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sexta-feira, setembro 06, 2019

Um filme gore sobre o estado social


Vale a pena ver ou rever este extraordinário filme de Ken Loach sobre a degradação do estado social no Reino Unido, porque vale exatamente na mesma medida, ou em pior medida ainda, para o nosso país, tomado de assalto por uma cleptocracia sem escrúpulos, servida por uma burocracia de zombies.

Ao atrasar escandalosamente o início do pagamento das pensões devidas, de reforma, invalidez ou viuvez, os governos que temos tido, e em particular o atual governo 'socialista' e a geringonça oportunista que manda no país, estão, na realidade, a promover retenções orçamentais dissimuladas, anti-constitucionais e sobretudo criminosas!

Os motivos são simples e claros:

1. O Estado partidário que temos mexe discricionariamente no dinheiro que não é seu;
2. Não paga juros pelos atrasos que são de sua exclusiva responsabilidade;
3. Sabe, e portanto induz conscientemente, a morbidez num setor social naturalmente mais suscetível à ansiedade;
4. Humilha e rouba, em suma, os cidadãos ao fim de uma vida de trabalho.

Um regime destes não merece o nosso respeito. Pelo contrário, merece uma justa revolta.


sábado, julho 08, 2017

A "nova filosofia" e a tragédia de Pedrógão Grande

Ao que parece, as antenas dos WT portáteis, que faltaram, custam 15 euso!

Walkie Talkies do SIRESP, sem antenas adequadas, agravaram caos, incompetência e tragédia


Enquanto o primeiro ministro continua fugido numa qualquer praia espanhola, e os pândegos parlamentares se divertem com mais comissões da treta e guerrilha retórica, o balanço público da tragédia de Pedrógão Grande continua a fazer-se, sendo cada vez mais evidentes as responsabilidades do Bloco Central, mas sobretudo do atual governo, e em particular de António Costa, em tudo o que de sórdido e mau tem ocorrido no país, nomeadamente por causa da austeridade de esquerda arquitetada pela Geringonça, mas mais ainda pelos efeitos nefastos do assalto que a turma de António Costa tem promovido por esse aparelho de estado acima, e abaixo!

Ficou provado que o incêndio de Pedrógão Grande não foi o resultado de um raio de Lúcifer, como um solícito boy da Judiciária começou por querer fazer crer à populaça pregada aos televisores.

Ficou provado que não há nenhuma prova meteorológica da ocorrência de um down burst.

Ficou provado que bombeiros e a dita proteção civil foram avisados atempadamente pelo IPMA sobre as condições atmosféricas adversas que se aproximavam da zona onde ocorreu a tragédia de Pedrógão Grande

Ficou provado que os bombeiros e em primeiro lugar a proteção Civil falharam clamorosamente na fase inicial e crucial do incêndio.

Ficou provado que ninguém encerrou ou mandou encerrar a EN236-I antes de nela terem morrido 33 (ou 47?) pessoas, vítimas da fornalha em que a mesma se transformou à medida que os pinheiros plantados ao longo das suas bermas começaram a arder em força. A EN236-I foi encerrada, por conseguinte, por volta das 22:15, segundo respondeu António Costa ao PP.

Ficou provado que os sistemas de comunicações do SIRESP, ao serviço da dita Autoridade Nacional de Proteção Civil, falharam clamorosamente, desde logo porque os bombeiros andavam como baratas tontas munidos de walkie-talkies com antenas urbanas, em vez de antenas adequadas, mais compridas, como recomenda a Motorola: “optimize and maximize range, the antenna must be as high up as possible.” Estas antenas custam 15 euros cada!

Ficou provado que o comandante operacional da dita Autoridade Nacional de Proteção Civil e o presidente da mesma confraria partidária estiveram a milhas da ocorrência—não por algum tempo, mas todo o tempo!

Ficou provado que presidência da república e governo chegaram ao local da tragédia já noite adiantada, única e exclusivamente porque foram avisados das dezenas de mortes na EN 236-I.

Ficou patente que a ministra da administração interna e o seu secretário de estado, um boy e uma girl de António Costa, ficaram de plantão até ao rescaldo da tragédia por instruções de um primeiro ministro que, depois de despejar no éter mediático uma bateria de perguntas aos seus serviços, escovando assim e miseravelmente as suas próprias responsabilidades, batia em retirada para uma zona de conforto chamada Palma de Maiorca.

Ficou, por fim, evidente, que a presidência de Marcelo Rebelo de Sousa, pese embora as carícias da cor-de-rosa Eurosondagem, foi, essa sim, atingida por um downburst!

Quanto ao assalto promovido por António Costa ao aparelho de estado (mais de metade das chefias da Autoridade Nacional de Proteção Civil mudaram com a sua chegada ao poder), para o que foi e é imprescindível cumplicidade comprada aos comunistas do PCP e aos trotsquistas e maoistas do Bloco, devo confessar um erro de análise. Cheguei a pensar que eram gente séria, e sobretudo inteligente, que poderiam alterar o figurino da esquerda em Portugal, transformando a Geringonça num verdadeiro governo de esquerda simultaneamente desempoeirado e pragmático. Mas enganei-me. Num país falido e que perde soberania a cada dia que passa, esta gentinha faz-me cada vez mais lembrar os náufragos que dão às costas italiana e grega. E o pior é que estão a dividir criminosamente Portugal entre Lisboa e o resto do país. Exemplo: todos pagamos taxas para a RTP, mas as instalações do Monte da Virgem, no Porto, só servem para produzir informação quando a malta de Lisboa vai para os copos, ou ainda não acordou. De um lado estão burocratas, corruptos e outros privilegiados, do outro, uma manada bovina de zombies, gente atónita, e um crescente número de revoltados. Vai acabar por dar mau resultado.

O regime político corrupto e irresponsável que temos entrou numa espiral implosiva sem retorno.

É preciso pensar em alternativas.


PS: vale a pena ver estes quatro videos, ainda que a segunda parte do Sexta às 11, sob o pretexto (e a pressão?) do dito contraditório, tenha sido mais uma lamentável demonstração da indigência mediática instalada. Já Pedro Soares, embora denuncie e bem a existência de uma negociata, parece esquecer que o Siresp não é uma empresa privada, mas uma PPP. E portanto, o problema não se resolve nacionalizando do Siresp, mas denunciando o contrato por manifesto incumprimento, e só depois deverá haver lugar à discussão sobre se o Siresp é melhor administrado por boys e girls do atual sistema partidário (não é, nem será), ou se deve, pura e simplesmente, ser contratado com a Altice, a NOS, ou a Vodafone. Colocando a discussão num plano meramente ideológico, como acabou por fazer, o Bloco evidencia, uma vez mais, a sua imaturidade política congénita.


RTP. Sexta às 9 (VI)
O que falhou na tragédia de Pedrógão Grande? | 07 Jul, 2017 | Episódio 22

TVI, 2017-07-06 21:05, Ana Leal
Governos conheciam fragilidades do SIRESP e nada fizeram

SIC-N, 23.06.2017 23h27
O relato do homem que deu o primeiro alerta do incêndio de Pedrógão Grande

ARTV Direto, 5/7/2017
Pedro Filipe Soares: “O SIRESP é uma negociata que tem fragilizado o país”

sábado, março 12, 2016

Mudança de regime?


Pior cego é o que não quer ver


Uma mudança de regime, que afirmo estar em curso em Portugal e em vários outros países, não se refere apenas à mudança das regras formais, algumas das quais, aliás, têm vindo a sofrer metamorfoses rápidas em Portugal —revisões constitucionais, incorporação de tratados europeus e novos tratados internacionais, alterações profundas na legislação laboral e fiscal, etc.—, mas também nos costumes, maneiras e consensos éticos e culturais da comunidade —por exemplo, a nova intolerância moral relativamente à corrupção, a defesa em lei dos direitos sexuais e das minorias em geral, o novo holismo social manifesto na defesa dos direitos dos animais e da Natureza, mas também de novidades no contrato social como as que estão germinando em volta do chamado RBI: rendimento básico incondicional, etc. Como afirmava Aristóteles (Livros III e IV da República) é esta textura que forma a identidade única dos povos e das suas cidades e define verdadeiramente um regime.

Referência: Open Yale

segunda-feira, novembro 02, 2015

Salazarismo de esquerda, não!

Francisco Assis por Ricardo Castelo/ N Factos - Público

Saúdo a iniciativa de Francisco Assis!


“Alternativa” de Assis é para “o próximo Congresso” do PS. 
Público, Nuno Sá Lourenço 02/11/2015 - 07:35  
O próximo Congresso socialista – anunciado pelo actual líder para depois das presidenciais – vai ser de confrontação. Quem o confirma são os dirigentes socialistas que vão participar no encontro anunciado pelo eurodeputado Francisco Assis, que é visto como o primeiro passo para uma candidatura à liderança no PS.  
João Proença, ex-secretário-geral da UGT e ex-membro da direcção de António José Seguro, confirmou a sua presença no encontro que deverá realizar-se até ao próximo fim-de-semana e explica o objectivo. “É fundamental preparar um alternativa para o próximo Congresso”, disse ao PÚBLICO antes de acrescentar que via o eurodeputado como o “melhor colocado” para desafiar António Costa.

Tal como antecipámos, Assis será o próximo SG do PS, e é bem possível que António Costa abandone o partido que está a tentar perverter levando atrás de si alguns fiéis. Será este o verdadeiro objetivo de Francisco Louçã? Pelo menos, é coerente com o que sempre defendeu na LCI (de que aliás fui líder, em 1975...), no PSR, e no seu renovado período de clandestinidade—desde que ajudou a criar o saco de gatos chamado Bloco de Esquerda.

