sábado, dezembro 04, 2010

España: estado de excepção

Quando menos se espera...

Como se a situação portuguesa não fosse suficiente para nos afligir, temos aqui ao lado uma bomba relógio que pode explodir a qualquer momento. — in O António Maria, 3-12-2010, 18:29.

Aeroporto de Barajas, Madrid.
Defensa asume el control del tráfico aéreo en España para frenar el caos

El Ejecutivo se ha visto obligado a la militarización del control aéreo ante el colapso generado por las "bajas masivas" del 70% de los controladores. Para poder tomar esta medida, que está prevista dentro de un decreto aprobado el mediodía del viernes por el Consejo de Ministros, el Ejecutivo ha publicado la norma de manera extraordinaria en el Boletín Oficial del Estado pasadas las 21.30. Además, el decreto especifica que también se permitirá realizar controles médicos a los controladores "de manera inmediata" para verificar que realmente no están en disposición de realizar sus funciones.

Los pasos de la intervención militar
  1. Ordenar a los controladores que acudan a sus puestos de trabajo. Si no cumplen la orden se enfrentan a graves delitos con penas, incluso penales. 
  2. Abrir al tráfico civil la decena de aeropuertos militares que hay en España. En Madrid se habilitarán el de Torrejón y el de Cuatro Vientos. 
  3. Desplazar a las torres de control de los aeropuertos civiles a coroneles que asuman el mando.
  4. El jefe del Estado Mayor del Ejército del Aire seleccionará y decidirá cuáles son los vuelos prioritarios.— in El País, 3/12/2010, esta noite.

Alguém me telefonara esta tarde (quando me preparava para publicar o post anterior) alertando-me para o facto de o primeiro ministro espanhol ter desistido à última hora de participar na Cimeira Ibero-Americana a decorrer em Mar del Plata, Argentina. Pensei que a situação financeira estaria a deteriorar-se rapidamente, apesar das medidas muito duras há dias anunciadas (privatização parcial da AENA e da centenária Lotaria Espanhola, etc.) Só hora e meia depois vi as as televisões abrirem os noticiários com a notícia do súbito abandono das torres dos aeroportos por parte dos controladores de tráfego aéreo e a paralisia imediata que tal situação gerou nos movimentos da aviação civil e aeroportos.

A greve instantânea, ou, como também se diz, selvagem, dos agulheiros dos céus espanhóis atingiu um ponto vital da mobilidade do país, paralisando todos os voos comerciais em Espanha, e lançando também o caos num série de aeroportos europeus.

Ao que parece esta decisão intempestiva foi uma resposta à decisão do governo de Zapatero de privatizar parcialmente a empresa pública de aeroportos e controlo do espaço aéreo espanhóis, usando de poderes que a boa democracia recomendaria que estivessem reservados, no mínimo, a decisão parlamentar por maioria absoluta. O desespero financeiro do país é tal, que o governo "socialista" parece ter esquecido os limites intrínsecos da acção política democrática. O resultado está à vista, e não é nada bonito, nem animador no que se refere à imagem civilista construída nos últimos 34 anos de democracia. De repente, ou seja, em menos de 12 horas, o governo cozinhou e decretou um Estado de Excepção, para resolver manu militari uma crise laboral extrema, mas não mais do que uma crise laboral. Que péssimo augúrio!

POST SCRIPTUM — para uma percepção correcta da greve dos controladores aéreos, vale a pena ler: Los internautas preguntan a César Cabo, Secretario de comunicación de Unión Sindical de Controladores Aéreos (El País) 

ACTUALIZAÇÕES
  • Fotogaleria do El País (5-12-2010)
  • Ao contrário das traduções trapalhonas dos nossos noticiários, o que se passou em Espanha não foi uma "requisição civil", mas sim a imposição da lei militar a centenas de civis por causa de uma "greve selvagem". O importante é realçar quão fina é a fronteira entre um estado democrático e o "estado de excepção" manu militari. Para quem tiver dúvidas, leia este filme dos acontecimentos pelo insuspeito (de antipatia pelo PSOE) El País. (5-12-2010)
  • As palavras de João Proença e de José Sócrates (Diário de Notícias), ambos "socialistas", são uma espécie de aviso à navegação de quem já está a pôr a barbas de molho pelo que aí vem, por exemplo, com o plano de privatização da ANA e de alienação de outros anéis preciosos, que a classe política instalada quer vender à pressa e ao desbarato, para continuar a gozar dos seus indecorosos privilégios. Não esperem, porém, que a pancada, e a revolta da classe média (praticamente inevitável), ocorram nos mesmos lugares e horas. E pensem duas vezes antes de usar os militares! (5-12-2010)

