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quarta-feira, outubro 08, 2014

Ébola: o estado e a segurança

Madrid. Hospital Carlos III? Caricata sinalização de uma zona contaminada pelo Ébola

E assim se evita a propagação do Ébola em Espanha!


Los trabajadores de la empresa concesionaria del centro se han negado a entrar en la habitación por miedo al contagio. El hospital les pedía que entraran sólo con una bata. PUBLICO.

Na saúde pública, como noutros setores estratégicos e vitais da sociedade (água, energia, mobilidade, formação, telecomunicações), o estado tem que reservar para si o ónus da despesa, mas também as garantias de eficácia e segurança que o negócio privado não dá, nem pode dar.

Imagine-se a rotura de uma barragem, um ataque cibernético, ou biológico, de larga escala, ou a proliferação do vírus Ébola até se transformar numa pandemia na Europa. Que empresa privada estará interessada num ´negócio' destes, ou terá sequer os meios e a autoridade para arcar com as despesas e a responsabilidade de enfrentar catástrofes desta dimensão?

O caso da empresa nuclear privada TEPCO no desastre nuclear de Fukushima, ou numa escala mais doméstica e entre nós, a forma como os hospitais PPP e clínicas privadas despacham os casos clínicos não rentáveis para o SNS, são provas mais do que palpáveis de que é fundamental e urgente discutir, nesta crise sistémcia que voltou a castigar a poupança pública e o emprego para safar especuladores privados e governos populistas e corruptos, qual deve ser o perímetro vital e estratégico do setor público da atividade económica e segurança de um país, ou de uma união de países, como é o caso da UE.

Antes de recomeçar esta discussão democrática crucial será necessário, porém, afastar os preconceitos ideológicos e a retórica partidária do costume.

Embora não seja aqui o lugar apropriado para expor e discutir a requalificação das nossas democracias doentes, por tudo o que consigo perceber relativamente ao que aí vem, seria bom começarmos a pensar numa espécie de paradigma comunista-capitalista como o próximo enquadramento económico, financeiro, social e cultural da globalização em marcha, e das suas regiões, nações e sociedades complexas.

Para este fim teremos inevitavelmente que rever os atuais pressupostos institucionais dos regimes políticos assentes em democracias e classes médias profissionais e culturais. Teremos, porventura, que caminhar na direção de economias de planificação global estratégica finamente articuladas e geridas, ao mesmo tempo que são alimentadas por vastos rizomas democráticos onde devem estar presentes com igual capacidade de influenciar as decisões públicas, as velhas e depauperadas instituições parlamentares, partidárias e governativas saídas de Montesquieu, da Revolução Francesa e do Jacobinismo (que precisam de uma reforma drástica e urgente), a par da miríade de instâncias de competência democrática, cultural e técnica que têm vindo a proliferar como efeito salutar da expansão dos níveis cognitivos e éticos das sociedades tecnológicas.

Está na altura de avançarmos para um renascimento democrático do mundo.

sábado, junho 21, 2014

Podemos?

Alexis Tsipras e Pablo Iglesias em Atenas./Foto: Clara Palma Hermann

Que sairá da cisão do PS? Provavelmente, nada, pois há jovens que envelhecerem de repente.


Podemos y Syriza acuerdan coordinar acciones en el Parlamento Europeoel diario, 20-6-2014

Pablo Iglesias e Íñigo Errejón se han entrevistado este viernes con el equipo de Alexis Tsipras, el secretario general de Syriza. Ambas formaciones han escenificado su alianza con la visita de la delegación de Podemos a Atenas, cuyo objetivo es “intercambiar experiencias y coordinar acciones a nivel europeo”.

Será que uma das metades que resultará da provável cisão no PS, já abençoada por Mário Soares, irá procurar replicar este modelo radical-experimentalista em Portugal? Com quem? Com o Bloco e o Livre? Com Marinho Pinto? Com o PCP? No imediato, ou seja, até às próximas Legislativas, cada capela mais ou menos cor-de-rosa ou vermelha irá medir forças. O resultado será porventua uma pulverização da 'esquerda', enquanto a coligação PSD-CDS poderá também entrar numa deriva prolongada. O eleitorado está desiludido, furioso e atento. As redes sociais terão cada vez mais força e influência nas dinâmicas políticas e eleitorais. Tal como Marinho Pinto, também os blogues, o Facebook e o Twitter estão em modo ralenti, e esperarão pelo melhor momento antes de atacar. Tempestade no horizonte? Seguramente!

Sobram novos velhos, e faltam velhos novos


A implosão em curso do atual regime afeta as suas principais instituições: a presidência da república e um presidente que nega o seu estado de evidente doença através de um papagaio chamado Marcelo Rebelo de Sousa, um governo desorientado e cansado, um parlamento que já não diz nem faz coisa com coisa, um tribunal constitucional que virou sindicato da baba burocrática do regime, sindicatos convertidos em tropas de choque da arruaça que apenas serve para defender privilégios de classe (a classe dos sindicalistas), e, por fim, um sistema partidário à beira da implosão. Já só falta mesmo converter a indignação popular crescente em algo parecido com o Podemos.

Podemos, em quatro linhas


O pânico instalou-se, porém, entre aqueles que há quase quaranta anos são donos dos partidos, dos governos, do parlamento, dos tribunais, das polícias, em suma, do país. Estão falidos depois de terem conduzido o país à insolvência. A criminosa dívida acumulada, que Jorge Sampaio considerava uma obsessão, resultou numa interminável depressão económica. Aos seus filhos e netos, salvo os do círculo íntimo do poder, isto é, salvo aos filhos do nepotismo instalado, esta corja não vai deixar nada se não sangue, suor e lágrimas. Mas pior, esta corja deu-se subitamente conta de que o conforto da sua própria velhice está ameaçado!

Daí a tentativa desesperada a que assistimos, quer no PS, quer no PSD, de as velhas elites retomarem à bruta o controlo partidário do regime. Para isso foram mesmo ao ponto de seduzirem meninos ambiciosos e oportunistas, e meninas doidivanas igualmente oportunistas, para atingirem o seu intento, ou seja, remover, a pontapé se for necessário, as lideranças jovens que entretanto foram chegando ao topo dos partidos do Bloco Central. O cinismo desta verdadeira Brigada do Reumático 2.0 mede-se pela forma despudorada como usam o colapso que eles mesmo criaram para aí afundarem quem pegou na batata quente e tenta desesperadamente, como pode, tirá-la do fogo.

António Costa foi o idiota útil que Mário Soares, José Sócrates e Almeida Santos nomearam sargento-ajudante na nobre causa de estender uma passadeira vermelha ao regresso ao poder da Brigada do Reumático 2.0, sob os auspícios de um putativo presidente chamado José Sócrates. Sim, o idiota útil é para queimar! Sócrates preparou a coisa bem: primeiro lixa Costa, e entretanto já deu instruções para o início da demolição de uma eventual candidatura presidencial de António Guterres.

É evidente que esta corja, seja porque é mitónoma, ou porque caminha rapidamente para a demência, não percebeu ainda o que os impedirá definitivamente de levar o seu golpismo descarado a bom porto, mesmo que a tentativa de defenestração de Seguro resultasse: o povo odeia-vos!

Assim sendo, quer Pedro Passos Coelho, quer António José Seguro, que bem precisam de melhorar, só têm que proteger os seus partidos do terrorismo partidário e dos vários Cavalos de Tróia que serão infiltrados entre as suas hostes. Só têm que desfazer rapidamente os ninhos de baterias de intelectuais orgânicos e jornalistas histéricas que entopem a comunicação social. Como? Contra atacando metodicamente e desfazendo todas as manobras em curso com bons pedaços de informação sobre a massa de que são feitos estes golpistas e conspiradores.

Voltando ao Syriza e ao Podemos, será que da implosão do atual sistema partidário e do regime poderemos esperar fenómenos semelhantes aos que ocorreram na Grécia e em Espanha? De uma coisa estou certo, movimentos como estes dois jamais poderão nascer de uma qualquer barriga de aluguer chamada Mário Soares, José Sócrates ou Isabel Moreira. Nem mesmo dos cacos do Bloco de Esquerda. E quanto ao PCP, na medida em que é um pilar, ainda que perverso, do regime e do aparelho de estado que temos, além de estalinista irremediável, nada há a esperar, salvo a demagogia de sempre.

Eu não creio em utopias, nem em revoluções, quando é evidente que o mundo entrou numa era nova, que será, por muitas décadas, de crescimento débil e ajustamento dramático à escassez relativa de três fontes de energia que eram abundantes, de acesso fácil e baratas, e que progressivamente, desde meados da década de 70 do século passado, se tornaram escassas, de difícll acesso e caras: carvão, petróleo e gás natural. Não foi a ideolgia maoista que trouxe progresso à China, mas a descoberta das suas grandes reservas de petróleo, nomeadamente em Daqing, em 1959, e que até ao início da década de 1960 importavam com muito sangue, suor e lágrimas, da então União Soviética. A China, que passou então de miserável importador, a grande exportador, é hoje o maior importador de petróleo do planeta. Daí a sua próxima e inexorável desgraça.

