People’s retirement savings are a convenient source of revenue for governments that don’t want to reduce spending or make privatizations. As most pension schemes in Europe are organised by the state, European ministers of finance have a facilitated access to the savings accumulated there, and it is only logical that they try to get a hold of this money for their own ends. In recent weeks I have noted five such attempts: Three situations concern private personal savings; two others refer to national funds.
Governos da Hungria, Bulgária, Polónia, Irlanda e França (!!) iniciaram um assalto sem precendentes às pensões de reformas dos seus países, entre outras coisas, para pagar dívidas de curto prazo dos respectivos dos governos e das suas imensas burocracias, salvar bancos falidos, nomeadamente públicos, e financiar os buracos dos próprios fundos de pensões e reformas, muitas destes em graves dificuldades, por terem andado a especular com juros, câmbios e derivativos financeiros, sem qualquer supervisão. É o descalabro anunciado.
Em Portugal os ensaios também já começaram: no tempo de Manuela Ferreira Leite, o fundo de pensões dos CTT emigrou para fossa comum do Estado, na era Sócrates, até ver, o fundo de pensões da empresa privada foi empandeirado para a fossa comum do Estado, e na Caixa Geral de Depósitos, o respectivo fundo de pensões comprou a própria sede da Caixa!
Que vão fazer os nossos burocratas parlamentares a este propósito? Tratar da vidinha deles, como sempre, enquanto as novas leis não chegam, ou tencionam discutir publicamente a destruição em curso do contrato social? Que diz o douto Louçã sobre isto? Que vai fazer ao seu PPR?
Que tal sugerir à funcionária do Prós e Contras um debate público urgente sobre esta matéria?
as três grandes prioridades de investimento chamam-se: ferrovia, eficiência energética e segurança alimentar
in Plan Estratégico Para El Impulso del Transporte Ferroviario De Mercancías En España, 14/09/2010 (PDF)
PS e PSD chegaram finalmente a acordo sobre as personalidades que irão coordenar o grupo de trabalho encarregado de reavaliar as Parcerias Público-Privadas (PPP): Guilherme de Oliveira Martins, mestre em ciências jurídico-económicas, independente próximo do Partido Socialista, e António Pinto Barbosa, professor de economia e fundador do PPD/PSD (1). Ambas as personalidades merecem grande respeito nas respectivas áreas profissionais, esperando-se que façam um trabalho tecnicamente competente e imune às pressões que sobre ambos pesarão enormemente, em particular, vindas do desmiolado e a caminho da falência Bloco Central do Betão — cuja miragem de salvação é o Novo Aeroporto de Lisboa, que não foi na Ota, como queriam, nem será em Alcochete, como querem e insistem todos os dias por todos os meios ao seu alcance. Nota importante: António Pinto Barbosa não é o irmão gémeo Manuel Pinto Barbosa, Presidente do Conselho Geral e de Supervisão da TAP!
Escrevi e repito que os nossos economistas têm grandes lacunas de informação em três domínios decisivos para o futuro do nosso país: energia, transportes e segurança estratégica —nomeadamente, territorial, marítima, hídrica e alimentar. Sem a frequência de seminários intensivos sobre estes temas correm o risco de falhar, como falharam estrondosamente até agora, nas previsões, nos modelos de desenvolvimento propostos, e nas consultadorias que prestaram.
Os casos Lusoponte, e aeromoscas de Beja —onde pontificaram as opiniões e propostas, respectivamente, de Joaquim Ferreira do Amaral e de Augusto Mateus, são a este título tristemente elucidativos: a ponte Vasco da Gama irá ser paga duas vezes pelos contribuintes, e o grande hub aeroportuário de Beja, de onde deveriam sair diariamente, segundo Augusto Mateus, toneladas de sardinhas —sim, sardinhas e carapaus!— para a União Europeia, está às moscas, provavelmente destinado a ser, no futuro, o parque de estacionamento para as aeronaves paradas da Portugália e da TAP que hoje atravancam as placas de estacionamento da Portela.
