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terça-feira, abril 04, 2017

Democracia online?


Falta uma alternativa às democracias populistas dominantes


A democracia online e os referendos deparam-se com alguns problemas. Se as perguntas não forem meticulosamente discretas, enquadradas e oportunas, correm-se riscos sérios de obter resultados absurdos ou indesejáveis. O Brexit que o diga!

A democracia deliberativa é uma coisa diferente, e uma alternativa lógica possível, procurando escapar às armadilhas populistas das chamadas democracias direta e referendárias, sem deixar de promover uma relação mais verdadeira e racional entre decisores e decisões. No fundo, precisamos de desenhar uma democracia simultaneamente cognitiva e inclusiva, em vez de deixarmos os regimes atuais apodrecerem sob o império da prepotência cesarista crescente, das burocracias partidárias e tecnocráticas, ou do populismo.

O artigo de Vinay Menon no The Star (1) sobre os acidentes que hoje ocorrem no marketing viral é um bom começo de reflexão.
Shall we ruin everything? Let’s put it to an online vote: Menon 
Asking the public to help name something is asking for trouble. 
Didn’t this lesson sail into clear view after theBoaty McBoatface imbroglio? Or five years ago, when Mountain Dew solicited names for a new apple-flavoured drink? That campaign, “Dub the Dew,” was hastily aborted when the company suddenly realized it might be forced to sell a beverage dubbed “Hitler Did Nothing Wrong.” 
— in The Star. By VINAY MENON
Sun., April 2, 2017

NOTA
  1. Devo esta leitura ao Pedro dos Reis. 

quinta-feira, abril 25, 2013

O que diz Cavaco

A sombra azul de Soares.

Esquerda Cómoda, à rasca

Para além da algazarra monocórdica do costume, o que importa realçar é a descolagem de Belém do golpe de estado populista que Mário Soares, o PCP e o Bloco, em sintonia com a maioria das corporações, oligopólios e rendeiros do regime (da banca ao setor energético), que vivem todos, sem exceção, do orçamento do Estado (e da miséria crescente de milhões de portugueses), imaginaram ser possível levar a cabo ainda antes das eleições autárquicas.

Curiosamente, esta evolução dos acontecimentos, para muitos inesperada, veio criar condições ímpares para a consolidação da direção socialista de António José Seguro — e para o grande dilema que agora enfrentam as tropas de José Sócrates e o Bloco.

Ao PS de Seguro interessa cada vez mais deixar a coligação fazer o trabalho sujo que tem que ser feito, de uma maneira ou doutra, sofrendo todo o ónus da destruição de poupanças, de empregos e de contratos sociais insustentáveis formalmente celebrados ao longo de três décadas de prosperidade ilusória e de consolidação de um neocorporativismo institucional sem precedentes.

Não há saída para o buraco negro do endividamento (1) cavado por décadas de populismo, ganância corporativa e partidocracia, que não passe por uma redução do peso paquidérmico do Estado, pela libertação fiscal da sociedade e pelo fim da canga partidária sobre a vida económica, institucional e cultural dos portugueses.

Há, sim, Estado a mais. Há, sim, partidos a mais nas nossas vidas (2). Há, sim, uma oligarquia económico-financeira e polipartidária que vive criminosamente à custa do esmagamento da criatividade social, empresarial e cultural dos portugueses. Há, sim, um regime em fim de vida que é preciso substituir por uma democracia transparente, responsável e justa.

Post scriptum

Os opinocratas de serviço exibiram ontem a sua indignação perante o discurso do Presidente. Criticaram-no por dinamitar as pontes com os partidos da esquerda cómoda. Mas não criticaram o golpe de estado palaciano que esteve em curso contra a maioria governamental; mas não criticaram o cerco de rua montado pelo PCP e pela Intersindical ao Presidente da República, aos ministros em funções e ao próprio parlamento!

Cavaco, que chegou a confundir-se com a fronda neocorporativa e populista anti-Troika, cedo percebeu que a maré iria virar depois do alívio vindo de Bruxelas e de Frankfurt na sequência do fiasco de Chipre e da deterioração da situação em França e na Holanda. Cedo percebeu que o regresso de Sócrates, depois dos dois ataques virulentos que este desferiu contra o seu comportamento e carácter, mudara as circunstâncias. Uma coisa seria a queda de Passos Coelho, estando Seguro à frente do PS, outra muito diferente seria provocar a queda do governo de coligação sabendo que está em curso uma guerra civil dentro do PS, onde Almeida Santos, Mário Soares, Manuel Alegre e José Sócrates são aliados! Aníbal Cavaco Silva, seja pelo seu apurado instinto de sobrevivência, ou porque Durão Barroso lhe explicou a situação, deu meia volta, anunciou o fim da telenovela das eleições antecipadas, foi premiado com a nomeação de um apoiante seu para o governo —Miguel Poiares Maduro (pdf)— e depois, como mandam os manuais, perseguiu o inimigo! Só mesmo os cagarros da nossa indigente imprensa não perceberam, ou não querem perceber.