Eu preferia que fossem as novas gerações do PS e do PSD (e já agora do CDS e do PCP, do Bloco, etc.) a fazerem as mudanças partidárias e institucionais imprescindíveis à transição do atual regime populista insolvente para uma sociedade mais pragmática, mais justa e muito mais ativa na busca e formulação de novos estilos de vida, onde a democracia e a liberdade predominem sobre o nepotismo, sobre o golpismo e sobre a corrupção, e onde a transparência da informação e as redes sociais inteligentes impeçam a degenerescência clpetocrática e burocrática que conduziu Portugal ao estado de aflição em que se enocontra.

O colapso do BES é um sinal evidente de que o business as usual partidário, que nos trouxe até ao desastre, morreu.

sábado, março 08, 2014

Democracia sem partidos?

Sólon (638-558 a.C), fundador da democracia ateniense.

O sistema partidário ocidental está esgotado


A propósito da célebre teoria de Milton Friedman sobre a aplicação de um imposto negativo sobre o rendimento (negative income tax) Miguel Horta escreveu:

Andamos há 200 anos a inventar formas de produzir mais e melhor, quando entretanto pouco melhorámos as formas de distribuir o que produzimos. Hoje o desfasamento das duas capacidades é enorme: a de produzir, a anos-luz do que era antes da revolução industrial; a de distribuir, próxima do que era então. Uma leitura possível da actual crise é mesmo esta: a inexistência de mecanismos de distribuição adequados impede o aproveitamento da gigantesca capacidade de produção existente.

A situação pede inovações na forma de distribuir os recursos pelas pessoas.

Um imposto negativo?

O estado social seria um imposto negativo mais abrangente e mais justo do que o negative income tax de Friedman se não tivesse sido capturado, como foi, pela lógica populista das democracias partidárias dominantes na Europa Ocidental e nos Estados Unidos. Sabemos hoje que o dito estado social faliu neste e no outro lado do Atlântico. Na verdade, para se cumprirem os objetivos estratégicos do welfare state —manter competitivo e coeso o potencial produtivo das nações industriais e urbanas cujas populações foram perdendo a ligação à terra e o controlo dos processos produtivos e cadeias de produção e reprodução social— as sociedades modernas geraram uma imensa burocracia de administração e controlo cujos custos apenas foram saudavelmente financiados enquanto houve energia barata e mercados coloniais. Esgotadas estas duas facilidades, o preço do não-trabalho e da distribuição gratuita de serviços deixou de ser coberto pelos excedentes da exploração do trabalho produtivo, passando a contribuir para o endividamento líquido, público e privado, dos países.

Não vale a pena, por ser completamente inútil, buscar explicações maniqueístas ou até partidárias para o grande colapso que nos atinge e que não deixará de se agravar até que encontremos uma solução racional para esta crise sistémica sem precedentes. As democracias partidárias e intrinsecamente populistas que temos não só formam uma barreira quase intransponível à mudança, como a sua persistência agrava e acelera a queda anunciada da civilização do consumo e do bem estar social.

Poderemos manter, por muito mais tempo, o manifesto impasse das democracias sociais  em que temos vivido?

Podemos já começar a pensar, discutir e experimentar democracias sem partidos?

Não seria verosímil substituir as atuais democracias demagógicas, cada vez menos representativas, por um regresso criativo à democracia ateniense primitiva, onde a representação partidária não existe, e em seu lugar são criadas instituições sofisticadas de dialética social e decisão democrática insuscetíveis de serem capturadas por demagogos e grupos de pressão?

Os partidos jacobinos, cada vez mais corruptos, que continuam a gerir os estados modernos são completamente inadequados à imaginação e gestão participadas das sociedades avançadas. Só mesmo a burguesia financeira especulativa continua a financiar o modelo partidário, populista e corrupto das democracias instaladas. Mas a verdade é esta: este modelo de democracia morreu e as suas réplicas africanas, asiáticas e sul-americanas não passam de grosseiras caricaturas.

Chegou porventura o tempo de mudarmos de vida e de democracia!


NOTA: este texto foi originalmente publicado no blogue do Partido Democrata.

sábado, maio 04, 2013

Partido Democrata-partido inteligente




Carta aos aderentes,​

É inadiável agir e precisamos, por isso, de um novo partido político que seja uma plataforma democrática e pragmática de resolução justa dos inúmeros problemas com que nos debatemos e têm vindo a agravar-se de forma rápida e dramática para milhões de portugueses.

Cheguei ao fim de vários anos de reflexão e espera a esta conclusão simples, mas pesada de consequências: é necessário criar uma nova plataforma política organizada e com vocação de poder, ou seja, preparada para disputar posições nas autarquias locais, no parlamento nacional e no governo do país.

O sistema partidário que temos está esgotado e sem capacidade de se regenerar sem o aparecimento e intervenção de novos interlocutores democráticos sérios e verdadeiramente representativos dos portugueses, sobretudo daqueles que olham aterrados para o empobrecimento catastrófico do país e para a corrupção infinita que atingiu o regime democrático.

O Partido Democrata é uma ideia a caminho de ser um projeto. Uma ideia aberta e um projeto pragmático de cooperação sem preconceitos.

Diria que a sua regra de ouro é esta:

— esquecer as ideologias tradicionais e negociar com pragmatismo e boa fé, em nome da justiça, do equilíbrio e da felicidade das pessoas.

Tenho vindo a desenvolver reuniões e conversas (por email, Skype, telefone e presenciais) com pessoas de todo o país. Estamos no começo, e nada há de mais estimulante do que começar algo novo!

Se quiser entrar na nossa conversa, será muito bem-vindo, será muito bem-vinda.

Iremos em breve convocar uma, ou várias e em simultâneo, convenções destinadas a aprovar um documento muito simples (10 mandamentos no máximo!) na base do qual se considere fundado o Partido Democrata.

Tudo o resto, programa, estatutos, organização, legalização, virá depois, com o tempo e as mediações que foram necessárias ao saudável crescimento desta nova plataforma de congregação política democrática.

Por enquanto, este movimento de vontades não obedece a nenhuma comissão coordenadora, nem a nenhuma pessoa em particular, o que não significa que esteja sem direção. As redes sociais, de que o Partido Democrata é e será cada vez mais uma emanação, trazem uma lógica colaborativa e de decisão inovadora à ação política e social das comunidades. Por aqui andaremos, sem a ingenuidade de acreditar no anti-partidismo primário, que apenas serve as mordomias de quem se apropriou das instâncias do poder democrático constitucional, mas não prestou bom serviço ao país.

Esperamos por si. Adira ao Partido Democrata, já!

Um abraço fraternal,

António Cerveira Pinto — em nome de todos os que já decidiram entrar nesta nau de esperança e vontade de agir.

ADERIR AO PARTIDO DEMOCRATA

sábado, abril 27, 2013

Democracia participativa

String Figures and How to Make Them. A Study of Cat's Cradle in Many Lands (1962) by Caroline Furness Jayne (LINK)

Incluir, criar, expandir
Sobre o contributo, bem-vindo, do Movimento Cidadania e Democracia Participativa

“El modelo clásico de partido tenía una cierta inspiración religiosa, como ya insinuó Gramsci, mezclando doctrina, rito y didactismo en relación a una población a instruir y a convencer. El interregno en el que estamos nos muestra transformaciones radicales en los medios de comunicación, más fragmentación y al mismo tiempo nuevas vías de articulación social, más énfasis en la autonomía personal, rechazo a liderazgos incontrolados y un conjunto de demandas políticas más imprevisibles y complejas. Al mismo tiempo, la gente está más preparada, surgen nuevas experiencias y hay mucho conocimiento accesible y compartido.” El País/ Joan Subirats.

A próxima democracia será o princípio de uma nova era —de menor crescimento, mas de maior criatividade, cultura e justiça— ou não será. A menos que estejamos à espera da derrocada dos regimes democráticos vigentes —envenenados pela corrupção, pela submissão encapotada à ganância financeira do capitalismo, pelo populismo, pelo excesso de concentração de poderes, pela invasão contínua das esferas de autonomia da cidadania, e pela irresponsabilidade governativa— será ainda preciso retomar os seus velhos e corrompidos aparelhos para, do seu interior, promover a inadiável reforma constitucional e política das instituições. Precisamos de uma Democracia 2.0, mas não sobre os escombros das democracias doentes que ainda suportamos.

O tempo desta metamorfose é agora! E o modo deverá assentar —creio que estamos todos de acordo— numa ideia simples: cooperação. Ou seja, permitir a necessária abertura de espírito para que os vários ritmos da metamorfose se interliguem e venham a produzir a necessária síntese criativa. Um desses ritmos é o do desenho do modus operandi da próxima democracia. Como deveremos organizar a ação daqueles que esperam e desejam contribuir para a emergência de uma democracia inteligente e justa, a tempo de impedir a derrocada completa do status quo?