A grande pergunta a fazer, nas vésperas da entrada do Fundo Europeu de Estabilização Financeira e do FMI num país tecnicamente falido, é esta: se nos últimos dez anos, apesar do afluxo contínuo de avultadas verbas dos fundos de apoio comunitário, Portugal esteve praticamente estagnado, que poderemos esperar em matéria de crescimento numa conjuntura duplamente marcada pela diminuição drástica do apoio comunitário e pelo colapso financeiro em curso das economias cujo modelo de crescimento (virtual) assentou basicamente na desindustrialização, nas importações, no consumo desmesurado de energia, bens materiais e serviços, e no endividamento? A resposta só pode ser uma: nenhum crescimento, salvo se algum grau de proteccionismo regressar aos grandes espaços económicos e demográficos do planeta —à semelhança do que há muito sucede no Japão, e também na China.
A actual crise portuguesa deve ser vista, na realidade, como o ponto final do nosso modelo colonial de existência. Este modelo acabou de vez em 1974-75, mas os vícios por ele criados sobreviveram até hoje, nomeadamente na tipologia da nossa burguesia burocrática e palaciana, na presença desmesurada, paternalista e autoritária do Estado na sociedade (que as esquerdas marxistas reciclaram a seu favor), e na dependência sistemática do país e respectivas elites de uma qualquer árvore das patacas. O colapso do modelo colonial iniciado em 1415 foi progressivo. Começou com a independência do Brasil, teve outro grande abalo por ocasião da independência das possessões portuguesas na Índia, e culminou com a independência do resto do império entre 1974 e 1999. Cada uma destas perdas de território funcionou como epicentro de agudas crises económico-financeiras (1828, 1846-47, 1890-92, 1923, 1978, 1983), todas elas redundando, ao cabo de alguns anos, em graves crises de regime. O colapso financeiro de 2009-2011 terá como consequência inevitável o agudizar da crise de regime que já é patente, e a probabilidade de uma revolução institucional. O regime secular de autoritarismo burocrático, mediocridade técnica e institucional, incultura, clientelismo e dependência externa, perdeu os pilares sobre os quais assentou ao longo dos últimos seiscentos anos. Para sobreviver, Portugal precisa de se reinventar.
E precisa tanto mais de se reinventar quanto o resto do mundo se encontra também à beira de uma dolorosa metamorfose. Ninguém nos virá ajudar pelos lindos olhos que já não temos. Dependemos agora inteiramente de nós próprios para sair do buraco onde caímos.
O mundo, sobretudo o mundo desenvolvido e industrializado, está confrontado com três pontos de viragem potencialmente catastróficos:
o pico petrolífero,
o pico alimentar e
o pico do endividamento especulativo.
Resumindo: a produção de petróleo per capita decai desde 1970, a produção de cereais per capita começou a decair na década de 1980, e a bolha de derivados financeiros OTC, fruto de um modelo de crescimento especulativo pela via do consumo e do endividamento exponenciais, traduzia no final de 2009 um risco potencial de incumprimento de contratos de futuros equivalente a uns inimagináveis $615 trillions (615 biliões ou 615 milhões de milhões de dólares), quase 10x o PIB mundial (2).
A gravidade de cada uma das curvas exponenciais acima mencionadas é por si só evidente. Mas o pior é que duas delas —a curva da alimentação e a curva da especulação resultante da criação de dinheiro a partir de castelos no ar— decorrem directamente da descoberta, exploração, abundância e esgotamento a curto prazo dos principais hidrocarbonetos que alimentaram e continuam a alimentar a era industrial e a modernidade tal qual as conhecemos desde meados do século 19 —momento a partir do qual as máquinas começaram a ser alimentadas a carvão, electricidade e petróleo.
Vale a pena seguir o crash course de Chris Martensen sobre este tema...
