sábado, janeiro 23, 2010

Portugal 155

Se o Pedro Passos Coelho...

WASHINGTON (21 Jan 2010) -- Rep. Dennis Kucinich (D-OH) on Wednesday said the Massachusetts election was a "wake up call" for Democrats and that his party had better change course or it could suffer devastating losses come November.
... "Every area of the economy is still about taking wealth from the great mass of people and putting it into the hands of a few. If you don't have a economic democracy, you don't have a political democracy." — in The Raw Story.

Há dinâmicas imparáveis. E a dinâmica de vitória de Pedro Passos Coelho, goste-se ou não se goste dele, já começou. E assim sendo, o melhor é irmos contribuindo para que o jovem turco não faça demasiadas asneiras.

Eu preferiria, porventura, ver Paulo Rangel suceder a Manuela Ferreira Leite, mas as coisas são o que são, e a entrevista que Pedro Passos Coelho deu hoje ao Mário Crespo foi uma prestação promissora.

É patente e compreensível a decisão da actual líder do PPD-PSD de se afastar, ainda que fazendo um indecoroso frete político à turma de parasitas que há décadas vivem do partido fundado por Sá Carneiro. Refiro-me claramente ao intriguista Marcelo, ao desamparado e manifestamente quadrado intelectual orgânico que dá pelo nome de Zé Pacheco Pereira, à candeia sombria da Fundação Luso-Americana e da SLN, Rui Machete, ao teddy boy já um pouco cota da 24 Julho, Pedro Santana Lopes, e a todas as ratazanas e pequenos parasitas acomodados que torcem pelo suicídio colectivo do PSD. Como lémures ameaçados por praga divina, preferem incendiar a instituição que os tem engordado, a dar lugar aos mais novos — como é natural, humano e inteligente. A síndroma salazarenta é, infelizmente, muito mais difícil de erradicar do que todos supúnhamos. Basta olhar, noutra direcção, para os clubes de inúteis que impedem os sindicatos, as associações patronais, e as ordens corporativas, de se tornarem algo de útil à democracia, para confirmarmos a natureza endémica desta praga hereditária.

Manuela Ferreira Leite perdeu o momento durante a campanha eleitoral que conduziria à sua clamorosa e inesperada derrota. Depois deste desaire, e apesar de ter sido quem primeiro, de entre a nomenclatura partidária, alertou para a gravidade dos nossos problemas, tem vindo a colocar-se primordialmente ao serviço da estratégia defensiva de Cavaco Silva e da velha guarda cor-de-laranja, responsável, a par da decrépita guarda cor-de-rosa, pelo descalabro a que a democracia portuguesa chegou ao fim de pouco mais de 30 anos de desvario populista. O actual regime demo-burocrático e clientelar, protagonizado por uma partidocracia basicamente corrupta, ocupou e asfixiou o tecido social do país, consumindo-lhe as energias criativas e a poupança. Tal como em muitas outras democracias europeias e americanas, a confiança morreu e o caos social espreita ao virar da esquina deste ou do próximo colapso económico-financeiro das economias virtuais do Ocidente. A guinada desesperada de Obama contra os vampiros de Wall Street e da Banca Global, que hoje fez afundar as bolsas americanas, europeias e asiáticas, tal como as declarações do congressista republicano Dennis Kucinich, deveriam inspirar o novel candidato a mudar o segundo maior partido político português.

Obama Calls for Limiting Size, Risk-Taking of Financial Firms
Jan. 22 (Bloomberg) -- President Barack Obama, tapping into voter anger over bank bailouts, called for limits on the size and trading activities of financial institutions in order to reduce risk-taking and prevent another financial crisis.
... “While the financial system is far stronger today than it was one year ago, it’s still operating under the same rules that led to its near collapse,” Obama said yesterday at the White House after meeting with former Federal Reserve Chairman Paul Volcker, who has been an advocate of taking such steps. “Never again will the American taxpayer be held hostage by a bank that is too big to fail.”

The proposals could affect trading at some of the nation’s largest banks, including New York-based Goldman Sachs Group Inc., Morgan Stanley and JPMorgan Chase & Co., according to Frederic Dickson, chief market strategist at D.A. Davidson & Co. in Lake Oswego, Oregon.

A grande pergunta é esta: será capaz?

O título do livro que Pedro Passos Coelho acaba de lançar (que ainda não li), se não for uma máscara da ignomínia, ou mais uma caricatura de política, então denota uma direcção ambiciosa. Ambiciosa porque pressupõe uma ruptura (Mudar/ Change). Ambiciosa porque é irrealizável sem estabelecer claramente que a próxima vitória do PSD tem que resultar de um movimento de opinião pública nascido desta crise profunda, e não de mais uma arranjo floral intra-partidário. Ambiciosa porque, para ter sucesso, implica obviamente a não recandidatura de Cavaco Silva.

Um aviso: cuidado com Alcochete! E Pedro, não me desiluda, como Sócrates me desiludiu!


Post scriptum —  (23-01-2010 19:22) Os condottieri da comunicação (vulgo, "agências") iniciaram, na edição do Expresso de hoje, a campanha de demolição de carácter de Pedro Passos Coelho. O ponto de partida foi a sua relação profissional com a Fomentinvest, uma empresa típica de lobbying político-empresarial e gestão virtual de empresas e fundos de investimento, cujo presidente é o antigo ministro laranja Ângelo Correia. O que encontraram, para já, é picuinhas, pífio, e se nada mais houver, pode dizer-se que o procedimento de clearance do bem colocado challenger à futura direcção do PPD-PSD, vai no bom caminho. Pelos vistos, Passos Coelho dificilmente se verá metido no usual colete de varas que a promiscuidade entre dinheiro fácil e poder há décadas limita a independência da generalidade dos decisores políticos. A Fomentinvest, precisamente por causa da sua natureza de empresa de gestão de influências, mesmo tendo em conta a notoriedade dos seus associados —Caixa Geral de Depósitos, Grupo Espírito Santo, BANIF, Banco Africano de Investimentos, Fundação Ilídio Pinho, IP Holding, Millennium BCP, Fundação Horácio Roque—, está em relativos maus lençóis. Com um capital de 20 milhões de euros demonstrou apenas um volume de negócios de pouco mais de 600 mil euros em 2007! Por sua vez, a sua aposta recente no mercado de derivados em volta da esperada super-bolha verde das chamadas emissões de CO2 equivalente, depois do fracasso redondo da Cimeira Climática de Copenhaga, e da agora anunciada suspensão dos subsídios públicos à produção de energia solar por parte da Alemanha e da França (que não deixará de contaminar o resto da UE), augura tempos difíceis numa empresa essencialmente virtual, como a Fomentinvest efectivamente é. Também por aqui, o mais que se poderá afirmar é que Pedro Passos Coelho já terá percebido que precisa de mudar de vida. "Crime, disse ela?" Não creio.