O Movimento Cidadania e Democracia Particpativa, que partilha do nosso entusiasmo simultaneamente crítico e construtivo, realizou já um trabalho notável no que diz respeito ao desenho, por assim dizer, da formação da vontade democrática numa Democracia 2.0. Antes de mais, pois, convido-vos a analisar as suas propostas.


MCDP—A organização de um partido diferente


MCDP—O Conselho Nacional

Estes dois organogramas e as explicações que os acompanham são seguramente uma excelente base de partida. Podemos compará-la, nomeadamente com as práticas em curso de partidos que comungam ideias semelhantes e que já estão envolvidos numa praxis que tem vindo a fazer a diferença em países como o Canadá e a Itália, entre outros. Refiro-me, por exemplo, ao NPD, ou ao Partito Democratico italiano, que acaba de formar um novo governo em Itália.

Seria interessante que o Movimento Cidadania e Democracia Participativa promovesse ele mesmo um seminário de análise comparativa dos organogramas, teóricos e em funcionamento, que satisfazem os critérios que todos partilhamos para a emergência de democracias mais inteligentes e participativas.


©António Cerveira Pinto
Escrito para o Partido Democrata

quinta-feira, abril 25, 2013

O que diz Cavaco

A sombra azul de Soares.

Esquerda Cómoda, à rasca

Para além da algazarra monocórdica do costume, o que importa realçar é a descolagem de Belém do golpe de estado populista que Mário Soares, o PCP e o Bloco, em sintonia com a maioria das corporações, oligopólios e rendeiros do regime (da banca ao setor energético), que vivem todos, sem exceção, do orçamento do Estado (e da miséria crescente de milhões de portugueses), imaginaram ser possível levar a cabo ainda antes das eleições autárquicas.

Curiosamente, esta evolução dos acontecimentos, para muitos inesperada, veio criar condições ímpares para a consolidação da direção socialista de António José Seguro — e para o grande dilema que agora enfrentam as tropas de José Sócrates e o Bloco.

Ao PS de Seguro interessa cada vez mais deixar a coligação fazer o trabalho sujo que tem que ser feito, de uma maneira ou doutra, sofrendo todo o ónus da destruição de poupanças, de empregos e de contratos sociais insustentáveis formalmente celebrados ao longo de três décadas de prosperidade ilusória e de consolidação de um neocorporativismo institucional sem precedentes.

Não há saída para o buraco negro do endividamento (1) cavado por décadas de populismo, ganância corporativa e partidocracia, que não passe por uma redução do peso paquidérmico do Estado, pela libertação fiscal da sociedade e pelo fim da canga partidária sobre a vida económica, institucional e cultural dos portugueses.

Há, sim, Estado a mais. Há, sim, partidos a mais nas nossas vidas (2). Há, sim, uma oligarquia económico-financeira e polipartidária que vive criminosamente à custa do esmagamento da criatividade social, empresarial e cultural dos portugueses. Há, sim, um regime em fim de vida que é preciso substituir por uma democracia transparente, responsável e justa.

Post scriptum

Os opinocratas de serviço exibiram ontem a sua indignação perante o discurso do Presidente. Criticaram-no por dinamitar as pontes com os partidos da esquerda cómoda. Mas não criticaram o golpe de estado palaciano que esteve em curso contra a maioria governamental; mas não criticaram o cerco de rua montado pelo PCP e pela Intersindical ao Presidente da República, aos ministros em funções e ao próprio parlamento!

Cavaco, que chegou a confundir-se com a fronda neocorporativa e populista anti-Troika, cedo percebeu que a maré iria virar depois do alívio vindo de Bruxelas e de Frankfurt na sequência do fiasco de Chipre e da deterioração da situação em França e na Holanda. Cedo percebeu que o regresso de Sócrates, depois dos dois ataques virulentos que este desferiu contra o seu comportamento e carácter, mudara as circunstâncias. Uma coisa seria a queda de Passos Coelho, estando Seguro à frente do PS, outra muito diferente seria provocar a queda do governo de coligação sabendo que está em curso uma guerra civil dentro do PS, onde Almeida Santos, Mário Soares, Manuel Alegre e José Sócrates são aliados! Aníbal Cavaco Silva, seja pelo seu apurado instinto de sobrevivência, ou porque Durão Barroso lhe explicou a situação, deu meia volta, anunciou o fim da telenovela das eleições antecipadas, foi premiado com a nomeação de um apoiante seu para o governo —Miguel Poiares Maduro (pdf)— e depois, como mandam os manuais, perseguiu o inimigo! Só mesmo os cagarros da nossa indigente imprensa não perceberam, ou não querem perceber.

Noticias ao Minuto - O controverso discurso de Cavaco

O chefe de Estado apelou aos partidos para que definam as suas estratégias além dos calendários eleitorais, dizendo ser “uma ilusão pensar que as exigências de rigor orçamental irão desaparecer no fim do programa de ajustamento, em meados de 2014" e alertando que, se persistir uma visão imediatista, “de nada valerá ganhar ou perder eleições, de nada valerá integrar o Governo ou estar na oposição".

"É essencial alcançar um consenso político alargado que garanta que, quaisquer que sejam as concepções político-ideológicas, quaisquer que sejam os partidos que se encontrem no Governo, o país, depois de encerrado o actual ciclo do programa de ajustamento, adoptará políticas compatíveis com as regras fixadas no Tratado Orçamental que Portugal subscreveu", defendeu, num discurso que foi sendo pontuado por vários apartes das bancadas da oposição.

Cavaco defendeu ainda existir hoje uma “fadiga de austeridade” no país – mas pedindo que não se explore a ansiedade e inquietação dos cidadãos -, pediu que o desemprego seja uma “prioridade da acção governativa” e destacou, apesar das “consequências gravosas” do programa de assistência financeira, os objectivos alcançados e o sentido de responsabilidade revelado pelos portugueses.
Jornal de Negócios - Seguro prudente...

O secretário-geral socialista, António José Seguro, afirmou hoje que, durante o congresso do PS, haverá bastantes oportunidades para discutir "as consequências políticas" do discurso do Presidente da República na sessão solene do 25 de Abril.

[...] Perante a insistência nesta questão, o líder do PS apenas acrescentou que compreendia o interesse da comunicação social.

"Mas também compreendem que na sexta-feira, quando se iniciar o congresso, no sábado durante os trabalhos do congresso e no domingo, terei várias oportunidades de intervir e pode ter a certeza satisfarei a curiosidade", afirmou.

NOTAS

A lei geral é esta, o resto é demagogia de piratas.
  1. Não há regra sem exceção, mas regra é regra: quanto mais deves (acima de um certo patamar) menos cresces:. A propósito: “It’s A Bit Early To Declare A Winner In The Economic Debate” — Written by Lance Roberts | Thursday, April 25, 2013. Streettalk Live.
  2. Não é que sejam muitos, mas interferem demasiado nas nossas vidas e na vida da economia.

Última atualização: 26 abr 2013, 12:27 WET

domingo, março 24, 2013

Manifesto, regime, democracia

Fonte: Mata e Valério, Banco de Portugal, AMECO, Santos Pereira "Como retomar o sucesso" (2011), OAM (2013)

Partidocracia ou democracia plena?

Foi publicado recentemente um manifesto pela democratização do regime. Causou alguma comichão nas sentinelas partidárias, apesar do seu alcance minimalista. Limita-se, o apressado texto que subscrevi, mas de que entretanto me afastei, a pedir mais responsabilização dos deputados eleitos, e mais transparência e equilíbrio nas regras de financiamento das campanhas eleitorais. Quase caiu o Carmo e a Trindade!

O acessório —certa terminologia patrioteira, na verdade escusada— deu o flanco aos empregados públicos da nossa democracia que, em vez de confrontarem o repto, se limitaram a gritar que a iniciativa é populista, como se coisa diferente fosse a democracia que temos. Populista, partidocrata e geneticamente condicionada pelo MFA (1) — quarenta anos depois da queda da ditadura!

Ou seja, a nossa democracia é populista e continua amarrada a uma Constituição doutrinária, partidocrata e bonapartista. Para episódio ilustrativo disto mesmo, basta analisar o folhetim Menezes-Seara-Cavaco a propósito da lei de limitação de mandatos autárquicos, e as reações do PCP, mais a recusa, por parte do parlamento, de esclarecer a lei que escreveu

Fonte: Álvaro Santos Pereira

Os gráficos sobre a evolução da nossa dívida pública e sobre o crescimento potencial do PIB ao longo dos últimos 100-150 anos, a que podemos juntar a evolução da dívida externa, do desemprego e da emigração, no mesmo período, permitem retirar uma conclusão elementar: não fora a nossa inserção na zona euro, e já teríamos um novo golpe militar, guerra civil ou revolução a caminho!