As consequências do pico petrolífero têm um alcance potencialmente catastrófico para o mundo tal qual o conhecemos desde que Eça de Queirós escreveu A Cidade e as Serras (1892/1901). Teríamos mesmo que recuar aos tempos anteriores a 1830, quando pela primeira vez um caminho ferro e um comboio movido a vapor e alimentado a carvão ligaram duas cidades, Liverpool e Manchester, para imaginar o que poderá ser um futuro sem motores a vapor, ou de explosão, e um mundo sem electricidade, nem computadores, ou telemóveis. A humanidade poderá ver-se em breve imersa numa crise global de recursos sem precedentes. Para muitos analistas tal significará o fim de quase tudo o que hoje temos de barato e assumimos como dádivas naturais da civilização.
Antes, porém, do dilúvio, ou da grande seca anunciada, há coisas que as pessoas e os governos podem fazer para mitigar o inevitável. A primeira delas é não agravar, por falta de informação, estupidez ou ganância, os factores da crise sistémica do actual modelo civilizacional. No caso presente, e em Portugal, não agravar o nosso endividamento, não agravar a nossa dependência energética, e não agravar a nossa dependência alimentar.
Para não agravar, ou mesmo travar o crescimento exponencial do nosso endividamento público e privado, é preciso começar por redefinir as funções essenciais do Estado, aliviando a canga de burocratas e de burocracias que pesa sobre a sua eficiência, e sobre a viabilidade económica do país —nomeadamente na forma de tempo perdido e impostos assassinos (3). Neste ponto, diria que se não formos capazes de sensibilizar as lapas partidárias do regime, haverá que criar um movimento social contra os impostos e contra a burocracia, antes que estes inviabilizem definitivamente a independência nacional.
Para não agravar ainda mais a dependência energética do país teremos que fazer quatro coisas:
diminuir drasticamente a intensidade energética da nossa economia;
aumentar drasticamente a eficiência energética de indústrias, serviços, edifícios e comportamentos;
renacionalizar, pelo menos parcialmente, os recursos energéticos comuns, acabando ao mesmo tempo com os oligopólios que hoje impedem a sociedade civil de produzir e consumir em pequena escala energia fora das redes;
dar máxima prioridade ao transporte colectivo urbano, suburbano, interurbano e internacional alimentado por energia eléctrica produzida no país. As oportunidades de investimento neste sector estratégico são enormes e compensam largamente os planos condenados ao fracasso de retomar o business as usual na estafada economia baseada em combustíveis líquidos baratos (autoestradas, aeroportos e plataformas logísticas).
Para não agravar a nossa dependência alimentar, que acarreta por si só um agravamento automático da nossa dependência energética e do nosso endividamento (comercial, público e externo), é fundamental começar por definir um Plano Nacional de Segurança Alimentar, transparente e permanentemente aberto ao escrutínio democrático e discussão pública.
Sendo a área dos serviços aquela que previsivelmente será mais afectada pela escassez tripla de petróleo, dinheiro e alimentos, pois não tem grande coisa para dar em troca daquilo que materialmente é imprescindível à vida —comida, guarida e mobilidade física—, será fundamental desenvolver estratégias de regresso à produção! Sobretudo enquanto durar a actual aceleração dos processos de automação e robotização computacionais das prestações de serviços, num quadro já caracterizado pela impossibilidade de crescimento das dívidas soberanas e das cargas fiscais (cofres naturais da segurança social), tornar-se-à imprescindível religar os indivíduos e as comunidades à produção e transacção dos bens essenciais à vida.
