domingo, setembro 26, 2010

Prioridades de Portugal

Os imbecis do Bloco Central, e os imbecis do Bloco de Esquerda, do PCP e do CDS, ainda não perceberam que temos apenas três prioridades estratégicas:
  • preservar e potenciar os nossos ecossistemas (máxima prioridade e poder absoluto ao Ministério do Ambiente);
  • ter uma estratégia de produção (agrícola, industrial e pós-industrial) simples, clara e inflexível, para o que será imprescindível forçar a reforma democrática das actuais corporações sindicais, profissionais e patronais (1);
  • e mudar radicalmente o paradigma de transportes e mobilidade (pondo os serviços em regime generalizado de tele-presença e tele-trabalho, as indústrias materiais em nichos de especialização manual —artística— e intelectual, e as mercadorias pesadas sobre carris e navios. Não precisamos de TGVs a andar a 300Km/h para coisa nenhuma! Não precisamos da Alta Velocidade ferroviária para transportar pessoas, salvo no eixo Lisboa-Madrid-Barcelona-Valência-Sevilha-etc. (2). Precisamos, sim, de refazer toda a nossa rede ferroviária para o transporte misto de pessoas e mercadorias (ou seja, para velocidades máximas de 250 Km/h), tendo em vista o grande projecto de interoperabilidade ferroviária e multi-modalidade que os burocratas bem pagos de Bruxelas já adquiriram como prioridade estratégica fundamental da União Europeia, tendo nomeadamente presente os impactos tremendos do pico petrolífero. O Novo Aeroporto da Ota em Alcochete não faz qualquer sentido quando é sabido que o transporte aéreo de massas está condenado. As empresas aéreas de Low Cost são o derradeiro paradigma de um sistema de transporte que em breve voltará a estar reservado aos endinheirados (Tires não pára de crescer!), pelo que é de prever que sejam estas mesmas empresas a gerir no futuro a grande rede europeia de transporte ferroviário (entre países, nos países, entre cidades, e dentro das cidades). Só a dependência corrupta dos nossos políticos, que se financiam nas empresas de construção e nos monopólios clientelares, pode explicar a sensibilidade interessada dos estados-maiores dos partidos aos argumentos da Mota-Engil e quejandos.
O sinal de partida de uma reorientação estratégica desta envergadura terá que ser, naturalmente, um ataque sem precedentes ao estado burocrático e paquidérmico que a corrupta nomenclatura partidária criou para sua própria segurança, e uma verdadeira operação mãos limpas contra as tríades, máfias e polvos da corrupção endémica que ameaça endividar Portugal por todo o século 21!

NOTAS
  1. Bastariam duas medidas para esta reforma democrática: limitar os mandatos de todos os cargos electivos a um máximo de 8 anos; e publicitação anual obrigatória, na Internet, dos relatórios e contas destas associações.
  2. A ligação Lisboa-Madrid (resto de Espanha) terá que ser uma linha mista para passageiros e mercadorias em bitola europeia e com sistemas de alimentação eléctrica e sinalização idênticos aos da Espanha, que por sua vez terão que ser idênticos aos franceses, alemães, austríacos, checos, polacos, e por aí adiante. A vigarice, imposta ao actual governo pela Mota-Engil, e protagonizada pelo moço de fretes António Mendoza, de construir uma nova linha exclusiva —recorrendo à moribunda bitola ibérica— entre Sines e Badajoz, ou mais exactamente, entre Évora e Caia (criando desta forma mais um pequeno monopólio despesista e improdutivo para o senhor Mota e o senhor Coelho), tem que ser travada imediatamente e denunciada como mais um verdadeiro acto de corrupção do Estado (ver a denúncia do PSD na AR). A linha Lisboa-Madrid tem, isso sim, que ser uma linha mista, para passageiros e mercadorias, por uma óbvia razão de racionalidade económica e estratégica. Por outro lado, esta linha não precisa, para já, de cruzar o rio Tejo sobre uma nova ponte desnecessária. Esta é aliás outra grande obra planeada com os pés, única e exclusivamente destinada a alimentar as empresas clientelares e corruptas do regime. A prova está no facto de a anulação do concurso da TTT, ganho por um consórcio liderado por espanhóis, ter sido uma exigência da Mota-Engil e do senhor Coelho. O mentiroso ministro das obras públicas deveria ser levado ao banco dos réus por toda esta embrulhada de tráfico de influências. Finalmente, se o futuro aeroporto de Lisboa poderá um dia, se for justificado, ir para Rio frio ou Alcochete, porque carga de água o Pinhal Novo é menos digno para acolher a ligação Lisboa-Madrid de Alta Velocidade?! Chegado à moderna e entretanto ampliada estação ferroviária do Pinhal Novo, o AVE, ou LAVE (enfim, o Transiberiano), enquanto despeja umas dezenas largas de passageiros, adapta os seus rodados para a linha mais larga que corre sobre a Ponte 25 de Abril, e lá arranca, depois de uma paragem de 15mn (ou até menos), até à nova Estação Central de Lisboa, nos antigos terrenos da Feira Popular. Nada mais simples, directo, tecnologicamente evidente, e economicamente racional.