sexta-feira, dezembro 03, 2010

Bancarrota-8

Pausa para respirar... e agir

A guerra financeira entre o dólar (pegado à libra) e o euro prossegue, com golpes baixos e muitos sorrisos. Os analistas anglo-saxónicos pintam diariamente quadros negros sobre o continente europeu, e Trichet lá vai respondendo de forma imprevisível e por vezes surpreendente ("Europe needs budgetary federation" — EUobserver"). O BCE andou e anda a comprar dívida soberana no mercado secundário. Bastou esta notícia não confirmada directamente pelo BCE, mas que quem comprou divulgou anonimamente, para os especuladores abrandarem os seus ataques aos flancos mais frágeis da dívida soberana europeia: Grécia, Irlanda, Portugal... e Espanha.

Jean-Claude Trichet disse hoje que o BCE continuará a comprar dívida pública dos países do euro e pediu sanções automáticas para os países que falhem compromissos orçamentais.

(…) O presidente da instituição escusou-se, no entanto, a pronunciar-se directamente sobre as informações publicadas pela imprensa sobre a compra em grande quantidade de títulos de dívida portugueses e irlandeses na quinta-feira.

(…) Na mesma conferência, o presidente do BCE pediu um sistema de sanções quase automáticas para os países que não cumpram os compromissos orçamentais, insistindo que os governos devem credibilizar os programas de ajustamento e reformas estruturais. — in "Trichet pede sanções automáticas e garante que BCE vai continuar a comprar dívida", 03 Dezembro 2010 | Jornal de Negócios com Lusa.

Este recuo dos especuladores é, porém, meramente táctico, pois o problema de fundo subsiste: a dívida soberana europeia é uma bolha especulativa gigantesca (ver este gráfico de maio —Europe's Web of Debt—do NYT) e vai acabar por rebentar. Daí que seja da mais elementar prudência pagar todas as nossas dívidas quanto antes, não contrair mais empréstimos, aplicar as poupanças em bens duradouros com uma grande valorização potencial (ouro, terra fértil, casas em segunda mão bem localizadas e a bom preço, e pouco mais), evitar investimentos especulativos em produtos financeiros e seguros mal explicados e de duvidosa proveniência (1).

A perspectiva sombria de um estouro da moeda única europeia não está —muito longe disso— afastada do horizonte mais próximo. Como não estão também afastadas as probabilidade reais de uma quarentena fora do euro para alguns dos leitões da Europa (PIGS), que nada devem à fama que os suínos sempre tiveram em matéria financeira — criar um porco foi, durante milénios, uma boa forma de investimento e de poupança.

Uma coisa é certa: espera-nos uma década de contínuo empobrecimento, pois os juros anuais da nossa dívida pública (6,5 mil milhões de euros em 2010, ou seja, qualquer coisa como 6,5 pontes Vasco da Gama) já ultrapassam tudo o que gastamos com a nossa alimentação! Se não pararmos imediatamente todas as Parcerias Público Privadas no sector da saúde e dos transportes, se não adiarmos a Alta Velocidade (à excepção da ligação para passageiros e mercadorias entre o Pinhal Novo e Caia) e não afastarmos para as calendas gregas o monstro aeroportuário da Ota em Alcochete, seremos inexoravelmente expulsos da Eurolândia. É uma aposta que faço com os meus leitores.

Há, porém, sinais de esperança. A venda do diário "i" pelo Grupo Lena é um sintoma claro de que as obras públicas já pararam, por falta de objectivos sensatos, por falta de financiamento e porque os projectos anunciados revelarem todos uma rentabilidade nula fora do regaço protector do agora obviamente falido cliente Estado. Se até Junho de 2011 (2), o défice e a dívida pública não recuarem para os valores exigidos pelo BCE e pela Alemanha, as penalizações serão a matar. Ou seja, a janela de oportunidade para se fazer o que é preciso fazer é de apenas um semestre. Será este o definitivo prazo de validade de José Sócrates?