Este é mais um sinal para o PR manter o governo recém-nomeado. O Salazarismo de Esquerda para que o derrotado Costa, e a gritaria que vai dentro do PCP e do Bloco estão a tentar levar o país, que assuma a responsabilidade de reconduzir o país a um novo resgate—bloqueando, como promete, a ação do governo empossado.

Aliás, o cerco da Assembleia da República no dia da votação da(s) moção(ões) de censura, já anunciado pela CGTP sob o lema “Mudança da maioria, implica mudança de política!” (ler comunicado da central sindical do PCP), certamente para exigir também a célebre Unicidade Sindical, está aí para o provar.

O Bloco, por sua vez, nunca esteve tão ansioso por andar à garupa de um partido 'socialista-liberal' (a designação é um update da autoria dos trotskistas franceses, de que o Bloco de Esquerda é uma filial dissimulada).

Se não houver gente com juízo no PS, António Costa e a sua Fronda desesperada lançarão um anátema sobre toda a esquerda liberal e democrática, a qual poderá durar décadas a sarar.

Se nem o país continental que é a Rússia, mesmo criando um império (a URSS e os países da Internacional Comunista), conseguiu levar a cabo a teoria peregrina do 'socialismo num só país' (de que Karl Marx nunca ouviu falar e que certamente destruiria num ápice), que destino teria um Portugal, já sem império colonial, fora do euro, fora da União Europeia, fora da NATO, em suma, levitando no éter podre dos vários revisionismo oportunistas do marxismo, conduzido pelo imprestável Costa, pela ávida Catarina e pelos quadrados estalinistas do PCP?

Não creio que venhamos a precisar de conhecer esta Caixa de Pandora.


ÚLTIMA HORA

Assis convoca opositores de Costa para encontro no sábado 
Público, Margarida Gomes 02/11/2015 - 23:09 
Eurodeputado considera “impensável” e “erro histórico” acordo com PCP e BE, mas diz que não vai apelar aos deputados para desrespeitarem a disciplina de voto. 
“Metade do eleitorado socialista está assustado com a deriva que o partido está a seguir e isto que nós estamos a fazer comparado com o que os apoiantes do actual secretário-geral fizeram à anterior direcção não é nada”, afirma fonte socialista, agitando com o risco de o PS guinar completamente à esquerda. “O partido corre o risco da ‘pasokização’ e ‘syrização’. Há aqui uma deriva à esquerda e isso é muito perigoso”, adverte a mesma fonte, considerando que o partido “deve ter uma reserva, evitando pôr as fichas todas em António Costa” numa próxima disputa da liderança.

Atualização: 2-11-2015 23:19

domingo, novembro 23, 2014

Este regime acabou



Sem uma terceira força parlamentar a gangrena continuará a crescer


Este regime, na realidade, já morreu. Falta tão só abrir os caixões e preparar o funeral. Serão as próximas eleições o momento certo do enterro, ou por urgência de higiene pública é forçoso acelerar os preparativos?

Esta deve ser a pergunta que Cavaco Silva, neste momento, faz a si próprio:
—se quero um novo Bloco Central (Passos Coelho-António Costa) para me salvar e salvar a honra do convento, então esta prisão do Sócrates veio atrapalhar tudo e quase todos. Antecipar eleições nestas circunstâncias poderia originar uma dinâmica explosiva de tumultos urbanos, dando por esta via razão aos milhões de portugueses que deixaram de votar no regime, mas que poderão estar disponíveis para eleger uma espécie de Podemos lusitano, o qual, na ocorrência, só poderá chamar-se António Marinho e Pinto e Partido Democrático Republicano (1);
— se, por outro lado, decido manter a data prevista das próximas Legislativas, dando cumprimento ao que diz a Constituição e as leis aplicáveis, não sei quem estará ainda de pé e livre para disputar as próximas eleições. O mais provável é que tanto o PSD, como o PS, já para não falar do PCP e do Bloco, percam no conjunto mais de um milhão de votos, e que o mar de abstenção se transforme num maremoto capaz de varrer de vez este regime. A menos que... apareça mesmo uma terceira força parlamentar com dimensão e jeito para compor o brinquedo da democracia num país a que escasseiam cada vez mais recursos económicos, financeiros e sobretudo morais para a manter.

O processo judicial abertamente escancarado com a prisão do ex-primeiro ministro José Sócrates, num país clubista, indigente, mal formado, corporativo e corrupto como o nosso é, ainda por cima falido, isto é, sem possibilidades objetivas de continuar a alimentar uma mole imensa de criaturas que nada produz e há décadas vive da redistribuição burocrática e partidária da riqueza confiscada a quem trabalha ou simplesmente juntou alguma poupança, ou que tem sido emprestada por credores externos, corre o risco sério de precipitar um súbito colapso do regime, em vez da sua metamorfose ordenada, na qual teriam que estar forçosamente previstas, por um lado, a substituição das gerações no poder político, económico e financeiro do país e, por outro, a alteração do xadrez parlamentar há muito acantonado entre a endogamia corrupta do Bloco Central (PS-PSD-CDS/PP) e a impotência sectária dos estalinistas e trotskistas que compõem o PCP e o dito Bloco de Esquerda.

Eu preferiria ver os movimentos da nova cidadania digital amadurecerem ao ponto de serem capazes de precipitar a criação de um novo Partido Democrata, lúcido, criativo, ponderado e decidido a mudar de alto a baixo a nossa democracia, preservando e aprofundando o seu legado positivo —a liberdade, a democracia e o estado de direito—, mas avançando rapidamente para um regime mais participativo, transparente e responsável.

Haverá tempo para uma reestruturação ordenada do regime?

O perigo de nos estamparmos numa curva apertada, que pode ser o modo como o caso de polícia com o antigo PM for conduzido, ou a crise instalada no Partido Socialista, ou as próximas Legislativas, é real.

A gangrena que atinge a nomenclatura do regime, a corja de rendeiros e devoristas que o conduziram à pré-bancarrota, é incurável. Só mesmo uma terceira força, que queremos mais democrática e transparente, poderá reconduzir as águas revoltas da nossa democracia a uma nova tranquilidade. Isto, claro, se os monstros corporativos da direita, que não deixaram de povoar o imaginário lusitano, não voltarem a despertar, uma vez mais, em desespero de causa.


POST SCRIPTUM

António Marinho e Pinto perdeu uma boa oportunidade para estar calado quando se pronunciou sobre a detenção de José Sócrates, arremetendo, como se ainda fosse Bastonário, contra Procuradores e Juízes. Quem decide, afinal, se os magistrados podem ou não ser 'humilhados' como José Sócrates? Não são os magistrados, pois não?

NOTAS
  1. Um partido em fase de legalização que tem sido reprimido pela imprensa indigente e desmiolada que temos, bem como pela corrupta indústria das sondagens que por aí anda e mente estatisticamente.

Atualização: 24 nov 2014, 20:56 WET

sexta-feira, junho 27, 2014

BES convoca Conselho de Estado


Sistema partidário sem banca: o fim de um regime e o começo de outro


Tudo começou a rolar muito depressa no dia 22 de maio último, quando a Reuters divulgou que o Luxemburgo começara a investigar irregularidades graves do Grupo Espírito Santo (GES) numa das suas empresas no Luxemburgo, detetadas numa auditoria da KPMG realizada a pedido do Banco de Portugal e divulgada no dia 20 de maio passado.

Em causa estão irregularidades nas contas da Espírito Santo International, que foram detetadas numa auditoria realizada pela KPMG a pedido do Banco de Portugal, informação que foi divulgada na noite de terça-feira no prospeto de aumento de capital do Banco Espírito Santo. A ES International é uma holding de topo na estrutura do império Espírito Santo, que concentra as participações na área financeira (o BES) e na área não financeira (a Rio Forte) — Expresso, 22.05.2014
(Reuters, 27-06-2014) - Luxembourg justice authorities have launched an investigation into three holding companies of Portugal's Espirito Santo banking family, the biggest shareholder in Portugal's largest listed bank which bears their name, a spokesman for the authorities said on Friday.

The three companies - Espirito Santo International SA, Espirito Santo Control SA and Espirito Santo Financial Group SA - are all holding companies in a complicated, cascading ownership structure by the family.

Banco Espirito Santo (BES) warned last month of "material irregularities" at one of the companies, Espirito Santo International.

The spokesman for Luxembourg's justice authorities said the investigation was launched on May 22 over alleged breaches of company law. He declined to give any further details about the investigation.
Recorde-se, porém, que já em 29 de março deste ano o Expresso revelava que a auditoria do Banco de Portugal à ESI detetara insuficiências financeiras na ordem dos 2,5 mil milhões de euros.
Possível extinção da Bespar torna BES "opável"Expresso, 8:43 Sábado, 29 de março de 2014

A auditoria à ESI, com sede em Luxemburgo, revela que esta tem insuficiências financeiras que podem ascender a 2,5 mil milhões de euros. O relatório final da auditoria do Banco de Portugal encomendada à  KPMG será entregue a 1 de abril, apurou o Expresso. As conclusões desta poderão trazer novas exigências ao grupo.

A situação é hoje clara: o grupo financeiro Espírito Santo está numa clara situação de insolvência, e começou a ruir às claras diante de todo o mundo no dia em que Ricardo Salgado tentou sucessivamente e sem sucesso um financiamento de urgência, no valor de 2.500 milhões de euros, junto dos governos português e angolano.

A abébia que o Banco de Portugal lhe dera há cerca de um mês, autorizando um empréstimo do BES, no valor de 100 milhões de euros, ao insolvente Rio Forte, uma das holdings do GES, foi apenas uma tentativa desesperada de impedir que o dique GES desabasse em plena operação de aumento de capital do BES.