segunda-feira, setembro 20, 2010

Rumos — 3

Morreu finalmente o projecto e o concurso para a TTT

Algumas das vicissitudes são afinal imediatas oportunidades de desenvolvimento e de riqueza. Morreu finalmente o projecto e o concurso para a TTT — Terceira Travessia do Tejo, que ligaria o Barreiro a Chelas, e que tinha uma expectativa orçamental acima de qualquer imaginação. Para além do que possa ser dito oficialmente, e por várias razões, nunca mais uma mente dentro do seu perfeito juízo voltará a concretizar tal concurso.

Em consequência muda completamente o quadro prospectivo na área metropolitana de Lisboa.

Primeira conclusão: a estação terminal de alta velocidade será na estação já existente no Pinhal Novo,  situada no alinhamento e apenas a 10 km do Poceirão, caindo pois por terra a lunática duplicação da “Gare do Oriente” do professor Calatrava. Do Poceirão/Pinhal Novo saem já regularmente modernas composições ao serviço da Fertagus, e dos comboios Alfa e Intercidades, as quais, atravessando a ponte, entregam os passageiros nas Estações de Metro de Sete Rios, Entrecampos, Roma e na própria “Gare do Oriente”. A poupança é múltipla.

Caem também por terra os planos do Dr. António Costa e do arquitecto Manuel Salgado, na Câmara Municipal de Lisboa, para os esquemas de circulação que a TTT induziria em Lisboa. A excelente escola Afonso Domingos em Chelas salva-se enfim da demolição anunciada pelo Ministério da Educação.

A estação de Entrecampos e o espaço livre da antiga Feira Popular identificam-se imediatamente como o futuro centro de origem para a ligação a Espanha e resto da Europa. A Sul do Tejo, por sua vez, nasce a possibilidade de reflexão sobre as oportunidades de desenvolvimento de centros empresariais e até de zonas habitacionais, turísticas e comerciais, nas proximidades do eixo Poceirão-Pinhal Novo, onde há espaço livre e acessível, em breve com ligação directa à rede ferroviária comunitária, e o aeroporto de Badajoz a 45 minutos de distância! O projecto de transportes do arco ribeirinho Sul ganha também nova acuidade. Em perspectiva estão assim investimentos razoáveis com ínfima participação do Estado. Olhem para o mapa por favor.

Frederico Brotas de Carvalho

sábado, setembro 18, 2010

Portugal: 1415-2015 (III)

Outra democracia, por favor!



Na pedagogia clarificadora de Rui Rodrigues, a situação financeira actual do país (que os intelectuais orgânicos da nomenclatura responsável pela segunda bancarrota da República não conseguem entender) é esta: Portugal está a endividar-se à razão de 2 pontes Vasco da Gama por mês, ou seja, 24 pontes por ano. Por sua vez as dívidas pública e privada acumuladas somam já qualquer coisa como 500 pontes Vasco da Gama! Em suma, só os juros anuais da nossa dívida conseguem comer toda a receita turística anual. Que acham que vai acontecer? Não será certamente o que a nossa alegre corja parlamentar e partidária anuncia. Vamos, pelo contrário, passar colectivamente pela maior humilhação nacional desde o Ultimato Inglês. Então como agora a culpa é quase toda das indecorosas elites que temos.
The direct consequences for Asia and Euroland: Successful accelerated decoupling or social chaos

