petrolífero global já chegou, em 2006, ou chegará até 2015 se descontarmos o efeito da uma recessão global duradoura, como a que está presentemente em curso. Entretanto, teremos volatilidade dos preços (que não é apenas resultado da especulação, como se diz) e a real possibilidade de um oil crunch, ou seja, a contração repentina da oferta sempre que há uma retoma da procura — e a subsequente e instantânea alta dos preços.

Assim como não vimos o crédito mundial secar, antes do colapso financeiro nos bater à porta com toda a sua brutalidade, tudo parece apontar agora para que o  colapso energético irrompa um dia destes por entre gargalhadas parlamentares, cimeiras inconclusivas e algum reality show novo.

sexta-feira, novembro 06, 2009

Crise Global 71

O colapso da era industrial



A produção mundial de petróleo convencional estagnou em 2004. Por sua vez os autores da Teoria de Olduvai (The Olduvai Theory -- Energy, Population, and Industrial Civilization, by Richard C. Duncan ) defendem que em 1970 terminou o período de crescimento exponencial da produção de energia à escala mundial, daí decorrendo uma estagnação do valor médio da produção de energia per capita, a qual se terá estendido até 2008, ano que marca o princípio do fim da era industrial, bem como do crescimento demográfico, alimentado desde 1830 pelo uso intensivo de energia barata. Esta teoria, secundada por várias previsões desde finais do século 19 (Henry Adams em 1893, Frederick Ackerman em 1932, e King Hubbert em 1949), estima uma quebra da população humana mundial, de 6,9 mil milhões em 2015, para 2,0 mil milhões em 2050.

Segundo a Teoria de Olduvai (1), mais cedo ou mais tarde as redes eléctricas irão colapsar sob a forma de uma cascata global de cortes de energia irreversíveis (2)(3).

Desde 2004 que a produção petrolífera não vai além dos 85 milhões de barris por dia (85 MM bpd). É o chamado "plateau" (planalto) que assinala o fim de um crescimento exponencial. Ao mesmo tempo, 54 dos 65 mais importantes países produtores de petróleo (ou seja, 83%) já ultrapassarem o pico de produção. Em breve (2011...) o planalto em que se encontra actualmente a oferta mundial de petróleo dará passo ao declínio contínuo da produção, a uma taxa estimada entre 4,5% e 8% ao ano (Robert Hirsch.)

Mas se a produção quiser responder à pressão estimada da procura mundial, e atingir em dez anos (2010-2020) os almejados 112 MM bpd, então será necessário compensar o declínio produtivo já instalado com a extracção de mais 75 MM bpd de jazidas que todavia não foram descobertas. Ou seja, seria necessário acrescentar às reservas conhecidas, no decurso da próxima década, novas reservas, por descobrir, equivalentes a 8 Arábias Sauditas — quer dizer, a oito vezes o petróleo explorado e existente em todas as jazidas daquele deserto de excêntricos. Seria pois preciso descobrir e explorar um novo poço gigante em cada 15 meses ao longo dos próximos dez anos. Uma missão claramente impossível! Entre 2000 e 2007 o ritmo de descobertas de poços gigantes decaiu para uma média de 9 poços por década, quando na década de 1980 foi de 24, e nos anos 60, de 120.

Mas o mais aterrador é que, ao contrário do que se pensa, as chamadas energias alternativas jamais poderão restabelecer os extraordinários níveis de produção de energia per capita (e) que permitiram a aceleração histórica da modernidade. De facto, o declínio exponencial da produção petrolífera que começará a sentir-se de forma catastrófica em todo mundo por volta de 2011-2012, arrastará consigo o colapso do paradigma eléctrico desenvolvido entre 1880 e 1930. Não há petróleo sem electricidade... e não haverá electricidade (4) sem petróleo!

De algum modo poderá dizer-se que todos os problemas de sobre-população humana, alterações climáticas e destruição de recursos naturais e formas de vida induzidas pelo homem, serão em breve atalhados por um regresso catastrófico à agricultura e à dispersão corpuscular da humanidade. O sobressalto, até chegar a nova Idade Média, será muito mais drástico, mortal e aterrador do que o que decorreu da queda do Império Romano.