A capacidade de produção alimentar em Portugal é limitada, mas ainda assim está longe de atingir o seu potencial. A propriedade rural encontra-se atomizada. Boa parte dos proprietários rurais vive e trabalha nas cidades, em grande medida por causa da revolução industrial e do desenvolvimento das cidades. Este período está, porém, a chegar ao fim. Em vez de se gastar inutilmente dinheiro público em Novas Oportunidades perdidas, talvez seja o momento de pensar onde melhor gastar os recursos financeiros que ainda vêm de Bruxelas. Por exemplo, lançando um programa nacional de agricultura biodinâmica e biológica, capaz de adaptar tecnologicamente os processos de cultivo e produção alimentar e florestal à escassez futura de adubos e pesticidas industriais (provenientes nomeadamente do gás natural e do petróleo), ao mesmo tempo que se especializa e confere competitividade cognitiva e social à agricultura, pecuária, piscicultura e silvicultura portuguesas. Estude-se, a este propósito o caso austríaco, para perceber até que ponto um país comunitário da Eurolândia pode abolir no seu espaço nacional todos os alimentos transgénicos e escolher uma via verde para a produção alimentar e conservação dos ecossistemas. Levar a segurança alimentar às cidades, e levar as cidades ao campo é todo um programa cujos impactos na mitigação dos constrangimentos que se seguirão ao fim do petróleo barato é demasiado grande para ser adiado. A inércia corporativa do regime tem que ser combatida e vencida, custe o que custar.
No início deste ano negro, o mais importante de tudo é evitar os jogos florais parlamentares e os teatros de sombras permanentemente instigados pelo governo, pelas oposições e pelos lóbis corporativos. Libertar a sociedade civil e salvar o país de uma morte súbita começa por aqui. O mais importante agora é discutir soluções.
NOTAS
António Pinto Barbosa Fiscal das contas públicas certificou irregularidades no BPP
05.01.2011 - 17:04 Por Cristina Ferreira. Público.
O presidente do grupo de trabalho para criar a comissão encarregue de fiscalizar as contas públicas, António Pinto Barbosa, certificou durante cerca de dez anos as contas do Banco Privado Português, que foi intervencionado no final de 2008 pelo Banco de Portugal, para evitar a sua insolvência imediata.
Mas haverá alguém que se salve deste naufrágio? — OAM
Se em vez de se considerar o valor nocional OTC dos contratos de derivados, apenas se tiver em conta o respectivo valor bruto de mercado, ou seja a expectativa razoável de ganho, ainda assim está em jogo um volume de apostas especulativas sobre taxas de juros, desvalorizações cambiais, e outros activos virtuais, equivalente a 1/3 do PIB mundial, ou seja, mais ou menos 17 biliões de euros (17*10^12€).
A "esquerda" monocórdica tem a mania de invocar a fuga aos impostos como argumento favorável ao aumento da carga fiscal. Está bom de ver que o argumento é idiota. Mas insistem, não querendo entender que se se combinar uma menor carga fiscal com uma vigilância e penalização forte aos infractores (começando pelos de cima) os resultados seriam bem melhores dos que os conseguidos com o terrorismo fiscal actualmente em curso. Um burro morto não paga impostos!
o melhor remédio para a ressaca desta madrugada Exclusivo: CHICOTE
Produzida em São Petersburgo, uma das melhores cervejas do planeta.
Há várias maneiras de curar uma ressaca de fim de ano —a pior de todas é parar de beber!
Os ingleses gostam muito de curar os violinos partidos que chocalham algures na cavidade craniana, e o travo a bilhetes de lotaria na boca, tomando um pequeno almoço líquido, à base de cerveja preta com dois ovos crus inteiros, ambos mergulhados num copo de meio litro bem medido (o chamado pinto). Ou então curam a monumental bebedeira com o clássico Bloody Mary. Os mediterrânicos sofisticados procuram calmamente uma esplanada e pedem um Campari com soda.
Opções que a CHICOTE não aprecia particularmente, mas compreende, passam por beber três Coca-Colas seguidas num copo sempre cheio de gelo, ou uma garrafa inteira de litro e meio de água Fastio ou Carvalhelhos gelada, devagarinho.
Para quem não se preocupa demasiado com o preço das coisas, sobretudo no day-after de uma passagem de ano, e está hospedado num hotel de 4 ou 5 estrelas, a receita chama-se Black Velvet: um longo copo gelado para dentro do qual deslizam a meias um Krug Brut Champagne Grande Cuvée 2005 e uma Guinness.