O dique, entretanto, cedeu depois de Maria Luís Albuquerque, Pedro Passos Coelho e José Eduardo dos Santos terem recusado atirar dinheiro para um buraco negro que, soube-se hoje por uma nota do BPI citada pela Reuters (ler notícia no Dinheiro Vivo), andará pelos 7.300 milhões de euros.

“...de acordo com fontes da imprensa, a ESI tem entre 2.000 e 2.500 milhões de euros de ‘book value’ negativo e a dívida total do GES está nos 7.300 milhões de euros”.

Para agravar este colapso irremediável soube-se ainda que a PT decidiu, sem consultar 90% dos seus acionistas, ajudar um dos seus sócios comprando 900 milhões de euros de papel comercial ao insolvente Rio Forte. Resultado: as ações do BES fecharam hoje a cair 11,43%, as do ESFG cairam 18,51%, as da Portugal Telecom, 5,64%, e o PSI20 1,65%.

Entretanto Cavaco Silva convocou ontem o Conselho de Estado para o dia 3 de julho. Até lá iremos assistir a uma verdadeira derrocada bolsista da Senhora Dona Branca Espírito Santo e Comercial de Lisboa


Apesar dos motivos oficialmente invocados, parece evidente que quem convocou de facto o Conselho de Estado foi o GES, ou melhor, a implosão acelerada do banqueiro do regime. Ninguém sabe que parte do BES poderá vir a ser engolida pela implosão do grupo. Ninguém sabe, aliás, muitas coisa, nomeadamente sobre os fundos de capitalização do grupo, sobre submarinos, herdades, aeroportos, campanhas eleitorais, e muito mais. Mas sabe-se, isso sim, que o sistema partidário indígena está neste momento em estado de choque, a começar pelo CDS, que tentou in extremis levar Pedro Passos Coelho a usar dinheiro da Troika, via CGD e BCP, para acudir à família Espírito Santo sem lhe exigir, como vem estabelecido nas regras da Troika, a abertura do baú das contas.

Como escrevemos a 20 de junho, o colapso do BES pode arrastar o regime para uma crise sem precedentes!

A promiscuidade entre alguns banqueiros indígenas e a partidocracia que capturou o regime foi a base de uma estabilidade democrática ilusória, sustentada por uma desastrosa alocação de recursos financeiros importados, pelo consequente processo de endividamento que nos levou até à pré-bancarrota, e pela corrupção pandémica do regime e do país.

No entanto, depois da implosão do BPN e do BPP, da redução a cêntimos do BCP e Banif, e do grande estouro em curso do BES-GES, a base oculta, mas até agora decisiva, do nosso sistema partidário e do nosso regime pseudo-constitucinal ruíu.

Os principais responsáveis políticos e financeiros da tragédia que se abateu sobre o país tentam ainda e desesperadamente agarrar-se aos destroços do navio Portugal, em nome dos vícios que não conseguem abandonar. Mas o mais provável é que tenham um dia destes que responder em tribunal pelo mal que fizeram.

Neste sentido, Pedro Passos Coelho e António José Seguro—e esperemos que António Guterres, ou até Rui Rio— são a porta estreita que se entreabre entre um passado que não consegue e sobretudo não pode voltar, e um futuro incerto, mas de rigor e esperança que falta e é urgente construir.

Quem nos trouxe até a este buraco merece a mão pesada da Justiça. Se a indígena por corrupta, se não servir, que venham os tribunais europeus recolocar este país nos carris!


PS: vale a pena ouvir o que disse José Gomes Ferreira na SIC sobre a crise no BES.

E ainda o que disse Ana Gomes sobre o BES-GES (Youtube):
Ana Gomes desanca o BES Caso BPN foi um sucesso, BES queria repetir a façanha.

No Conselho Superior da Antena 1 desta manhã, Ana Gomes diz compreender "o esforço de tantos comentadores, sabichões e economistas em tentar isolar e salvar do lamaçal o BES, o maior e um dos mais antigos bancos portugueses, que emprega muita gente e ninguém quer ver falido e nacionalizado, mas a verdade é que o GES está para o BES como a SLN para o BPN".
Segundo a eurodeputada socialista, o "banco foi e é instrumento da atividade criminosa do grupo". "Se o BES é demasiado grande para falir, ninguém, chame-se Salgado ou Espírito Santo, pode ser demasiado santo para não ir preso", sublinha.

"Nem os empregados do BES, nem as Donas Inércias, nem os Cristianos Ronaldos se safam se o Banco de Portugal, a CMVM, a PGR e o Governo continuarem a meter a cabeça na areia, não agindo contra o banqueiro Ricardo Salgado e seus acólitos, continuando a garantir impunidade à grande criminalidade financeira, e não só, à solta no Grupo Espírito Santo", alerta.

Ouvida pelo jornalista Luís Soares, Ana Gomes recorda como começaram a ser investigadas as contas do grupo e afirma que o líder do BES, Ricardo Salgado, dizia não querer financiamento do resgate "para não ter que abrir as contas do grupo à supervisão do Estado, esse Estado na mão de governantes tão atreitos a recorrer ao GES/BES para contratos ruinosos contra o próprio Estado".

Para além de acusar Ricardo Salgado de tentar "paralisar as tentativas de investigação judicial" em vários casos -- como o dos submarinos, Furacão ou Monte Branco --, Ana Gomes argumenta que a mudança das regras da supervisão bancária a nível europeu "obrigou o Banco de Portugal a analisar as contas do GES/BES a contragosto e com muito jeitinho".

A eurodeputada socialista critica a escolha da consultora PMG -- "uma empresa farta de ser condenada e multada nos Estados Unidos, no Reino Unido e noutros países por violação dos deveres de auditoria e outros crimes financeiros" e que "foi contratada pelo BES desde 2004, pelo menos, para lhe fazer auditoria" --, só que "a borrasca era tão grossa que nem a PMG se podia dar ao luxo de a encobrir".

Finalmente, mais estas três peças vídeo sobre o ainda maior banco privado português:
Octávio Teixeira analisa a situação no BES e a execução orçamental — SIC-N, 25/6/2014.
Editor de Economia da TVI explica importância do BES no sistema bancário português exibindo alguns gráficos sugestivos — Público/TVI, 20-06-2014

O fim da era Ricardo Salgado, cujo grupo deveu o seu rápido crescimento pós reprivatização à canalização de uma parte substancial dos fundos comunitários para as suas áreas de negócio, cortesia dos políticos que sempre soube trazer no bolso — Diário Económico, 20-06-2014

Última atualização: 29 jun 2014, 15:44

quinta-feira, abril 25, 2013

O que diz Cavaco

A sombra azul de Soares.

Esquerda Cómoda, à rasca

Para além da algazarra monocórdica do costume, o que importa realçar é a descolagem de Belém do golpe de estado populista que Mário Soares, o PCP e o Bloco, em sintonia com a maioria das corporações, oligopólios e rendeiros do regime (da banca ao setor energético), que vivem todos, sem exceção, do orçamento do Estado (e da miséria crescente de milhões de portugueses), imaginaram ser possível levar a cabo ainda antes das eleições autárquicas.

Curiosamente, esta evolução dos acontecimentos, para muitos inesperada, veio criar condições ímpares para a consolidação da direção socialista de António José Seguro — e para o grande dilema que agora enfrentam as tropas de José Sócrates e o Bloco.

Ao PS de Seguro interessa cada vez mais deixar a coligação fazer o trabalho sujo que tem que ser feito, de uma maneira ou doutra, sofrendo todo o ónus da destruição de poupanças, de empregos e de contratos sociais insustentáveis formalmente celebrados ao longo de três décadas de prosperidade ilusória e de consolidação de um neocorporativismo institucional sem precedentes.

Não há saída para o buraco negro do endividamento (1) cavado por décadas de populismo, ganância corporativa e partidocracia, que não passe por uma redução do peso paquidérmico do Estado, pela libertação fiscal da sociedade e pelo fim da canga partidária sobre a vida económica, institucional e cultural dos portugueses.

Há, sim, Estado a mais. Há, sim, partidos a mais nas nossas vidas (2). Há, sim, uma oligarquia económico-financeira e polipartidária que vive criminosamente à custa do esmagamento da criatividade social, empresarial e cultural dos portugueses. Há, sim, um regime em fim de vida que é preciso substituir por uma democracia transparente, responsável e justa.

Post scriptum

Os opinocratas de serviço exibiram ontem a sua indignação perante o discurso do Presidente. Criticaram-no por dinamitar as pontes com os partidos da esquerda cómoda. Mas não criticaram o golpe de estado palaciano que esteve em curso contra a maioria governamental; mas não criticaram o cerco de rua montado pelo PCP e pela Intersindical ao Presidente da República, aos ministros em funções e ao próprio parlamento!

Cavaco, que chegou a confundir-se com a fronda neocorporativa e populista anti-Troika, cedo percebeu que a maré iria virar depois do alívio vindo de Bruxelas e de Frankfurt na sequência do fiasco de Chipre e da deterioração da situação em França e na Holanda. Cedo percebeu que o regresso de Sócrates, depois dos dois ataques virulentos que este desferiu contra o seu comportamento e carácter, mudara as circunstâncias. Uma coisa seria a queda de Passos Coelho, estando Seguro à frente do PS, outra muito diferente seria provocar a queda do governo de coligação sabendo que está em curso uma guerra civil dentro do PS, onde Almeida Santos, Mário Soares, Manuel Alegre e José Sócrates são aliados! Aníbal Cavaco Silva, seja pelo seu apurado instinto de sobrevivência, ou porque Durão Barroso lhe explicou a situação, deu meia volta, anunciou o fim da telenovela das eleições antecipadas, foi premiado com a nomeação de um apoiante seu para o governo —Miguel Poiares Maduro (pdf)— e depois, como mandam os manuais, perseguiu o inimigo! Só mesmo os cagarros da nossa indigente imprensa não perceberam, ou não querem perceber.