Noticias ao Minuto - O controverso discurso de Cavaco

O chefe de Estado apelou aos partidos para que definam as suas estratégias além dos calendários eleitorais, dizendo ser “uma ilusão pensar que as exigências de rigor orçamental irão desaparecer no fim do programa de ajustamento, em meados de 2014" e alertando que, se persistir uma visão imediatista, “de nada valerá ganhar ou perder eleições, de nada valerá integrar o Governo ou estar na oposição".

"É essencial alcançar um consenso político alargado que garanta que, quaisquer que sejam as concepções político-ideológicas, quaisquer que sejam os partidos que se encontrem no Governo, o país, depois de encerrado o actual ciclo do programa de ajustamento, adoptará políticas compatíveis com as regras fixadas no Tratado Orçamental que Portugal subscreveu", defendeu, num discurso que foi sendo pontuado por vários apartes das bancadas da oposição.

Cavaco defendeu ainda existir hoje uma “fadiga de austeridade” no país – mas pedindo que não se explore a ansiedade e inquietação dos cidadãos -, pediu que o desemprego seja uma “prioridade da acção governativa” e destacou, apesar das “consequências gravosas” do programa de assistência financeira, os objectivos alcançados e o sentido de responsabilidade revelado pelos portugueses.
Jornal de Negócios - Seguro prudente...

O secretário-geral socialista, António José Seguro, afirmou hoje que, durante o congresso do PS, haverá bastantes oportunidades para discutir "as consequências políticas" do discurso do Presidente da República na sessão solene do 25 de Abril.

[...] Perante a insistência nesta questão, o líder do PS apenas acrescentou que compreendia o interesse da comunicação social.

"Mas também compreendem que na sexta-feira, quando se iniciar o congresso, no sábado durante os trabalhos do congresso e no domingo, terei várias oportunidades de intervir e pode ter a certeza satisfarei a curiosidade", afirmou.

NOTAS

A lei geral é esta, o resto é demagogia de piratas.
  1. Não há regra sem exceção, mas regra é regra: quanto mais deves (acima de um certo patamar) menos cresces:. A propósito: “It’s A Bit Early To Declare A Winner In The Economic Debate” — Written by Lance Roberts | Thursday, April 25, 2013. Streettalk Live.
  2. Não é que sejam muitos, mas interferem demasiado nas nossas vidas e na vida da economia.

Última atualização: 26 abr 2013, 12:27 WET

terça-feira, março 12, 2013

Indignados, sim, mas organizados!


Manifesto pela Democratização do Regime

A tragédia social, económica e financeira a que vários governos conduziram Portugal interpela a consciência dos portugueses no sentido de porem em causa os partidos políticos que, nos últimos vinte anos, criaram uma classe que governa o País sem grandeza, sem ética e sem sentido de Estado, dificultando a participação democrática dos cidadãos e impedindo que o sistema político permita o aparecimento de verdadeiras alternativas.

Neste quadro, a rotação no poder não tem servido os interesses do Povo. Ela serve sobretudo para esconder a realidade, desperdiçando a força anímica e a capacidade de trabalho dos portugueses, bem como as diversas oportunidades de desenvolvimento que o País tem tido, como aconteceu com muitos dos apoios recebidos da União Europeia.

A obsessão do poder pelo poder, a inexperiência governativa e a impreparação das juventudes partidárias que, com inusitada facilidade e sem experiência profissional ou percurso cívico, chegam ao topo do poder político, servem essencialmente objectivos e interesses restritos, nacionais e internacionais, daqueles que utilizam o Estado para os seus próprios fins.

O factor trabalho e a prosperidade das pessoas e das famílias, base do progresso da Nação, são constantemente postos em causa pela austeridade sem desígnio e pelos sacrifícios impostos aos trabalhadores, como se fossem eles, e não os dirigentes, os responsáveis pelo desgoverno do Estado e pelo endividamento excessivo a que sucessivos governos conduziram Portugal.

Como se isso não bastasse, o poder político enveredou pela afronta de culpar os portugueses, procurando constantemente dividi-los: os mais novos contra os mais velhos, os empregados contra os desempregados, os funcionários públicos contra os trabalhadores do sector privado.

A Assembleia da República, sede da democracia, desacreditou-se, com os deputados a serem escolhidos, não pelos eleitores, mas pelas direcções partidárias, que colocam muitas vezes os seus próprios interesses acima dos interesses da Nação. A Assembleia da República representa hoje sobretudo – com honrosas excepções – um emprego garantido, conseguido por anos de subserviência às direcções partidárias e de onde desapareceu a vontade de ajuizar e de controlar os actos dos governos.