Como se a situação portuguesa não fosse suficiente para nos afligir, temos aqui ao lado uma bomba relógio que pode explodir a qualquer momento. Chama-se Espanha (3) e a ela devemos qualquer coisa como 86 mil milhões de euros!

Vivi em Espanha alguns anos e tenho vários amigos do coração por lá. Num painel sobre as televisões autonómicas para o qual fui convidado, creio que no ano 2002 ou 2003, interroguei-me sobre a origem de tanto dinheiro, e sobre a viabilidade futura das autonomias, não pelo lado da sua legitimidade, mas tão simplesmente pelo lado da despesa. Quem pagava então, e quem pagaria no futuro semelhante gasto fiscal? Outro aspecto da sociedade espanhola que me causou sempre igual apreensão foi a dimensão e ineficiência de boa parte dos seus serviços públicos, bem como a presença ostensiva dos grandes oligopólios no quotidiano dos espanhóis. Lá como cá a democracia era e é um bem recente, degustado como uma iguaria deliciosa cujo preço ninguém perguntava, nem pergunta (ou só agora começa a perguntar...) Os resultados que eu temia estão à vista e, claro está, nada pude fazer para os evitar, apesar de ter falado e escrito sobre o tema vezes sem conta.

A situação em Espanha é tanto mais dramática quanto boa parte da população continua anestesiada pelos poderes político-partidários e mediáticos. Lá como cá, os comportamentos chegam a ser de uma irracionalidade impensável. Em Portugal, por exemplo, com o anúncio antecipado da subida do IVA em 2011 (certamente para estimular o crescimento do PIB ainda este ano...), a venda de automóveis aumentou mais de 50% relativamente a 2009. Em Espanha, felizmente para todos, as medidas governamentais têm sido mais sensatas. Mas chegarão? A imprensa anglo-saxónica tem as maiores dúvidas!

— As necessidade financeiras do Estado espanhol para 2011 ascendem a 21% do respectivo PIB, ou seja a 226 mil milhões de euros! Mas os bancos, por sua vez, também precisam de refinanciar as respectivas dívidas num montante de 220 mil milhões de euros!!

(…) Should the EU really impose a 6.7pc interest charge on Ireland’s bail-out loans, it should not be surprised if the new Irish government in January walks away from the whole stinking arrangement, and pulls the plug on Europe’s banking system.

(…) Has Mr Zapatero read the IMF’s devastating Article IV report on his own country? It states that the government’s “gross financing needs” for 2011 will be €226bn, or 21pc of GDP. “Spain’s financing requirements are large and, retaining market confidence will be critical. Spain has exhausted its fiscal space. Targets should be made more credible.”

Madrid must attract €226bn of good money from Spanish savers, German pension funds, French banks, Japanese life insurers, and China’s central bank, so that an incompetent government (this one happens to be socialist, but the Greek conservatives were worse) can continue to run budget deficits of 7pc to 8pc of GDP in 2011. Why should they lend a single pfennig, having already been told by EU leaders that they will face scalping if Spain ever needs a rescue?

(…) Furthermore, Spanish banks will need to roll over €220bn in 2011 and 2012, according to Enrique Goñi, head of Banca Cívica. “We’re in the antechamber of a new liquidity crisis. We’re living through a financial pre-collapse,” he said. — in "Germany faces its awful choice as Spain wobbles", by Ambrose Evans-Pritchard, The Telegraph (29 Nov 2010).

— A Eurolândia (e sobretudo a Alemanha) está metida numa camisa de sete varas. Não pode suportar indefinidamente todas as dívidas soberanas dos membros da união monetária, sob pena de rebentar com a poupança de quem a tem, e colocar a Europa à beira da ruína. E não pode inundar as economias de liquidez, sob pena de desvalorizar perigosamente o euro, criar uma inflação potencialmente incontrolável, e acabar por destruir a moeda única.

(…) Investors’ no-confidence vote in the aid package for Ireland may force European policy makers to expand their arsenal to fight the debt crisis threatening to tear the euro apart.

Options outlined by economists at Societe Generale SA and Barclays Capital include: Boosting the 750 billion-euro ($975 billion) temporary rescue fund or turning it into an asset- buying program; cutting interest rates on bailout loans; issuing joint bonds for the 16 euro nations or flooding the economy with cash from the European Central Bank.