Noticias ao Minuto - O controverso discurso de Cavaco

O chefe de Estado apelou aos partidos para que definam as suas estratégias além dos calendários eleitorais, dizendo ser “uma ilusão pensar que as exigências de rigor orçamental irão desaparecer no fim do programa de ajustamento, em meados de 2014" e alertando que, se persistir uma visão imediatista, “de nada valerá ganhar ou perder eleições, de nada valerá integrar o Governo ou estar na oposição".

"É essencial alcançar um consenso político alargado que garanta que, quaisquer que sejam as concepções político-ideológicas, quaisquer que sejam os partidos que se encontrem no Governo, o país, depois de encerrado o actual ciclo do programa de ajustamento, adoptará políticas compatíveis com as regras fixadas no Tratado Orçamental que Portugal subscreveu", defendeu, num discurso que foi sendo pontuado por vários apartes das bancadas da oposição.

Cavaco defendeu ainda existir hoje uma “fadiga de austeridade” no país – mas pedindo que não se explore a ansiedade e inquietação dos cidadãos -, pediu que o desemprego seja uma “prioridade da acção governativa” e destacou, apesar das “consequências gravosas” do programa de assistência financeira, os objectivos alcançados e o sentido de responsabilidade revelado pelos portugueses.
Jornal de Negócios - Seguro prudente...

O secretário-geral socialista, António José Seguro, afirmou hoje que, durante o congresso do PS, haverá bastantes oportunidades para discutir "as consequências políticas" do discurso do Presidente da República na sessão solene do 25 de Abril.

[...] Perante a insistência nesta questão, o líder do PS apenas acrescentou que compreendia o interesse da comunicação social.

"Mas também compreendem que na sexta-feira, quando se iniciar o congresso, no sábado durante os trabalhos do congresso e no domingo, terei várias oportunidades de intervir e pode ter a certeza satisfarei a curiosidade", afirmou.

NOTAS

A lei geral é esta, o resto é demagogia de piratas.
  1. Não há regra sem exceção, mas regra é regra: quanto mais deves (acima de um certo patamar) menos cresces:. A propósito: “It’s A Bit Early To Declare A Winner In The Economic Debate” — Written by Lance Roberts | Thursday, April 25, 2013. Streettalk Live.
  2. Não é que sejam muitos, mas interferem demasiado nas nossas vidas e na vida da economia.

Última atualização: 26 abr 2013, 12:27 WET

domingo, março 24, 2013

Manifesto, regime, democracia

Fonte: Mata e Valério, Banco de Portugal, AMECO, Santos Pereira "Como retomar o sucesso" (2011), OAM (2013)

Partidocracia ou democracia plena?

Foi publicado recentemente um manifesto pela democratização do regime. Causou alguma comichão nas sentinelas partidárias, apesar do seu alcance minimalista. Limita-se, o apressado texto que subscrevi, mas de que entretanto me afastei, a pedir mais responsabilização dos deputados eleitos, e mais transparência e equilíbrio nas regras de financiamento das campanhas eleitorais. Quase caiu o Carmo e a Trindade!

O acessório —certa terminologia patrioteira, na verdade escusada— deu o flanco aos empregados públicos da nossa democracia que, em vez de confrontarem o repto, se limitaram a gritar que a iniciativa é populista, como se coisa diferente fosse a democracia que temos. Populista, partidocrata e geneticamente condicionada pelo MFA (1) — quarenta anos depois da queda da ditadura!

Ou seja, a nossa democracia é populista e continua amarrada a uma Constituição doutrinária, partidocrata e bonapartista. Para episódio ilustrativo disto mesmo, basta analisar o folhetim Menezes-Seara-Cavaco a propósito da lei de limitação de mandatos autárquicos, e as reações do PCP, mais a recusa, por parte do parlamento, de esclarecer a lei que escreveu

Fonte: Álvaro Santos Pereira

Os gráficos sobre a evolução da nossa dívida pública e sobre o crescimento potencial do PIB ao longo dos últimos 100-150 anos, a que podemos juntar a evolução da dívida externa, do desemprego e da emigração, no mesmo período, permitem retirar uma conclusão elementar: não fora a nossa inserção na zona euro, e já teríamos um novo golpe militar, guerra civil ou revolução a caminho!

Mas se a zona euro implodir —já nem menciono outras situações, como a de uma eventual saída de Portugal da zona euro, ou mesmo o regresso da Alemanha ao marco— em que situação ficaremos? Tem razão Mário Soares em andar muito preocupado. Tem razão Loureiro dos Santos, ao evidenciar de forma tão viva a sua preocupação. Tem razão Adriano Moreira. Só os tontos, as crianças e os políticos desmiolados ignoram os perigos que espreitam a democracia portuguesa.

A crise económica e social onde caímos e de onde não sairemos nas próximas décadas, pois, na realidade, temos pela frente uma metamorfose radical que só agora começa a ser percebida, é, em primeiro lugar, uma crise sistémica do capitalismo, que por sua vez traduz o fim de uma era, por ser impossível continuar a satisfazer o crescimento da procura agregada mundial com recursos limitados, cujos picos de exploração ou fadiga estão a surgir em cadeia. Só depois, a crise em que estamos é uma crise portuguesa, ainda que esta sua faceta endógena se agrave dia a dia por efeito de uma decadência estrutural de origem histórica e institucional que coincide, na minha opinião, com a demorada morte do império, iniciada pela independência do Brasil.

Sem querermos perceber a causa das coisas é impossível enfrentar, quantos mais ultrapassar, os problemas. Talvez por isto mesmo os rendeiros, os devoristas e os burocratas dos sucessivos regimes que se seguiram ao declínio do império colonial —o nosso petróleo!— tenham preferido sempre regimes não democráticos, ou de democracia populista vigiada, como o que precisamente temos neste momento.

Se não soubermos nos tempos mais próximos impor uma alteração ao regime que temos e que continua a ser de exploração e rendas, sem criatividade, nem desejo de concorrência, o perigo de cairmos numa nova ditadura é real. Bastará um desacoplamento da carruagem Lusitânia do comboio Europa para que o que agora nos parece remoto, se torne iminente.

Até agora os Indignados têm vindo para a rua, ensaiando algumas das modalidades locais da luta não violenta ensinadas por Gene Sharp. Estas táticas foram desenhadas para derrubar ditaduras, o que não é o caso, por enquanto. E por isso falham, deixando atrás de si um sabor amargo de incompletude. Pior ainda, são capturadas pelas oportunistas, conservadoras e autoritárias burocracias do PCP e do Bloco.

Outro manifesto, por favor!

O regime, ao contrário do que pensa Rui Ramos, está mesmo bloqueado. Há uma ténue oportunidade de impedirmos que resvale em breve para o caos institucional, o colapso governativo e novas aventuras autoritárias, ainda que no início, eventualmente, com cores mais ou menos vermelhas.

O manifesto pela democratização do regime tem uma falha congénita: não coloca em cima da mesa a absoluta necessidade de constituir uma terceira força partidária parlamentar capaz de aumentar a sustentação a prazo do regime, e com força suficiente para introduzir alterações institucionais de fundo na nossa sociedade e na qualidade da nossa deformada democracia.

Precisamos de uma democracia mais direta, mais participativa, mais transparente, mais forte e mais justa — mas para aqui chegarmos, não há volta a dar, precisamos dum novo partido!


NOTAS
  1. Excelente entrevista que o “i” fez  este Sábado a Rui Ramos!

    O modelo esgotou-se?


    Até agora, não se esgotou. Em Junho de 2011, os partidos continuaram a dominar as eleições. Há uma grande agitação ao nível partidário, porque a classe política sofre do medo de ver surgir um novo Cavaco Silva. Em 85, depois da austeridade conduzida pelo Bloco Central, eis que alguém vai para o governo, apanha uma conjuntura diferente e fica no poder dez anos. Esse é o receio que existe agora. É essa a razão da agitação ao nível partidário, mas essa agitação não se repercute ao nível da formação de novos partidos ou movimentos de opinião. Aliás, o único partido que está com ares de fragmentação é o Bloco de Esquerda. Os outros estão no mesmo sítio. Nas sondagens, os inquiridos escolhem os mesmos partidos. As pessoas vão às manifestações, mas quem as organiza está ligado aos partidos.

    [...]

    A possibilidade legal de qualquer cidadão poder candidatar-se à Assembleia da República podia ajudar a credibilizar?

    Talvez. Mas em Itália, quando caiu o antigo sistema político, instalado há 20 anos, achou-se que se ia criar um sistema mais transparente e aberto, e o resultado foi Berlusconi e Beppe Grillo... O sistema político criado em 74/75 foi o da criação de estabilidade. Foi criado para dificultar maiorias de um só partido, para garantir que os partidos dominavam a sociedade civil e as direcções partidárias dominavam os partidos. Este sistema foi montado para disciplinar uma sociedade que julgou que não se conseguia disciplinar a si própria - que, se fôssemos devolvidos aos nossos interesses, expectativas e ambições, isto tornar-se-ia ingovernável. Era isto que nos explicava o dr. Salazar e mesmo os democratas acreditavam nele. Portanto, criaram um sistema que, podendo ser uma democracia, era ao mesmo tempo uma espécie de ditadura dos partidos: uma partidocracia. Acabar com isto é abrir tudo outra vez...

    [...]

    A queda do governo pode solucionar alguma coisa?