Mas a escolha urbana da CHICOTE vai para o que os ingleses, especialistas em tudo o que diz respeito ao álcool, chamam the Hair of the Dog that Bit You ("um pelo do que cão que te mordeu" — outra maneira de ver o problema teórico da ressaca). Basicamente a receia é esta: volta a beber um pouco do que transformou a tua cabeça num disco voador: um copito de vinho branco ou tinto de muito boa qualidade, ou uma cerveja estupidamente gelada, mas que seja uma cerveja premium, muito saborosa, leve, sem o rabo amargo do lúpulo — em suma, uma Baltika no. 7, criada nas famosas fábricas de cerveja de São Petersburgo, mas que faz hoje parte do império de 304 marcas da dinamarquesa Carlsberg. Para encontrar esta cerveja em Portugal, basta procurar uma loja de produtos eslavos, nomeadamente russos. A loja ucraniana situada na estação de comboios de Carcavelos é um dos pontos de abastecimento regular da CHICOTE. Já por lá passámos hoje, claro!
O melhor comentário (rubrica diária)
“Não me interessa se o sr. primeiro ministro não desiste, não arreda pé, ou se mantêm firme. A mim interessa saber se ele é capaz de ser timoneiro desta nau de 10 milhões de almas? Se é capaz de escolher os melhores da tripulação de 4 milhões para servir o país? Se é capaz de afastar os que andam envolvidos em corrupções? Se é capaz de escolher quem melhore o sistema de justiça? Ou de decidir que rumo vamos escolher? Será o mar, a investigação e as PME's ou os empréstimos atrás de empréstimos? Será capaz de promover a redução do número de deputados? Será capaz de reduzir os viciados nos subsídios? Será capaz de pôr os ricos a pagar em vez de quem precisa de um subsídio de emprego? Será capaz de falar com a oposição e com os parceiros sociais? É que nesta nau precisamos de todos e não se vai lá sem se ouvir os outros.” — por António Gonçalves
A dívida externa portuguesa supera os 200% do PIB! E não os 100% que não sei quantos economistas vêm lançando para o ar mediático nas últimas semanas, depois de terem tolerado durante anos a conversa fiada dos 3% em volta do défice orçamental, como se este fosse o maior problema estrutural do país. Não é! — inO garrote da dívida externa portuguesa, O António Maria (19-11-2008).
Uma das possíveis causas da nossa desgraça económica deriva do simples mas inacreditável facto de a esmagadora maioria dos economistas portugueses não perceberem patavina de energia, agricultura, pescas, pecuária, transportes, e mal saberem o que é uma empresa, quanto mais pagar salários da sua imaginação e suor! Outro aspecto igualmente grave da sua cada vez mais evidente ignorância, é a falta de conhecimento histórico analítico das crises cíclicas do Capitalismo (ao que parece História, Cultura e Arte são disciplinas que nunca viram ao longo das suas burocráticas vidas). Mas pior ainda: sofrem, quase todos, de uma escandalosa iliteracia terminológica! Dois exemplos:
Apesar de aqui termos chamado a atenção para a dimensão real e gravidade da dívida externa portuguesa em 4 de Novembro de 2008 (A cenoura e o pau do Bloco Central), 19 de Novembro de 2008 (O garrote da dívida externa portuguesa), e no dia 10 de Dezembro do mesmo ano (Economistas lentos), chamando a atenção para a falácia da chamada "dívida externa líquida", só agora, no suplemento de economia do Expresso de ontem, o reputado economista Daniel Bessa reconhece que, afinal, o que importa reter é mesmo a dimensão colossal da nossa dívida externa bruta — a qual, segundo números do Banco de Portugal que consultou recentemente, e que se referem a 30 de Setembro último, apontam para qualquer coisa como 294% do PIB. Quando chamei a atenção para esta catástrofe iminente, em 19 de Novembro de 2008, a percentagem era de 200% — ou seja, em apenas dois anos (entre Junho de 2008 e Setembro de 2010) a dívida externa portuguesa passou de 200 para 294% do PIB. A isto chama-se crescimento exponencial. Sabem o que é? Ora vejam o vídeo que incluí acima, do excelente crash course de Chris Martenson.