(…) “As the crisis deepens and threatens core countries, the future of monetary union continues to be called into question,” said Chandler. “As the situation becomes more desperate, the unthinkable has to be thought. Quantitative easing by the ECB may be one of the few ways out.”  — in "Contagion May Force EU to Expand Arsenal to Fight Debt Crisis", By Simon Kennedy and James G. Neuger, Bloomberg - Dec 1, 2010.

NOTAS
  1.  Outra opção que começa a ser interessante, e que poderá ser objecto de grande concorrência em breve, são os depósitos a prazo. Consultar esta tabela comparativa de depósitos a prazo, publicada hoje pelo Money GPS.
  2. A portinhola do BCE onde se financiam a 1% os bancos comerciais, para logo comprarem dívida soberana com rendimentos acima dos 5% (6%, 7%, e 9%), ou realizar operações de empréstimos a particulares e empresas com TAEGs acima dos 20%, deveria fechar-se no próximo dia 31 de Janeiro. Mas a necessidade de um contra-ataque do BCE contra o cerco montado pelos estrategas financeiros de Wall Street e da City londrina contra o euro, manterá a dita portinhola do easy money aberta até Junho. É por isso que os próximos seis meses vão der decisivos. E é por isso que a cidadania deverá exercer toda a sua vigilância e pressão sobre a corja político-partidária — do governo, às oposições, passando pelo senhor Cavaco. Os candidatos presidenciais que se opõem ao actual presidente da república são irrelevantes. Por patriotismo, deveriam fazer uma coisa: desistir da farsa eleitoral que aí vem, colocando assim o regime perante as suas responsabilidades. [3-12-2010; 22:40]
  3. Li, já depois de publicado este post, o artigo de Paul Krugman, O Prisioneiro Espanhol, publicado no i [4-12-2010, 1:19]

Futebol

A FIFA sabe onde está o dinheiro!
Cristiano Ronaldo, anúncio da Nike.
A Inglaterra ficou chocada. Portugal e Espanha tinham condições ímpares. Mas os próximos dois campeonatos mundiais de futebol irão para a Rússia e para o Qatar. Explicação: a FIFA sabe onde está o dinheiro. É aliás fácil saber: está onde há petróleo, matérias primas fundamentais, ou trabalho barato. A Rússia já anunciou que quem comprar um bilhete para o próximo mundial de futebol terá transportes gratuitos entre os vários estádios do campeonato. Ora aí está uma coisa que nem o reino de sua majestade inglesa, nem o rei espanhol, nem Portugal poderiam oferecer. A explicação é simples: não temos petróleo, o petróleo já está de novo nos 90 dólares (o Pico do Petróleo veio para ficar e a China não pára de pressionar a procura), e as energias alternativas continuam e serão por mais uma ou duas décadas puras miragens que os pobres países "vanguardistas" como nós pagarão antecipadamente em nome de quase-monopólios piratas.

quarta-feira, dezembro 01, 2010

Regressar à monarquia

A III República faliu. E agora?



Duarte de Bragança considera que a actual crise que Portugal enfrenta é “comparável à vivida nos tempos da Primeira República”, e defende que a solução seria o país regressar à monarquia, razão pela qual insiste na realização de um referendo. — in Público.

Depois de o actual presidente da república ter presidido ao afundamento de Portugal, que nos resta? Fará sentido instaurar uma monarquia constitucional, com o objectivo de atingir a prosperidade das restantes monarquias europeias: Bélgica, Dinamarca, Espanha, Liechtenstein, Luxemburgo, Mónaco, Noruega, Países Baixos, Reino Unido e Suécia? Ou é melhor re-eleger o traste Aníbal Cavaco Silva para o cargo imprestável de presidente da república? Esta discussão parece fora do tempo, mas talvez se torne moda bem antes do senhor Duarte de Bragança ter preparado convenientemente o seu primogénito para voos inesperadamente altos.

Mesmo as piores monarquias europeias, Inglaterra, Bélgica e Espanha, estão melhores do que nós! São países civilizados, onde a lei e os tribunais funcionam a tempo e horas, há estado social efectivo, os rendimentos per capita são dos mais altos do planeta, o pluralismo partidário é total e as liberdades são conquistas plenamente assumidas por todos os actores democráticos. Tão ou mais importante: a distribuição da riqueza é muitíssimo mais justa em todas estas monarquias do que em Portugal, e os respectivos governos e partidos políticos não foram, como por cá, capturados por clientelismos partidários, corporativos, ou burocráticos, nem por nomenclaturas ocultistas, nem muito menos por castas consanguíneas. Já algum sociólogo ousou fazer um mestrado sobre os apelidos da nova nomenclatura minocrática?