Mas se a zona euro implodir —já nem menciono outras situações, como a de uma eventual saída de Portugal da zona euro, ou mesmo o regresso da Alemanha ao marco— em que situação ficaremos? Tem razão Mário Soares em andar muito preocupado. Tem razão Loureiro dos Santos, ao evidenciar de forma tão viva a sua preocupação. Tem razão Adriano Moreira. Só os tontos, as crianças e os políticos desmiolados ignoram os perigos que espreitam a democracia portuguesa.

A crise económica e social onde caímos e de onde não sairemos nas próximas décadas, pois, na realidade, temos pela frente uma metamorfose radical que só agora começa a ser percebida, é, em primeiro lugar, uma crise sistémica do capitalismo, que por sua vez traduz o fim de uma era, por ser impossível continuar a satisfazer o crescimento da procura agregada mundial com recursos limitados, cujos picos de exploração ou fadiga estão a surgir em cadeia. Só depois, a crise em que estamos é uma crise portuguesa, ainda que esta sua faceta endógena se agrave dia a dia por efeito de uma decadência estrutural de origem histórica e institucional que coincide, na minha opinião, com a demorada morte do império, iniciada pela independência do Brasil.

Sem querermos perceber a causa das coisas é impossível enfrentar, quantos mais ultrapassar, os problemas. Talvez por isto mesmo os rendeiros, os devoristas e os burocratas dos sucessivos regimes que se seguiram ao declínio do império colonial —o nosso petróleo!— tenham preferido sempre regimes não democráticos, ou de democracia populista vigiada, como o que precisamente temos neste momento.

Se não soubermos nos tempos mais próximos impor uma alteração ao regime que temos e que continua a ser de exploração e rendas, sem criatividade, nem desejo de concorrência, o perigo de cairmos numa nova ditadura é real. Bastará um desacoplamento da carruagem Lusitânia do comboio Europa para que o que agora nos parece remoto, se torne iminente.

Até agora os Indignados têm vindo para a rua, ensaiando algumas das modalidades locais da luta não violenta ensinadas por Gene Sharp. Estas táticas foram desenhadas para derrubar ditaduras, o que não é o caso, por enquanto. E por isso falham, deixando atrás de si um sabor amargo de incompletude. Pior ainda, são capturadas pelas oportunistas, conservadoras e autoritárias burocracias do PCP e do Bloco.

Outro manifesto, por favor!

O regime, ao contrário do que pensa Rui Ramos, está mesmo bloqueado. Há uma ténue oportunidade de impedirmos que resvale em breve para o caos institucional, o colapso governativo e novas aventuras autoritárias, ainda que no início, eventualmente, com cores mais ou menos vermelhas.

O manifesto pela democratização do regime tem uma falha congénita: não coloca em cima da mesa a absoluta necessidade de constituir uma terceira força partidária parlamentar capaz de aumentar a sustentação a prazo do regime, e com força suficiente para introduzir alterações institucionais de fundo na nossa sociedade e na qualidade da nossa deformada democracia.

Precisamos de uma democracia mais direta, mais participativa, mais transparente, mais forte e mais justa — mas para aqui chegarmos, não há volta a dar, precisamos dum novo partido!


NOTAS
  1. Excelente entrevista que o “i” fez  este Sábado a Rui Ramos!

    O modelo esgotou-se?


    Até agora, não se esgotou. Em Junho de 2011, os partidos continuaram a dominar as eleições. Há uma grande agitação ao nível partidário, porque a classe política sofre do medo de ver surgir um novo Cavaco Silva. Em 85, depois da austeridade conduzida pelo Bloco Central, eis que alguém vai para o governo, apanha uma conjuntura diferente e fica no poder dez anos. Esse é o receio que existe agora. É essa a razão da agitação ao nível partidário, mas essa agitação não se repercute ao nível da formação de novos partidos ou movimentos de opinião. Aliás, o único partido que está com ares de fragmentação é o Bloco de Esquerda. Os outros estão no mesmo sítio. Nas sondagens, os inquiridos escolhem os mesmos partidos. As pessoas vão às manifestações, mas quem as organiza está ligado aos partidos.

    [...]

    A possibilidade legal de qualquer cidadão poder candidatar-se à Assembleia da República podia ajudar a credibilizar?

    Talvez. Mas em Itália, quando caiu o antigo sistema político, instalado há 20 anos, achou-se que se ia criar um sistema mais transparente e aberto, e o resultado foi Berlusconi e Beppe Grillo... O sistema político criado em 74/75 foi o da criação de estabilidade. Foi criado para dificultar maiorias de um só partido, para garantir que os partidos dominavam a sociedade civil e as direcções partidárias dominavam os partidos. Este sistema foi montado para disciplinar uma sociedade que julgou que não se conseguia disciplinar a si própria - que, se fôssemos devolvidos aos nossos interesses, expectativas e ambições, isto tornar-se-ia ingovernável. Era isto que nos explicava o dr. Salazar e mesmo os democratas acreditavam nele. Portanto, criaram um sistema que, podendo ser uma democracia, era ao mesmo tempo uma espécie de ditadura dos partidos: uma partidocracia. Acabar com isto é abrir tudo outra vez...

    [...]

    A queda do governo pode solucionar alguma coisa?

    Eu não estou a dizer que este governo deve ficar lá para sempre e que não há no país ministros melhores do que estes. O que digo é que a queda deste governo representaria, em primeiro lugar, a destruição de uma maioria que, neste momento, sustenta no parlamento um governo normal. A primeira dúvida era se seria possível refazê-la com outros componentes. Uma queda deste governo que não fosse pela auto-dissolução da maioria abria um precedente preocupante. Ficávamos a saber que, doravante, bastaria parecer que as coisas estavam a correr mal para cair um governo. Os riscos são muito grandes.

    in Entrevista Rui Ramos. “Mudar o governo não vai acabar com a crise” — i online.

domingo, setembro 16, 2012

Outro regime, por favor!


Não será ele, mas não os trava. Porquê?


Que se lixe a Troika, ou que se lixe esta Democracia?

Que se lixe a Troika. Queremos as nossas vidas. Manif 15 de setembro
(2012)

Portugal veio à rua: centenas de milhar de pessoas de todos os partidos, sem partido, crianças, jovens, adultos empobrecidos e ameaçados pelo desemprego, desempregados, doentes e reformados.

A manifestação, que partiu da iniciativa de uma jovem socióloga de 31 anos, Magda Alves, decorreu pacificamente, apesar de dois incidentes poderem ter degenerado numa radicalização súbita e incontrolável dos acontecimentos. Refiro-me à tentativa frustrada de imolação pelo fogo de um jovem de vinte e poucos anos, e aos empurrões junto à escadaria da Assembleia da República.

A manif não foi controlada por nenhum partido político, apesar dos oportunistas do costume terem aproveitado os microfones e as câmaras de televisão, sempre à sua disposição, para tentarem retirar alguns trunfos. Os pobres diabos do Bloco e do PCP não percebem que os portugueses sabem demasiado bem que os votos nos partidos parlamentares têm sido papeis deitados ao lixo. E não percebem que um regime que chegou ao grau de corrupção, oportunismo, populismo e incompetência em que o nosso está, não lhe resta outra alternativa que não seja uma mudança estrutural.

Precisamos de convocar UMA NOVA CONSTITUINTE, precisamos de OUTRA CONSTITUIÇÃO, e queremos UMA DEMOCRACIA INCLUSIVA, TRANSPARENTE e PARTICIPATIVA.

Isto já lá não vai com as eleições do costume, pois estas estão totalmente viciadas por dentro.

Só o ritual e a contagem de votos (com a abstenção sempre a subir) é que ainda exibe a aparência de democracia. Depois de cada festa eleitoral tudo regressa ao mesmo, ou seja, a uma democracia formal capturada pelo Bloco Central da Corrupção (PS-PSD-CDS_PP), de que nem o PCP, nem o Bloco, escapam, com a agravante de se contentarem com as migalhas do poder, que recebem em troca da legitimação diária do regime que promovem apesar da retórica e dos protestos invariavelmente vagos, oportunistas e populistas.

Também não serão manifestações anónimas que levarão Portugal para uma saída do buraco para onde foi empurrado. Estas arruadas são importantes para avaliar o estado da irritação do país, mas se não desaguarem numa mudança democrática do regime, acabarão por redundar em desânimo agravado, ou pior ainda, no seu aproveitamento oportunista e desvio para fins inconfessáveis, não só pelos partidos do costume, mas mesmo por forças que trabalham na sombra, embora com a ajuda das agências de comunicação.

Não tenho dúvidas de que esta manifestação, para lá da sua grande importância enquanto barómetro da irritação popular, está neste preciso momento a ser aproveitada pelas mesmas forças que destruíram o país. As sombras deste regime corrupto quererão neste momento aproveitar o protesto para forçar o desajeitado PM a remodelar o governo, com o único fito de afastar os responsáveis pelas pastas da saúde, da educação, e da economia, energia e transportes.