OAM 675 — 22 Jan 2010 00:00

sexta-feira, janeiro 15, 2010

Portugal 154

Orçamento vigiado - 1

As cartas estão lançadas, mas não pelo discurso tosco de Cavaco Silva tentando recuperar pateticamente as virtudes da globalização mercantil e financeira, nem pela Pitonisa Constâncio tentando acertar o seu gaguejar com o silvar das agências de notação financeira, nem sequer pelo boneco das finanças. Os cutelos que agora pesam sobre o pescoço da nossa liberdade económica e financeira chamam-se Moody's Investors Service, Fitch Ratings, Standard & Poor's, Banco Central Europeu e... Alemanha! É para eles que governo e oposição tentam ensaiar uma coligação de aparências. Temo, porém, pelo resultado desta pantomima.

Moody’s Says Greece, Portugal May Face ‘Slow Death’

Jan. 13 (Bloomberg) -- The Portuguese and Greek economies may face a “slow death” as they dedicate a higher proportion of wealth to paying off debt and investors demand a premium to hold their bonds, Moody’s Investors Service said.


Moody's Misery Index
(1995-2010), Source: Moody's/New York Times, Jan 2010.


Sovereign Debt: The Developed World’s Next Big Problem?

By Arpitha Bykere, Elisa Parisi-Capone, and Katharina Jungen
1/13/2010 | Roubini Global Economics.

In 2009, downgrades and debt auction failures in countries like the UK, Greece, Ireland and Spain were a stark reminder that investors and rating agencies will soon turn from friends to foes if advanced economies don’t take strides to put their fiscal houses in order. The severe recession, combined with a financial crisis during 2008-09, worsened the fiscal positions of developed countries. The impact was greatest in countries with a history of structural fiscal problems, and those that maintained loose fiscal policies and ignored fiscal reforms during the boom years.


Greece looks set to go the way of Argentina

By Desmond Lachman

Jan.11 2010. "...much like Argentina a decade ago, Greece is approaching the final stages of its currency arrangement. There is every prospect that within two to three years, after much official money is thrown its way, Greece's euro membership will end with a bang." — FT.com.


Why the eurozone has a tough decade to come
By Martin Wolf
Published: January 6 2010 02:00 | Last updated: January 6 2010 02:00. Finantial Times.

What would have happened during the financial crisis if the euro had not existed? The short answer is that there would have been currency crises among its members. The currencies of Greece, Ireland, Italy, Portugal and Spain would surely have fallen sharply against the old D-Mark. That is the outcome the creators of the eurozone wished to avoid. They have been successful. But, if the exchange rate cannot adjust, something else must instead. That "something else" is the economies of peripheral eurozone member countries. They are locked into competitive disinflation against Germany, the world's foremost exporter of very high-quality manufactures. I wish them luck.


Manuela Ferreira Leite, não me canso de lembrar, foi quem primeiro colocou sem meias palavras o dedo na ferida. E fê-lo alertando para a gravidade da situação em que nos fomos afundando ao longo de duas décadas de bonança comunitária inconsciente.

As patacas de Bruxelas pareciam não ter fim. O euro fez de nós, de um dia para outro, novos ricos — sem termos que trabalhar, ou trabalhando pouco e mal. Um escocês de 60 anos que pedalava desde Edimburgo até Marraquexe, com quem tive o prazer de conversar alguns minutos em Arouca, espantava-se com a juventude e exuberância do nosso parque automóvel. É certo que algumas infraestruturas melhoraram radicalmente (sobretudo estradas e autoestradas), que passou a existir uma rede razoavelmente universal de assistência médica, que o saneamento básico, a segurança social e o sistema educativo chegaram à maioria da população. Mas a que preço?

Pelo que agora começamos a perceber, o afluxo de fundos comunitários, ou pelo menos parte significativa desse afluxo trouxe, por um lado, a destruição de segmentos críticos do nosso tecido produtivo industrial e agrícola, e por outro, tão grave quanto o primeiro, engendrou uma ilusão colectiva de crescimento económico progressivamente assente na expansão de alguns sectores económicos improdutivos ou fracamente produtivos: serviços, burocracia e uma crescente nomenclatura de parasitas políticos. A novidade da democracia foi desculpando erros sucessivos, indolências várias, o regresso em força da endogamia institucional, e uma corrupção cada vez mais descarada.

Mas na realidade o que houve foi um endividamento externo estrutural, a princípio invisível, que iludiu a destruição progressiva, sistemática e irreversível dos empregos produtivos, sob a aparência feliz de um consumo fundamentalmente a crédito. Esta voragem consumista foi porém financiada pelo crescimento imparável das nossas dívidas externa e pública, as quais permitiram ir adiando o pagamento das importações de mercadorias, serviços e capital que criaram a falsa imagem do nosso recente progresso e bem-estar social. A hora de pagar a conta, entretanto, chegou — antes mesmo de a democracia amadurecer. Os perigos são evidentes.