Como se esta manifestação de iliteracia económica não fosse já de si inadmissível, acresce a confusão que Daniel Bessa e uma parte substancial de economistas, comentadores económicos, ministros e jornalistas, continuam a fazer entre milhares de milhões, bilhões e biliões!
Na coluna citada do Expresso desta semana Daniel Bessa confunde sistematicamente milhares de milhões de euros com biliões de euros. A confusão é grave. Pois um bilião de euros são um milhão de milhões de euros, i.e. 10E12€, ou 10^12€, ou 1 000 000 000 000€, quer dizer, mil milhões + novecentos mil milhões de euros! Já agora aproveito para recomendar um pequeno artigo sobre esta confusão, publicado recentemente pelo Jornal de Negócios.
Colocando os números no sítio certo, é então assim:
devemos ao exterior 505 mil milhões de euros (294% do PIB), entre dívidas comerciais, empréstimos contraídos no estrangeiro e investimento estrangeiro realizado no nosso país (por exemplo, espanhol e alemão), que espera naturalmente retorno e ganho;
o estrangeiro, por sua vez, deve-nos, entre dívida comercial, empréstimos contraídos em Portugal e investimento português no estrangeiro (por exemplo na falida Irlanda), 325 mil milhões de euros;
a posição líquida da dívida externa portuguesa é assim de 180 mil milhões de euros, ou seja, 105% do PIB (na realidade, se contarmos com as dívidas do sector empresarial do Estado, empresas regionais e municipais, e um longo etc., será bem maior!)
Este exemplo de dupla iliteracia, de que padece também Luís Campos e Cunha, que se passou recentemente com armas e bagagens do rosa socratinta para a laranjada cavaquista, não pode deixar de preocupar seriamente o vulgar cidadão, como eu, que tende a pensar apenas na corrupção como causa de todos os nossos males, esquecendo que, afinal, a ignorância oceânica dos nossos economistas pode ser uma causa bem maior do próximo grande colapso da Lusitânia.
Agora é preciso limpar os cacos, resistir ao assalto fiscal e à destruição de serviços públicos essenciais, bem como controlar os bancos e colocar as burocracias partidárias na ordem
"We propose the creation of a harmonious economic community stretching from Lisbon to Vladivostok." — Vladimir Putin, ao Süddeutsche Zeitung (ler artigo no Spiegel Online de 25-11-2010)
A resposta à ofensiva das moedas falidas do eixo anglo-saxónico (EUA-Inglaterra) contra o euro, na tentativa desesperada de impedir o abandono crescente do dólar como moeda de reserva mundial, parece estar em curso de forma rápida e eficaz, embora os radares da imprensa convencional captem com dificuldade e lamentável atraso esta realidade subtil mas de importância decisiva para os deslocamentos em curso das placas tectónicas do poder mundial.
Por um lado, a SCO (Shanghai Cooperation Organization) tornou-se, de 2001 para cá (lembram-se de 2001?), numa poderosa aliança de estados euro-asiáticos. Por outro, a China começou a usar a sua moeda nas trocas internacionais com países como a Argentina, e acaba de acordar com a Rússia o abandono progressivo da divisa americana nas transacções entre estas duas potências económicas e nucleares mundiais. Esta tendência, cujo anúncio prematuro por Saddam Hussein lhe viria a custar a vida e a segunda grande invasão do Iraque pelos Estados Unidos e Inglaterra, foi retomada em Novembro passado por uma ofensiva diplomática sem precedentes de Vladimir Putin, tendo por alvo directo a Alemanha de Angela Merkel, mas visando obviamente um cenário muito mais amplo e particularmente atractivo para a União Europeia no momento em que esta enfrenta um ataque traiçoeiro e sem precedentes de Wall Street e Londres contra a estabilidade e integridade do euro. Mas mais: os emergentes BRIC, actualmente presididos pela China, acabam de incorporar formalmente no seu seio a África do Sul, transformando-se em BRICS: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul (South Africa), na mesma semana em que sete países do Leste Europeu (1) anunciam a sua vontade de entrar na Eurolândia, apesar da crise (ou por causa dela...) Por fim, como que a provar a sabedoria de quem foge da nota verde, os dados mais recentes da economia dos USA, nomeadamente sobre a queda imparável dos preços do imobiliário, são de deixar os cabelos em pé (2).