    Eu não estou a dizer que este governo deve ficar lá para sempre e que não há no país ministros melhores do que estes. O que digo é que a queda deste governo representaria, em primeiro lugar, a destruição de uma maioria que, neste momento, sustenta no parlamento um governo normal. A primeira dúvida era se seria possível refazê-la com outros componentes. Uma queda deste governo que não fosse pela auto-dissolução da maioria abria um precedente preocupante. Ficávamos a saber que, doravante, bastaria parecer que as coisas estavam a correr mal para cair um governo. Os riscos são muito grandes.

    in Entrevista Rui Ramos. “Mudar o governo não vai acabar com a crise” — i online.

domingo, março 17, 2013

Louçã, um falso Trotsky

León Trotsky (1879-1940)

Da Revolução que não passou de uma miragem intelectual pequeno-burguesa

Vista à distância de quase um século a Revolução Russa de 1917 pode hoje ser percebida, não como a realização de uma utopia socialista, que nunca foi, mas como o acerto forçado e violento dos relógios de um grande império medieval autocrático para a hora industrial.

Sem burguesia empreendedora digna desse nome, sem as liberdades burguesas essenciais à boa instrução liberal e ao desenvolvimento criativo das ciências e das tecnologias, ancorada profundamente em instituições extrativas seculares num território imenso, e movida sobretudo pela energia dos bois, das mulas, dos rios e das mãos e pernas de milhões de camponeses presos à terra, a Rússia dos czares, após sucessivas campanhas militares desastrosas a oriente e ocidente do seu território, acabaria por sucumbir à revolução bolchevique, liderada então por Lenine e Trotsky, entre outros. Como um dia Lenine proclamou, o Comunismo é o resultado da fusão produtiva entre Conselhos Operários (Sovietes) e eletricidade — em suma, um capitalismo de estado, sem burguesia, sem liberdade, e submetida à gestão de uma imensa burocracia política, administrativa e militar.

Sabe-se hoje que, tendo recursos energéticos concentrados, abundantes e de acesso rápido e barato, qualquer país, mesmo atrasado ou vivendo em ditadura, pode crescer muito rapidamente e apanhar o comboio, o barco a motor, o submarino, o automóvel, o avião e o foguetão do desenvolvimento, desde que para tal alguém lhe venda o conhecimento necessário.

Foi o que sucedeu na União Soviética de Lenine, Trostsky e Estaline, no Japão da Restauração Meiji (1), na Arábia Saudita e nos Emiratos, ou na China depois do início da exploração regular do vasto campo petrolífero de Daqing, descoberto em 1959, um ano depois do fracassado Grande Salto em Frente de Mao (1958-1961), e posto a produzir regularmente em 1963, três anos antes do início da chamada Revolução Cultural, a qual traria de novo Mao Zedong à plenitude dos seus poderes ditatoriais, e lançaria a China no caminho do verdadeiro salto em frente que hoje todos conhecemos.

Mas o que a energia fóssil abundante e barata, como o carvão, o petróleo e o gás natural, dá —i.e. crescimento rápido— também tira, quando o acesso a estas formas de energia condensada e portátil passa a depender da importação, e de uma produção em geral mais cara e menos abundante, por sua vez prisioneira inevitável da especulação mercantil, política e financeira crescente.

As importações líquidas (importações menos exportações) de petróleo nos Estados Unidos em 1973 já eram de 6 milhões de barris/dia, 7,524 barris/dia em 2012, e o pico ocorreu em 2005: 12,549 milhões de barris/dia. Entre 1970 e 1992 a China foi auto-suficiente em abastecimento de petróleo, mas desde 2006 que importa mais de metade das suas necessidades de crude, ou seja, acima de 5 milhões de barris/dia, logo atrás da União Europeia e dos Estados Unidos, e ligeiramente à frente do Japão e da Índia. Porque será que a economia chinesa começou a abrandar, e não voltará a crescer a dois dígitos?

As ideologias revolucionárias (e a verborreia vazia do zero à esquerda do PS) morrem, como se vê, na praia dos recursos!

Do populista demagogo Louçã, herdeiro desgraçado de nada

É lamentável vermos o herdeiro clandestino de Trotsky em Lisboa, senhor economista desonesto e mente rasa, Francisco Louçã, manipular a sua audiência ingénua com gráficos enganadores sobre a situação financeira portuguesa. Diz o demagogo do Bloco de Esquerda, agora disfarçado de comentador televisivo, que havia dinheiro para pagar vencimentos e pensões aos funcionários públicos em 2011. Não havia problema nenhum em 2011, disse categoricamente o cartomante vermelho diante de um gráfico com moedinhas. E em 2012, como seria? E em 2013, como seria? E em 2014, como seria?

Se os credores deixarem de emprestar, e os bancos portugueses fecharem um depois do outro, onde irá parar a coluna de moedinhas dos pensionistas e dos funcionários públicos? Tamanha falta de honestidade intelectual é difícil de conceber, a menos que venha dum populista, claro!

Francisco Louçã, disfarçado de comentador político (que não é!), tem agora uma janela de massas para promover a sua agenda escondida de sempre: a do oportunismo aninhado numa memória falsa de Trotsky e da Revolução Russa (ver vídeo no Facebook).

Não deixa assim de ser sintomático o seu incómodo com o surgimento do Manifesto pela Democratização do Regime.

NOTAS
  1. A grande vantagem que o Japão adquiriu sobre a Rússia e a China, Coreia, etc., no início da revolução industrial, resulta em grande parte da transição do último Shogunato (Tokugawa), medieval e militar, para o Império do Japão, consumada na chamada Carta do Juramento, tornada pública por ocasião da tomada de posse do Imperador Meiji do Japão, em 7 de abril de 1868, e onde apenas cinco princípios viriam a mudar rapidamente a face e o poder do Japão:

    1. Estabelecimento de assembleias deliberativas.
    2. Envolvimento de todas as classes na condução dos negócios do estado.
    3. A revogação das leis suntuárias e restrições de classes em empregos.
    4. Substituição dos "maus costumes" pelas "leis da natureza".
    5. Uma busca internacional por conhecimento para fortalecer as fundações do domínio imperial.

terça-feira, março 12, 2013

Indignados, sim, mas organizados!


Manifesto pela Democratização do Regime

A tragédia social, económica e financeira a que vários governos conduziram Portugal interpela a consciência dos portugueses no sentido de porem em causa os partidos políticos que, nos últimos vinte anos, criaram uma classe que governa o País sem grandeza, sem ética e sem sentido de Estado, dificultando a participação democrática dos cidadãos e impedindo que o sistema político permita o aparecimento de verdadeiras alternativas.

Neste quadro, a rotação no poder não tem servido os interesses do Povo. Ela serve sobretudo para esconder a realidade, desperdiçando a força anímica e a capacidade de trabalho dos portugueses, bem como as diversas oportunidades de desenvolvimento que o País tem tido, como aconteceu com muitos dos apoios recebidos da União Europeia.

A obsessão do poder pelo poder, a inexperiência governativa e a impreparação das juventudes partidárias que, com inusitada facilidade e sem experiência profissional ou percurso cívico, chegam ao topo do poder político, servem essencialmente objectivos e interesses restritos, nacionais e internacionais, daqueles que utilizam o Estado para os seus próprios fins.

O factor trabalho e a prosperidade das pessoas e das famílias, base do progresso da Nação, são constantemente postos em causa pela austeridade sem desígnio e pelos sacrifícios impostos aos trabalhadores, como se fossem eles, e não os dirigentes, os responsáveis pelo desgoverno do Estado e pelo endividamento excessivo a que sucessivos governos conduziram Portugal.

Como se isso não bastasse, o poder político enveredou pela afronta de culpar os portugueses, procurando constantemente dividi-los: os mais novos contra os mais velhos, os empregados contra os desempregados, os funcionários públicos contra os trabalhadores do sector privado.

A Assembleia da República, sede da democracia, desacreditou-se, com os deputados a serem escolhidos, não pelos eleitores, mas pelas direcções partidárias, que colocam muitas vezes os seus próprios interesses acima dos interesses da Nação. A Assembleia da República representa hoje sobretudo – com honrosas excepções – um emprego garantido, conseguido por anos de subserviência às direcções partidárias e de onde desapareceu a vontade de ajuizar e de controlar os actos dos governos.

A Nação portuguesa encontra-se em desespero e sob vigilância internacional. Governos sem ideias, sem convicções, sem sabedoria nem estratégia para o progresso do País, colocaram os portugueses numa situação de falência, sem esperança, rumo ou confiança.  O Estado Social está a desmoronar-se, mais do que a racionalizar-se, deixando em angústia crescente centenas de milhares de desempregados e de novos pobres.

E não é apenas o presente que está em desagregação. É simultaneamente o futuro de dezenas de milhares de jovens sem emprego ou com salários que não permitem lançar um projecto de vida.

Só por incompetência partidária e governativa se pode afirmar que os portugueses têm vivido acima das suas posses —como se as posses de milhões de famílias que recebem menos de mil euros por mês fosse o problema— ou que não existem alternativas aos sacrifícios exagerados impostos aos mais pobres e à classe média.

É urgente mudar Portugal, dando conteúdo positivo à revolta e à crescente indignação dos portugueses. As grandes manifestações já realizadas mostraram de forma inequívoca o que milhões de portugueses pensam do sistema político e da nomenclatura governativa. Há uma diferença dramática entre os políticos que pensam na próxima geração e os que pensam sobretudo na próxima eleição. A sociedade portuguesa tem naturalmente respeito pelas figuras políticas e pelos partidos que foram determinantes no regresso do País a um Estado de Direito Democrático. E pelos políticos que, com visão, souberam recolocar Portugal na Europa.