Deleveraging: Now the hard part

The challenge of managing the enormous debt burden weighing on global recovery is only just beginning.

Even as signals multiply that a global economic recovery is underway, government and business leaders face uncertainty over its durability and how to manage the lengthy process of debt reduction—or deleveraging—that will weigh on growth after the bursting of the great global credit bubble.

New McKinsey research shows that the challenge of reducing total debt levels relative to GDP is a global problem that is only just getting started. Leverage is still very high in some sectors of several countries, including the United States. History also shows that deleveraging episodes are painful—on average lasting six to seven years—and exert a significant drag on GDP growth in the early stages. in Mc Kinsey Quartely, January 2010.


Os dilemas com que nos defrontamos são bem mais reais do que o vendedor de feira que nos governa quer fazer crer no seu invertebrado optimismo:
  • a redução competitiva dos custos unitários do trabalho tendo em vista melhorar a balança comercial é duplamente inviável: em primeiro lugar, porque 80% ou mais das nossas exportações são intra-comunitárias (e num mercado maduro como o europeu, os frutos da exploração têm sobretudo origem na escala e qualidade dos investimentos, produção e redes de distribuição, na boa gestão empresarial e na própria capacidade alargada de consumo, e não na sobre-exploração unitária dos trabalhadores), e em segundo lugar, porque os grandes produtores mundiais que podem beneficiar de custos unitários do trabalho verdadeiramente baixos estão noutros continentes (Ásia, África e Américas);
  • continuar a subsidiar publicamente o consumo interno para criar emprego e alimentar as empresas, por outro lado, apenas agravará o endividamento geral do país, i.e. todos os défices: fiscal, doméstico e comercial, além de promover uma perigosa hipertrofia burocrática do país;
  • aumentar o investimento público através das grandes obras é ainda uma forma incorrigível de financiar pela via do endividamento geral do país o fluxo de importações de bens e serviços, promovendo além do mais a sobrevivência de uma casta empresarial de Estado incapaz de criar algo de novo, oportunista e sem capacidade nem vontade de competir fora dos regaços protectores da corrupção governamental (esteja esta em Portugal, Angola ou Marrocos);
  • em suma, esperar pelo investimento massivo externo, ou tentar atrai-lo com artimanhas mal pensadas, é acreditar que o dito tem as virtudes de um bom samaritano, quando todos já sabemos que 80-90% das intenções de investimento, no actual estádio do capitalismo, se centram no investimento financeiro oportunista e especulativo, como se viu no monumental colapso económico causado pelo rebentamento da bolha imobiliária em Espanha. O investimento industrial, aquele que realmente conta, é sempre e cada vez mais resultado de estratégias de poder meditadas e de longo prazo visando a integridade e força nacional dos países que ainda têm cabeça para pensar e ânimo patriótico;
  • por fim, aliviar o endividamento público, deixando o desemprego chegar aos 20% ou mais, como parece ser a tendência imparável da Espanha, sem uma rede social de apoio de emergência, poderá desencadear um tal grau de desespero social que a saída venha a ser, ou uma vaga de emigração em massa, de pessoas, empresas e capitais, ou a implosão do actual regime constitucional.
Será possível cozinhar um Orçamento de compromissos? E será possível fazê-lo com credibilidade sem uma visão de médio-longo prazo sobre o futuro do país? Por onde cortar? Por onde apostar? Que caminho nos resta?


Post scriptum
— numa primeira e sumária abordagem estratégica à correcção dramática que deverá ser imprimida ao rumo do país, sob pena de cairmos na mais penosa insignificância face aos demais estados da União Europeia, diria que há quatro prioridades absolutas:
  1. Combater o envelhecimento populacional e a crise demográfica, fomentando literalmente a procriação e uma imigração selectiva;
  2. Relançar o sector produtivo de bens transaccionáveis, e a empresa privada;
  3. Atacar sem dó nem piedade a corrupção profunda da democracia portuguesa;
  4. Lançar um novo paradigma de mobilidade e transportes, com prioridade absoluta aos transportes ferroviário e marítimo — movidos a electricidade e bio-combustíveis renováveis.
Envelhecimento: "Portugal é o oitavo país mais velho do mundo | Económico".

Produção e empresa privada: O argumento falacioso de Cavaco Silva favorável à liberdade capitalista que actualmente manipula a divisão internacional do trabalho (a célebre globalização neoliberal) deve ser objectiva e cientificamente combatido, sem margem para hesitações, em nome de um equilíbrio justo dessa mesma divisão internacional e da cooperação substancial entre os povos. O emprego produtivo é uma prioridade estratégica inegociável, que nenhum oportunismo, nem ganância especulativa podem destruir. É esta a lição que devemos extrair sem demora da crise sistémica do capitalismo especulativo a que a recessão mundial de 2008-09 apenas deu início.

Corrupção da democracia: Segundo o Banco Mundial Portugal piorou, entre 2009 e 2010, a sua posição no que toca à facilidade de fazer negócios no país. Entre 183 economias analisadas Portugal permanece na posição 48. Mas há quatro índices onde a posição portuguesa é particularmente má e impeditiva do investimento externo, faça o que fizer Basílio Horta: contratação de pessoal (posição 171 em 183!), lidar com licenças para obras de construção civil (posição 111), obtenção de crédito (posição 87) e impostos (posição 80).

Ou seja, se queremos andar para a frente e travar o declínio para que caminha o país teremos que atacar imediatamente e radicalmente dois fenómenos enquistados na democracia saída da revolução de Abril: a corrupção profunda do funcionamento burocrático do regime, e a inércia conservadora e igualmente corrompida das organizações corporativas e sindicais.

Só começando por desfazer estas duas instâncias do poder fáctico que se esconde detrás da aparência democrática constitucional do regime, chegaremos a algum lado. Tudo mudará depois, começando pelo exercício efectivo do direito à Justiça.