A actual implosão dos sistemas político-partidários (com o respectivo cortejo de corrupção, traições e populismo geral), o ciclo de depressão económica duradoura em que o mundo acaba de entrar e as guerras regionais, mundiais e civis que espreitam no horizonte, quando não estão já em curso, permitem-nos confirmar que a hora da nossa querida e louca civilização de prazer e consumo chegou ao fim.

É possível pensar em cenários e estratégias de mitigação da tragédia. Mas quererá alguém pô-los em prática?


POST SCRIPTUM
  • A propósito do desmiolado debate parlamentar em volta do surrealista programa de governo de José Sócrates (ainda sob o império corrupto e obtuso da Tríade de Macau), duas observações:
    1. o lamentável espectáculo oferecido a todos nós pela Oposição (salvaguardando, diga-se em abono da verdade, a inflexibilidade lúcida de Manuela Ferreira Leite) é o exemplo acabado da exaustão do actual sistema partidário; desconhece o que se passa no mundo real, compraz-se com jogos florais populistas e não propõe uma única medida séria de mitigação para a actual crise sistémica;
    2. não se podendo esperar nada de bom do actual regime político, teremos que começar urgentemente a estimular uma reorganização social a partir do zero. Ou melhor, a partir dos agrupamentos sociais elementares: famílias genéticas, profissionais e culturais, bairros, freguesias, aldeias, vilas e redes electrónicas de cidadania e inteligência colectiva (as grandes cidades terão que ser reestruturadas em redes de freguesias e bairros, e em redes electrónicas, enquanto puderem...) O exercício proposto é este: que precisa Portugal para aguentar o impacto do colapso energético em curso; que infraestrutura técnica e que tipo de organização do território precisará o país num cenário demográfico reduzido a 6 milhões de habitantes, com um PIB equivalente a 40-50% dos actuais 170 mil milhões de euros, num contexto internacional marcado pelo colapso sucessivo da Globalização e da União Europeia, e de uma mais do que provável e violenta fragmentação do reino de Espanha. Se não formos capazes de realizar este exercício de prospectiva estaremos certamente condenados a um triste fim.


2009 Commemorative Lecture : Dr. Dennis L. Meadows



NOTAS
  1. A designação desta teoria provém da Garganta de Olduvai, uma região de desfiladeiros no Norte da Tanzânia, onde se crê que os primeiros hominídeos, antecedentes do homem actual, surgiram. Ver imagem da Olduvai Gorge.

  2. "Peak Cheap Oil Update - Part I: The glass is half empty" (iTulip)

    ...Gasoline and diesel, distillates of crude oil, are unique as a liquid fuel. The amount of work a gallon of these fuels can do when by volume burned simply defies imagination. Consider the most mundane act of the automobile owner, stopping off at a gasoline station to refuel. A mere ten gallons of gasoline propels a two-ton vehicle hundreds of miles up and down hills at speed in excess of 60 miles per hour. Try pushing your car ten feet on a flat driveway and you will begin to appreciate how much work the gasoline in your tank is doing. The amount of work a liquid fuel can do by volume is referred to as its energy density. Liquid hydrogen, by comparison, has less than one third of the energy density of gasoline. That means that you need three times as much by volume to travel the same distance, assuming both the gasoline and hydrogen powered engines deliver the same number of miles per gallon.

    You can pour the gasoline into your tank on a hot summer’s day or in winter when the temperature is well below zero. Crude oil can be shipped through pipes over long distances in a wide range of temperatures and climates.

    Crude oil, and its distillates, is the one and only substance like this. No other liquid that humans can dig out of the ground, refine, and pour into a tank at any climate on earth even comes close. Every other liquid fuel, such as liquid hydrogen, has to be manufactured out of something else, then compressed, and if stored as a liquid kept at temperatures hundreds of degrees below zero. You cannot transport any other fuel through hundreds of miles of pipelines. Crude oil and its distillates can be piped over long distances at a wide range of naturally occurring temperatures, and stored cheaply in unpressurized tanks.

    We are using up this unique and irreplaceable liquid fuel source several million times faster than it was created by nature hundreds of millions of years ago. In a little more than two human life spans can we have used up half of all of the oil that took several million human life spans to accumulate.

    ... [Robert] Hirsh says that the only practical solutions [for oil depletion mitigation] are: conservation and rationing, wider use of heavy oils, more intensive oil recovery from existing fields, and conversion of natural gas to liquids and coal to liquids.