Sete dos dez países com maiores rendimentos per capita no mundo, são monarquias: Luxemburgo, Noruega, Qatar, Dinamarca, Emiratos Árabes Unidos, Holanda e Suécia (Wikipedia). Não vejo, pois, onde possa estar a superioridade dos regimes republicanos, e nomeadamente das três repúblicas portuguesas que se seguiram ao regicídio. 
  • A primeira sucumbiu ao cretinismo parlamentar, à corrupção e ao ateísmo oportunista e estúpido. Nasceu sem nobreza pública, de um regicídio, e foi miseravelmente à falência.  
  • A segunda, nasceu de um golpe de estado militar, impôs-se como uma ditadura durante 48 anos, e acabou por morrer às mãos de outro golpe de estado militar.  
  • A terceira, ou seja aquela que, ironicamente, no ano do centenário do regime republicano, volta a mergulhar o país numa vergonhosa bancarrota, nasceu de uma revolta corporativa no seio do exército, impôs-se como uma democracia burocrática e populista (minocracia), sem horizonte claro nem imaginação, entregue aos mesmíssimos vícios que colocaram Salazar ao leme da mais longa ditadura europeia do século 20, e a que restam escassos anos de vida
Se a União Europeia se aguentar, ou enquanto o euro e a União Europeia se aguentarem, Portugal estará, em princípio, a salvo de novo golpe de estado, revolta popular ou guerra civil. Mas se, ou melhor dizendo, quando o sonho alemão de uma grande Europa, de Lisboa a Vladivostoque, voltar a soçobrar —o que acontecerá inevitavelmente se a guerra financeira em curso entre o dólar-libra e o euro se resolver contra o euro-marco (com o apoio entusiasta do Bloco de Esquerda e imbecis da mesma laia)—, podemos todos ter a certeza de que a Espanha voltará a ser uma ameaça à pouca soberania que Portugal ainda tem, e que este indecoroso e miserável regime republicano será pasto de novo golpe de estado e tumulto populista, se entretanto não tivermos encontrado um novo enquadramento institucional para o nosso país.

Olhando para o panorama desolador das próximas eleições presidenciais, e para o incurável e terminal cretinismo parlamentar da nossa pseudo-democracia, apenas antevejo uma solução capaz de evitar mais uma longa noite de ignorância e medo: regressar à monarquia. Ou melhor, criar uma nova monarquia, constitucional, democrática, laica, eficiente, transparente, justa e solidária. Para lá chegar não é preciso muito. Basta um referendo!

A Bulgária está a pensar fazê-lo. Somos menos espertos, ou corajosos, do que eles?

POST SCRIPTUM (2-12-2010) — Na realidade, uma monarquia europeia civilizada e pós-moderna, a que poderíamos chamar monarquia republicana (!), é em tudo semelhante a uma república, com uma única mas essencial diferença: poder assegurar, através de um biopoder residual, a existência de uma ultima ratio civilizada em caso de bloqueio grave do regime democrático. Este poder moderador, ou salomónico nos casos mais críticos, tem que estar acima das querelas partidárias, e por conseguinte não pode em caso algum emanar dos partidos políticos, nem ser por estes condicionado (desde logo na própria hipótese de candidatura). Esta monarquia republicana (isto é, constitucional, parlamentar, referendária, em suma, democrática) não resolveria, nem todos, nem sequer os nossos principais problemas, mas ajudaria a reafirmar a condição montesquiana a que toda a democracia tem que obedecer sob pena de, subvertendo a lógica da separação dos poderes, deitar fora a verdadeira democracia, colocando no seu lugar aquilo que designo por minocracia: um regime de aparência democrática, mas assente em bases eleitorais tendencialmente minoritárias, alienadas e/ou e distorcidas, e subordinado aos impérios gémeos da burocracia e da partidocracia.

terça-feira, novembro 30, 2010

Bancarrota - 7

O perú não chega ao Natal
e o reCavaco que se ponha a pau!
Insolvent – Greece, Ireland, Portugal and probably Spain
Posted by Neil Hume on Nov 30 10:45.