Enquanto formos iludidos pela mera discussão dos epifenómenos, em vez de irmos direitos ao miolo da corrupção, nada conseguiremos. E mais, ninguém virá auxiliar-nos nesta tarefa urgente e crítica, da qual depende efectivamente a sobrevivência ou a morte desta República.

Prioridade à ferrovia: "To increase investment in railways, Kallas instead suggested using more of the EU's regional funding, which he said "is very much going to the roads at the moment". He added that he "supported the Parliament's objectives to invest more in railways" and heeded their request for a commitment of 40% of the EU transport budget to the rail sector." — in "EU transport nominee wants ‘bigger money’, fewer projects" | EurActiv.


OAM 674 — 15 Jan 2010 02:59 (última actualização: 20 Jan 2010 12:12)

quinta-feira, janeiro 07, 2010

Portugal 153

easyTrain
um transiberiano para toda a gente!


Tokaido Shinkansen, começou por correr a 200Km/h, hoje ultrapassa os 300Km/h nos seus percursos entre Tóquio, Nagoya, Kyoto e Osaka. Os horários funcionam ao segundo! Estive lá e posso testemunhar... (OAM)

Bitola europeia e Alta Velocidade Ferroviária são as prioridades

Transporte ferroviário de passageiros na UE liberalizado

Desde 1 de Janeiro — O transporte ferroviário de passageiros entre países da União Europeia ficou oficialmente aberto à concorrência desde dia 1 de Janeiro. A norma da Comissão Europeia pretende criar novas perspectivas empresariais e de emprego, pressupondo a utilização das infra-estruturas ferroviárias de outros Estados-membros para a realização de rotas internacionais. Desta forma, os operadores poderão oferecer um serviço ferroviário de passageiros internacional, o que, até aqui, acontecia apenas mediante protocolos e acordos pontuais. Para isso, o operador necessita apenas de licença ferroviária e de ter certificados de segurança para operar nos diferentes Estados-membros. Num comunicado oficial, Antonio Tajani, o vice-presidente da Comissão Europeia e responsável de Transportes, revelou que "Trata-se de uma nova etapa na realização de um espaço integrado do transporte ferroviário que beneficiará tanto as empresas quanto os passageiros" — Andreia Amaral, in Transportes em revista.

O NAL de Alcochete só deve avançar quando os privados se responsabilizarem pelo investimento, e por conseguinte for um projecto economicamente viável sem a permanente sangria fiscal dos portugueses. Antes disso, mantenha-se a sub-aproveitada Portela e substituam-se rapidamente as incompetentes administrações da ANA e da TAP.

A arara que puseram no MOPTC é mais um contínuo do Bloco Central do Betão e de quem comprou os terrenos de Alcochete dias antes do senhor Sócrates abandonar a Ota pelo "deserto" da Margem Sul, pelo que tudo o que este Mendonza diz é mero eco da voz do dono. Por exemplo, quando o novo velho ministro afirma que a Portela está a rebentar pelas costuras, ou revela ignorância absoluta (coisa comum nos políticos) ou má fé mal disfarçada. Como é sua obrigação saber, o aeroporto da Portela apenas tem uma hora de ponta por dia (08:00), e nem todos os dias, como se pode constatar fácil e sistematicamente no sítio da Online Coordination System (1). Além do mais, basta reparar nas placas de estacionamento do aeroporto da Portela, atravancadas com aviões parados da TAP, para se perceber que nem o aeroporto está saturado, nem a TAP tem muito que fazer.

Se o senhor Mendonça mandar os aviões da TAP dormir ao aeromoscas de Beja (um aviso sobre o que se pode passar em Alcochete!), ou alugar ao Ministério da Defesa a Base Aérea do Montijo para ali colocar algumas bases Low Cost e parte da TAP, ou simplesmente ordenar à TAP que use as mangas do aeroporto em vez de andar a passear passageiros e bagagens pelo meio das pistas, verá que o novo aeroporto de Lisboa em Alcochete, reservado o terreno e obtida a viabilidade ambiental necessária, pode bem esperar pela próxima legislatura, e decidir-se então se há ou não oportunidade e viabilidade económica e financeira para o dito. Para esta legislatura, já todos sabemos que não há!

Outra questão é a do célebre TGV, i.e. a Alta Velocidade ferroviária...

Percebe-se que o Bloco Central do Betão ande pouco interessado na coisa, sobretudo depois de a Mota-Engil ter perdido a Terceira Travessia do Tejo para o consórcio liderado pela espanhola FCC, das célebres irmãs judias Alícia e Esther Koplowitz. É que os sucessivos governos que até agora tivemos desde 1974 encarregaram-se de destruir a indústria ferroviária nacional, chegando mesmo ao ponto de correr com os canadianos da Bombardier, fabricantes outrora associados à velha Sorefame, e que entre outras coisas fazem aviões a jacto, metropolitanos e comboios de Alta Velocidade! A Bombardier é só uma das maiores empresas mundiais do ramo, e os espertos da Lusitânia despediram-na quando já se sabia que a Europa iria dispor de uma rede de Alta Velocidade/Velocidade Elevada para passageiros e mercadorias, prevendo-se que a mesma possa vir a cobrir todas as capitais europeias e grandes cidades antes de 2030! Ficámos sem indústria, sem trabalho, sem tecnologia, mas com o senhor Coelho na Mota-Engil, e o senhor Vara no BCP. É este padrão de imbecilidade criminosa que o senhor Mendonça do governo Sócrates II quer prosseguir. Espero bem que o tiro lhe saia pela culatra.

Compare-se o cretinismo governamental português em matéria de transportes com a posição britânica do actual secretário dos transportes do governo Brown:
On the fast track to the easyTrain future. By Andrew Adonis, Secretary of State for Transport (UK)

It’s a brave politician who predicts what 2010 holds in store, but I am confident that for Britain it will be the year of high-speed rail.