    Yet by Hirsh’s calculations, even if all of these methods of oil depletion mitigation are applied, assuming the optimistic 5% median annual global oil production decline rate, the world will still experience an oil shortage of 30% compared to current consumption rates.

    ...

    In economic terms, higher oil prices means that the global economy will shrink.

    Hirsh’s 2008 analysis of the impact of rising oil prices on economic growth revealed an approximate 1% decline in GDP per 1% decline in the oil supply. The 30% decline in oil supply in ten years following the end of the plateau in oil production at 5% per year, implies a 30% drop in GDP in a decade. During the first three years of The Great Depression, between 1930 and 1934, U.S. GDP declined 24%. Peak Oil implies a per-capita economic decline even more severe than The Great Depression, although the economic decline may be more gradual. -- in Peak Cheap Oil Update - Part I: The glass is half empty.

  3. Hirsch (2008) quantified how historic declines in world oil supply caused proportionate declines in world GDP. He provides a framework for mitigation planning including:

    "(1) a Best Case where maximum world oil production is followed by a multi-year plateau before the onset of a monatomic decline rate of 2-5% per year; (2) A Middling Case, where world oil production reaches a maximum, after which it drops into a long-term, 2-5% monotonic annual decline; and finally (3) a Worst Case, where the sharp peak of the Middling Case is degraded by oil exporter withholding, leading to world oil shortages growing potentially more rapidly than 2-5% per year, creating the most dire world economic impacts." -- in Wikipedia.

  4. The Olduvai Theory -- Energy, Population, and Industrial Civilization, by Richard C. Duncan (PDF)

    [...] The International Energy Agency (lEA, 2004) estimates that the cumulative worldwide energy investment funds required from 2003 to 2030 would be about $15.32 trillion (T, US 2000 $) allocated as follows: 1. Coal: $0.29T (1.9% of the total), 2. Oil: $2.69T (17.6%), 3. Gas: $2.69T (17.6%), 4. Electricity: $9.66T (63.1%). Thus the lEA projects that the worldwide investment funds essential for electricity will be 3.7 times the amount needed for oil alone, and much greater than all of that required for oil, gas, and coal combined. The OT says that the already debt-ridden nations, cities, and corporations will not be able to raise the $15.32 trillion in investment funds required by 2030 for world energy. (Not to mention the vastly greater investment funds required for agriculture, roads, streets, schools, railroads, water resources, sewer systems, and so forth.)

    --

    During the last two centuries we have known nothing but exponential growth and in parallel we have evolved what amounts to an exponential-growth culture, a culture so heavily dependent upon the continuance of exponential growth for its stability that it is incapable of reckoning with problems of no growth. (M. King Hubbert, 1976, p. 84)

    1. Coal grew exponentially for 209 years: 1700- 1909. 2. Oil grew exponentially for 137 years: 1833-1970. 3. Natural gas grew exponentially for 90 years: 1880-1970. 4. Hydroelectric energy grew exponentially for 82 years: 1890-1972. 5. Nuclear-electric energy grew exponentially for 20 years: 1955-1975. Note well that none of the five sources of primary energy production grew exponentially after 1975.

    World total energy production grew exponentially at about 4.6%/y from 1700 to 1909. Next it grew linearly at 2.2%/y from 1909 to 1930 and 1.5%/y from 1930 to 1945. Subsequently it surged exponentially at 5.5%/y from 1945 to 1970. This was followed by linear growth at 3.5%/y from 1970 to 1979. Thereafter world total energy production slowed to linear growth of about 1.5%/y from 1979 to 2003.

    World population grew linearly at an average of 0.5%/y from 1850 to 1909; 0.8%/y from 1909 to 1930; 1.0%/y from 1930 to 1945; 1.7%/y from 1945 to 1970; 1.8%/y from 1970 to 1979; and 1.5%/y from 1979 to 2003 (UN, 2004; USCB, 2004).

    Comparing the foregoing numbers: World total energy production easily outpaced world population growth from 1700 to 1979, but then from 1979 through 2003 total energy production and population growth went dead even at 1.5%/y each. World total energy production per capita, e, grew exponentially at 3.9%/y from 1700 to 1909. Thereafter it grew at linear rates of 1.4%/y from 1909 to 1930; 0.5%/y from 1930 to 1945; 3.7%/y from 1945 to 1970; 1.7%/y from 1970 to 1979; and 0.0%/y (i.e., zero net growth, called the ‘Plateau') from 1979 to 2003.

