segunda-feira, fevereiro 08, 2016

Grandes devedores do BES

Gráfico elaborado pelo Expresso (certamente incompleto


No top25 dos devedores do BES estão: Mota Engil/Martifer (944  M€), Mello/Brisa (618 M€), Andrade Gutierrez (346 M€), Ascendi (516 M€), Tecnovia (283 M€), Teixeira Duarte (269 M€), Grupo Lena (229 M€), José Guilherme (223 M€), OPWAY (190 M€)...

O que têm estas empresas em comum? Uma gigantesca bolha imobiliária, e a base financeira especulativa de um regime que continua a desfazer-se dia a dia.

E da TAP, não consta nada?

quinta-feira, fevereiro 04, 2016

O próximo terramoto financeiro



Portugal não é seguramente a maior dor de cabeça da Alemanha!


O mundo financeiro global caminha para um reset, voluntário ou involuntário. Em ambos os casos catastrófico. Por algum motivo o FED desistiu do tightening, e o BCE decidiu aumentar a diarreia moneária, a que chama alívio quantitativo, em janeiro último, além da aplicação de taxas de juro negativas (Bloomberg).

O problema de fundo é este: assumiram-se e contrataram-se responsabilidades futuras para as quais não haverá dinheiro, na medida em que este depende de uma riqueza ainda por criar, que não será criada na dimensão estimada e inscrita na tinta invisível dos contratos de futuros, de que as promessas de pensões e as rentabilidades de astronómicos fundos de investimento, boa parte dos quais especulativos, são a maior dor de cabeça que poderemos imaginar.

"These Are Extremely Poor Results": Deutsche Bank Reports Titanic $7 Billion Annual Loss
Zero Hedge. Submitted by Tyler Durden on 01/21/2016 14:35 -0400

When it comes to picking a poster child for everything that’s wrong with Wall Street and the financial industry in general, it’s sometimes difficult to decide just who gets the blue ribbon for “most nefarious.”

Indeed, since 2008 we’ve learned that virtually every systemically important financial institution on the face of the planet has at one time or another engaged in some manner of chicanery be it the manipulation of the world’s most important benchmark rates, the peddling of worthless mortgage bonds, or the rigging of FX markets.

Having said all of that, Deutsche Bank may well qualify as the institution that “best” exemplifies the banking industry’s penchant for greed, corruption, and general malfeasance.

From rate rigging to book cooking to deplorable HR procedures, the German lender has it all and last summer, the bank showed co-CEOs Anshu Jain and Jürgen Fitschen the door amid shareholder pressure to reform the corporate culture and improve performance.

To be sure, new CEO John Cryan has his hands full.

The bank is saddled with mountainous legacy litigation and faces an uphill battle to streamline operations. Back in October, Cryan announced that Deutsche would cut 35,000 positions and exit 10 countries as part of a sweeping overhaul.

Oh, and Cryan also preannounced a massive loss and subsequently scrapped the dividend.

On Thursday, we got the latest bad news out of Deutsche as Cryan reported what he called “sobering” results for 2015. In short, the bank is staring down a net loss of €6.7 billion for the year, the first annual loss since 2008. The shares plunged.

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quarta-feira, fevereiro 03, 2016

A falácia One-off do PS

João Galamba, deputado do PS

Qual é a falácia contida nesta frase do deputado João Galamba, do Partido Socialista?

“se os cortes dos salários dos funcionários públicos e a sobretaxa eram medidas temporárias, então não deviam ter contado para redução do défice estrutural quando foram tomadas e, por essa razão, também não devem contar para défice estrutural quando são revertidas”.— in João Galamba (Facebook)/Observador.
Os cortes, na realidade, não foram medidas temporárias, quando consideradas do ponto de vista orçamental (e de Bruxelas), ainda que o tenham sido quando vistas na ótica dos atingidos. Logo, os cortes e a sobretaxa foram mesmo medidas estruturais, tendo por isso contado para o défice.

Onde está, então, a falácia do Governo?