Over the past 30 years most of Europe and much of Asia have embraced high-speed rail as their modern 21st-century backbone transport infrastructure. Europe now has 3,600 miles of high-speed line in operation, with 2,000 more under construction. China will have 6,000 miles open by 2012, including all 800 miles of the new Beijing-Shanghai line.

(...)

This is a moment to seize. The past 50 years have brought an incredible democratisation of travel, boosting prosperity and opportunity. Air travel, once the preserve of the rich, has been opened up to a mass market. I believe that high-speed rail could similarly transform mobility and opportunity for the next generation.

My ambition is not only that Britain catches up with the rest of Europe in establishing high-speed rail, but that we leapfrog them in the services that we offer. In the same way that Britain led the way in developing low-cost, mass-market, international aviation, I want us to become a pioneer in low-cost, mass-market high-speed rail. I have spent a year studying international high-speed rail. While you can’t fail to be impressed by the technical ingenuity shown in the development and operation of high-speed rail services around the world, the level of innovation in the services being offered is surprisingly low.

(...)

I want to see not just easyJet but easyTrain — high-speed trains with airline-style pricing and mass-market appeal so that high-speed rail is for all, not just the wealthy. — in Times Online.

Está bom de ver que pelo andar ronceiro da carruagem portuguesa, acabaremos por ter TGV, de Lisboa, do Porto e de Aveiro para Espanha e o resto da Europa. Mas dada a lentidão fomentada da nossa economia e da nossa indústria em responder a este grande desafio, o mais provável é que venhamos a ser apenas clientes finais de um produto Made in Europa, mas falando apenas castelhano e inglês. Importam-se? Eu importo-me!


Post scriptum
— Luís Campos e Cunha continua a verberar o TGV, como aliás a maioria dos economistas portugueses. Pergunto: estudaram realmente este dossier? Ao contrário do novo aeroporto, da terceira travessia sobre o Tejo e das novas autoestradas, a Alta Velocidade ferroviária é um investimento e um custo partilhado, não apenas com a União Europeia, mas também com a Espanha. Aliás as ligações Lisboa (Pinhal Novo)-Madrid (via Caia), Porto-Vigo, e Aveiro-Salamanca, são verdadeiros projectos interdependentes, que interessam a toda a Ibéria, que não podem subsistir nacionalmente isolados sob pena de criar problemas estratégicos muito complicados, quer a Espanha se mantenha unida por muitos anos, ou soçobre a uma qualquer variante de federalismo. A rentabilização das autoestradas depende apenas de nós, da nossa vitalidade económica e juventude (ambas em acentuado declínio!) e de algum escasso turismo rodoviário. 82% dos voos da Portela provêm ou destinam-se à Europa, sendo 30% deles de ou para Espanha, ou seja, para rentabilizar o novo aeroporto seria preciso alterar radicalmente esta realidade, cada vez mais dominada pelas companhias Low Cost, que não gostam de aeroportos pomposos e caros. Por fim, a rentabilização da futura rede ferroviária de Alta Velocidade/Velocidade Elevada (vulgo TGV) depende sobretudo da dinâmica da própria rede, ibérica e europeia, e menos do esforço solitário dos portugueses. Espero que esta demonstração colha a devida atenção do estimado economista Luís Campos e Cunha.


NOTAS
  1. A Portela tem apenas uma hora de pico por dia, às 08:00, e outra com algum movimento, às 14:00. O resto é o lá vem um! Para comprovar este desmentido das baboseiras da nova arara que colocaram no MOPTC, o ministro Mendonça, basta consultar o sítio Online Coordination System, seguindo este procedimento de acesso à base de dados online:

    Week
    : W09 -> Airport: LIS -> Week containing: 11JAN.


OAM 673 07-01-2010 18h56 (última actualização: 08-01-2009 00:13)

Portugal 152

Catroga: menos Estado, melhor Estado



Ouvi ontem a excelente entrevista de Eduardo Catroga a José Gomes Ferreira (SIC-N). O principal de tudo foi a clareza e simplicidade com que o ex-ministro de Cavaco Silva expôs os conceitos e fez as contas em cima do guardanapo!

O endividamento geral do país, e sobretudo o problema das finanças públicas, de que aqui se tem escrito o suficiente, é o ponto nevrálgico da análise de Catroga, que sublinha a necessidade de um compromisso partidário a curto, médio e longo prazo, no sentido de sair do actual "pântano económico e financeiro", ultrapassando uma estagnação que dura já há uma década.

Catroga afirma que a trajectória das finanças públicas em curso desde 2000 é insustentável, sendo inadiável corrigi-la. Os casos da Islândia, da Irlanda, da Grécia, da Espanha, da Itália, do Reino Unido..., são um sinal de alarme para todas as economias endividadas, como a nossa.

O mote foi lançado pelo Presidente da República. Catroga trocou por miúdos!


OAM 672 07-01-2010 16:00

Portugal 151

Enquanto a TAP agoniza, as Low Cost florescem!

"Em todas as 31 rotas que a easyJet disponibiliza em Portugal, transportámos em 2009 mais de 3 milhões de passageiros. Esperamos naturalmente aumentar este número em 2010 bem como o número de ligações a partir dos 4 aeroportos portugueses onde operamos, Lisboa, Porto, Faro e Funchal." — Beatriz Fernández (easyJet), in LowCost Portugal (6 Jan 2010).

Na realidade, as Low Cost estão a ser uma benção económica para o país: trazem negócio às cidades e regiões e permitem um contacto muito mais estreito e regular da diáspora portuguesa com o seu "terroir". Ou muito me engano, ou são mesmos os emigrantes portugueses a causa do grande sucesso das Low Cost em Portugal —e a garantia da sua sustentabilidade a prazo. Só por isto, o gaúcho da TAP deveria ser despachado de volta ao Brasil e o inenarrável Mário Lino chamado a responder por tanta inépcia durante o seu desgraçado consulado ministerial.