[...] Ireland is insolvent, Portugal is quietly insolvent, Greece is de facto insolvent and Spain will be insolvent once the problems in its banking sector are recognised.
[...] Buiter predicts the ECB could be forced to buy Spanish government paper and fund its banking system by purchasing the debt from the European Financial Stability Facility if things get really bad. — in FT Alphaville .
A compra da cadeia de lojas Carrefour pelo Continente, em 2007, coincidiu com uma proliferação de lojas de mini-preço pelo país fora. É isto que importa reter, e não a histeria hipnótica organizada em volta da vinda do FMI. Estamos falidos e em regime de piloto automático desde 8-9 de maio último, sob comando da Alemanha e do BCE. A classe partidária portuguesa, por inteiro, incluindo o traste presidencial, é responsável por este descalabro.

Como o LEAP2020/GEAB anunciou, em 8-9 de maio deste ano deu-se um golpe de Estado no seio da União Europeia, o qual devolveu à Alemanha e à França os comandos de um projecto por eles imaginado no pós-guerra. Desde aquele fim-de-semana furtivo que Portugal se tornou num protectorado de Bruxelas.

No entanto, Alemanha tem um dilema pela frente:
  • se duplicar ou triplicar o Fundo Europeu de Estabilização Financeira (EFSF), para acorrer às insolvências dos PIGS, da Bélgica e da própria França, incorrendo no mesmo estratagema do Quantitative Easing (QE) adoptado pela declinante América de Bush e Obama, o euro chegará rapidamente à paridade com o dólar, e as economias emergentes, capitaneadas pela China, Rússia, Brasil e Irão fugirão destas pseudo moedas de reserva a sete pés... seja para um novo regime de trocas internacionais bilaterais (yuans por rublos, reais por pesos, etc.), seja para o ouro. Se Angela Merkel optar por "salvar" os gastadores improdutivos da Europa, o ouro poderá facilmente duplicar ou triplicar o seu valor no prazo de um a dois anos!  
  • Se, por outro lado, a Alemanha deixar cair aos trambolhões uma parte significativa da União, e os PIGS empobrecerem demasiado, passando a abastecer-se cada vez mais nas lojas chinesas, a Alemanha ver-se-à forçada abandonar o euro, lançando a Europa numa convulsão sem precedentes.
É um dilema dos diabos!

Bancarrota - 6

Medidas simples, duras, mas claras e eficazes
Ponham um tecto máximo nas reformas pagas pelo Estado... de 1700 euros, e ponha-se fim à acumulação de pensões e reformas pagas com o dinheiro dos contribuintes. Como a Suíça fará a partir de 2011. Quem quiser mais, poupe e invista em PPRs.




Reformas na Suíça com tecto máximo de 1700 euros
Na Suíça, ao contrário de Portugal, não há reformas de luxo. Para evitar a ruína da Segurança Social, o governo helvético fixou que o máximo que um suíço pode receber de reforma são 1700 euros. E assim, sobra dinheiro para distribuir pelas pensões mais baixas. — 2010-11-10. Ver Causa defendida no Facebook

Banco de Portugal: Sector público tem de aumentar poupança
O Banco de Portugal antecipa uma recessão em 2011, por efeito do Orçamento do Estado. Um ajustamento inescapável, diz, defendendo como “prioridade” o aumento da poupança do sector público. Os investimentos, defende, devem ser canalizados “para finalidades comprovadamente reprodutivas”. E só a credibilidade na execução orçamental reduzirá os custos da mudança. — Jornal de Negócios.

domingo, novembro 28, 2010

Bancarrota-5

Dívidas soberanas, quem paga?

Photograph: Matt Dunham/AP
The sorrow of Portugal

Yesterday, I had a rather sad conversation with a friend in Portugal. The country has just had to force through another austerity budget; and fears are mounting that it will be next in line for an EU bail-out. “We should never have entered the euro”, my friend lamented. “Everything went downhill from there. For us and for everyone.” — in Finantial Times, Nov. 26, 2010.

Those too young to vote, yet with their futures at stake, have organically come together to be heard.

'The word spread through Twitter and Facebook; rumours passed around classrooms and meeting halls: get to Westminster, show them your anger.'