Nisto: é que os cortes e a sobretaxa só poderão extinguir-se quando o seu impacto orçamental for substituído por outras medidas estruturais com o mesmo impacto positivo no défice.

Ora como o Governo se limita a revogar as citadas medidas sem substitui-las por outras de idêntico impacto positivo no défice, as que ora propõe no esboço orçamental só poderão mesmo ser consideradas medidas estruturais, com impacto negativo no défice!!!

Capiche?

segunda-feira, janeiro 25, 2016

Marcelo: o Povo é quem mais ordena

Marcelo discursa depois da vitória.
Foto: Miguel Manso/ Público (pormenor)

As esquerdas bem têm que meter a viola do seu triunfalismo de secretaria no saco


António Costa deu mais um sinal da sua falta de caráter. Primeiro, furtando-se a assumir a derrota eleitoral do PS, de que é secretário-geral, depois, vindo falar imediatamente após o discurso do novo presidente para lhe recordar as abstenções, desvalorizando desta forma cínica a vitória do candidato de centro-direita. A verdade é que Marcelo foi eleito, António Costa, não!

Os resultados são inequívocos:

  • Marcelo superou em mais de 170 mil votos o resultado de Cavaco em 2011
  • Marcelo ganhou em todos os distritos do país, Alentejo incluído.
  • Marcelo ultrapassou Nóvoa em mais de um milhão de votos
  • Marcelo superou em mais de 650 mil votos o resultado do PS em 2015
  • O PS (Nóvoa e Belém) perdeu quase 500 mil votos para Marcelo e demais candidatos
  • Marcelo superou em mais de 300 mil votos o resultado acumulado do PSD+CDS+PPM em 2015
  • O Bloco (Marisa) perdeu mais de 80 mil votos para Marcelo e demais candidatos
  • Edgar (PCP-PEV) perdeu mais de 260 mil votos para Marcelo e demais candidatos
A indigência de algum jornalismo entristece-me. Por sua vez o regresso em força das agências de comunicação e dos agentes partidários de serviço é um mau sinal.

sábado, janeiro 23, 2016

O embuste orçamental de 2016

Mário Centeno, ministro das finanças

Mário Centeno baralhou e deu de novo as cartas da austeridade


A única coisa que vai crescer perigosamente em 2016—2019, se este governo não mudar de rumo, ou não for substituído, é a nossa exposição à irresponsabilidade populista da geringonça das esquerdas.

Quatro linhas de crítica a este esboço de orçamento:

  1. O PIB não vai crescer 2,1% em 2016, mas entre 1,0% e 1,7%.
  2. O Estado vai emitir 71,1 mil milhões de euros de dívida no período 2016-2019, em vez  dos 59 mil milhões previstos em setembro. Ou seja, mais 12,1 mil milhões de euros.
  3. Na antecipação do pagamento da dívida ao FMI, que o anterior governo programou saldar até 2017, Mário Centeno terá dado indicações ao IGCP para pagar, de 2016 a 2019, menos 6,6 mil milhões de euros do que estava previsto, empurrando esta responsabilidade para lá de 2019.
  4. O reembolso da dívida em 2016 será inferior em 400 milhões de euros do que o anteriormente provisto.

OE 2016 versus OE 2015

Défice: 2,6% [-0,4 pp]
Dívida pública: 126% [-2,7 pp]
Crescimento: 2,1% [sobretudo por via das exportações]
PIB potencial: 0,5% [0,1% em 2015 ; -0,4% em 2014]
Hiato do produto [PIB real - PIB potencial; en.: output gap]: -0,9% [-2,4% em 2015]
Remuneração por trabalhador: +2,1% [sobretudo por efeito dos aumentos do SMN e dos vencimentos nas administrações públicas]*
Investimento público: +4% [Portugal 2020]
Consumo privado: 2,6% [igual a 2015]
Consumo público: 0,0% [recua face a 2015: 0,2%]
Exportações: 4,9% [recuam 1% face a 2015: 5,9%]
Importações: 5,9% [recuam 1,6% face a 2015: 7,6%]
Procura interna: 2,4% [cresce 0,2% face a 2015: 2,2%]
Procura externa líquida (exportações-importações]: melhora de -0,7% para -0,3%

* No privado, pelo contrário, haverá contenção salarial e menor custo unitário por unidade de PIB. É assim que traduzimos esta frase sibilina de Mário Centeno: "No setor privado, a moderação salarial e a evolução positiva da produtividade, permitirão que os custos unitários do trabalho evoluam em linha com os dos principais parceiros comerciais, mantendo a competitividade das exportações nacionais."]