Este vai-e-vem dos nossos emigrantes, que são muitos e cada vez mais europeus, apresenta externalidades positivas cuja importância seria bom avaliar convenientemente: diminuição da pegada ecológica por viajante/emigrante, menos mortalidade nas estradas, menos consumo de combustíveis, mais movimentos pendulares (ponto-a-ponto) mas com percursos de menor duração e menos tempo morto, maior percepção do estado do país por parte de quem se viu obrigado a emigrar devido à incompetência e corrupção da nossa democracia, etc…

O modelo das companhias de bandeira —caro, subsídio-dependente, endogâmico, conservador, endividado— está definitivamente esgotado. As falidas British Airways (cujo buraco no respectivo fundo de pensões poderá vir a inviabilizar a anunciada fusão com a Ibéria), Air Japan, ou TAP, são disto mesmo esclarecedores exemplos, a não seguir e a corrigir imediata e drasticamente. Os peritos, mas os peritos mesmo, que tomem cartas no assunto e aconselhem convenientemente os medíocres políticos que supostamente nos governam.

Uma medida de poupança imediata seria obrigar os nossos deputados, eurodeputados, aparachiques partidários e todos os altos funcionários da nossa gordurosa burocracia a trocar os descontos da TAP (que pagamos com impostos!) pelas companhias Low Cost. Façam as contas!

Vamos observar minuciosamente a encenação que a nomenclatura partidária se prepara para confeccionar em volta do próximo Orçamento de Estado. Eduardo Catroga deu ontem uma excelente entrevista ao José Gomes Ferreira (SIC-N), que bem pode servir de mote ao observatório cívico que a blogosfera deve desde já montar sobre a Operação Orçamento de Estado 2010.


OAM 671 07-01-2010 11:24

quarta-feira, janeiro 06, 2010

Portugal 150

O mais parecido com uma Câmara Corporativa... Gay e Lésbica!

José Sócrates é contra: defende que os deputados do seu partido sejam impedidos de votar a favor esses dois projectos, admitindo apenas algumas excepções (por exemplo: Miguel Vale de Almeida, primeiro deputado assumidamente gay, que tem feito desta luta uma causa de vida e por isso foi convidado para integrar a bancada do PS) e Sérgio Sousa Pinto (ex-líder da JS e um "histórico" do partido na defesa das chamadas causas "fracturantes") — in DN.


Há duas castas de deputados no PS: as prima-donas (Miguel Vale de Almeida e Sérgio Sousa Pinto) e os párias (o resto do rebanho parlamentar "socialista"). Registo mais esta nódoa da nossa democracia. E ainda: afinal a Assembleia da República, além de subalternizar os deputados eleitos face a um primeiro-ministro designado pela burocracia partidária em maniqueístas e encenadas pseudo directas partidárias, está à beira de consagrar o regresso do nosso parlamento à natureza corporativa que foi timbre do Salazarismo. Desta vez, começaram pelas gays e lésbicas. Depois virão os professores (que já são a maioria do hemiciclo), os advogados (que são em bom número também), os amigos da Mota-Engil, o clube de fãs do sucateiro de Ovar e os independentistas de Carcavelos, que desejam legitimamente criar um imposto local para rentabilizar o uso da sua magnífica praia! Todos com direito a determinadas prerrogativas especiais —de casta— na balbúrdia populista que há 35 anos foi rebaptizada com o nome de Assembleia da República.

Que tal um abanão neste indecoroso, decadente e corrupto regime de incongruências e despotismo populista?

Estou farto de vos aturar!


Post scriptum
— Sobre os casamentos heterodoxos.

Sou a favor da legitimação do casamento homossexual, como sou a favor da legitimação de mais tipos de casamento, desde que celebrados de livre vontade e não consubstanciem qualquer forma de exploração ou manipulação da pessoa humana, nem prejudiquem os direitos de terceiros, nomeadamente familiares, com laços sanguíneos ou jurídicos conhecidos. E também apoio a extensão dos direitos de adopção aos casais heterodoxos, desde que estes preencham as condições de idoneidade, transparência social e conforto económico adequados.

Gostaria no entanto de saber se os distintos e privilegiados senhores deputados Miguel Vale de Almeida e Sérgio Sousa Pinto estarão comigo na defesa futura do casamento aberto, do casamento poligâmico, e do casamento poliândrico. Deixo a polémica questão do casamento incestuoso para a próxima década.

OAM 670 06-01-2010 12:26

domingo, janeiro 03, 2010

Portugal 149

Eleições em Maio?


Entre Reguengo e Valada (cheia), 2 Jan. 2010 (Foto OAM)

"Com este aumento da dívida externa e do desemprego, a que se junta o desequilíbrio das contas públicas, podemos caminhar para uma situação explosiva." — in Discurso de Ano Novo do Presidente da República.

Se a indecisão em volta do próximo Orçamento de Estado redundar num impasse político, e se as crises internas dos partidos do Bloco Central se agudizarem, nomeadamente em resultado do impasse criado no parlamento, ao ponto de assistirmos a cisões no PS e no PSD, não vejo como possa Cavaco Silva evitar a dissolução da Assembleia da República e a marcação de eleições legislativas antecipadas. Acho até que todos ganharíamos num tal cenário: os actuais e futuros partidos políticos, o presumível futuro candidato presidencial Aníbal Cavaco Silva, e mesmo nós, pobres contribuintes. Pelo contrário, a continuação do definhamento em curso da democracia portuguesa, cujas múltiplas feridas não param de deitar pus, apenas agravará o custo e a dor dos cuidados intensivos de que urgentemente necessitamos e acabarão por ser impostos a bem ou a mal.

"Em face da gravidade da situação, é preciso fazer escolhas, temos de estabelecer com clareza as nossas prioridades.

Os dinheiros públicos não chegam para tudo e não nos podemos dar ao luxo de os desperdiçar.

(...) Nas circunstâncias actuais, considero que o caminho do nosso futuro tem de assentar em duas prioridades fundamentais.