Outside Downing Street, in front of a line of riot police, I am sitting beside a makeshift campfire. It's cold, and the schoolchildren who have skipped classes gather around as a student with a three-string guitar strikes up the chords to Tracy Chapman's Talkin Bout a Revolution. The kids start to sing, sweet and off-key, an apocalyptic choir knotted around a small bright circle of warmth and energy. "Finally the tables are starting to turn," they sing, the sound of their voices drowning out the drone of helicopters and the screams from the edge of the kettle. "Finally the tables are starting to turn."

Then a cop smashes into the circle. The police shove us out of the way and the camp evaporates in a hiss of smoke, forcing us forward. Not all of us know how we got here, but we're being crammed in with brutal efficiency: the press of bodies is vice-tight and still the cops are screaming at us to move forward. Beside me, a schoolgirl is crying. She is just 14. — in Guardian.co.uk, 24 Nov, 2010.

A União Europeia pode quebrar pelo elo mais forte: a Alemanha. Porquê? Porque das duas uma: ou os estados falidos da Europa assumem rapidamente dietas violentas nos seus orçamentos Pantagruélicos, e por esta via põem em causa os privilégios das corporações, nomenclaturas, burocracias e bases eleitorais de que dependem para se manterem no poder, ou então, persistem nas actuais manobras de retórica populista e de dissimulação orçamental com as graves implicações que uma tal opção terá para o euro enquanto moeda de reserva alternativa ao papel higiénico norte-americano. Adiar por mais um ano, ou até por mais seis meses, a inevitável austeridade orçamental que permitirá estancar a gangrena financeira dos países sobre-endividados, levará o Fundo Europeu de Estabilização Financeira (EFSF) a ter que duplicar a sua actual capacidade de resgate das dívidas soberanas (750 mil milhões de euros), para acudir ao dominó das bancarrotas europeias actualmente em curso.

A simples probabilidade de o Banco Central Europeu entrar pela mesma via da Reserva Federal, o chamado Quantitative Easing (QE), pondo os computadores a criar dinheiro electrónico sem qualquer base de riqueza efectivamente criada, levou já o Brasil, a China, a Rússia e o Irão —a que se somará em breve um número crescente de países produtores de matérias primas, energia e trabalho barato— a estabelecer uma estratégia monetária de recurso que poderá passar pelo abandono das moedas de reserva americana e europeia. A actual corrida ao ouro e à prata, e a retenção destes metais preciosos pelos grandes produtores, são um sintoma claro de que o sistema monetário nascido dos acordos de Bretton Woods está mais do que moribundo. Morreu e vai ser em breve enterrado.

Os verdadeiros credores da nossa dívida colectiva, pública e privada, isto é, aqueles que produzem a maioria dos bens transaccionáveis que preenchem as nossas vidas mais ou menos confortáveis e neuróticas, não estão dispostos a financiar por muito mais tempo o nosso consumo e o nosso lazer sem um contra-valor real. A China, o Brasil, a Rússia, o Irão, e os estados petrolíferos do Médio Oriente, estão atulhados de liquidez virtual e fartos de inflação. Querem agora uma parte crescente dos nossos activos em troca de mais petróleo, em troca de mais soja, e em troca de mais telemóveis e computadores.

A Revolução Industrial fez-se em cima de uma escabrosa pilha de cadáveres e escravos. Durou 200 anos e não sobreviverá a 2030. Os escravos coloniais, sobretudo depois do renascimento da China, e da grande rebelião muçulmana em curso, deixaram de obedecer ao império judaico-cristão e rejeitam também categoricamente a supremacia branca, anglo-saxónica e protestante. Um novo mundo, inimaginável por enquanto, está em gestação. A geratriz desta revolução está no Oriente. Aos antigos cruzados resta-lhe acordar.

Os desafios são arrepiantes. Não, não são nenhuma farsa, como as minocracias burocráticas europeias querem fazer crer. A Alemanha está muito consciente destas ameaças, e por isso não irá tolerar por muito mais tempo a irresponsabilidade populista dos pequenos burocratas e regimes corruptos do Sul da Europa. Em breve colocará a União perante um dilema sem precedentes: ou se colocam os PIGS em quarentena, fora do euro, durante 1, 2, 4... 10 anos, ou a Alemanha bate com a porta e regressa ao marco. Se o falido Reino Unido continua com a sua libra esterlina, se a Suécia continua com a sua coroa, porque não libertar a economia alemã do fardo de alimentar porcos a pérolas e burros a pão de Ló? Na realidade, parece-me mais verosímil uma saída da Alemanha do Sistema Monetário Europeu, do que a expulsão das paquidérmicas minocracias burocráticas do Sul da Europa, e da sacrificada Irlanda, do ilusório bem-estar em que têm vivido desde o aparecimento da moeda única.