A despesa do Estado continua incontrolável. O resultado do descontrolo imparável da dívida pública será o inevitável empobrecimento da população e a destruição da classe média. Para inverter esta rampa para o suicídio social, é urgente reformar o Estado, ou seja, é preciso neutralizar imediatamente os milhares de carraças de origem partidária e financeira que sugam o suor e sangue do país, usando para tal o discurso piedoso sobre os direitos constitucionais.

Sem começar por aqui, a balbúrdia e o ruído aumentarão de volume, os oportunistas ganharão mais do que nunca, pois terão mais e mais vítimas moribundas a quem extrair o emprego, a casa, as alianças, o pão, o sono e, finalmente, a vida. Tudo é fonte de rendimento especulativo para quem já capturou a democracia e o país.

Como me recordava um amigo brasileiro este fim-de-semana, “cachorro que come ovelha, só morto se endireita.”


Esta é uma das patas do Polvo que destruiu Portugal


Manif de 15 de setembro na imprensa nacional e internacional

José Gomes Ferreira: Contra a TSU, pela austeridade
SIC-N

Portugal Hit by Protests Against Austerity Measures
The Wall Street Journal

Thousands Protest Austerity Measures in Spain and Portugal
The New York Times

Spain and Portugal see big anti-austerity rallies
BBC News Europe

Thousands Of Protesters Across Europe Demonstrate What Europe's Next Crisis Will Be
Business Insider

domingo, agosto 12, 2012

Por uma Nova Constituinte

Esta era a República de Stuart Carvalhais. Como será a próxima?

Precisamos de uma 4ª República. A democracia portuguesa degenerou pela terceira vez e conduziu o país à falência.

Se a Troika falhar a sua missão, em grande medida por causa das resistências egoístas dos grupos de interesse sentados à mesa do Orçamento (banqueiros, burguesia rendeira, partidos, corporações, sindicatos e instituições criadas para a caça ao subsídio), cairemos na situação da Grécia. E se os defensores do euro e de uma verdadeira União Europeia soçobrarem perante os egoismos nacionais e corporativos que mostram já descaradamente as suas múltiplas cabeças, então não restará a Portugal outro caminho que não seja a mais desesperada bancarrota.

Nada está decidido, mas o pior pode mesmo começar a rolar encosta abaixo depois do próximo dia 12 de setembro, quando o Bundesbank decidir se apoia ou não o endividamento direto do BCE a partir dos pedidos hemorrágicos de liquidez por parte das cleptocracias, burocracias e forças populistas que detêm o poder na maioria dos sobre endividados países europeus.

Chegou o momento de exigir o fim deste regime e da sua constituição. Chegou o momento de exigir uma nova assembleia constituinte e uma nova constituição democrática para Portugal.

Mas não tenhamos dúvidas, o status quo não cederá aos melhores argumentos que possamos elaborar se a tal não for forçado. E para aqui chegarmos só há uma solução:

— boicotar todas a eleições daqui em diante em nome da formação de uma nova assembleia constituinte.

Os partidos existentes, mas também as autarquias e os cidadãos em geral devem propor textos constitucionais alternativos ao ainda vigente, simplificados e que permitam, por um lado, superar as deficiência congénitas da Constituição de 1975, responsável pela degenerescência da 4ª República, e por outro, definir qual a posição clara que Portugal deve assumir face à União Europeia.

Precisamos de fundar a 4ª República, de forma democrática, racional, e sem golpes de estado!

Do ponto de vista do Novo Partido Democrata —que de momento não passa de uma ideia em fase de maturação na minha própria cabeça— a 4ª República deve estender e reforçar os conceitos de democracia, liberdade e economia inclusiva.

Desde logo, a ideia de democracia representativa deve ser alargada e deixar de ser confundida com a simples e degenerada democracia electiva que se foi impondo ao país como uma fatalidade partidocrata, incompetente, irresponsável, corrupta e gravemente subsidiária da velha burguesia extractiva e rendeira que durante séculos manteve o país na cauda do mundo.

A democracia electiva deve ser mais transparente e mais restrita na ocupação do espaço físico, económico e mental dos portugueses. Deve ser menos cara, e mais fiscalizada. Deve ser, por outro lado, complementada por outras formas de democracia e exercício livre da cidadania responsável, começando por conferir uma autonomia radicalmente distinta aos poderes autárquicos e regionais, os quais deverão passar a ser, formal e de realmente, independentes dos partidos políticos.

Os partidos políticos, por sua vez,  deverão sofrer uma delimitação institucional clara dos poderes derivados da representação electiva, quer no plano dos poderes legislativos, quer na faculdade de gerar maiorias governamentais a partir dos espectros parlamentares saídos das eleições.

Se esta é porventura a maior alteração estrutural que poderá ser introduzida numa futura constituição, muitas outras, fundamentais, mas também de pormenor, deverão ser objecto de discussão e votação na futura assembleia constituinte de que este regime precisa como de pão para a alma.

Desde logo, acabar com o lixo ideológico e hipócrita da verborreia marxista. Desde logo, acabar com o obtuso tribunal constitucional. Desde logo, acabar com o conselho de estado, criando em seu lugar um senado independente do presidente da república e do parlamento, com poderes limitados mas bem definidos, e cujos membros são automaticamente cooptados em função de critérios objectivos: ex-presidentes da república, ex-primeiros ministros, ex-presidentes do supremo tribunal de justiça, ex-presidentes da assembleia da república, ex-presidentes das regiões autónomas, ex-presidentes da assembleia nacional de autarquias, ex-presidente do conselho nacional das ordens profissionais, ex-presidente da associação nacional de sindicatos, ex-chefes de estado-maior do exército, marinha e força aérea, ex-comandante-geral das polícias, …

Estas ideias costumam constar de programas partidários, mas não é o caso!

O que vos proponho é simultaneamente mais simples e mais exigente: montar um laboratório sobre o futuro da nossa democracia, onde estas e outras questões sejam discutidas de forma livre, informada e programática.

Seis ideias para começar:
  1. NOVA CONSTITUINTE — NOVA CONSTITUIÇÃO
  2. GARANTIR A SEPARAÇÃO DOS PODERES DO ESTADO
  3. PODER LOCAL INDEPENDENTE — A FREGUESIA COMO AGRUPAMENTO DE GOVERNANÇA LOCAL, BASE DE UM PODER AUTÁRQUICO NÃO PARTIDÁRIO
  4. LIMITAÇÃO DE TODOS OS MANDATOS ELETIVOS
  5. LEI DE INCOMPATIBILIDADES REFORÇADA NA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA E NO GOVERNO
  6. ELIMINAÇÃO DAS RENDAS, SUBSÍDIOS, ISENÇÕES E PRIVILÉGIOS ILEGÍTIMOS OBTIDOS ATRAVÉS DA CAPTURA DO ESTADO POR INTERESSES PARTICULARES

Segue o diagrama, em desenvolvimento, do futuro laboratório para UMA NOVA CONSTITUINTE

Diagrama (em desenvolvimento) do Laboratório NPD-lab (1.2) NPD-lab-1.2


Última atualização: 16 agosto 2012 17:41

quinta-feira, março 22, 2012

Novo Partido Democrata — 2


Sandro Botticelli — O Nascimento de Vénus (pormenor)

Sem classe média não há democracia!
 
Se isto é verdade, não pode deixar de ser uma grande preocupação assistirmos ao processo recentemente acelerado de destruição da classe média portuguesa, que a bancarrota do país e os grupos parasitários ameaçam transformar num processo dificilmente reversível no curto e médio prazo, sobretudo se a própria classe média não reparar na gravidade da situação e se deixar lentamente engolir pelo cano de esgoto da fiscalidade brutal e insaciável que tomou conta do nosso presente e ameaça destruir o nosso futuro.

Os ricos sempre souberem viver e os pobres sempre conseguiram sobreviver em regimes absolutistas e ditatoriais, mas os democratas e liberais, não. Se deixarmos o bloco central que há mais de trinta anos atrai as maiorias eleitorais render-se de vez aos processos de captura e manipulação da sociedade por parte dos ricos rendeiros do regime, com a consequente desintegração ideológica da democracia, haverá um momento, mais próximo do que poderemos imaginar, em que a diversidade democrática portuguesa será brutal e repentinamente reduzida à lógica maniqueísta e populista típica dos regimes pré-democráticos, dando assim lugar a uma espécie de pós-democracia miserável, tecnológica, burocrática, autoritária e policial.

O perigo de caminharmos rapidamente para uma ditadura cibernética de aparência democrática, com simulações eleitorais cada vez menos concorridas e mais manipuladas, não é uma fantasia, nem uma hipótese teórica de uma qualquer teoria da conspiração. A expropriação fiscal da classe média, que arrasta atrás de um indecente cortejo burocrático e policial o roubo ilegítimo mas aparentemente legal das poupanças e outros ativos desta classe criativa —como a família, o amor e as amizades—, está em curso e ameaça aniquilá-la em menos de uma geração. Para impedi-lo será preciso mudar o curso suicida das democracias europeias e americanas num novo tempo histórico, em que a abundância de recursos acabou e o predomínio colonial do Ocidente deixou felizmente de prevalecer na ordem mundial.