Mapa da área de influência da nova aliança estratégica promovida pela China
As economias do Ocidente europeu e norte-americano estão sobre endividadas, quer no que se refere às respectivas dívidas externas, quer no que respeita às respectivas dívidas públicas. Mas o mesmo é ainda mais verdade para o Japão —onde a deflação continua a fazer vítimas, nomeadamente entre os pensionistas (3)—, não deixando de ser verdade também para muitos outros países: Austrália, Israel, Sudão, Líbano, etc. Ou seja, teremos que procurar a causa deste endividamento global em algo de mais fundamental do que as divergências —aliás praticamente inexistentes— entre sociais-democratas e neoliberais. Todos têm sido neo-keynesianos à sua maneira desde a crise petrolífera de 1973 —uns empolando mais as burocracias de Estado, partidárias e municipais, outros transformando as economias em gigantescos jogos de Monopólio, onde o dinheiro é grátis e não custa praticamente nada a fabricar (pois aflui aos mercados em formatos puramente virtuais por actos de magia electrónica e administrativa!) Em ambos os casos a receita é, por assim dizer, keynesiana: trata-se de inventar trabalho e consumo onde não existe!
Há dois factos até agora não refutados que poderão fazer alguma luz sobre a magnitude e sincronia da actual crise sistémica do Capitalismo:
a produção de petróleo per capita tem vindo a decair consistentemente desde 1970,
e a produção de cereais per capita começou igualmente a decair de forma aparentemente irreversível desde 1980.
Outro ponto a ter em conta é o fim objectivo do colonialismo e do imperialismo ocidentais, que embora tenha começado a desaparecer lentamente no longínquo ano de 1823, por imposição da célebre Doutrina Monroe, que retirou progressivamente o "novo mundo" do domínio colonial europeu, acelerou extraordinariamente com os processos de descolonização na Ásia e em África depois da Segunda Guerra Mundial. A verdade é que este processo de implosão do imperialismo ultramarino iniciado pela Europa em 1415 (com a conquista de Ceuta por portugueses, galegos, biscainhos e ingleses), só agora está a chegar ao fim. Podemos ler estes sinais nas sucessivas derrotas da Europa e da América na Indochina, em África, e mais recentemente no Iraque e no Afeganistão. Podemos entender o alcance destes sinais desde 1960, quando os principais países produtores de petróleo formaram a OPEP, excluindo expressamente do seu seio grandes produtores com eram e ainda são os Estados Unidos e o Canadá. Podemos, enfim, ter a certeza de que algo de fundamental mudou, quando os países emergentes dos BRICS começaram a juntar os trapos, conscientes da sua importância global enquanto detentores de vastos territórios ricos em recursos naturais e humanos.
De um lado, temos a velha Europa, a parte rica da América do Norte (EUA e Canadá), e o Japão, industrializados, urbanizados, e devoradores insaciáveis de recursos. Do outro, uma imensa maioria populacional pobre, pouco industrializada, pouco e mal urbanizada, e com acesso limitado às matérias-primas, fontes de energia e bens de consumo, vivendo paradoxalmente em territórios imensos, onde se encontra boa parte dos recursos vitais para a sobrevivência do modelo de desenvolvimento e crescimento criado e desenvolvido pelas antigas potências imperiais: energia, minérios, recursos alimentares e mão de obra barata.