OAM 645 06-11-2009 01:22 (última actualização: 10:19)

segunda-feira, fevereiro 25, 2008

Energia

Sol, mar e vento!

A população mundial cresce ao bonito ritmo de 1% ao ano. Isto quer dizer, que hoje somos cerca de 6,7 mil milhões de criaturas, e em 2050, se não ocorrer nenhuma catástrofe de proporções bíblicas, seremos 9 191 287 000 de almas penadas. Outro dado curioso é o do nosso consumo energético, o qual tem vindo a crescer 2% ao ano. Consumimos hoje o equivalente a um motor com uma potência de 15 TWatt (1), mas se nada mudasse na actual inércia dos negócios, o motor energético de 2050 teria que ter uma potência de 30-35 TWatt. A boa notícia, dada há dias pelo Nobel da Física, Carlo Rubbia (2), é que bastaria um quadrado de areia no deserto do Saara, com 200x200 Km, para satisfazer tão descomunal necessidade energética. A má notícia é que poucos acreditam na possibilidade de reconverter a actual dependência das energias fosseis e não renováveis (petróleo, carvão, gás natural e nuclear), que era em 2005 da ordem dos 86%, para valores capazes de travar os efeitos nefastos das emissões antropogénicas de CO2 para a atmosfera.

Segundo Rubbia, a predominância dos fósseis na produção de energia deverá prosseguir, traduzindo-se num agravamento nas emissões com efeito de estufa, na estabilização da energia nuclear e num pequeno incremento das energias renováveis. Em 2004 era esta a distribuição das diversas origens da energia produzida pelos humanos:
Energias não renováveis: 86,8%
  • Petróleo: 34,3%
  • Gás natural: 20,9%
  • Carvão: 25,1%
  • Nuclear: 6,5%
Energias Renováveis: 13,1%
  • Combustíveis e resíduos renováveis (biomassa, cana de açúcar, etc.): 10.6%
  • Hidroeléctricas: 2,2%
  • Outras
    • Geotérmica: 0,414%
    • Eólica: 0,064%
    • Solar: 0,039%
    • Ondas: 0,0004%
Estes números dão uma ideia do caminho a percorrer, da dimensão dos obstáculos e sobretudo da inércia que será necessário vencer para corrigir a situação actual. Quando os governos europeus falam das suas ambiciosas metas ecológicas -- chegar aos 20% de energias obtidas de fontes primárias renováveis (vento, água, sol e biomassa), até 2020 -- é bom percebermos todos que se trata de uma transferência de apenas 6,9% em 12 anos, quando a taxa de crescimento anual do consumo à escala planetária é de 2%. Algo me diz que estamos em presença de uma vontade política desgraçadamente ridícula face ao desafio que a humanidade tem pela frente.


Pico carbónico, sim ou não?


Embora o petróleo líquido e o gás natural devam atingir o pico produtivo mundial no intervalo compreendido entre 2008 e 2018 (3), as reservas de carvão (5000 a 20.000 GTon), de óleos extra-pesados (tar sands) e de xistos oleosos (oil shale) seriam, segundo Carlo Rubbia, mais do que suficientes para alimentar o consumo energético mundial, à actual taxa de crescimento, por várias centenas de anos!

Na verdade, não é bem assim (4). Para que tal fosse viável, seria necessário que o ENROI (Energy Net Return on Energy Invested) da produção das variantes pesadas da energia fóssil (oriundas do petróleo de profundidade ou situado em zonas geladas, das areias betuminosas e dos xistos oleosos) não tornasse os necessários investimentos gigantescos que estão em causa em tais operações, muito arriscados e de rentabilidade duvidosa (como as contas até agora feitas demonstram ser). Por outro lado, mesmo conseguindo optimizar o ENROI, existem as maiores dúvidas sobre quem poderia pagar o preço final dos combustíveis e produtos derivados de hidrocarbonetos tão caros.


Os efeitos das emissões de CO2 duram quanto tempo?