As democracias ocidentais estão no início de uma metamorfose cultural desordenada, largamente manipulada por minorias que já capturaram estados e governos por esse mundo fora, e se preparam agora para anestesiar e depois liquidar a base social das democracias modernas. Queremos que assim seja?

Suponho que não!

No primeiro texto que escrevi, em Janeiro deste ano, sobre a urgência de criar um Novo Partido Democrata, o NPD, pode ler-se:
Quando será que este governo cairá na lama? No fim da legislatura? Antes mesmo? Tudo irá depender do tempo que Álvaro Santos Pereira aguentar. A sua saída ditará simbolicamente o fim da própria presunção de inocência do senhor Passos de Coelho e do cada vez mais irritante Gasparinho. Depois deste cabo dobrado, a corrida eleitoral recomeçará! Porque pensam que anda Sócrates e a corja que deixou plantada no parlamento tão agitados?

O cada vez mais débil António José Seguro precisará em breve de recorrer a uma Unidade de Cuidados Intensivos (estratégica e táctica). Esperemos que saiba encontrar o conselheiro certo. Mas, como venho insistindo, já não chega. Aquela roseira velha não recupera sem uma grande poda!

E nós, ou seja, os que hesitam entre deixar de votar de vez, e a ténue esperança de uma renovação do jogo democrático, precisamos doutro partido para mudar este estafado rotativismo em que estamos metidos há mais de três décadas e cujo triste balanço é a bancarrota. Já não acontecia há 120 anos!
(Ler texto completo aqui)

Portugal caminha rapidamente para um segundo resgate. As palavras desencontradas do governo escondem o óbvio: o país está profundamente falido e insolvente, depende dos credores internacionais para comer e para pagar os seus funcionários públicos, as reformas e assistência médica e social ainda prestada, e para manter a aparência institucional dos cadáveres adiados da banca, que mais não fazem do que executar o pouco sangue que ainda respira na economia.

Desde a assinatura do memorando com a Troika de credores, Portugal é um protectorado, alías um protectorado formalmente independente, isto é, onde o poder político resultante de processos eleitorais cada vez mais inexpressivos pode, apesar de tudo, continuar a destruir o país, em nome do salve-se quem puder, em nome dos grandes rendeiros, em nome da continuidade patética da retórica partidária e parlamentar, em nome dos privilégios das corporações profissionais, sindicais e partidárias. Quanto maior for o buraco cavado pelas elites assassinas do país, mais doloroso e prolongado será o nosso cativeiro e mais arrasadora será a destruição da classe média.

O maior problema que temos pela frente é pois o de saber se quando acordarmos ainda iremos a tempo de nos levantarmos!

Aos que dizem que Portugal não precisa de mais partidos, repito: com os que temos não iremos a parte nenhuma. Do CDS ao dito Bloco de Esquerda, as soluções estão esgotadas, e sobretudo as dependências de cada um destes partidos do orçamento público é de tal ordem que já nada mais farão mais do que reproduzir até à exaustão as suas cada vez mais impotentes e caricatas ladainhas.

Precisamos, sim, de novos partidos e sobretudo de uma democracia menos partidária!

Parece um paradoxo, mas não é. Portugal precisa de um Estado eficiente, isto é, mais leve, mais transparente, mais profissional, mais responsável, menos partidário, mais digno, em suma. E precisa de uma ligação mais verificável e orgânica entre eleitores e eleitos. Precisa também de estender o tecido democrático para lá das paredes do parlamento e da governação central e municipal, ou seja, precisa de uma sociedade mais democrática, transparente, responsável e pragmática em todos os seus níveis de organização, cuja reflexão e apostas cheguem facilmente e influenciem os níveis superiores de decisão e governo. Precisamos, ao mesmo tempo, de libertar a sociedade, a economia, a política e a cultura das carraças, dos piolhos, das pulgas e da sarna que a atormenta e vem consumindo de forma deplorável.

Eu estou disposto a colaborar no renascimento da democracia portuguesa. E você, está?

domingo, maio 24, 2009

Portugal 105

Corrija o seu voto!

Depois de interagir com o Eu-Profiler, descobri que continuo a situar-me entre socialistas e algumas novas estirpes de democratas e liberais de esquerda. Não sou populista. Não sou conservador. E sou definitivamente europeísta. Os partidos portugueses de que estou mais próximo são o Partido Socialista (75,5%), o Partido Humanista (72,9%), o Movimento Esperança Portugal (67,1%) e o Movimento Mérito e Sociedade - 50,7%. O Bloco de Esquerda, cujo voto continuo a recomendar, apenas para retirar a maioria absoluta ao PS, não coincide em mais do que 46,3% com as minhas efectivas prioridades políticas.

Mas a descoberta mais surpreendente do perfil obtido depois de percorrer a trintena de perguntas colocadas pelo Eu-Profiler é que os partidos do meu coração não existem ainda em Portugal, mas já mexem e bem noutros países europeus: o Parti Démocratique do Luxemburgo, o Socialdemokratiska arbetarepartiet da Suécia, o Partij van de Arbeid holandês, o Social Democratic and Labour Party da Irlanda do Norte, o Socialdemokraterne da Dinamarca, o Demokratik Sol Parti e o Milliyetçi Hareket Partisi da Turquia. Todos estes partidos, e ainda o Hrvatska socijalno liberalna stranka da Croácia, o Eestimaa Rohelised e o Eestimaa Rahvaliit da Estónia, estão mais próximos do meu pensamento do que qualquer partido português! Façam o teste e surpreendam-se.

Votar é um hábito democrático. E como todos os hábitos tende a sofrer dos males da inércia que afecta tanto os sistemas físicos, como os intelectuais. Um dia votámos no PS, no PSD ou no CDS, e assim ficamos para toda a vida. Errando e dando tiros no pé, por preguiça e inconsciência pura, mas vendo bem, sem desculpa!

Se alguém nos disser, ou descobrirmos subitamente, que o nosso pensamento evoluiu, ou simplesmente mudou, e por conseguinte aquele partido em que nos habituámos a votar já nada tem que ver connosco, ou até contraria os nossos renovados interesses, convicções e desejos, que deveremos fazer? Persistir num hábito que perdeu forma e sentido? Ou experimentar novos caminhos?

Pois bem, a tempo das próximas eleições europeias surgiu uma Aplicação de Aconselhamento Eleitoral — Voting Advice Application (VAA) — desenvolvida por um consórcio independente formado pela Robert Schuman Centre for Advanced Studies (RCAS), integrado no European University Institute (EUI); Kieskompas e NCCR Democracy (University of Zurich/Zentrum für Demokratie Aarau)/Politools network. Chama-se Eu-Profiler. Esta divertida aplicação é seguramente pioneira no caminho que todos começamos a percorrer em direcção às democracias virtuais.

É tempo de corrigir o sentido de voto, e de começarmos a pensar em novos partidos!


OAM 587 24-05-2009 13:50

segunda-feira, março 16, 2009

Portugal 92

Uma semana com 20 horas?

Diante da natureza da crise e dos seus efeitos devastadores, é também a teoria económica de matriz neoliberal que perde credibilidade e se revela incapaz de interpretar a realidade económica. Consequentemente a efectiva resposta aos novos desafios da crise não deve ser procurada em políticas económicas assentes naquela inspiração. — "Reflexão para a Quaresma de 2009" (PDF), Comissão Nacional Justiça e Paz.

Senator Hugo Black of Alabama, a champion of a 30-hour workweek, agreed to sponsor the Administration bill on this subject in the Senate, while Representative William P. Connery of Massachusetts introduced corresponding legislation in the House. — in Fair Labor Standards Act of 1938: Maximum Struggle for a Minimum Wage by Jonathan Grossman (1).

Roosevelt later "voiced regret that he did not get behind the Black-Connery Thirty Hour Week Bill and push it through Congress" — in Jeremy Rifkin, The End of Work.

Eu não sou suspeito de morrer de amores pelo papagaio que a tríade de Macau colocou à frente do partido e do governo de maioria que actualmente nos governa. Mas devo confessar um facto: não é apenas a José Sócrates e à dita tríade que podemos atribuir a responsabilidade pelos mais de 574 mil desempregados, inactivos e sub-empregados registados pelo INE.

Comparando os números da análise crítica de Eugénio Rosa, compilados com base nas estatísticas oficiais, ficamos a saber que o desemprego em Portugal se manteve sempre em alta desde que José Sócrates prometeu criar 150 mil novos postos de trabalho. Esta tendência altista iniciou-se, porém, pouco depois de António Guterres ter entregue o governo, de mão beijada, a Durão Barroso.

Entre os 548.900 desempregados, no 1º trimestre de 2005, e os 574.200, no fim do 4º trimestre de 2008 —com um pico máximo no 4º trimestre de 2006, de 614.000, e um mínimo de 539.600 no fim do 2º trimestre de 2006—, registou-se um agravamento indisfarçável do desemprego em mais 25 mil postos de trabalho.