Era uma questão de tempo até que o mapa da divisão internacional do trabalho e do poder mudasse de geografia e de mãos. E é o que vem acontecendo de forma clara desde 1971, ano em que o presidente americano Richard Nixon descolou a divisa americana do ouro, pondo-a a flutuar num reino de arbitrariedade cambial, cujo fim negro se aproxima agora, perigosamente, do fim. O ataque indecente e traiçoeiro dos piratas de Wall Street e da City londrina contra o euro, mais não tem sido do que um último e lamentável episódio demonstrativo do que pode fazer um sistema fiduciário técnica e moralmente falido, entregue à ganância e ao crime, quando estrebucha.
China, Rússia e boa parte dos países árabes estão fartos do dólar e dos americanos. Decidiram por isso apostar na moeda única europeia. É pois provável que não deixem cair o Euro, apesar de todas as pressões e do preço que tiverem que pagar por tal decisão estratégica. Os leilões de dívida soberana que ocorrerão na Europa ao longo de todo o ano de 2011 vão ser o verdadeiro teste de esforço à nova ordem económica e financeira mundial prestes nascer.
Curiosamente, Putin, líder de facto de um imenso país despovoado e a caminho de uma perigosa depressão demográfica, já terá percebido que a China é um aliado de circunstância. Tornar pois possível a grande Europa de Lisboa a Vladivostoque é agora o grande desígnio "secreto" da Rússia (4), que os portugueses deverão acarinhar com o mesmo entusiasmo que deverão colocar na rápida entrada da Turquia numa Eurolândia que tem tudo a ganhar com a sua abertura a Leste. Uma nova Europa com mil milhões de habitantes e uma longa história cultural poderá fazer a diferença que falta na recomposição planetária dos equilíbrios entre as grandes regiões humanizadas. E no fim, Portugal até poderá deixar de estar na periferia —se souber transformar-se numa pequena mas importante potência diplomática mundial. Bom ano, Portugueses!
REFERÊNCIAS
A V.O. de Mark Blyth on Austerity, encontra-se acessível na Videoteca deste blogue, ou no portal Vimeo.
NOTAS
"Sept pays candidats pour rejoindre le club. Par Fabrice Nodé-Langlois". Le Figaro (27/12/2010)
"Investors Attempting to Dump Bonds Push Bid Index Near Record: Muni Credit", By Brendan A. McGrail, Bloomberg, Dec 27, 2010.
ROBERT SHILLER: "If House Prices Keep Falling This Fast, The Economy Is Screwed", Business Insider, Dec 29, 2010.
Japan to cut pension benefits amid deflation. Japan Today, Tuesday 21st Dec, 08:18 AM JST
Sobre isto mesmo escrevemos, a pretexto da cimeira Europa-Rússia celebrada durante a presidência portuguesa da UE em Lisboa, em Outubro de 2007, o seguinte:
A cimeira Europa-Rússia que hoje tem lugar em Portugal, no âmbito da presidência portuguesa da União Europeia, na conjuntura explosiva que o mundo está a atravessar, tem uma importância crucial para o futuro imediato do próprio projecto europeu. Ou a Europa descola diplomaticamente da América e defende os seus interesses regionais de forma inteligente e clara, ou permanece atrelada às manobras inglesas (e agora também do garnisé francês), deixando os proto-fascistas da Casa Branca conduzirem o planeta para uma III Guerra Mundial. Mesmo que limitada, mesmo que não alastre imediatamente a todo o planeta, uma guerra de mini-nukes (contra o Irão, por exemplo) levará necessariamente a um novo Tratado de Tordesilhas, desta vez entre os EUA e a Rússia-China, por cima dos escombros materiais e ideológicos de uma Europa decapitada de qualquer protagonismo nos próximos duzentos anos. O contrário desta possibilidade passa pela existência de uma terceira posição estratégica independente, protagonizada pela Europa, em nome da racionalidade, da distensão e da cooperação mundial. Não é assim tão difícil. — in "Rússia, Vladimir Putin, um novo príncipe" (O António Maria, 25-10-2007.)