Carlo Rubbia, dando de barato que há suficiente energia fóssil, e suficiente ciência e tecnologia para aproveitá-la (um mito comum e bem moderno), chama no entanto a atenção para um facto ainda mal percebido pelos poderes de decisão e longe da consciência social dominante. O facto é este: a produção antropogénica de CO2 terá efeitos sobre o clima da Terra durante centenas de milhar de anos!

A sobrevivência do plutónio é da ordem dos 25 mil anos. Mas a sobrevivência média do CO2 é de 30-35 mil anos. 1 a 33% das partículas emitidas agora perderão a sua actividade daqui a mil anos; 10 a 15% só daqui a 10 mil anos; e 7% das mesmas levarão 100 mil anos a "morrer"!

O degelo da calota polar e da Gronelândia, muito mais rápido do que o previsto, deriva em boa parte dos efeitos nefastos dos milhões de toneladas de CO2 lançados diariamente na atmosfera pela acção humana. O risco de o nível do mar subir entre 7 e 15 metros nalgumas zonas costeiras é cada vez mais plausível. A concretizar-se, por exemplo, na região chinesa do delta do rio Yangtze -- Xangai, Hangzhou, Nanjing --, onde vivem mais de 90 milhões pessoas, haverá uma catástrofe de proporções inimagináveis.

A redução até 2050 de metade das actuais emissões de CO2, proposta pela União Europeia, numa conjuntura habituada ao crescimento contínuo da produção e do consumo energético, vai ser um desafio tremendo, para o qual as actuais democracias populistas, muito corrompidas pela promiscuidade que mantêm com os sectores económicos-financeiros, invariavelmente atrelados a metas de rentabilidade e lucro fácil a curto prazo, não se encontram preparadas.

Passar de 6,5 GTon de emissões de CO2 provenientes do uso de energias fósseis (80% de toda a energia produzida/consumida pelos humanos), para 3,2 GtonC, quando os cenários da economia convencional continuam a apontar para um patamar de emissões, em 2050, de 15 GtonC, revela bem a dimensão trágica da verdadeira revolução energética que terá que ser realizada se quisermos sobreviver. (4)



Blue Men Group Tackles Global Warming

O Sol é tudo. Mas teremos tempo para inverter o actual curso suicida?

Segundo Carlo Rubbia, 15 TWatt de energia primária fornecida pelo Sol (equivalente ao actual consumo energético mundial) é a energia recebida por apenas 0,13% dos desertos solares do planeta, qualquer coisa como um quadrado com 200x200 Km2 no Saara! Onde está então a dificuldade energética, pergunta o físico nuclear do CERN e prémio Nobel?!

O problema científico e tecnológico resume-se, na sua opinião, a privilegiar a energia solar termoeléctrica, baseada em sistemas altamente eficientes de concentração da energia solar (Concentrating Solar Power - CSP), acoplados a receptores térmicos (sal, óleo, etc.) que acumulam calor a altas temperaturas, na ordem dos 450-650 ºC. Este calor serve, ou para acionar motores térmicos (do tipo Stirling e Brayton), ou para ferver água a alta pressão em geradores de vapor, que farão rodar as turbinas electromagnéticas.

Entre as tecnologias CSP actualmente em operação (a tecnologia solar mais barata), contam-se as Torres de Energia Solar, os Discos Solares e os Reflectores cilíndricos parabólicos. Outra tecnologia solar disponível (sobretudo para pequenas instalações, ou localizadas longe das redes de distribuição eléctrica) é a dos painéis foto-voltaicos, que convertem directamente a energia solar em energia eléctrica, embora com custos superiores e menor rendimento do que a tecnologia CSP. Para uma síntese sobre este tema, ler o artigo da Wikipedia.

O governo português está disposto a financiar a Rede Eléctrica Nacional para que esta compre electricidade produzida por particulares em regime de microgeração, a 65 cêntimos por kilowatt hora (kWh), um valor seis vezes superior aos 10,8 cêntimos que actualmente pagamos em casa. Este preço, para além dos incentivos fiscais e financeiros na aquisição dos equipamentos e instalação dos micro-geradores eólicos, foto-voltaicos e solares térmicos, destinam-se a distribuir o esforço de investimento na reconversão do paradigma energético. Mas pode igualmente comportar uma intenção indesejável: a de assegurar o controlo monopolista da distribuição da energia, impedindo, pela via legislativa, que a produção de energia solar barata possa vir a converter-se numa fonte de rendimento melhor distribuída, por exemplo, pelas comunidades locais e municípios. Vale pois a pena estudar em pormenor o problema das redes de distribuição, reivindicando, não apenas o direito à micro-geração, mas também o direito à criação de redes privadas, comunitárias, e municipais de distribuição eléctrica, sob supervisão das entidades responsáveis pela eficiência e segurança dos sistemas e redes elétricas.