O que está hoje em causa já não é a opção pela democracia, mas torná-la efectiva e participada. Já não está em causa aderir à Europa, mas participar no relançamento do projecto europeu. Não está em causa governar, mas corrigir um rumo que nos conduziu à actual crise e realizar as mudanças que isso implica.

Todavia, nada será possível sem um processo de reformas profundas no Estado e na economia, reformas cujos obstáculos estão, em primeiro lugar, nos interesses de uma classe política instalada e na promiscuidade entre o poder político e os interesses financeiros. Impõe-se uma ruptura, que a nosso ver passa por três passos fundamentais:

— Em primeiro lugar, por leis eleitorais transparentes e democráticas que viabilizem eleições primárias abertas aos cidadãos na escolha dos candidatos a todos os cargos políticos;

— Em segundo lugar, pela abertura da possibilidade de apresentação de listas nominais, de cidadãos, em eleições para a Assembleia da República. Igualmente, tornando obrigatório o voto nominal nas listas partidárias;

— Em terceiro lugar, é fundamental garantir a igualdade de condições no financiamento das campanhas eleitorais. O actual sistema assegura, através de fundos públicos, um financiamento das campanhas eleitorais que contribui para a promoção de políticos incompetentes e a consequente perpetuação do sistema.

Esta ruptura visa um objectivo nacional, que todos os sectores da sociedade podem e devem apoiar. Alterar o sistema político elimina o pior dos males que afecta a democracia portuguesa. Se há matéria que justifica a união de todos os portugueses, dando conteúdo às manifestações de indignação que têm reclamado a mudança, é precisamente a democratização do sistema político.

É urgente reivindicar este objectivo nacional com firmeza, exigindo de todos os partidos a legislação necessária. Queremos que eles assumam este dever patriótico e tenham a coragem de —para o efeito— se entenderem. Ou então que submetam a Referendo Nacional estas reformas que propomos e que não queiram assumir. Os portugueses saberão entender o desafio e pronunciar-se responsavelmente.

Entretanto, os signatários comprometem-se a lançar um movimento, aberto a todas as correntes de opinião, que terá como objectivo fazer aprovar no Parlamento novas leis eleitorais e do financiamento das campanhas eleitorais.

A Pátria Portuguesa corre perigo. É urgente dar conteúdo político e democrático ao sentimento de revolta dos portugueses. A solução passa obrigatoriamente pelo fim da concentração de todo o poder político nos partidos e na reconstrução de um regime verdadeiramente democrático.


NOTA (22 mar 2013)

Estive em dado momento envolvido nas conversas que viriam a dar lugar ao Manifesto pela Democratização do Regime. Contribuiu para a sua redação, embora questionasse sempre alguma terminologia suscetível de convocar demónios populistas com que não me identifico. O que se seguiu ao anúncio público prematuro do Manifesto levou-me entretanto a desligar-me do processo. O blogue e a página Facebook que entretanto publicara em apoio ao manifesto perderam assim justificação, tendo por isso sido retiradas. Publico, e para memória futura, cópia do email enviado à lista de subscritores.

Caio fora :(
Caros concidadãos,

Desde que o Manifesto foi publicado tive ocasião de acompanhar mais de perto o que se está a passar. E francamente não gosto :(

Não se pode exigir mais democracia, mais representatividade, e mais transparência, e demonstrar ao mesmo tempo, por enquanto pela calada, um tão inacreditável desejo de controlo centralista do que não passa de uma mão cheia de nada.

Desvinculo-me assim, hoje mesmo, do Manifesto.

Este blogue e a página associada no Facebook ficarão no éter como testemunhos da minha passagem por mais uma ilusão momentânea, mas deixarão ambos de aceitar publicações.

Saudações democráticas,

António Cerveira Pinto

terça-feira, outubro 30, 2012

Refundação do regime, já!

Rafael Bordalo Pinheiro, O António Maria, 29 jun 1882 Arch. B.N.

Perplexidades orçamentais 2006-2013

O povo que pode trabalhar decresceu nos últimos seis anos (2006-2011), o PIB cresceu a menos de 1% ao ano, mas o preço da casa da democracia aumentará mais de 65% entre 2006 e 2013, e o forrobodó das empresas públicas e sacos azuis escondidos do orçamento aumentou esta fatura fiscal em mais de 730%. Como não exigir a refundação do regime?

Passei uma parte desta tarde a comparar números de dois orçamentos do estado português, o de 2006 e a proposta para 2013. As comparações, por vezes, não são lineares, dada a falta de regras de compilação e exposição do texto governamental mais importante de todos. Cada governo faz o que quer, e ainda sobra tempo para os deputados vociferarem, rirem às gargalhas dos apartes, em suma, cagarrarem como cagarram ao cair da noite os cagarros nas pontas negras das ilhas açorianas.

Percebo lindamente porque o BCE, a Comissão Europeia e o senhor Wolfgang Schaueble querem passar a por alguma ordem nos bacanais orçamentais, a começar por aqueles que são escrevinhados com as unhas pelos celebérrimos PIIGS.

O mais surpreendente da comparação desta tarde, e que deixo à vossa atenta leitura, exigindo explicações ao contabilista Gaspar e à corja parlamentar, sobre as linhas que o Excel coloriu a rosa, é verificar que, afinal, as despesas com a saúde, com a educação e com a administração local serão menores em 2013 do que em 2006! Mesmo a Saúde sobe apenas 1,19%, de 2006 para 2013.

Na realidade, se tivermos em conta a inflação, estas despesas baixaram. A austeridade, afinal, começou há muito, pelo menos para a maioria da população portuguesa, que desde então tem emigrado em massa.

OE-2006-2013-Portugal


Mas então porquê tanto alarido?

Mesmo as subidas com gastos sociais, pensões de reforma, subsídios de desemprego, apoio às famílias e solidariedade social, subindo compreensivelmente perante o colapso em curso, sobem no seu conjunto pouco mais de 50% em 2013 relativamente a 2006.

De onde vem então o escândalo?

Reparem em todas as linhas sombreadas a rosa (na folha Excel publicada), e em particular nas rubricas Gestão da Dívida Pública (subiu de 49,6 mil milhões de euros em 2006, para uns previstos 124,75 mil milhões em 2013), e Despesas Excepcionais (transparência absoluta...), que subirão de quase 2,3 mil milhões de euros, em 2006, para uns inacreditáveis 19 mil milhões de euros, em 2013.

Sabem o que são estas “despesas excepcionais”?

Pois é, são tudo aquilo que os governos socialistas e o Bloco Central da Corrupção esconderam debaixo do nariz dos credores e da opinião pública, com a plena cobertura do PCP, do Bloco de Esquerda e dos sindicatos, ou seja, é o forrobodó das 120 PPPs cozinhadas com o setor bancário oligopolista nacional (com responsabilidades que montam a mais de 60 mil milhões de euros!), e das empresas públicas sobre endividadas, tudo isto colocado meticulosamente fora do perímetro orçamental até à chegada da tão vilipendiada Troika!

Ou seja, dos 183,7 mil milhões de euros do OE2013, 143,7 mil milhões correspondem a dívidas e serviço da dívida! Se isto não é motivo suficiente para derrubar democraticamente este regime, então será porque outra forma de o derrubar, menos democrática, estará em gestação. E já agora, como justifica o contabilista Gaspar tanto dinheiro para estudos e projetos se não há investimento público programado? De 14,86 milhões de euros em 2006, para 35,48 milhões de euros em 2013 é um salto de 238,76%! Para quem? Para os amigos cor-de-laranja, é isso? E como explicam os deputados as suas indecorosas despesas?

O desenho de Rafael Bordalo Pinheiro que acompanha este post foi publicado em 29 de junho de 1882, oito anos antes do Ultimato inglês, doze anos antes da bancarrota de 1892, dezoito anos antes do regicídio e da queda da monarquia.

A alternativa é evidente: ou proceder desde já à refundação democrática do regime, ou esperar, não oito anos, mas talvez apenas dois, para uma solução mais dramática.

Só há uma reforma possível face à dissolução iminente do estado a que chegámos: formar uma nova Assembleia Constituinte para redigir, discutir e aprovar um novo texto constitucional, claro, simples, essencial, sem cargas ideológicas idiotas e já agora compatível com a União Europeia, que deverá ser ratificado em referendo nacional vinculativo.


POST SCRIPTUM (1)

Comparando a Suécia com Portugal (números arredondados...)

Suécia (2012): 9,5 milhões de habitantes

PIB (Gov./2012): 410 mil milhões de euros
PIB/capita (est. 2012): 43 mil euros
Orçamento público, 2013: 96,7 mil milhões de euros
Despesa corrente primária, i.e. s/ amortizações, s/ juros, s/ cont. comunitária: 90 mil milhões de euros (21% do PIB)
Dívida pública (2012): 130,4 mil milhões de euros
Juros da dívida pública (2013): 2,6 mil milhões de euros
Impostos e afins depois de deduções: 21% do PIB (85,6 mil milhões de euros)

Vale a pena consultar o sítio do governo sueco aqui.

E vale a pena perguntarmos a nós próprios, e à corja partidária instalada, do Bloco ao CDS, porque motivo não existe informação estatística decentemente organizada e exposta aos cidadãos, nomeadamente no que se refere às coisas simples da vida: quanto ganhamos, quanto gastamos, onde gastamos, quanto devemos e a quem devemos. Os documentos do Orçamento de Estado de Portugal, embora tenham melhorado muito nos dois últimos exercícios, são uma verdadeira mistificação numerológica. Na realidade, correspondem a prestações de contas manhosas, cheias de lixo debaixo do tapete, compiladas e expostas de forma a tornar quase impossível entender as tais realidades simples que todo o cidadão deve conhecer.