Tendo o INE interrompido desde 2003 o cálculo estatístico da emigração portuguesa, nomeadamente para a Europa, não podemos quantificar com exactidão a perda total de empregos no nosso país ao longo dos últimos quatro anos. Lendo porém o Relatório Internacional sobre Migrações de 2007 da OCDE (citado pelo D.N.), segundo o qual os 5 milhões de emigrantes espalhados pelo planeta se aproximam rapidamente da população activa do país (2), podemos estimar uma sangria média anual para o exterior nos últimos quatro anos na ordem dos 36.761 emigrantes —ou seja, quase 150 mil pessoas quando a presente legislatura chegar ao fim.

Em vez dos 150 mil novos postos de trabalho prometidos por José Sócrates, Portugal perdeu nos últimos quatro anos mais 172.344 empregos — os 25.300 desempregados a mais que no fim de 2008 se somam aos 548.900 do início da legislatura, mais 147.044 emigrantes. Ou seja, quando este governo for a votos, haverá 721.244 portugueses (ou talvez mesmo 800 mil) sem perspectivas de trabalho regular no nosso país, entre os quais se encontrarão desempregados recentes e de longa duração, jovens à procura do primeiro emprego e portugueses que emigraram desde 2005.

Os 70.334 novos desempregados inscritos até ao fim de Janeiro de 2009 (3) revelam bem até que ponto estamos perante uma tendência avassaladora, que nem este nem o próximo governo conseguirão travar, se não se perceber primeiro as causas do fenómeno.

O aumento do desemprego durante o governo de maioria absoluta é uma consequência directa da redução do Défice Orçamental imposta pelo Pacto de Estabilidade da União Europeia. Obras públicas e "jobs for the boys", alimentados sobretudo pelas receitas extraordinárias das privatizações e pelos fundos comunitários, foi a maneira como António Guterres disfarçou a tendência para a destruição do emprego inscrita nas sucessivas revoluções tecnológicas que têm marcado o Capitalismo desde o aparecimento da máquina a vapor. Porém, assim que o financiamento da bolsa artificial de emprego criada pela expansão do sector público começou a pesar no défice orçamental e na dívida pública, e o chicote de Bruxelas colocou Portugal sob a ameaça de multas pesadas por infracção manifesta do Pacto de Estabilidade —tendo então começado as dramáticas "reformas estruturais"—, o desemprego disparou.

Basta comparar os números oficiais do desemprego ao longo deste século:

Governo António Guterres
  • 2000: 4,0%
  • 2001: 4,0%
Governo Durão Barroso
  • 2002: 5,0%
  • 2003: 6,3%
Governo Santana Lopes
  • 2004: 6,7%
Governo José Sócrates
  • 2005: 7,6%
  • 2006: 7,6%
  • 2007: 8,0%
  • 2008: 7,6%

As anunciadas grandes obras públicas, pela fraca quantidade, qualidade e natureza precária dos empregos prometidos, nada podem fazer para inverter esta tendência de fundo. E pior do que isso: são uma ilusão caríssima que o País não pode suportar, nem sequer está em condições de financiar, mesmo que o IVA fosse parar aos 25% e a especulação financeira pagasse impostos. Os impactos desta ilusão na dívida externa portuguesa são pura e simplesmente insustentáveis. Neste ponto, o consenso crescente entre os economistas só é contraditado pela demagogia generalizada dos partidos políticos, à excepção, diga-se em abono da verdade, de Manuela Ferreira Leite.

A retórica dos partidos excêntricos da Oposição não convence. Ao elegerem o emprego e a segurança como bombos da festa anti-Sócrates, PP, PCP e Bloco de Esquerda —que nenhuma estratégia concreta propõem para mitigar o iminente colapso económico e social do país—, sabem que não têm soluções para esses dois dramas. A Direita folclórica do PP não pode ser mais previsível na sua histeria securitária, e a Esquerda previsível repete palavras de ordem há muito descredibilizadas. Onde pretendem pois chegar os partidos excêntricos com semelhante demagogia? Eu também quero ver o papagaio da tríade de Macau fora de São Bento. Mas em nome de algo que faça sentido! A voz grave, mas esfíngica, de Manuel Alegre, por si só, não basta. Precisa-se urgentemente de uma estratégia clara e criativa para superar a mais grave crise sistémica do Capitalismo desde a Grande Depressão.


O desemprego é o principal coveiro do Capitalismo

A principal causa da destruição de milhões de empregos em todo o mundo, mais ainda do que a deslocalização de milhares de empresas para a China e em geral para os países de mão-de-obra barata, é a inovação tecnológica aplicada tanto aos processos produtivos como aos métodos de gestão.

As ciências e as tecnologias aumentam a produtividade do trabalho. Este aumento, por sua vez, é responsável pelo acréscimo da produção, pela concentração do capital, pelo crescimento dos lucros, mas também pela extinção acelerada do trabalho humano! Se a tecnosfera cresce e é cada vez mais inteligente, ao mesmo tempo que o trabalho humano desaparece e é cada vez pior remunerado, quem irá no futuro adquirir os frutos da extraordinária produtividade das economias pós-industriais?

Até ao eclodir da primeira grande crise sistémica global do Capitalismo, esta aporia do progresso foi mitigada por uma estratégia combinada de deslocalização da produção para países com factores de exploração do trabalho mais favoráveis, e por uma expansão artificial do crédito e da massa monetária. O que agora desabou foi precisamente a bolha do endividamento continuado e excessivo das economias mundiais. As consequências são fáceis de prever: crises de endividamento, falências pessoais, falências empresariais, falência do sistema financeiro, quebra abrupta da procura, desinflação, quebra abrupta da produção, deflação, ajustamento dos modelos de emprego às nova tecnologias produtivas e de gestão, desemprego em larga escala, colapso iminente de milhares de sistemas públicos, colapso potencial dum número indeterminado de países, hiperinflação, adaptação catastrófica dos actuais sistemas sociais à super produtividade tecnológica.

É assim desde o aparecimento da máquina a vapor que levou à desertificação progressiva dos campos e ao crescimento exponencial das cidades. É assim desde a invenção da electricidade, do motor de combustão e das telecomunicações que conduziram à contracção do emprego industrial e ao aparecimento das sociedades de serviços. É assim desde o aparecimento da micro-electrónica, da computação digital e das bio e nanotecnologias que irão fazer disparar a produtividade e o desemprego para patamares dificilmente imagináveis.

Segundo Jeremy Rifkin, cujo livro, The End of Work, não me canso de recomendar, por volta de 2050, apenas 5% da população adulta mundial será provavelmente suficiente para dar conta de toda a produção industrial necessária.

Ainda segundo Rifkin, em apenas sete anos, entre 1995 e 2002, as vinte maiores economias mundiais perderam 31 milhões de postos de trabalho só na indústria transformadora. Ao contrário do que poderíamos imaginar, 15 milhões dos empregos perdidos ocorreram na China. Entre 1982 e 2002, apesar da produção de aço nos Estados Unidos ter subido de 75 para 102 milhões de toneladas, o emprego neste sector diminuiu de 289 mil para 74 mil trabalhadores. No sector de serviços a destruição massiva de empregos não é menos surpreendente, sobretudo para quem continua a crer que este sector será capaz de absorver eternamente os deserdados da agricultura e da indústria transformadora. O chamado net banking, por exemplo, pode chegar a reduzir 90% dos seres humanos necessários para gerir a mesma carteira de clientes que um banco convencional. Ou seja, o futuro de boa parte das actividades de serviços (finança, seguros, comércio, jornalismo, publicidade, etc.) irá eliminar milhões de empregos urbanos ao longo das próximas décadas.

Em Portugal, o caso da transportadora aérea nacional, embora menos badalado que a situação igualmente terminal da Alitália, é um bom exemplo do futuro dramático que se avizinha.

O Grupo TAP, depois de ter sido forçado politicamente a comprar por 140 milhões de euros (que não tem) a falida Portugália Airlines, do Grupo BES, ficou com cerca de 10 mil trabalhadores a cargo, ou seja, o mesmo número de trabalhadores que conjuntamente empregavam em Fevereiro de 2007 a easyJet, a Ryanair e a Air Berlin.

A Alitália, uma empresa em perda acelerada de produtividade, apesar de ter uma das mais jovens frotas europeias, continua incapaz de competir com o ascendente sector das Low Cost. Os seus 22 mil funcionários, i.e. 122,9 trabalhadores por aeronave, são um handicap muito desfavorável na comparação com as três principais Low Cost europeias, Ryanair, Easy Jet e Air Berlin, com uma média de 37,5 trabalhadores por avião. Na TAP esta relação é ainda mais desfavorável: 156,3 trabalhadores por aeronave. Alitália e TAP são pois empresas obsoletas na concepção estratégica do negócio, nos métodos de gestão e sobretudo na racionalização dos custos e flexibilidade laborais. A tendência para a concentração capitalista no sector não irá retroceder, pois sendo o capital fixo cada vez mais eficiente e precioso, também é cada vez mais caro e difícil de obter sem que previamente sejam dadas garantias de uma gestão racional dos recursos disponíveis. A contracção do emprego nestas, como na generalidade das companhias aéreas mundiais, pode ser adiada, mas é inevitável a médio prazo.