Premier Wen Jiabao shakes hands with his Russian counterpart Vladimir Putin
on a visit to St. Petersburg on Tuesday. ALEXEY DRUZHININ / AFP

China, Russia quit dollar in trade settlement

China and Russia have decided to renounce the US dollar and resort to using their own currencies for bilateral trade, Premier Wen Jiabao and his Russian counterpart Vladimir Putin announced late on Tuesday. — in People's Daily Online, November 24, 2010.

Yuan begins trading against the rouble

SHANGHAI - China started allowing the yuan to trade against the Russian rouble in the interbank market from Monday as policymakers promote the currency's use in global trade and finance.

The move will help "facilitate bilateral trade between China and Russia and help develop yuan trade settlements," according to a statement published on the website of the China Foreign Exchange Trade System (CFETS), a subsidiary of the People's Bank of China. — in China Daily, Nov. 23, 2010.

Crisis of Fiat Currencies: US Dollar Surpluses Converted into Gold
China, Russia, Iran are Dumping the Dollar

China and Russia are both large gold producers and for a number of years have been buying up domestic gold and silver production, so that it never reaches the market and does not affect prices. If anything the absence of sales tends to push the markets higher. As a matter of fact Russia and India are visible buyers. Even Iran with its oil surplus recently announced that they had purchased 340 tons of gold. Their recent gold purchases are very significant as affiliate members, which have access to the present and ultimate direction of the group. You might say buying gold has been a protective effort to shield members and close observers from the problems generated by dollar policies. They are accumulating gold, as many have been worldwide, for the past ten years, but particularly over the past few years. — in Global Research, November 22, 2010.

China to rebuild Argentine rail
BEIJING - CHINA and Argentina have agreed to invest about US$10 billion (S$13.8 billion) over several years to renovate the Latin American country's dilapidated railway system and build a subway for its second-largest city.

(…) Argentina's once-extensive rail network was largely dismantled during the privatisations of the 1990s. But as agricultural output soars, farmers and grain elevators - who send more than 80 per cent of grains by costly road transport - have been calling for investment to revive the railways. —  in Strait Times, Jul 13, 2010.

China, Argentina to settle trade in yuan: Xinhua

HONG KONG (MarketWatch) -- China and Argentina have agreed to set up a 70 billion yuan ($10.24 billion) currency swap system that will enable trade between the two nations to be settled in the Chinese currency, the state-run Xinhua News Agency reported Monday. — in Market Watch, March 30, 2009.

Os dados estão lançados. Não vejo como possamos, a menos que optemos por uma sinistra deriva suicida, deixar de olhar os problemas de frente. A globalização, tal como foi engendrada, exportou a economia para o Oriente (1) e levou o Ocidente à bancarrota. Para controlar os estragos e retomar um certo equilíbrio na divisão internacional do trabalho teremos que voltar a levantar barreiras à circulação libertina dos capitais, das mercadorias e das pessoas, em nome da integridade produtiva das nações e em nome da sustentabilidade dos ecossistemas de que a vida humana é parte integrante e indissociável.

As democracias ocidentais deixaram há muito de ser democracias (basta ler as estatísticas eleitorais.) Na realidade, o que temos são sociedades burocráticas sem trabalho, que nada ou pouco produzem, e que consomem o que de facto não podem pagar, a não ser contraindo mais daquilo que rapidamente aprendemos todos a contrair nas últimas quatro décadas: dívidas!

Os países europeus terão que passar rapidamente por um processo de profunda revolução ideológica e política. Vai ser preciso libertar da esfera burocrática estatal toda a comunicação, toda a administração e toda a ciência. Mas vai ser, por outro lado, absolutamente necessário reincorporar na esfera social, de uma forma distinta dos actuais sectores públicos, e público-privados, o bem comum: o ar que respiramos, a água que bebemos e alimenta o resto da Natureza, as vias da mobilidade humana, as fontes de energia, a agricultura e a indústria. Não é a propriedade privada em si que está em causa, mas a sua concentração, monopolização e transfiguração financeira. A tarefa é avassaladora e complexa. Mas nem por isso menos inadiável.


NOTAS
  1. List of countries by steel production