…in 2011, China and Asia will have to prove that they have become entities capable of guaranteeing at least their own growth without relying on the United States and thus leading to growth in all the BRIC countries and Euroland in the same breath. Indeed the United States’ arrival in austerity will result in a sharp drop in exports to the US and, therefore, require a greatly increased consumption inside China, inside Asia and with the BRIC countries. Meanwhile Euroland’s entry into stagnation from the end of 2010 will face an intellectual challenge which consists of choosing to favour a new partnership with the BRIC countries, or sink into economic difficulties along with the United States and the United Kingdom. — Global Europe Anticipation Bulletin, GEAB 47, Setembro 2010.
O crescimento tímido de 2010 deveu-se essencialmente a estímulos governamentais de emergência, necessariamente efémeros e suportados pelo crescimento explosivo do endividamento público, bem como pela destruição do tecido social de dezenas de países. Em 2011, numa Europa previsivelmente estagnada, a sorte de um país como Portugal, que nada fez nos últimos dois anos para rever o seu modelo político e social, não poderia ser mais sombria.

O desemprego mundial ultrapassa os 200 milhões de pessoas. Só a China tem mais de 9 milhões de desempregados urbanos e 100 milhões de camponeses excedentários. O FMI estima que serão precisos 440 milhões de novos postos de trabalho se o crescimento populacional continuar ao ritmo actual. Portugal tem os mais elevados níveis de desemprego de sempre, que continuarão a aumentar, por duas razões: a economia portuguesa estará estagnada ou em recessão durante o ano de 2011; e a capacidade de absorção das centenas de milhar de emigrantes portugueses, por parte dos países de acolhimento, atingiu o limite. Ou seja, assistiremos, já a partir de 2011, ao regresso precipitado e acelerado de muitos milhares de compatriotas que, ao longo da última década, saíram do país, nomeadamente para a União Europeia.

Como se isto não bastasse, pela via fiscal, e pela prática dissimulada de uma política de juros desigual (1), aquilo que está em marcha é uma descomunal e impiedosa expropriação da poupança privada europeia e mundial.
Alemanha recusa-se a prolongar ajuda aos países em dificuldade

No final da reunião do Conselho Europeu, que hoje decorreu em Bruxelas, Angela Merkel disse aos jornalistas que deixou uma mensagem clara aos chefes de Governo dos 27: “Primeiro, a Alemanha não vai apoiar uma extensão das actuais ajudas [aos países em dificuldades]. Segundo, temos de trabalhar arduamente para definir as sanções e as lições a tirar desta crise”. A chanceler alemão exigiu um mecanismo permanente para combater a crise e substituir o pacote actual.  — Público, 16-09-2010.
 A Alemanha decidiu travar a criação de mais dinheiro virtual, pois não se esqueceu do tempo em que imprimia notas de mil milhões de marcos e mais. Para atingir este objectivo irá porém forçar os países sobre endividados a entrar nos eixos de uma economia financeiramente controlada.

Portugal vai chegar ao fim de 2010 completamente nas lonas. E em 2011, ano da reeleição da esfinge presidencial, seremos provavelmente colocados na unidade de cuidados intensivos do BCE, depois de escancararmos aos olhos do mundo as mentiras da nossa democracia degenerada. Muito provavelmente é isto mesmo que Passos de Coelho e José Sócrates querem, pelo que não me admiraria nada se ambos esticassem a corda na discussão e votação do Orçamento de Estado de 2011 — até partir.

Não gostaria de finalizar este artigo imputando todas as responsabilidades da actual situação à incompetência governativa, à incompetência parlamentar, e à incompetência partidária do regime. Há de facto realidades mundiais que os ultrapassam. Mas a irresponsabilidade manifesta da nomenclatura partidária que temos diminuiu e continua a diminuir as possibilidades de mitigação da crise. Com petróleo acima dos 60 dólares o barril, não há economia que resista. Nem a chinesa. Mas se continuarmos a votar na actual nomenclatura partidária, a queda será mais rápida, brutal e prolongada.