A Nação portuguesa encontra-se em desespero e sob vigilância internacional. Governos sem ideias, sem convicções, sem sabedoria nem estratégia para o progresso do País, colocaram os portugueses numa situação de falência, sem esperança, rumo ou confiança.  O Estado Social está a desmoronar-se, mais do que a racionalizar-se, deixando em angústia crescente centenas de milhares de desempregados e de novos pobres.

E não é apenas o presente que está em desagregação. É simultaneamente o futuro de dezenas de milhares de jovens sem emprego ou com salários que não permitem lançar um projecto de vida.

Só por incompetência partidária e governativa se pode afirmar que os portugueses têm vivido acima das suas posses —como se as posses de milhões de famílias que recebem menos de mil euros por mês fosse o problema— ou que não existem alternativas aos sacrifícios exagerados impostos aos mais pobres e à classe média.

É urgente mudar Portugal, dando conteúdo positivo à revolta e à crescente indignação dos portugueses. As grandes manifestações já realizadas mostraram de forma inequívoca o que milhões de portugueses pensam do sistema político e da nomenclatura governativa. Há uma diferença dramática entre os políticos que pensam na próxima geração e os que pensam sobretudo na próxima eleição. A sociedade portuguesa tem naturalmente respeito pelas figuras políticas e pelos partidos que foram determinantes no regresso do País a um Estado de Direito Democrático. E pelos políticos que, com visão, souberam recolocar Portugal na Europa.

O que está hoje em causa já não é a opção pela democracia, mas torná-la efectiva e participada. Já não está em causa aderir à Europa, mas participar no relançamento do projecto europeu. Não está em causa governar, mas corrigir um rumo que nos conduziu à actual crise e realizar as mudanças que isso implica.

Todavia, nada será possível sem um processo de reformas profundas no Estado e na economia, reformas cujos obstáculos estão, em primeiro lugar, nos interesses de uma classe política instalada e na promiscuidade entre o poder político e os interesses financeiros. Impõe-se uma ruptura, que a nosso ver passa por três passos fundamentais:

— Em primeiro lugar, por leis eleitorais transparentes e democráticas que viabilizem eleições primárias abertas aos cidadãos na escolha dos candidatos a todos os cargos políticos;

— Em segundo lugar, pela abertura da possibilidade de apresentação de listas nominais, de cidadãos, em eleições para a Assembleia da República. Igualmente, tornando obrigatório o voto nominal nas listas partidárias;

— Em terceiro lugar, é fundamental garantir a igualdade de condições no financiamento das campanhas eleitorais. O actual sistema assegura, através de fundos públicos, um financiamento das campanhas eleitorais que contribui para a promoção de políticos incompetentes e a consequente perpetuação do sistema.

Esta ruptura visa um objectivo nacional, que todos os sectores da sociedade podem e devem apoiar. Alterar o sistema político elimina o pior dos males que afecta a democracia portuguesa. Se há matéria que justifica a união de todos os portugueses, dando conteúdo às manifestações de indignação que têm reclamado a mudança, é precisamente a democratização do sistema político.

É urgente reivindicar este objectivo nacional com firmeza, exigindo de todos os partidos a legislação necessária. Queremos que eles assumam este dever patriótico e tenham a coragem de —para o efeito— se entenderem. Ou então que submetam a Referendo Nacional estas reformas que propomos e que não queiram assumir. Os portugueses saberão entender o desafio e pronunciar-se responsavelmente.

Entretanto, os signatários comprometem-se a lançar um movimento, aberto a todas as correntes de opinião, que terá como objectivo fazer aprovar no Parlamento novas leis eleitorais e do financiamento das campanhas eleitorais.

A Pátria Portuguesa corre perigo. É urgente dar conteúdo político e democrático ao sentimento de revolta dos portugueses. A solução passa obrigatoriamente pelo fim da concentração de todo o poder político nos partidos e na reconstrução de um regime verdadeiramente democrático.


NOTA (22 mar 2013)

Estive em dado momento envolvido nas conversas que viriam a dar lugar ao Manifesto pela Democratização do Regime. Contribuiu para a sua redação, embora questionasse sempre alguma terminologia suscetível de convocar demónios populistas com que não me identifico. O que se seguiu ao anúncio público prematuro do Manifesto levou-me entretanto a desligar-me do processo. O blogue e a página Facebook que entretanto publicara em apoio ao manifesto perderam assim justificação, tendo por isso sido retiradas. Publico, e para memória futura, cópia do email enviado à lista de subscritores.