Outra asserção sibilina: "O Plano Orçamental apresenta uma saudável recomposição das receitas fiscais com a diminuição do peso dos impostos diretos, cuja receita diminui 3,4%, e aumento de 5,8% do peso dos impostos indiretos." Os impostos indiretos atingem sobretudo a aquisição de bens e serviços, ou seja, o consumo conspícuo (fiscalidade saudável), mas também os fatores de produção como o gasóleo e demais produtos petrolíferos, eletricidade, farinhas, circulação de pessoas, bens e serviços, etc. (ou seja, uma fiscalidade parasitária que atrofia o PIB potencial e a competitividade externa da economia). Já os impostos diretos, além de mais transparentes, podem gerar maior justiça fiscal e eficácia estratégica na economia.



source: tradingeconomics.com


Portugal GDP Annual Growth Rate  Forecast 2016-2020
GDP Annual Growth Rate in Portugal is expected to be 1.40 percent by the end of this quarter, according to Trading Economics global macro models and analysts expectations. Looking forward, we estimate GDP Annual Growth Rate in Portugal to stand at 1.02 in 12 months time. In the long-term, the Portugal GDP Annual Growth Rate is projected to trend around 1.27 percent in 2020, according to our econometric models.

terça-feira, janeiro 12, 2016

Calote ou restruturação suave?

Christine Lagarde
Foto: AFP/ Getty images

Os principais credores institucionais levam Portugal ao colo


Bruxelas aprova por mais seis meses regime português de apoio à banca 
Correio da Manhã/Lusa, 12.01.2016  11:23 
A Comissão Europeia voltou hoje a prolongar, por mais seis meses e até 30 de junho, o regime excecional de apoio às instituições financeiras em Portugal, criado há quase oito anos devido à crise. Desde a sua criação, em outubro de 2008, a medida de ajuda à banca foi prolongada várias vezes, a última das quais a 22 de julho de 2015, tendo agora sido prorrogada até 30 de junho próximo, anunciou o executivo comunitário. Em comunicado, a Comissão Europeia considera que o regime se enquadra nas ajudas de Estado a instituições bancárias devido à crise e que a extensão da medida está bem dirigida, proporcionada e limitada no tempo e no seu raio de ação. 
FMI: dívida pública deveria ter sido reestruturada 
Observador, 20/12/2015, 11:03 
O Fundo Monetário Internacional (FMI) assumiu, num relatório divulgado durante esta semana, que os programas de ajustamento implementados pela troika nos últimos sete anos em países como Portugal, tiveram várias falhas. No caso português, a principal falha apontada é o facto de não se ter considerado a possibilidade de uma restruturação da dívida pública.
FMI admite que programa de ajustamento pode ter aumentado dívida acima do esperado  
LUSA, 16 de dezembro de 2015, às 21:20 
Num relatório de avaliação de programas de resgate financeiro em 27 países iniciados entre 2008 e 2013 divulgado hoje, o Fundo Monetário Internacional (FMI) afirma que “o efeito de contração da consolidação orçamental na procura pode ter contribuído, com outros fatores, para aumentar o rácio de dívida pública face ao PIB [Produto Interno Bruto] mais do que o esperado no curto prazo”. 
Esse é o caso de Portugal, um dos países analisados neste relatório, indicando o Fundo que “esta tendência foi exacerbada devido a custos de recapitalização da banca”, bem como “da reclassificação da dívida de empresas públicas que estavam anteriormente fora do perímetro das administrações públicas”. 
BCE anuncia programa alargado de aquisição de ativos
BCE, 22 de janeiro de 2015