Prevê-se que a produção de energia solar termoeléctrica (CSP) baixe progressivamente de preço ao longo das próximas duas décadas, devendo custar cerca de 2 cêntimos por kWh em 2020. Isto é, 1/5 da actual factura energética doméstica! Se pensarmos que por essa altura já parte significativa dos meios de transporte individual usará mais energia eléctrica do que combustíveis fósseis, adivinha-se as proporções gigantescas da revolução energética em curso. Para além do direito à micro-geração individual, familiar e comunitária de energias sustentáveis, o grande desafio colocar-se-à brevemente no terreno da eliminação dos actuais monopólios e oligopólios de distribuição, e em geral na des-concentração democrática das redes eléctricas.

A Espanha tem já uma Plataforma Solar comercial a funcionar em Sanlúcar la Mayor, Sevilha (ver vídeo noticioso), cinco centrais a iniciar até 2010 e mais 13 em fase de planeamento, num total de 19 centrais solares baseadas predominantemente na tecnologia termoeléctrica (CSP), com uma capacidade a instalar de 1,5 GW.


Barragens para quê?

A pergunta que fazemos é simples: qual o impacto real das 10 barragens hidroeléctricas cuja construção o governo intempestivo de José Sócrates, e do seu caricato ministro da Economia, apresentou como decisão inabalável? Não poderíamos ter melhores resultados seguindo o caminho avisado da Espanha? Ao contrário dos parques solares, as barragens produzem gases com efeito de estufa, atacam a biodiversidade, fragilizam os estuários dos rios, arrasam paisagens únicas, expropriam os pequenos a favor de oligopólios, destroem actividades económicas pré-existentes, deslocam comunidades humanas, comprometem actividades económicas de longa duração (como o turismo bem planeado). Por outro lado, o emprego que geram é meramente pontual e dura apenas o tempo das obras de construção. A única vantagem que parece subsistir é a da retenção de água doce e a sua potencial contribuição para a mitigação dos períodos de seca. Mas a que preço? E para que fins, realmente? Aliás, no caso das previstas pequenas barragens anunciadas repetidamente por José Sócrates, tratando-se de afluentes de rios maiores, eles próprios já regularizados por barragens, até este argumento residual redunda em manifesta falácia! Sobra, talvez, uma única justificação para a teimosia política: a velha confraria do betão que formatou ao longo destes últimos 30 anos o exercício da política à portuguesa!

Não é de barragens que precisamos para dar negócio aos empreiteiros e trabalho ao país. Mas sim de outro tipo de obras com efeitos multiplicadores muito mais amplos e duradouros. Como por exemplo, a reformulação audaciosa da rede ferroviária nacional e a sua interligação à rede espanhola, nomeadamente nos segmentos da Alta Velocidade e Velocidade Elevada. Como por exemplo, o lançamento de uma Nova Reforma Agrária nacional visando transformar Portugal num importante produtor especializados de bens agrícolas com elevado Valor Ecológico Acrescentado. Como por exemplo, a reconversão da maioria das nossas cidades em eco-cidades. Como por exemplo, a defesa e promoção da biodiversidade do território. Como por exemplo, a promoção de uma nova economia do mar.

Post-scriptum -- (26-02-2008) Recebi entretanto duas referências que merecem ser aprofundadas, para complemento do quadro traçado neste artigo:
  1. por um lado, a importância que ultimamente tem vindo a ser dada ao petróleo do Árctico, cujo acesso seria uma consequência do derretimento de extensas áreas daquela zona polar!
  2. outra, é a relevância dada num relatório europeu recente ao hidrogéneo, bem como o projecto da primeira instalação industrial de produção de electricidade a partir de hidrogéneo no Abu Dhabi.
    La recherche européenne démontre que l'hydrogène pourrait permettre de réduire la consommation de pétrole dans les transports routiers de 40% d'ici à 2050.