Por um lado, o reforço da competitividade externa das nossas empresas e o aumento da produção de bens e serviços que concorrem com a produção estrangeira.

Por outro lado, o apoio social aos mais vulneráveis e desprotegidos e às vítimas da crise." — idem.

A reponderação do plano de obras públicas do governo Sócrates não pode deixar de ser a ilação lógica deste acertado juízo presidencial. Boa parte de tais obras são desnecessárias, desastrosas do ponto de vista estratégico e tecnológico, caríssimas, fruto presumível de especulação ilícita e sem efectiva repercussão nos níveis de emprego e competitividade do país (pois o trabalho é temporário e toda a tecnologia importada.)

A Alta Velocidade/Velocidade Elevada ferroviária para pessoas e mercadorias, salvo os troços Caia-Pinhal Novo e Porto-Vigo, deve pois abrandar o respectivo calendário, o que é bem diferente de rejeitar a ideia do dito TGV, como muitos fazem. O aeroporto de Alcochete pode esperar. A TTT Chelas-Barreiro tem que parar imediatamente (e o senhor da RAVE, demitido!) As barragens que nada trazem de essencial, atentam contra a sustentabilidade económica e destroem os ecossistemas naturais (Tua, Fridão, etc.) devem fazer marcha-atrás (e o senhor Mexia, posto a andar!) O plano de autoestradas, em fase final de execução, enfim, talvez mereça ser concluído como previsto, ainda que renegociando as carraças contratuais que consubstanciam boa parte dos eufemismos a que chamam Parcerias Público Privadas. Por sua vez, o aeroporto da Portela pode e deve ser ampliado e melhorado quanto antes, a TAP reestruturada de uma ponta a outra e a base aérea militar do Montijo arrendada temporariamente à ANA para complemento da Portela. Voltando ao tema da ferrovia, deveria ser traçado um plano urgente de migração da actual bitola ibérica para a bitola europeia em todos os trajectos com especial valor estratégico para a economia portuguesa: ligações entre portos, dos portos atlânticos a Espanha e ao resto da Europa e ligações entre todas as capitais de distrito do país (1).

"Cerca de noventa e cinco por cento das nossas empresas têm menos de vinte trabalhadores.

Sendo esta a estrutura do nosso tecido produtivo, o contributo das pequenas e médias empresas é decisivo para a redução do desemprego e para o desenvolvimento do País.

Às instituições financeiras, por seu lado, exige-se que apoiem de forma adequada o fortalecimento da capacidade das pequenas e médias empresas para enfrentarem a concorrência externa.

Se o Estado tem a responsabilidade de garantir a estabilidade do sistema financeiro em períodos de turbulência, os bancos têm a responsabilidade social de garantir que o crédito chega às empresas." — ibidem.

Este ponto é porventura dos mais sensíveis da política futura, pois exigirá, para ter sucesso, uma verdadeira arte da governação e um duradouro e imaginativo consenso sobre o modelo estratégico da nossa economia, do nosso ordenamento territorial e da nossa flexibilidade laboral e financeira. A solução necessária não está ainda disponível e não creio que qualquer dos actuais partidos tenha a suficiente imaginação para propor ideias sem preconceitos no âmbito da discussão do próximo Orçamento de Estado. Mas de uma coisa podemos estar todos certos: os bancos não podem investir o dinheiro que não têm! Vamos pois precisar de menos maniqueísmo e de verdadeira criatividade política, económica, financeira e social para sairmos da armadilha do endividamento estrutural do país, da hipertrofia do Estado, da falta de Justiça e da corrupção para que fomos conduzidos ao longo das últimas duas décadas por uma nomenclatura irresponsável.

"Importa ter presente que Portugal tem já um nível de despesa pública e de impostos que é desproporcionado face ao seu nível de desenvolvimento.

Assim, seria absolutamente desejável que os partidos políticos desenvolvessem uma negociação séria e chegassem a um entendimento sobre um plano credível para o médio prazo, de modo a colocar o défice do sector público e a dívida pública numa trajectória de sustentabilidade.

O Orçamento do Estado para 2010 é o momento adequado para essa concertação política, que, com sentido de responsabilidade de todas as partes, sirva o interesse nacional.

Não devemos esperar que sejam os outros a impor a resolução dos nossos problemas." — ibidem.

Ninguém poderá seriamente evitar estas questões colocadas por Cavaco Silva. Mas serão os actuais partidos políticos capazes de assumir o desafio? Duvido. Duvido mesmo muito!

Cavaco Silva, que verdadeiramente não sei se terá condições para se recandidatar ao cargo que actualmente ocupa (bastará Santana Lopes saltar-lhe na frente para desfazer tal hipótese), termina a sua mensagem de Ano Novo alertando para as falsas querelas com que José Sócrates e o seu estado-maior de piratas e criaturas de seita, querem lançar sobre o país como mais uma cortina de ilusionismo e manipulação.

Liberalização do divórcio, casamento entre homossexuais, regionalização são temas inegavelmente importantes, mas são também assuntos povoados de tabus. Numa democracia plena, que não na democracia populista em que a nossa nomenclatura partidária transformou o país, temas sensíveis como estes exigem estudo, pedagogia, discussão pública e até referendos! Não merecem, como aconteceu no caso da legislação proposta para o casamento gay, que se transforme o parlamento num campo concentracionário, com deputados de primeira (Miguel Vale de Almeida e Sérgio Sousa Pinto) e ralé sem direito à consciência. Os casais homossexuais não poderão adoptar crianças, impõe o chefe Sócrates aos seus apaniguados (2). Mas basta uma pessoa para requerer a adopção! (3).

Por fim a regionalização. Quem de bom senso pretende discuti-la serenamente ou mesmo levá-la por diante no preciso biénio ou triénio em que Portugal atravessa a sua maior crise financeira, de envelhecimento populacional (4) e de endividamento, desde 1892?! Se não for de um doido, diria que tal estratagema só poderá ter saído dum gabinete de propaganda e contra-informação ao pior estilo dos regimes autoritários do século 20.



