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terça-feira, julho 15, 2025

Nem sempre galinha...

D. João V
pintado pelo italiano rococó Pompeo Batoni (1708-1787)

A propósito dos sistemas políticos e das discussões sobre o sexo dos anjos.

Diz-se que o bem parecido e riquíssimo D. João V terá dito ao seu confessor, numa passeata na Tapada de Mafra — o primeiro santuário ecológico (não por projeto, mas por consequência) criado por este rei para alimentar o Convento de Mafra, de água, carne, hortícolas, e prazers vários (eu percorri e brinquei naquele incrível lugar quando não tinha sequer 10 anos de idade!) — a seguinte frase lapidar:

—  "Nem sempre galinha, nem sempre rainha."

Diz-se que a rainha austríaca era muito feia (noblesse oblige), e que o rei teve uma paixão insuperável por uma freira e madre do cistercense mosteiro de S. Dinis em Odivelas — onde a minha irmã estudou sete anos. A Madre chamava-se Paula, e dela o Rei D. João V teve três filhos, que perfilhou e educou com esmero.

Ora bem, os sistemas políticos são teorias. A realidade dos equilíbrios sociais e culturais dos povos é sempre mais variada, rica e complexa. Um cozido à portuguesa pode ser preparado com mais carne de boi e porco, chouriço, moira e farinheira, ou com mais batata, nabo, couve, cenoura e feijão branco. Já o arroz, há quem o prefira simplesmente cozido na água de cozer as carnes, ou antes, como o meu ido Pai, um bom arroz de feijão vermelho. A sopa de cozido, com ou sem pedra filosofal, é matéria consensual.

Ou seja, não existem democracias puras, nem regimes verdadeiramente liberais, e até as ditaduras configuram um menu interminavel de opções, mais ou menos violentas, mais ou menos inteligentes, mais ou menos produtivas. O nosso famigerado Salazarismo, que tirou o país da bancarrota sistémica e da balbúrdia violenta do rotativismo e dos golpes militares, foi, como sabemos, ao longo de 48 anos (menos do que a democracia, agora exangue, que se lhe seguiu) uma ditadura 'suave', quando comparada com a bestialidade franquista, fascista, nazi, estalinista, maoista, e um longuíssimo etc. só no século passado!

Neste momento volta-se a discutir Carl Schmitt (1888-1985) e as suas teorias, como diríamos hoje, 'iliberais' e "soberanistas" Estas defendem, no essencial, a necessidade de os estados definirem claramente o que entendem por ação política e soberania, limitando, por assim, o potencial das democracias agirem no interesse dos povos que representam, especialmente em momentos de especial complexidade (excesso e burocracia, por exemplo), aflição (dívida externa, pública e privada excessivas, por exemplo) e, ou, ameaça externa (dos credores, ou de movimentos geoestratégicos desfavoráveis). Schmitt defendeu a figura de 'estado de exceção' para lidar com estas limitações inerentes às democracias liberais, cujos princípios de racionalidade, por vezes, não conseguem lidar a realidade pura e simples de haver bons e maus no mundo e de, por vezes,  os 'maus' rondarem o nosso quintal com o objetivo de nos roubarem as galinhas, e o galinheiro.

A espécie de guerra civil larvar que decorre atualmente nos Estados Unidos, mas também a emergência convulsiva dos movimentos soberanistas na Europa, que não são apenas populistas, xenófobos e racistas, ou até o pânico que conduziu Vladimir Putin e a Rússia imperial e colonial que ainda subsiste a imporem à Ucrânia, contra todos os Tratados, Acordos e Lei Internacional uma guerra canalha de ocupação e usurpação da soberania aí estabelecida na sequência do colapso da União Soviética (que assim perdeu, de facto, a Guerra Fria contra as tais democracias liberais), são testemunhos em carne viva do que pode ocorrer, nas democracias (Europa ocidental e central, Estados Unidos), tal como nas ditaduras (Rússia), quando sobram problemas de endividamento, perda de competitividade, balbúrdia migratória, e alterações radicais nos paradigmas energéticos, de acesso aos recursos naturais e tecnológicos, coroados por problemas de ordem ambiental e climática, que definem o modo de vida dos povos e das suas nações e estados.

Neste momento, os Estados Unidos estão a operar como um 'estado de exceção', sem precisar, porém, de instituir uma qualquer ditadura. A democracia continua a funcionar, como em nenhuma outra parte do globo, mas as decisões que têm que ser tomadas estão a ser tomadas, tanto no que respeita à poda necessária na paquidérmica burocracia e dispersão de poderes pragmáticos que consomem o Estado, como no enfrentamento das ameaças externas vindas de quem fez mal as contas sobre a verdadeira força imperial dos Estados Unidos e dos seus aliados na Europa e na Ásia. 