O voluntarismo neo-keynesiano é um erro

O desemprego deixou de ser um problema conjuntural que a demagogia partidária possa resolver. Na realidade, à medida que se esgotam as estratégias de mitigação (obras públicas, expansão do sector público, criação monetária, especulação financeira, endividamento) da principal tendência evolutiva das sociedades humanas actuais — a tendência para a diminuição do trabalho humano no sistema produtivo —, o desemprego e a falta de trabalho ocupam o centro das preocupações da esmagadora maioria da humanidade.

Se há cada vez menos trabalho, e se o trabalho disponível é cada vez mais mal pago independentemente do grau de preparação e até de responsabilidade de quem vai tendo acesso a este recurso em vias de extinção, que regime de acesso ao bem comum podem os humanos esperar no futuro?

O recurso à despesa pública de tipo keynesiano seria mais do mesmo, i.e. maior inércia dos sistemas económicos, sociais e políticos obsoletos, mais endividamento de quem já está sobre endividado (todos nós!), e diminuição dos períodos de expansão económica, com o consequente aumento, duração e gravidade das recessões e depressões económicas.

Ao contrário do que se diz por aí, não foi o New Deal (1933-1938) que salvou a América da interminável Grande Depressão, mas sim a preparação e entrada do país na Segunda Guerra Mundial. O ataque e destruição dos 11 obsoletos navios e 188 aviões de guerra estacionados na base militar de Pearl Harbour, em 1941, foi mais uma oportunidade do que um verdadeiramente inesperado casus belli.

Quando Franklin D. Roosevelt chegou ao poder (1933) e lançou o primeiro New Deal (1933-1934), o desemprego situava-se nuns elevadíssimos 25%. No início de 1937 desceu para os 15%, mas no fim desse mesmo ano, princípios de 1938, voltou a subir para os 21%. Em 1939, a jovem Conservative coaliton (formada pela maioria conservadora do Partido Republicano e pela minoria conservadora, sobretudo sulista, do Partido Democrata) bloqueou os planos liberais de Roosevelt, interrompendo o segundo New Deal então em curso (1935-38) e favorecendo claramente o esforço de guerra americano, primeiro no auxílio aos aliados ingleses, e depois de Pearl Harbour, entrando directamente na guerra mundial. Em 1940 o desemprego desceu para 15%; em 1942 (um ano depois de Pearl Harbour), para 7,5%; e em 1943, para 3,75%. A família Bush bem tentou recriar uma oportunidade parecida. Mas a sorte dos deuses não esteve do seu lado. Que fará Obama? A Cimeira do G20 que terá lugar em Londres no próximo dia 2 de Abril será porventura decisiva a este respeito...


Porque seremos o único animal que paga pelo que bebe e come?

O maior problema que temos pela frente é saber como distribuir o trabalho humano que assegura e faz progredir o trabalho das máquinas físicas, comunicativas e cognitivas que, por sua vez, asseguram a produção de uma parte crescente de tudo o que precisamos para viver e aumentar os níveis de sofisticação das redes de interacção social a que pertencemos.

Desde logo, precisamos de redefinir radicalmente a titularidade dos meios de produção, procedendo à sua integral socialização. Sabemos hoje que boa parte da concentração capitalista mundial e dos aumentos de produtividade do trabalho pela via da automação e da desmaterialização de muitos processos produtivos é alimentada financeiramente pela gigantesca poupança acumulada nos fundos de pensões. De facto, só mesmo a poupança —isto é a acumulação— permite estimular o aumento da produtividade do trabalho, na medida em que só a poupança que conduz à acumulação de reservas assegura em geral o crescimento económico, pela sua capacidade de desviar uma parte dos recursos, da esfera do consumo, para a esfera produtiva.

No entanto, se o trabalho assalariado tende a desaparecer, sobrando por outro lado uma enorme capacidade produtiva e de consumo progressivamente fora do sistema de valor capitalista, onde irá no futuro a economia dominante buscar a poupança de que necessita para promover os investimentos de capital intensivo de que depende criticamente para seguir em frente na procura de uma ainda maior produtividade do trabalho assalariado? No dia em que tudo for comandado por robots, quem contribuirá para os fundos de pensões que hoje, segundo Jeremy Rifkin, perfazem 1/3 dos activos financeiros da maior economia do mundo? O buraco negro do endividamento exponencial que hoje ameaça destruir a economia mundial é o resultado indesejável da tentativa de fugir a esta pergunta.

O trabalho assalariado tem que passar a ser uma actividade temporária de menor duração e mais sustentável em termos energéticos, abrangendo a totalidade dos adultos saudáveis, mas apenas durante um período limitado das suas vidas (por exemplo, dos 22 aos 45 anos), ocupando em média 4 a 5 horas seguidas de trabalho diário bem remunerado, 4 ou 5 dias por semana. Antes de chegar à idade profissional as pessoas deveriam evoluir livremente numa rede educativa alimentada em partes iguais pelo sector público, pelas empresas privadas e pelo chamado terceiro sector — uma vastíssima rede de voluntariado, cooperação e criatividade, cuja importância económica poderá ultrapassar, antes do final deste século, a dos actuais sectores empresariais públicos e privados. Depois dos 45 anos as pessoas abandonariam progressivamente a economia capitalista, levando consigo uma pensão vitalícia e universal (isto é, igual para todos). A partir deste ponto começa o terceiro sector, i.e. um estádio social de grande liberdade individual e de intensa criatividade, seguindo o paradigma da dádiva, por oposição ao paradigma da troca. Esta espécie de economia social radical deverá basear-se na cooperação, no voluntariado e na solidariedade. O que fazemos chegar aos outros, e o que os outros nos fazem chegar, tem origem num puro acto de amor e libertação subjectiva. O paraíso na Terra? Porque não?

Perante a crise actual, em vez de perdermos mais tempo a discutir as grandes obras públicas, deveríamos analisar e levar por diante duas reformas estruturais com impactos imediatos na redução dos riscos que a deterioração da actual situação económica comporta para a paz social:
  1. reduzir a semana de trabalho a 20 horas, diminuindo ao mesmo tempo a semana laboral para 4 dias;
  2. criar em todas as cidades com mais de 50 mil habitantes um cartão de residente municipal que dê acesso a múltiplos recursos em troca de voluntariado.
Se estas medidas de fundo fossem acompanhadas de um plano nacional de eficiência energética incidindo numa primeira fase sobre todos os edifícios públicos nacionais e municipais, teríamos com certeza resultados bem mais visíveis do que as expectativas demagógicas alimentadas irresponsavelmente pelo debate eleitoral em curso.


NOTAS
  1. Vale a pena ler toda a descrição de Jonathan Grossman sobre a iniciativa do Presidente Roosevelt relativamente à legislação laboral proposta no quadro da Grande Depressão de 1929-1943, de que os contributos do Senador Hugo Black e do deputado da Câmara dos Representantes, William P. Connery, foram então fonte de grande polémica e voltam hoje a inspirar autores como Jeremy Rifkin. Aqui fica a passagem completa de onde retirei a citação sobre o famoso, embora não aplicado Black-Connery Bill.
    On May 24, 1937, President Roosevelt sent the bill to Congress with a message that America should be able to give "all our able-bodied working men and women a fair day's pay for a fair day's work." He continued: "A self-supporting and self-respecting democracy can plead no justification for the existence of child labor, no economic reason for chiseling worker's wages or stretching workers' hours." Though States had the right to set standards within their own borders, he said, goods produced under "conditions that do not meet rudimentary standards of decency should be regarded as contraband and ought not to be allowed to pollute the channels of interstate trade." He asked Congress to pass applicable legislation"at this session."

    Senator Hugo Black of Alabama, a champion of a 30-hour workweek, agreed to sponsor the Administration bill on this subject in the Senate, while Representative William P. Connery of Massachusetts introduced corresponding legislation in the House. The Black-Connery bill had wide Public support, and its path seemed smoothed by arrangements for a joint hearing by the labor committees of both Houses.

    Generally, the bill provided for a 40-cent-an-hour minimum wage, a 40-hour maximum workweek, and a minimum working age of 16 except in certain industries outside of mining and manufacturing. The bill also proposed a five-member labor standards board which could authorize still higher wages and shorter hours after review of certain cases. — in Fair Labor Standards Act of 1938: Maximum Struggle for a Minimum Wage by Jonathan Grossman.
  2. 5.507.000, no 1º trimestre de 2005; 5.613.900, em Dezembro de 2008.
  3. Mais 44,7% do que em Dezembro de 2008; mais 27,3% do que em Janeiro de 2008.


OAM 557 17-03-2009 19:30 (última actualização: 25-03-2009 01:47)