NOTAS
  1. «Vários capitalistas ingleses, aqueles que pertencem à aristocracia financeira de Londres, estão dispostos a construir uma linha de caminho-de-ferro no Sul de Portugal, linha essa que virá a ser um dos troços da rede geral ferroviária da Europa, que terá de atravessar a Espanha e ligará o porto de Lisboa aos principais mercados do mundo.» 40.

    (40) Arquivo Histórico do Ministério das Obras Públicas, DGOP-EC, 107, Documentos Relativos às Propostas Feitas para a Construção do Caminho-de-Ferro de Leste a partir de Santarém e do Caminho de Ferro de Lisboa ao Porto, 1856-59. Em 1872, o cônsul inglês em Lisboa também partilhava as ideias dos seus contemporâneos acerca do desenvolvimento dos caminhos-de-ferro em Portugal, ao comentar que uma linha directa entre Lisboa e Paris «reduziria o tempo de viagem em, pelo menos, vinte e quatro horas e, em minha opinião, até muito mais. Todas as malas postais da América do Sul e do Pacífico e o grande número de passageiros que quisessem evitar o golfo da Biscaia seguiriam esse caminho; e, se se fizessem as necessárias alterações e melhoramentos no porto, Lisboa não teria, praticamente, de temer qualquer concorrência» (Great Britain Parliamentary Papers, 1873, LXV, 828, «Report by Consúl Brackenbury on the Trade and Navigation of the Consular District of Lisbon for the Year 730 1872», p. 995). — in António Lopes Vieira, A política da especulação — uma introdução aos investimentos britânicos e franceses nos caminhos-de-ferro portugueses.

  2. "Sócrates impõe voto contra a adopção por casais gay" — in i.

  3. Quem pode requerer a adopção? "Uma pessoa se tiver: mais de 30 anos; mais de 25 anos, se o menor for filho do cônjuge do adoptante" — in Portal do Cidadão.

  4. Quantifying Eurozone Imbalances and the Internal Devaluation of Greece and Spain

    ... the main source of these economies' difficulties, while certainly very much present in the here and now, essentially has its roots in population ageing and a period, too long, of below replacement fertility that has now put their respective economic models to the wall. It is interesting here to note that while it is intuitively easy to explain why economic growth and dynamism should decline as economies experience ongoing population ageing, it is through the interaction with public spending and debt that the issue becomes a real problem for the modern market economy. Contributions are plentiful here but Deckle (2002) on Japan and Börsh-Supan and Wilke (2004) on Germany are good examples of how simple forward extrapolation of public debt in light of unchanged social and institutional structures clearly indicate how something, at some point, has to give. Whether Spain and Greece have indeed reached an inflection point is difficult to say for certain. However, as Edward rightfully has pointed out, this situation is first and foremost about a broken economic model than merely a question of staging a correction on the back of a crisis.

    Secondly and although it could seem as stating the obvious, Greece and Spain are members of the Eurozone and while this has certainly engendered positive economic (side)effects, it has also allowed them to build up massive external imbalances without no clear mechanism of correction. Thus, as the demographic situation has simply continued to deteriorate so have these two economies reached the end of the road. In this way, being a member of the EU and the Eurozone clearly means that you may expect to enjoy protection if faced with difficulty, but it also means that the measures needed to regain lost competitiveness and economic dynamism can be very tough. Specially and while no-one with but the faintest of economic intuition would disagree that the growth path taken by Greece and Spain during the past decade should have led to intense pressure on their domestic currencies, it is exactly this which the institutional setup of the Eurozone has prevented. I have long been critical of this exact mismatch between the potential to build internal imbalances and the inability to correct them, but we are beyond this discussion I think. Especially, we can safely assume that the economists roaming the corridors in Frankfurt and Brussels are not stupid and that they have known full well what kind of path Greece and Spain (and Italy) invariably were moving towards.

    Essentially, what Greece and Spain now face (alongside Ireland, Hungary, Latvia etc) is an internal devaluation which has to serve as the only means of adjustment since, as is evidently clearly, the nominal exchange rate is bound by the gravitional laws of the Eurozone. Now, I am not making an argument about the virtues of devaluation versus a domestic structural correction since it will often be a combination of the two (i.e. as in Hungary). What I am trying to emphasize is simply two things; firstly, the danger of imposing internal devaluations in economies whose demographic structure resemble that of Greece and Spain and secondly, whether it can actually be done within the confines of the current political and economic setup in the Eurozone.

    ...

    Internal Devaluation, What is it All About Then?

    If the technical aspects of an internal devaluation have so far escaped you it is actually quite simple Absent, a nominal exchange depreciation to help restore competitiveness the entire burden of adjustment must now fall on the real effective exchange rate and thus the domestic economy. The only way that this can happen is through price deflation and, going back to my point above, the only way this can meaningfully happen is through a sharp correction in public expenditure accompanied with painful reforms to dismantle or change some of the most expensive social security schemes. This is naturally all the more presicient and controversial as both Spain and Greece are stoking large budget deficits to help combat the very crisis from which they must now try to escape. Positive productivity shocks here à la Solow's mana that fall from the sky may indeed help , but in the middle of the worst crisis since the 1930s it is difficult to see where this should come from. Moreover, with a rapidly ageing population it becomes more difficult to foster such productivity shocks through what we could call "endogenous" growth (or so at least I would argue).

    ...

    From 2000-2009(Q3) the accumulated annual increases in the CPI was 57% for Germany versus 109.4% and 104% for Greece and Spain respectively. Assuming that Germany remains on its historic path of annual CPI readings (which is highly dubious in fact), this gives a very clear image of the kind of correction Greece and Spain needs to undertake in order to move the net external borrowing back on a sustainable path which in this case means that these two economies are now effectively dependent on exports to grow.

OAM 669 03-01-2010 23:55 (última actualização: 04-01-2010 10:25)