O ponto de viragem, ou melhor dito, de consolidação da situação estratégica mundial (uma grande potência dominante chamada Estados Unidos da América) deu-se quando os B2 norte-americanos atacaram o complexo de enriquecimento de urânio (com fins obviamente militares) da ditadura teocrática do Irão. Ficámos desde então a saber que os Estados Unidos podem atacar qualquer buraco ou idiota no mundo sem que os potenciais alvos se apercebam sequer quando e de onde vem o tiro. Os B2 podem transportar não apenas bombas anti-bunker, mas ovigas nucleares táticas. Foi isto que calou as cabeças pensantes de Moscovo e de Pequim. Os resultados desta operação começaram a sair em catadupa e estão longe de terminar. Pequim e Moscovo vão ter que mudar de vida, se quiserem prosperar e regressar a um convívio económico e cultural com o resto do mundo. Os BRICS não contam obviamente neste campeonato.

O que importa hoje discutir, regressando a Carl Schmitt, não é a sua filiação no Partido Nacional Socialista, de Adolf Hitler (a convite de Martin Heidegger), mas o contributo que deu ao pensamento filosófico sobre a ação humana e sobre a ação política em particular. O enquadramento racional de Montesquieu sobre a separação de poderes, e a ideia democrática vista numa perspetiva dinâmica, não estão em causa. Devem, pelo contrário, ser bem defendidos sempre. Mas não à custa da soberania das nações e estados. Encurralar um estado soberano, sobretudo se este for historicamente forte, é sempre uma péssima ideia. O erro do Tratado de Versalhes (1919), que ditou uma política de reparações draconianas à Alemanha empurrou a Europa para a Segunda Guerra Mundial. Os Estados Unidos nunca assinaram o Tratado de Versalhes. Seria bom que a Europa não esquecesse esta lição quando for preciso gerir a implosão da Federação Russa.

quarta-feira, abril 03, 2019

O que é a democracia?


Resposta rápida


Se alguém assassinasse Trump, a Rainha de Inglaterra, ou António Costa, os três países a que estes políticos pertencem continuariam as suas vidas sem sobressaltos de maior depois dos funerais e dos declarados dias de luto nacionais. Se alguém assassinasse Putin, Xi Jinping, ou Nicolas Maduro, os regimes dos países que estes senhores comandam entrariam inexoravelmente em colapso. É esta a diferença entre democracia e ditadura. Podemos interpretar esta ideia como um corolário da teoria urbanística de Gonçalo M. Tavares sobre a velocidade das ditaduras e a lentidão das democracias.

A 11 mil metros de altitude, entre Bruxelas e Lisboa. 30-03-2019

quinta-feira, dezembro 14, 2017

Macronésia?

Emmanuel Macron


Emmanuel Macron: um novo modelo de liderança?


Apesar de cada vez mais furibundo com as esquerdas, a direita, mesmo evoluída, não é o chá que costumo tomar. Nunca foi. Mas precisamos, reafirmo, de ter uma direita civilizada—de uma vez por todas! E já agora, de uma esquerda decente, que não traia tudo aquilo que a identifica com os ideais de uma sociedade utópica.

Infelizmente, o que temos são turmas de cortesãos e cortesãs amamentados pelos nossos impostos e pela dívida pública, acolitados debaixo de chapéus de intriga e poder a que chamam partidos políticos. Faltava provar que as minorias radicais (PCP e Bloco) eram farinha do mesmo saco. Devemos agradecer à Geringonça ter eliminado a réstia de ilusão que aconchegava ainda alguns espíritos sensíveis ao marxismo mas que, infelizmente, não foram atualizando os seus conhecimentos teóricos ao longo das últimas décadas.

O país está a esvaziar-se de capital e de inteligência, sobrando demasiada corrupção, sacanagem e uma espécie de letargia que invade o cada vez maior exército de zombies pendurados na dívida pública. 

Não espero, nem desejo um salvador, ao contrário duma maioria silenciosa e ansiosa que não pára de crescer e que, sim, espera pelo eterno ausente chamado Sebastião. As sondagens do regime refletem apenas a sensibilidade da corte e da burocracia, mas à medida que as administrações públicas e os partidos caminham inexoravelmente para a falência (“Novo banco empresta 2 milhões ao PS”— Jornal de Negócios) o que avistamos no horizonte é mais ansiedade e desejo de segurança, fatores psicológicos favoráveis à emergência de um líder decidido a esmagar o poder deletério das máfias que tomaram conta do país e o arruinaram.

Não será Rio, com certeza. Mas se não aparecer por aí um tugalês a copiar Macron, alguma espécie pós-moderna de Salazar acabará por surgir :(

O que se passou e terá passado no caldeirão chamado Raríssimas, e o que se passou e terá passado com o tráfico de crianças através das ligações insondáveis entre a IURD e a rede sórdida de exploração e tráfico de seres humanos imersa no Estado, nomeadamente pelas vias da pedofilia e outras perversões sexuais intoleráveis, parece-me suficiente para exigirmos o fim desta falsa democracia. 