Portugal (2011): 10, 6 milhões de habitantes (-300 000 emigrantes, entre 2006-2012) = 10,3 milhões de residentes

PIB (Pordata/2011): 159 mil milhões de euros
PIB/capita (2011): 15 mil euros
OE2013: 183,7 mil milhões de euros
Despesa corrente primária, i.e. s/ amortizações, s/juros, s/ cont. comunitária): 57,4 mil milhões de euros (36% do PIB2011)
Dívida pública (set 2012): 189,7 mil milhões de euros
Juros e outros encargos em 2013: 7,2 mil milhões de euros
Impostos e afins depois das deduções: 15% do PIB (37 mil milhões de euros)

Para que os nossos impostos chegassem à mesma % do PIB que ocorre na Suécia, 21%,  seria necessário aumentar a sangria fiscal em 1,85 mil milhões de euros. No entanto, enquanto os 21% suecos correspondem a 85,6 mil milhões de euros, em Portugal tal % daria uma receita muito inferior: 38,9 mil milhões de euros.

Repare-se nestas duas distâncias:
  • Suécia: despesa corrente primária (2013): 90 mil milhões de euros; receita fiscal: 85,6 mil milhões;
  • Portugal: despesa corrente primária (2013): 57,4 mil milhões de euros; receita fiscal: 37 mil milhões (se houvesse agravamento da carga fiscal para os acima mencionados 21% do PIB, a receita situar-se-ia em 38,9 mil milhões de euros — i.e. a 18,5 mil milhões de euros de distância da despesa pública primária, sem amortizações nem juros. Esta diferença só poderá ser preenchida por novos empréstimos (quem empresta?), ou baixando drasticamente a despesa dos previstos 36% do PIB para valores próximos dos 21% praticados na social Suécia :(
Finalmente, enquanto que a Suécia, um país com menos 800 mil habitantes que Portugal, com duas vezes e meia no nosso PIB (que continuará a descer nos próximos anos...) e 2,8 vezes o PIB/capita português, pagará, em 2013, 2,6 mil milhões de euros pelo serviço da sua dívida, Portugal terá que pagar 7,2 mil milhões de euros no próximo ano. Pior é quase impossível!

Eu compreendo que a Mário Soares estas contas horrorosas lhe pareçam, como sempre pareceram, enfadonhas. Mas aos pouco mais de dez milhões de almas penadas que começam a vaguear sem norte por este país fora, a realidade trágica destes números são um verdadeiro cutelo sobre as suas vidas.

E é preciso dizê-lo com clareza: o PS e a esquerda inconsciente, demagógica e despesista que sempre acompanhou o partido fundado, ente outros, por Mário Soares, apesar dos impropérios e da galhofa, são os principais responsáveis por este desastre.

A única guerra civil que poderá um dia ocorrer em Portugal, doutor Mário Soares, será, por incrível que pareça, contra o legado adulterado do sonho de uma manhã de primavera, a que tantos acorreram com total esperança e ingenuidade. O meu 25 de abril não foi o seu 25 de abril.

Refundar esta democracia corrupta até aos ossos é mesmo a única tábua de salvação que nos resta pela frente.


Cortes que ainda podem e devem ser introduzidos no OE2013
  • Administração Local: previsto: 2.121.207.562€ — proponho diminuição da despesa em 600M€
    Total Freguesias: 184.038.450 € — manter a mesma verba, redistribuindo-a de forma inteligente, diminuindo o número de freguesias urbanas, sobretudo em Lisboa e Porto
  • Presidência da República: previsto: 15.248.380€ — proponho diminuição da despesa em 2.287.257 €
  • Assembleia da República: previsto: 132.727.131€ — proponho diminuição da despesa em 39M€
  • Gabinete Representante República na RA Açores: previsto: 319.251.400€ — proponho que se acabe com esta indecorosa manifestação de colonialismo caricato e oportunista!
  • Gabinete Representante República na RA Madeira: previsto: 242.475.480€ — proponho que se acabe com esta indecorosa manifestação de colonialismo caricato e oportunista!
  • Min. Admin Interna: previsto: 2.066.149.723€ — proponho diminuição da despesa (menos meios e menos polícias!) em 500M€
  • Min. Finanças/ Despesas Excepcionais (PPPs, EPs e Parpública?): previsto: 19.018.727.691€ — proponho diminuição da despesa em 5700 M€
  • Min. Finanças, Estudos: previsto: 35.488.020€ + 10.228.049€ — proponho diminuição da despesa em 15M€
  • Min. Justiça: previsto: 1.160.787.561€  — proponho diminuição da despesa em 348M€
Total da redução7.766.014.137€ — sem tocar numa única despesa social, nem na saúde, nem na educação, setores onde, todavia, é possível fazer melhor e com mais eficiência orçamental.

NOTA: esta proposta tem um valor meramente heurístico. Serve para suscitar a discussão!


POST SCRIPTUM (2)

Um amigo perguntou-me se não deveria haver cortes também na Presidência da República. E eu respondi assim:

Caríssimo,
Creio que sim, embora o orçamento da PR tenha crescido cerca de 8% relativamente a 2006, ao contrário do da AR, que cresceu quase 66%. Um corte de 15% no orçamento do Palácio de Belém seria justificado nas presentes circunstâncias, creio. Vou corrigir o post;)

De qualquer modo estes "pequenos" cortes têm sobretudo um valor pedagógico e simbólico. Não valem pelo impacto efetivo na redução da descomunal dívida pública do país.

Aliás, o simples facto de a subida do IRS e os cortes nas pensões de reforma atingirem as classes médias altas e a alta burocracia como vão atingir é que fez acordar de uma vez por todas as nossas elites profissionais e partidárias.

Agora, sim, estamos quase todos no mesmo barco: o barco de uma longa vaga de ajustamento deflacionista e de redução do consumo (e sobretudo do consumismo!) que poderá durar facilmente até 2050...

Assim sendo, não há alternativa à refundação do regime democrático, salvo uma ditadura — o que seria bem pior :(

POST SCRIPTUM (3)

O Expresso de 3/11/2012 elaborou um quadro a que deu um título enganador: "Para onde vai o dinheiro do Estado". Se fosse Para Onde Vai O Nosso Dinheiro, estaria certo. Assim, não.

Um exemplo:

A despesa efectiva das Autarquias, estimada para 2013, é de 7.149 milhões de euros, mas as correspondentes receitas são de 7.863 milhões de euros — logo, haverá um saldo positivo!

Por outro lado, a Despesa do Estado (por classificação económica) com as administrações locais é bastante inferior: 2.627 milhões.

É que as autarquias têm receitas próprias várias — IMI, etc....

Donde a importância cada vez maior de observarmos o que gasta, e como gasta, o poder local...


POST SCRIPTUM (4)

A confusão sobre a dívida portuguesa, pública e privada, é congénita!
Na realidade, quando se fala de dívida pública, não se sabe se estamos a falar de Dívida Direta das Administrações Públicas (um conceito usado pelo IGCP), ou se de Dívida Pública na ótica do Procedimento dos Défices Excessivos.

Andei a espreitar e os números mais fiáveis, do Banco de Portugal e INE, são estes:

ANO DE REFERÊNCIA: 2011

A) Dívida do Setor Público não financeiro: administrações públicas + empresas públicas não incluídas nas administrações públicas:

235,964 mil milhões euros (138,0 por cento do PIB)


Dívida do sector privado não financeiro:

479,264 mil milhões euros (280,3% do PIB)

Endividamento sector não financeiro, público e privado:

715,229 mil milhões de euros (418,4% do PIB)



Evolução dos endividamentos das regiões e autarquias

B) Dívida pública na ótica do Procedimento dos Défices Excessivos (difere da Dívida Direta do Estado compilada pelo IGCP):

184,3 mil milhões de euros (107,8 por cento do PIB)

Dívida da administração local:

5,7 mil milhões de euros (3,3% do PIB)

Dívida da administração regional:

4,4 mil milhões de euros (3,1% do PIB)


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Última atualização: 6 nov 2012, 19:58

domingo, outubro 14, 2012

Rendeiros e Devoristas


Nosferatu, o morto-vivo, o imortal de Murnau (1922)

Nem a Troika, nem este governo são os principais problemas

Problema são os vampiros insaciáveis do regime. Pela calada das suas metáforas e disfarces faliram o país e preparam-se para continuar a beber o sangue dos portugueses ad aeternum. Se estes deixarem, claro!


Expresso (13 out 2012): dos 7,2 milhões de prédios urbanos registados 1.590.768 usufruem de isenções temporárias ou permanentes de IMI. 565.534 usufruem de isenções permanentes.

Observando os beneficiários destas isenções indecorosas ficamos a conhecer de forma precisa quem são os novos devoristas de Portugal:
  • os fundos de investimento imobiliário, com valor estimado de 12 mil milhões de euros (além do IMI também não pagam IMT pelas transações imobiliárias que realizam!);
  • as 4860 instituições particulares de solidariedade social (ver também a lista oficial), ou seja, as famosas IPSS, de que a União das Misericórdias é uma parte autónoma, mas muito importante, e que foi em tempos presidida pelo padre Melícias (um franciscano simpático que usufrui a linda reforma de 7450 euros)
  • os clubes de futebol — os adeptos que não se queixem da carga fiscal antes de fazerem as perguntas devidas sobre o que são, na realidade, os seus clubes de futebol :(
  • os sindicatos — não pagam IMI, mas os seus associados pagam a dobrar :(
  • as associações patronais — a mania de pedir...
  • as coletividades de cultura e recreio, onde, como todos sabemos, se realizam as mais diversas atividades lucrativas — como alugar instalações para eventos desportivos, culturais e religiosos;
  • os colégios particulares, que são caros, como todos sabemos, e que pertencem na sua maioria à igreja católica;
  • e ainda todos os edifícios considerados de interesse público ou com valor municipal — ou seja, uma bolsa interminável de favores à disposição dos partidos e dos poderes de turno. Pergunta: o Pavilhão Atlântico recentemente "oferecido" ao genro de Cavaco Silva, paga IMI? E pagou IMT?