O BCE alarga as aquisições a obrigações emitidas por administrações centrais da área do euro, organismos e instituições europeias. 
O valor combinado mensal das aquisições de ativos ascenderá a €60 mil milhões. 
As aquisições realizar-se-ão, pelo menos, até setembro de 2016. 
O programa foi concebido para cumprimento do mandato de manutenção da estabilidade de preços. 
O Conselho do Banco Central Europeu (BCE) anunciou hoje um programa de aquisição de ativos de âmbito alargado, o qual visa assegurar o cumprimento do mandato do BCE de manter a estabilidade de preços e implica a adição de um programa de aquisição de obrigações de dívida pública aos já existentes programas de aquisição de ativos do setor privado, com vista a fazer face aos riscos de um período demasiado prolongado de inflação baixa. 
O Conselho do BCE tomou esta decisão perante uma situação em que a maioria dos indicadores da inflação observada e esperada na área do euro apresentava uma tendência para mínimos históricos. Como potenciais efeitos de segunda ordem na fixação de salários e preços ameaçavam afetar negativamente a evolução dos preços no médio prazo, a situação exigia uma resposta vigorosa em termos de política monetária. 

A restruturação suave da dívida portuguesa soma e segue.

Desde 2012 que Christine Lagarde e Olivier Blanchard (1) (2) vêm reconhecendo erros na política de austeridade aplicada ao seus sócios, nomeadamente a Portugal. Talvez por isto o FMI acabou por aceitar sucessivas trocas de dívida cara por dívida barata e alongamentos nas maturidades, propostos pelos gestores da dívida portuguesa.

De algum modo esta correção resulta do murro na mesa dado por Mario Draghi em 24 de julho de 2012 numa aparente declaração de guerra contra os grandes especuladores, sobretudo americanos, que têm atacado o euro:

‘Within our mandate, the ECB is ready to do whatever it takes to preserve the euro. And believe me, it will be enough.’/ ECB

Em 22 de janeiro de 2015 o BCE, depois de baixar sucessivamente a taxa de juro de referência, anunciou um programa alargado de aquisição de ativos, condição sine qua non para países como Portugal continuarem a aceder aos mercados da dívida soberana em condições sustentáveis. Já não bastavam os juros negativos introduzidos pelo BCE em 11 de junho de 2014!

O que não deixa de ser muito engraçado é o silêncio dos nossos macro-economistas. Ressaltam como especialmente patéticos os silêncios do PS, do PCP e do Bloco, nomeadamente os silêncios de Mário Centeno, de Eugénio Rosa, e de Mariana Mortágua. Engoliram mais um sapo, foi?

A verdade é que este enorme alívio dado pelo FMI, mas também pela Comissão Europeia e pelo BCE, ao governo de António Costa, um governo, recorde-se, suportado pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda sempre que for conveniente aumentar a despesa pública ou os impostos, e pelo PSD sempre que for preciso forçar os contribuintes a engolirem elefantes bancários, cria todas as condições para, talvez pela última vez, acertarmos o passo com as nossas capacidade produtivas e riqueza realmente acumulada.

Daqui ao Orçamento 2016, e deste até ao fim da legislatura, nenhum partido com assento parlamentar poderá queixar-se da União Europeia, nem do FMI para desculpar erros próprios, ou a mais do que provável prossecução aventureira de receitas neo-neo-keynesianas, de que mais um embuste —o da falsa arborização da Segunda Circular— é já exemplo do provável regresso fatal ao lugar do crime.

Uma restruturação plena implicaria a renúncia efetiva de uma parte da dívida, e um 'haircut' junto dos detentores de instrumentos de dívida soberana portuguesa.

Esta medida, sempre defendida pelo Bloco de Esquerda (o PCP vai mais longe: defende a saída do euro!) foi sucessivamente rejeitada pelo PS, PSD e CDS. Daí que possamos falar de uma restruturação suave da nossa dívida, obtida à custa da queda das taxas de juro, dos alongamentos das maturidades, e da troca de dívida cara por dívida barata, mas também sob a proteção permanente dos nossos principais credores institucionais: o BCE e o FMI.