Teremos, pergunto, coragem suficiente para uma nova revolução democrática e libertária? Ou iremos, uma vez mais, esperar pelo ditador?

sexta-feira, maio 05, 2017

Rui Moreira e Salazar



O frenesim autárquico acorda os mais distraídos

“Todos estamos à espera que haja uma má notícia europeia e, quando houver uma má notícia, isto cai”—Rui Moreira (Sábado, 4/5/2017)

Quero crer que Rui Moreira precisava neste momento de uma prova de vida mediática, ou não estivesse o país partidário em plena corrida autárquica. Depois do PS exigir mais lugares na lista de Moreira, este aproveitou para reiterar a independência partidária da sua candidatura. Alguém acredita? Pelo que me foram dizendo, a máquina que esteve na base da sua eleição, e agora exige um prémio maior para voltar a elegê-lo, foi o Partido Socialista.

Depois de Ana Catarina Mendes ter dito que "a vitória das listas que o PS integra serão as vitórias do PS", o protagonista principal do movimento “Porto, o Nosso Partido” (designação algo populista, convenhamos), acordou da sua letargia. De facto, embora a Câmara Municipal do Porto funcione bastante bem, esperava-se de Rui Moreira uma afirmação estratégica mais vincada e sobretudo mais clara enquanto líder da capital do Norte, nomeadamente no que se refere à própria influência do Norte na condução dos destinos do país, a qual continua muitíssimo abaixo do que lhe corresponde em criatividade e capacidade produtiva próprias.

Rui Moreira andou a marcar passo num ponto essencial para todo o país: fazer da cidade-região do Porto a capital económica, financeira e cultural do Noroeste Peninsular. Não se percebe, por exemplo, como a ligação ferroviária de alta velocidade entre Ferrol, Corunha, Santiago e Vigo não chega ao Porto. Será que ninguém tem coragem para exigir dos senhorios do Terreiro do Paço coisa tão óbvia?

Não basta parecer populista, é preciso sê-lo, nem que seja um bocadinho, para garantir a realização do que é racional, justo e oportuno.

Quanto à propaganda do medo que as palavras ditas por Rui Moreira aos estudantes poderão sugerir, uma coisa é certa: se Marine Le Pen derrotar Emmanuel Macron no próximo domingo (hipótese que as sondagens contrariam), tudo começará a mudar rapidamente na Europa, e em Portugal também!

No entanto, se Macron e a União Europeia prevalecerem (o que as sondagens asseguram), e se nos deixarmos de populismos, à esquerda, ao centro e à direita, e formos pagando o que devemos, não há razão nenhuma para inventar um novo Salazar. Já não temos colónias, lembram-se?

Mas atenção: nada dispensa uma reciclagem profunda da nossa democracia, corrupta e imbecil.

Ou as novas gerações mudam os partidos da corda na direção certa, ou estes terão em breve a mesma sorte dos partidos europeus que têm vindo a implodir, sobretudo na banda esquerda do arco-iris partidário.


DESENVOLVIMENTOS

Costa intervém e PS confirma Manuel Pizarro como candidato no Porto

...o secretário-geral do PS, António Costa, telefonou ao presidente da concelhia, Tiago Barbosa Ribeiro, a dizer que o PS tem de apresentar um candidato próprio. Por “uma questão de dignidade partidária”.

Público. Margarida Gomes, 6 de Maio de 2017, 10:27 actualizada às 12:45

Bem parecia que a a coisa estava combinada entre Ana Catarina Mendes e António Costa. Rui Moreira vai ter que dar ao pedal para manter o lugar. Talvez fosse o momento de apresentar ideias inovadoras para o Porto e o norte do país.
O PS tem três meses para definir quem representará o partido na corrida à segunda maior câmara do país, depois de Rui Moreira ter abdicado do apoio do PS às eleições autárquicas marcadas para 1 de Outubro.
[...]
De acordo com o Expresso, que cita fonte da candidatura independente, Rui Moreira avançará apenas com o apoio do CDS/PP; um partido que "sempre teve um comportamento exemplar, sem pressões nem exigências de negociações, ao contrário do PS".
Jornal de Negócios. Marta Moitinho Oliveira martaoliveira@negocios.pt05 de maio de 2017 às 18:29

A crise na aliança dissimulada entre Rui Moreira e os socialistas agravou-se nas útlimas horas, com Rui Moreira a dispensar o apoio dos socialistas à sua candidatura, em nome da independência e da rejeição dos jobs for the boys and girls. Das duas uma: ou o habilidoso Costa dá a volta ao texto nas próximas horas, ou a situação apodrece, e o PS terá mesmo que avançar com um candidato e com uma candidatura partidária à Câmara Municipal do Porto. O problema é que não será fácil desmentir a secretária-geral adjunta do PS, Ana Catarina Mendes, pois tal desautorização levaria custos pesados ao núcleo duro de António Costa. Rui Moreira, por sua vez, poderá vender caro um eventual apaziguamento com os socialistas. Aguardam-se os próximos episódios desta mini crise, sobre a qual espero não ter que ouvir o comentador-presidente Marcelo Rebelo de Sousa.

Atualizado em 6/5/2017 15:52 WET