Caio fora :(
Caros concidadãos,

Desde que o Manifesto foi publicado tive ocasião de acompanhar mais de perto o que se está a passar. E francamente não gosto :(

Não se pode exigir mais democracia, mais representatividade, e mais transparência, e demonstrar ao mesmo tempo, por enquanto pela calada, um tão inacreditável desejo de controlo centralista do que não passa de uma mão cheia de nada.

Desvinculo-me assim, hoje mesmo, do Manifesto.

Este blogue e a página associada no Facebook ficarão no éter como testemunhos da minha passagem por mais uma ilusão momentânea, mas deixarão ambos de aceitar publicações.

Saudações democráticas,

António Cerveira Pinto

terça-feira, fevereiro 26, 2013

Itália—o partido mais votado

Beppe Grillo, um comediante pela cidadania e pela política honesta

O centro (corrupto) morreu. Por uma democracia forte!

O MoVimento 5 *****, liderado por Beppe Grillo foi o partido mais votado nas eleições legislativas italianas do passado fim-de-semana: 25.6%, 8.689.168 votos. Curiosamente a indigente imprensa que temos omitiu o facto!

De ora em diante a Europa começará a polarizar-se rapidamente... mas não entre os partidos populistas convencionais, que serão cada vez mais odiados por todos, pois esconderam da população, ao longo das últimas décadas, o colapso económico, laboral e social dos diversos países europeus.

Depois da Itália, seguir-se-ão o Reino Unido e a França. Apertem os cintos e organizem-se, a começar por assembleias de bairro convocadas via Facebook e desenvolvidas via Meetup (ou plataformas similares), onde todos os participantes deverão fazer declaração de interesses (empregados/desempregados; patrões/assalariados; confissão religiosa/ou não, filiação partidária/ou não), instituindo assim o máximo de transparência por forma a evitar a cooptação das assembleias por organizações partidárias, corporativas e/ou religiosas, em nome de uma cidadania democrática forte como única instância determinante da reflexão e da ação.

O movimento Que Se Lixe a Troika deixou-se infiltrar e cooptar pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda, pelo que se transformou num falso movimento cívico, sem ideias (apenas maniqueísmo) e sem autonomia. Não será por aqui que encontraremos uma alternativa ao apodrecido e totalmente corrompido sistema partidário português.

Chamo a vossa atenção para ordem das prioridades do programa do MoVimento***** — Estado e cidadania; Energia; Informação; Economia; Transportes; Saúde, Instrução. Não poderia ser mais inovadora, oportuna e alternativa às agendas cansadas, retóricas, corrompidas e invariavelmente populistas das falhadas partidocracias das falidas democracias europeias. O preâmbulo do programa diz o seguinte:
A atual organização do Estado é burocrática, sobre dimensionada, cara, ineficiente. O Parlamento já não representa os cidadãos, que não podem escolher os candidatos, mas apenas os símbolos dos partidos. A Constituição não é aplicada. Os partidos substituíram-se à vontade popular e subtraíram-se ao seu controle e julgamento. (1)



O Seguro quer crescimento e o resto do regime não fala doutra coisa. E diz que vai trazê-lo de volta ao país, e que com este crescimento vai reinstaurar a esperança, a liberdade (de não ser escravizado pelo fascismo fiscal em curso, suponho), o pão (que só o trabalho deveria dar), a paz (que nem já os sindicatos populistas conseguem segurar) e a habitação (que os bancos estão a roubar descaradamente nas barbas de uma classe política acomodada, cobarde e indigente).

Isto, sim, é puro populismo, e conversa fiada de quem não prestou pela falência do país.

Precisamos de uma nova agenda de conteúdos, meus senhores.

Portugal vai decrescer daqui em diante a um ritmo médio de 2% ao ano (na melhor das hipóteses!)

Que fazer, então?

Há neste momento reflexões dispersas sobre a necessidade urgente de substituir o insolvente regime instalado, por outro, genuíno, transparente, responsável e fiável. As que O António Maria tem desenvolvido a este propósito estão condensadas num outro blogue, a que chamei Novo Partido Democrata. O momento chegou, porém, de agir e fazer convergir as ideias para um movimento de cidadania alargado.

NOTAS
  1. Se alguém quiser fazer o favor de traduzir para português este programa prestaria certamente um bom contributo para a discussão em curso no nosso país sobre uma crise em quase tudo muito semelhante.

domingo, dezembro 09, 2012

Democracia incompleta

Atenas: o estaleiro da democracia

A democracia é uma obra aberta; compete aos democratas aperfeiçoá-la

Durante 5 dias foi perguntado, na Blogosfera e no Facebook, se pode haver uma democracia com menos presença e com menos influência partidárias. A resposta foi inequívoca: SIM (87%)

Pois então vamos a isso!