    Bruxelles, 25 février 2008.
    Un projet scientifique financé par le programme de recherche de l'UE a conclu que l'introduction de l'hydrogène dans le système énergétique réduirait la consommation totale de pétrole des transports routiers de 40% d'ici 2050. En prenant la tête du marché mondial des technologies de l'hydrogène, l'Europe peut ouvrir de nouveaux débouchés et renforcer sa compétitivité. Mais l'analyse indique également que la transition ne se fera pas automatiquement. Des obstacles importants doivent d'abord être surmontés, tant du point de vue économique et technologique qu'institutionnel, et il faut agir dès que possible. Le projet HyWays associe des entreprises, des instituts de recherche et des agences gouvernementales de dix pays européens. À l'issue d'une série de plus de 50 ateliers, le projet a abouti à une feuille de route pour l'analyse des incidences potentielles, sur l'économie, la société et l'environnement de l'UE, du recours à grande échelle à l'hydrogène, sur le court et le long terme, assortie d'un plan d'action indiquant les modalités à suivre pour concrétiser ce programme. Le rapport est publié au moment où les États membres doivent approuver un nouveau partenariat de recherche entre secteurs public et privé, d'un montant de 940 millions d'euros, pour le développement de la filière hydrogène et des piles à combustible. -- in Press Releases Rapid.



NOTAS
  1. Um Tera Watt é o mesmo que um bilião de Watt, ou um milhão de milhões de Watt (também representado assim: 10E12Watt ou 10^12 Watt).
  2. Carlo Rubbia, "The great Energy transformation - QM 2008 Inaugural Session", 2008 (PDF).
  3. Giant Oil Fields - The Highway to Oil: Giant Oil Fields and their Importance for Future Oil Production. Fredrik Robelius. 30-03-2007. (PDF)
  4. A abundância dos óleos extra-pesados não significa automaticamente a sua acessibilidade económica. O preço da sua produção, estima-se, será sempre superior em 40% ao custo da produção petrolífera actual! Leiam-se estes dois recentes artigos sobre o assunto:

    Chris Sanders, Sanders Research Associates Ltd.
    29-02-2008. "Orwell's vision, Lockheed's dream"

    "Paul Krugman, the New York Times' economic pundit, blogger, and candidate in waiting to be US Treasury Secretary in the next Democratic administration, has blogged on peak oil. This suggests that it must finally be safe to talk about it seriously in public and amongst adults. He usefully points out the fact, illuminated some years ago by Hall, Cleveland and Kaufman in Energy and Resource Quality (1986), that the production costs of alternative fuels, such as shale oil in his example, rise along with the price of oil. Thus the idea, much loved in the popular press and amongst quite a few people in the financial markets who ought to know better, that higher oil prices make investment in alternative energy sources feasible once oil reaches such and such a price, is a fallacy."

    Paul Krugman, New York Times
    19-02-2008. "Feeling a bit peaked"

    "Peak oil, that is -- a dismal theory that keeps getting more plausible.

    ... A curious fact: a couple of years ago the firmly held belief of many right-wing economic commentators (why is this ideological? I'm not sure, but it was) was that the spectacular rise in home prices wasn't a bubble, but that the rise in oil prices was."
  5. Gaiolas de CO2: New materials can selectively capture CO2, scientists say. CBCNews.

OAM 323 25-02-2008, 03:06 | 29-02-2008, 12:50

quinta-feira, dezembro 06, 2007

Crise Iraniana 3

President George W. Bush during a press conference at the White House
G.W. Bush anuncia que Irão não tem em curso nenhum programa nuclear militar.
Mandel Nagan/Agence France-Presse--Getty Images.

Dois Vietnames e meio

An Assessment Jars a Foreign Policy Debate About Iran
By STEVEN LEE MYERS
Published: December 4, 2007

"WASHINGTON, Dec. 3 -- Rarely, if ever, has a single intelligence report so completely, so suddenly, and so surprisingly altered a foreign policy debate here.

"An administration that had cited Iran's pursuit of nuclear weapons as the rationale for an aggressive foreign policy -- as an attempt to head off World War III, as President Bush himself put it only weeks ago -- now has in its hands a classified document that undercuts much of the foundation for that approach.

"The impact of the National Intelligence Estimate's conclusion -- that Iran had halted a military program in 2003, though it continues to enrich uranium, ostensibly for peaceful uses -- will be felt in endless ways at home and abroad.