Quanto à austeridade, duvido que uma restruturação da gigantesca dívida portuguesa a evitasse.

O resultado da ilusão populista é a desgraça que continua a desfazer a Grécia. Seguiu, como todos sabemos, a via das restruturações sanguíneas. Entre nós, o preço de mais uma rodada de centralismo burocrático e demagogia esquerdista será bem pior do que a austeridade.

Apesar de suave, a restruturação em curso daquela que é uma das maiores dívidas soberanas do planeta, não deixará de capturar uma parte decisiva da nossa soberania, como se tem visto na alienação acelerada do sistema financeiro e bancário e em vários setores estratégicos da economia: energia, água, transportes e o mais que veremos durante o governo de António Costa.


NOTAS

  1. IMF/ World Economic Outlook/ "Coping with High Debt and Sluggish Growth", October 2012 (pdf)
  2. IMF Working Paper, "Growth Forecast Errors and Fiscal Multipliers2, January 2013
    By Olivier Blanchard and Daniel Leigh (pdf)

domingo, janeiro 10, 2016

O sinaleiro presidencial

Américo Thomaz, presidente da república portuguesa de 1958 a 1974, conhecido como o 'corta-fitas'

A nossa democracia tem vindo a perder sucessivos graus de liberdade


Com o fim à vista da essência do regime saído da Constituição de 1975, o parlamento vai tornar-se o refúgio democrático de um país onde o poder essencial de decidir o que é importante emigrou para Bruxelas, Estrasburgo e Frankfurt.

Desta circunstância ao embaciamento do cargo de presidente da república foi o passo de uma vigência: a do último mandato de Aníbal Cavaco Silva. Mesmo que Marcelo Rebelo de Sousa, o previsível próximo presidente, consiga promover uma grande coligação à portuguesa, a qual, na realidade, há muito existe e voltou a verificar-se no resgate público do Banif e na subsequente aprovação do orçamento retificativo (o PSD apoiou o PS, votando a favor ou abstendo-se, e depois deste passo garantido, o PCP e o Bloco puderam votar contra em nome das suas cada vez menos convincentes aparências), a abertura futura para acordos de regime orientados para a sobrevivência dos poucos graus de liberdade que ainda nos restam, ainda que necessária e urgente, já pouco poderá fazer pelo poder das elites nacionais. Daí a situação de impasse em que nos encontramos. O próximo presidente da república, mantendo embora os poderes da representação simbólica, da palavra, da chefia suprema das forças armadas, do veto constitucional e da dissolução do parlamento, será cada vez menos capaz de impor soluções às crises políticas que aí vêm. Estas, ou se resolvem no quadro parlamentar, ou terão que ser dirimidas em sucessivas eleições e referendos.

Nada impede, porém, num quadro extremo de degradação insanável da situação política, que os futuros presidentes da república, esgotada a capacidade de promover o diálogo institucional, e perante impasses perigosos, como aquele que poderia ter existido depois das últimas eleições legislativas, mas que acabou por se resolver matando uma convenção não escrita sobre quem deve governar depois de umas eleições legislativas, não use a palavra e a comunicação direta com o povo —i.e. as suas forças vivas— para promover governos de iniciativa presidencial. Seria sempre uma ultima ratio, mas o espaço para esta emergência existe, tem toda a legitimidade constitucional, e porque assim é, não se pode afirmar que o semi-presidencialismo tenha desaparecido. Serão mais os governos a depender do parlamento, do que o presidente a depender de ambos.

Se o próximo presidente vier a promover uma maior e mais isenta relação entre eleitos e eleitores, tornar-se-à então mais verosímil a emergência de uma nova balança institucional entre políticos, partidos políticos, parlamento, governo e presidência da república na sua relação democrática com o povo que a todos legitima direta ou indiretamente.

Profetizar que os próximos presidentes da república não passarão de sinaleiros do regime não chega para transformá-los em figuras decorativas do regime, como Américo Thomaz foi para Salazar e Marcello Caetano.