Warren Buffet anda a comprar caminhos de ferro. Como se compreende então a fúria pacóvia da classe política portuguesa contra os comboios? Quando andavam sobretudo de automóvel, só pensavam em autoestradas. Agora que passam a vida nos aviões, crêem que sem grandes aeroportos, mesmo vazios e ruinosos, como os estádios de futebol, lhes falta o status, e o país não progride. No entanto é fácil de perceber que o negócio está noutro lugar: no transporte de baixo custo. Foram as Low Cost, e não as patetices do actual e dos últimos ministros das obras públicas e transportes, que trouxeram alguma animação ao negócio aeroportuário. A easyJet e a Ryanair fizeram mais pelo turismo e pela economia portuguesas do que toda a turma socratina junta. Com o fim do petróleo barato teremos mesmo que mudar de vida e de paradigma de transportes. É assim tão difícil perceber isto?

São aliás estes detalhes que poderão fazer toda a diferença.


NOTAS
  1. 0,5% para o financiamento interbancário, 1% para os bancos europeus que se financiam no BCE, mas 2,28%, e até 28,9%, para quem quer comprar casa, ou necessita de recorrer a uma crédito pessoal.

segunda-feira, setembro 06, 2010

O grande roubo

ESTÃO A BRINCAR COM O FOGO!
Governo espera por estudos para fazer uma nova Lei dos Solos

O Governo vai basear-se em cinco estudos específicos para enquadrar uma eventual nova Lei dos Solos, destinada a travar a especulação imobiliária e a desordem territorial no país. O Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território quer lançar este mês a discussão pública sobre o assunto, mas não tem ainda uma proposta de lei concreta para pôr sobre a mesa. Será, antes, o princípio do debate, envolvendo também workshops técnicos, consultas a especialistas, entidades com interesse na matéria e também ex-governantes. — Público.

Então agora que a construção civil e a especulação imobiliária tocaram no tecto e implodiram é que este governo quer rever a lei dos solos?! Ou muito me engano ou está em preparação um plano de expropriação das zonas periurbanas do país em larga escala, através dum mecanismo de chantagem que é a reclassificação dos solos para construção urbana futura.

Como previ, depois de venderem os anéis, depois do saque fiscal em curso e que vai agravar-se, e antes de roerem os seus próprios dedos, os partidos e a burocracia da degenerada democracia portuguesa preparam-se para tomar de assalto a propriedade privada rural, para daí obter novas fontes de financiamento para os municípios. Pode ser o princípio duma guerra civil!

POST SCRIPTUM — gostava de saber o que é que o senhor Passos de Coelho e a rainha de Boliqueime têm a dizer sobre isto?

domingo, setembro 05, 2010

Agressores sexuais finalmente condenados



Pedofilia
entre a ditadura e a democracia há coisas que não mudaram

Em 1967 rebentou o escândalo sexual conhecido por Ballet Rose (ver artigo de José Maria Martins). Sete anos depois a ditadura caiu. Mas nem os Pides, nem boa parte dos protagonistas do regime, nem os pedófilos foram molestados. Até hoje!

O problema maior da pedofilia não se prende tanto com as práticas sexuais em si (embora façam delirar a populaça e os média), mas antes com a agressão sexual, com a violência física, por vezes extrema, sobre miúdos impotentes,  e com a chantagem económica sobre os mais fracos —levado a cabo por gente impune e acima de qualquer suspeita, sob o olhar conivente das polícias, dos tribunais, e dos governos.

A pedofilia andou escondida durante décadas, ou séculos, sob as saias do poder, religioso e laico. A exposição mediática recente tem pelo menos o mérito de traçar um risco de giz no chão. De um lado estão os cobardes, os amorais e os criminosos de sempre. Do outro, quem se indigna e exige perseguição e castigo dos criminosos. No meio fica uma classe político-partidária indigente que não merece o que lhe damos.

Portugal é um país falido, sobretudo no plano moral. Alguém cobrará os juros devidos. Não tenhamos dúvidas disso. E tal como disse Catalina Pestana, também eu mantenho a convicção de que Paulo Pedroso só não se sentou no banco dos réus porque foi protegido por boa parte da classe política portuguesa —para minha maior vergonha— de esquerda!

Documentário da TVI 
Relato da SIC sobre as tentativas de impedir a prisão de Paulo Pedroso

Rumos — 2

Falei na semana passada no enorme stock de habitações construídas, mais de 600.000, que em todo o país aguardam comprador, paralisando toda a cadeia da construção civil, com imediatas repercussões para as autarquias as quais se privam das taxas respectivas.