... "There are still hawks in the administration, Vice President Dick Cheney chief among them, who view Iran with deep suspicion. But for now at least, the main argument for a military conflict with Iran -- widely rumored and feared, judging by antiwar protesters that often greet Mr. Bush during his travels -- is off the table for the foreseeable future." -- The New York Times.

Ao contrário do que se fartaram de escrever as araras que comentam as grandes questões internacionais, o Irão não está a desenvolver nenhum programa militar nuclear, pelo menos desde 2003. Reconheceram-no agora os serviços secretos que trabalham para G. W. Bush, mais de um mês depois de tal conclusão ter sido sublinhada por Mohamed ElBaradei, o Director-Geral da Agência Internacional de Energia Atómica.

O jogo do gato e do rato em que o cowboy do Texas caíu que nem um patinho, serviu às mil maravilhas a China, a Rússia, a Venezuela, os Emiratos Árabes, a Arábia Saudita e o próprio Irão. O petróleo disparou para além do que é devido ao Pico Petrolífero; a Rússia investiu no reforço do seu potencial militar (nuclear estratégico e convencional); a Arábia Saudita comprou dezenas de caças de última geração ao Sr. Blair (com luvas pelo meio e nada de investigações detalhadas sobre o assunto); o Iraque sabotou com sucesso a legislação que Bush queria fazer passar no parlamento do país ocupado, desenhada com o fito de hipotecar boa parte do petróleo iraquiano à sua própria família e amigos; a China acaba de emergir como actor estratégico de primeiro plano na diplomacia mundial; em suma, os Estados Unidos estão na mais completa falência, estourando mais de 50% das suas receitas fiscais numa cruzada para a qual já não têm, nem tomates, nem combustível. A Europa andou, como sempre, a pavonear a sua indigência estratégica. Quando é que o Solana se reforma?

E agora, em que ficamos? A China proibiu por duas vezes navios de guerra norte-americanos de visitarem os seus portos, ao mesmo tempo que aparece como pacificadora das grandes tensões diplomáticas mundiais (Coreia do Norte, Irão, ...). A Rússia voltou a patrulhar em força o Atlântico e o Mediterrâneo, tendo programado grandes exercícios aero-navais para o início de 2008. China e Japão acertam estratégias financeiras globais no que respeita ao lucrativo negócio do chamado carry trade. A Europa está borrada de medo com o que possa acontecer nos próximos dois anos em consequência do tsunami financeiro em curso.

Os Estados Unidos, único país que atacou (por duas vezes) um país com bombas atómicas, continua a investir milhares de milhões de dólares na sofisticação do seu arsenal nuclear, provocando assim a actual intensificação da corrida aos armamentos em todo o mundo, seja no sector das armas convencionais, das armas proibidas (nucleares, química e biológica), ou ainda do explosivo sector da guerra electrónica. Pela natureza do seu actual modelo económico especulativo e consumista, assente na expansão infinita de uma dívida que depois exporta para o resto do planeta, assim como pela ilusão imperial em que ainda vive, esta gigantesca e rica democracia tem vindo a transformar-se no mais perigoso perturbador da paz mundial. É um tigre ferido, e como tal muito perigoso. Precisa de ajuda e teremos que ajudá-la. Os tempos difíceis que aí vêm convidam, como nunca, à humildade, à inteligência e à cooperação.


OAM 290 06-12-2007, 01:54

sábado, dezembro 01, 2007

America

O re-despertar de uma nação



The Select Committee on Energy Independence and Global Warming holds a hearing, "Youth Leadership on Climate Change." The hearing coincides with Power Shift 2007. Katelyn McCormick of Students Promoting Environmental Students gives opening testimony.

Enquanto os imbecis da nomenclatura política portuguesa (todos os partidos com assento parlamentar e os seus órgãos de propaganda desmiolada ou cínica) se entretêm com invariáveis e ridículos jogos retóricos em volta do pedaço que abocanham à mesa do orçamento, desviando a nossa atenção do que é decisivo, para focar a nossa curiosidade no que é acessório e anestésico, falando sempre do alto da sua ignorância, preguiça e estupidez, eis um contraponto notável de imaginação, vontade e estratégia.

O vigor da democracia americana continua a impressionar-me, apesar de todos os assassinos.

OAM 285 01-12-2007, 00:40