Resumindo, pagamos todos mais IMI e mais IMT do que seria necessário, para que o estado capturado pelos devoristas satisfaça de privilégios estas insaciáveis criaturas. A teia está bem montada e engoliu literalmente o embaraço democrático que no início, isto é, pouco depois do 25A, atrapalhou os rendeiros e os cleptocratas de sempre. Sabem quem é a presidente da mesa da assembleia geral da União das Misericórdias? Pois é, acertaram: a irmã Maria de Belém Roseira.

Se todos, ou quase todos, pagassem impostos, a fiscalidade deveria baixar, naturalmente. Os partidos, como em tudo o que lhes convém, não pagam — pois imagino que se instalaram todos em imóveis com valor municipal. E nós que julgávamos que o financiamento vinha só dum lado. Não, vem de todos os lados e mais alguns. É só cavar um pouco mais, e lá aparece outro pequeno desvio orçamental em direção aos partidos!

Nestas circunstâncias, mudar de governo não adianta coisa nenhuma, pois todas as combinações de governo que se podem imaginar apenas serviriam para alimentar o monstro, nunca para o enfrentar.

Quando os rabos pelados do novo regime devorista instalado depois do 25A, que colonizam de forma permanente e omnipresente o espaço mediático, acusam os ministros deste governo de impreparação, de falta de aderência à realidade (neste particular Álvaro Santos Pereira foi o bombo da festa), ou mais recentemente acusam todo o governo pelo assalto fiscal em curso (porque lhes chegou finalmente aos bolsos!) eu desconfio das suas razões. Aliás percebo muito bem que a sua única intenção é impedir que os seus privilégios sejam beliscados, nem que o país se afunde entre as suas lágrimas de crocodilo e as suas contas bancárias e ativos tantas vezes ilegitimamente adquiridos. Nisto, todos se juntam, dos burocratas de sucesso do PCP e professores do Bloco, aos passageiros do táxi CDS.

O Bloco Central da Corrupção é isto: uma turma interminável que se está nas tintas para o país e se atirou de cabeça para dentro do caldeirão da poupança salazarista, e depois para o dilúvio de euros vindo de Bruxelas e Frankfurt, até que não restasse nada, ou seja, até que ficasse apenas à vista o cadáver adiado de um país estupefacto com o que lhe aconteceu.

É por isto que eu não confio nada nos partidos do parlamento. É por isto que defendo o boicote nacional das próximas eleições autárquicas. É por isto que a menos que o euro desapareça, ou sejamos expulsos da união monetária, a nossa saída está mesmo inscrita no memorando da Troika.

Livrem-nos da corja devorista!




A tempestade mundial ainda não amainou

Tal como estão as coisas em Portugal, Grécia e Espanha —mas também na Irlanda, Bélgica, Reino Unido e EUA— teremos depressão e recessões sucessivas até 2017, pelo menos. Haverá até lá uma destruição, sem precedentes na história do capitalismo, de excedentes de capital fictício, de máquinas, de empresas, de capacidade produtiva e de emprego .

Mas o pior de tudo chama-se hipertrofia dos ditos estados de bem-estar social, capturados pelos bancos, pelas partidocracias, pelas corporações e pela burocracia, e que crescem como manchas de azeite entornado que em breve poderão transformar-se em regimes de terrorismo fiscal intermitente.

Se a Grécia não aguentar, duvido que o euro aguente. Logo, a Alemanha vai ter que acabar por aceitar um crescimento desmesurado da massa monetária de onde virá, mais cedo ou mais tarde, inflação como não vemos há décadas.

A inflação é o alimento preferido do devorismo demopopulista europeu, precisamente por causa dos regimes de exceção fiscal. Depois de expropriadas pela via fiscal, o que ainda sobreviver das riquezas nacionais será confiscado através da inflação. O monstro estatal e o buraco negro da especulação financeira são insaciáveis.

Tudo se conjuga para uma catástrofe inimaginável. Não tardaremos a ver a extrema direita portuguesa contagiada pela explosão que a mesma terá em breve no país vizinho. A esquerda está a repetir os erros do passado, e portanto vai acabar por dar mais um grande tiro no pé.

A China, aliada à Rússia e à Índia criará em breve uma moeda única asiática para fugir à inflação monetária do dólar e do euro. Em breve deixará o Ocidente entregue a novas guerras fratricidas.

Quando isto ocorrer, e temo bem que venha a ocorrer, em Portugal haverá um novo golpe de estado constitucional, e possivelmente uma nova ditadura. Não vai parecer uma ditadura, mas vai ser uma ditadura.

Eu acho que deveríamos evitar chegar aqui, mas para tal, teremos que tomar a tempo a iniciativa de refundar a democracia, com outra constituição e acabando de vez com o predomínio sombrio dos devoristas.

segunda-feira, setembro 03, 2012

O erro de Adriano Moreira

Se não mudarmos o regime, este será mais um Mapa Cor-de-Rosa perdido :(

Adriano Moreira está profundamente errado

Adriano Moreira diz que “o país foi sempre dependente de factores externos”, tendo “pouco a pouco evoluído para um estado exíguo, com uma deficiência de relação entre objectivos e capacidades do Estado”, até chegar a uma “submissão que é traduzida por uma imagem de protectorado” — in Jornal de Negócios, 3 set 2012.

A bondade da análise de Adriano Moreira morre de um erro fatal: a total falta de curiosidade sobre o que nos leva a ser um país pobre.

Porque é que somos pobres, com tanto mar, com um património ex-colonial tão vasto, duradouro e entranhado, com uma diáspora emigrante tão numerosa e economicamente relevante, e com a situação geográfica que continua a ser tão privilegiada e estratégica hoje, como à data da fundação do reino, se países, nomeadamente europeus, sem nenhuma das nossas vantagens, são tão mais ricos: a Dinamarca, a Suécia, a Finlândia, a Áustria, a Suíça, o Luxemburgo, ou até a velhíssima República de São Marino?

Que acha que ocorreria se houvesse petróleo, gás natural e metais raros no fundo da Plataforma Marítima Portuguesa alargada?

Sabe perfeitamente o que as nossas elites fizeram da expoliação colonial, não sabe? Sabe o que Cavaco Silva, as araras parlamentares e os sindicatos fizeram às nossas pescas, não sabe? E já agora, sabe o que ocorreu em Macau depois de os portugueses saírem? Pois bem, acabou o monopólio do jogo, e a economia local disparou para mais de 21% ao ano! A solução da Árvore das Patacas morreu, e nós ou aprendemos a lição, ou morreremos com ela.

Do que nós precisamos, em primeiro lugar, é de arrumar de vez a nossa casa, começando por acabar com a mania dos monopólios, públicos, ou concedidos por um Estado secularmente corrupto, eliminando consequentemente as próprias condições genéticas que deram origem e permitem reproduzir as elites rendeiras que desde sempre apostaram no atraso cultural das populações e na repressão da liberdade empresarial e criativa.

A democracia fundada no rescaldo do golpe de estado militar que derrubou a anterior ditadura limitou-se, até agora, a instalar uma partidocracia de cariz endogâmico, apoiada nas velhas redes de caciquismo local, e financiada pelas mesmas elites de sempre, que, como é sabido, recuperaram quase todo o poder que perderam entre março e novembro de 1975, retomando depois, paulatinamente, contra o próprio texto constitucional (por isso precisa de ser inteiramente revisto), não só o que seria legitimamente seu, mas muito mais do que isso: o mesmíssimo poder de corromper estruturalmente o Estado e as suas instituições, e agora também a democracia populista que entretanto se instalou para viver, como a elite corrupta e preguiçosa que há séculos temos, das rendas ilegítimas e da expropriação fiscal crescente da larga maioria dos portugueses.

Não deixa de ser irónico que o texto do célebre memorando de capitulação orçamental do país face aos nossos credores, representados pela famigerada Troika, seja, no essencial, um libelo contra o abuso das elites e o excesso de rendas extraídas à produtividade potencial do país. Talvez por isso o documento precisasse de duas semanas para ser traduzido, apesar de ter sido a principal arena da retórica partidocrata durante essas mesmas duas semanas. Nenhum jornal teve a coragem e o bom senso de publicar e distribuir o dito Memorando, para que alguns milhares, já não digo milhões, de portugueses o pudessem ler e discutir na praça pública e quotidiana da democracia que temos.

A nossa salvação enquanto nação e estado depende largamente da concretização da União Europeia, mas depende, antes de mais e sobretudo, de nós mesmos. Depende, para já, de sabermos se teremos ou não a coragem para proceder a uma profunda alteração de regime, que a tal Revolução de Abril não logrou. A Constituição que temos é uma fraude. Uma fraude porque anuncia o impossível, uma fraude porque determina o que ninguém cumpre —a começar pelo sistema partidário e instituições constitucionalmente desenhados e instituídos—, e uma fraude ainda porque não obteve algo de tão elementar como seja libertar a sociedade e a economia das elites, antigas e novas, que vivem literalmente à custa de monopólios, rendas e privilégios corporativos, prejudicando gravemente a saúde económica e cultural do país.

A bancarrota em que voltámos a cair demonstra que o essencial não mudou, apesar de toda a retórica oportunista.

Eu recomendaria ao senador Adriano Moreira a leitura de um livro que acabo de devorar: Why Nations Fail, de Daron Acemoglu e James A. Robinson.