Qual a fundamentação para o país ter conseguido tão poderoso canal de financiamento da mais de 4.000.000 de fogos ao longo de 25 anos? Como se conseguiu construir e vender mais de 150.000 fogos anuais quando a população portuguesa está estabilizada? O ano passado já nasceram menos de 100.000 portugueses e já morreram mais do 100.000. Os programas de realojamento de bairros degradados e históricos absorveram certamente mais de 1.000.000 de fogos ao longo destes anos, mas concluíram a sua missão. O enorme êxodo dos novos licenciados e profissionais que ocorreu do interior para o litoral, Lisboa e Porto, também se pode considerar já estabilizado. Ao todo terão sido responsáveis por uma procura de cerca de 60.000 habitações por ano, talvez 1.500.000 ao todo. A politica de favorecimento estatal, municipal e bancário da segunda casa, para férias no Litoral, poderá ter sido responsável por mais uns 600.000 fogos. A elevada taxa de divórcios propiciou a entrada no mercado de mais um indeterminado número de fogos, sendo agora a tábua de salvação dos promotores.

Os centros históricos vão-se esvaziando, não se adaptando ao perfil da procura, enquanto crescem os centros periféricos. Agora que quase todas essas fileiras estão paralisadas, a construção sobreviverá se encontrar novos caminhos. As unidades de turismo anual ou sazonal poderão ser um sucesso em zonas de interesse lúdico cultural ou balneário. Tem-se falado muito no mercado da reabilitação urbana. É uma ilusão. Os altíssimos custos de construção (na reabilitação) e os recentes entraves normativos e legais fazem deste mercado um nicho insignificante e de rentabilidade duvidosa. A nossa economia sairá forçosamente da construção civil. Os actuais modelos de crescimento estão esgotados.

Frederico Brotas de Carvalho

terça-feira, agosto 31, 2010

Rumos — 1

NOTA PRÉVIA: este texto não é meu, mas sim de Frederico Brotas de Carvalho, um amigo com quem partilho há já alguns anos diálogos frutuosos sobre a crise portuguesa, os meandros da politiquice e as possíveis saídas para o bloqueamento do país. É pois com enorme prazer que aqui publicarei um conjunto de reflexões suas —sob o título “Rumos”— ao longo das próximas semanas. — O António Maria.

Muitas vezes interroguei o alto nível de vida que registávamos nas cidades. Exportamos menos do que importamos. Produzimos menos que consumimos. Se o modelo é desequilibrado qual o mecanismo que promove o seu equilíbrio e a alimentação dos circuitos de redistribuição?

Nos últimos 30 anos terão sido construídos e vendidos em Portugal mais de 4.000.000 de fogos com recurso ao crédito à habitação. Os 308 municípios através dos seus PDM’s aprovados e revistos viabilizaram 10.000.000 de fogos com cerca de 35.000.000 de camas para uma população que se sabia não iria aumentar até 2015.

A banca recorreu sistematicamente ao financiamento externo e hoje sabe-se que a dívida privada supera os 120% do PIB, ou os 200.000.000.000€.

Foi precisamente este canal de endividamento que assegurou o fluxo financeiro e os altos níveis de consumo nas áreas urbanas e que polarizou 80% dos portugueses num litoral desordenado.

Nascem e morrem aproximadamente 100.000 portugueses por ano. Sob um fluxo uniforme há um mercado avaliado em 60.000 novos fogos por ano. Contabilizam-se por vender mais de 600.000 fogos pelo lado do parque da oferta.

Significa isto que de uma forma mais ou menos adaptável teremos um stock de 10 anos de fogos por estrear. Toda a cadeia de promoção vai bloquear.

Qual era até agora o modelo de criação de riqueza?

Os municípios desagregavam terreno rural para terreno urbano, nos PDM’s, promovendo uma súbita multiplicação administrativa de valor de 1 para 30. O terrenos loteados eram vendidos com recurso ao crédito. Os construtores construíam também a crédito. Com lucros globais até 50% a propriedade horizontal era por fim vendida, com recurso a um ultimo crédito que cobria confortavelmente todos os precedentes. O que exportávamos em contrapartida? Hipotecas. Essa cadeia quebrou-se. Os municípios são já os primeiros a sentir brutalmente a paralisação do sector, não auferindo as taxas de urbanização. A seguir toda a sociedade vai sentir  o fecho deste canal. A implicações são imensas. Não esqueçamos que 85% do pão que comemos ao pequeno almoço é importado.

Frederico Brotas de Carvalho