sábado, janeiro 23, 2016

O embuste orçamental de 2016

Mário Centeno, ministro das finanças

Mário Centeno baralhou e deu de novo as cartas da austeridade


A única coisa que vai crescer perigosamente em 2016—2019, se este governo não mudar de rumo, ou não for substituído, é a nossa exposição à irresponsabilidade populista da geringonça das esquerdas.

Quatro linhas de crítica a este esboço de orçamento:

  1. O PIB não vai crescer 2,1% em 2016, mas entre 1,0% e 1,7%.
  2. O Estado vai emitir 71,1 mil milhões de euros de dívida no período 2016-2019, em vez  dos 59 mil milhões previstos em setembro. Ou seja, mais 12,1 mil milhões de euros.
  3. Na antecipação do pagamento da dívida ao FMI, que o anterior governo programou saldar até 2017, Mário Centeno terá dado indicações ao IGCP para pagar, de 2016 a 2019, menos 6,6 mil milhões de euros do que estava previsto, empurrando esta responsabilidade para lá de 2019.
  4. O reembolso da dívida em 2016 será inferior em 400 milhões de euros do que o anteriormente provisto.

OE 2016 versus OE 2015

Défice: 2,6% [-0,4 pp]
Dívida pública: 126% [-2,7 pp]
Crescimento: 2,1% [sobretudo por via das exportações]
PIB potencial: 0,5% [0,1% em 2015 ; -0,4% em 2014]
Hiato do produto [PIB real - PIB potencial; en.: output gap]: -0,9% [-2,4% em 2015]
Remuneração por trabalhador: +2,1% [sobretudo por efeito dos aumentos do SMN e dos vencimentos nas administrações públicas]*
Investimento público: +4% [Portugal 2020]
Consumo privado: 2,6% [igual a 2015]
Consumo público: 0,0% [recua face a 2015: 0,2%]
Exportações: 4,9% [recuam 1% face a 2015: 5,9%]
Importações: 5,9% [recuam 1,6% face a 2015: 7,6%]
Procura interna: 2,4% [cresce 0,2% face a 2015: 2,2%]
Procura externa líquida (exportações-importações]: melhora de -0,7% para -0,3%

* No privado, pelo contrário, haverá contenção salarial e menor custo unitário por unidade de PIB. É assim que traduzimos esta frase sibilina de Mário Centeno: "No setor privado, a moderação salarial e a evolução positiva da produtividade, permitirão que os custos unitários do trabalho evoluam em linha com os dos principais parceiros comerciais, mantendo a competitividade das exportações nacionais."]

Outra asserção sibilina: "O Plano Orçamental apresenta uma saudável recomposição das receitas fiscais com a diminuição do peso dos impostos diretos, cuja receita diminui 3,4%, e aumento de 5,8% do peso dos impostos indiretos." Os impostos indiretos atingem sobretudo a aquisição de bens e serviços, ou seja, o consumo conspícuo (fiscalidade saudável), mas também os fatores de produção como o gasóleo e demais produtos petrolíferos, eletricidade, farinhas, circulação de pessoas, bens e serviços, etc. (ou seja, uma fiscalidade parasitária que atrofia o PIB potencial e a competitividade externa da economia). Já os impostos diretos, além de mais transparentes, podem gerar maior justiça fiscal e eficácia estratégica na economia.



source: tradingeconomics.com


Portugal GDP Annual Growth Rate  Forecast 2016-2020
GDP Annual Growth Rate in Portugal is expected to be 1.40 percent by the end of this quarter, according to Trading Economics global macro models and analysts expectations. Looking forward, we estimate GDP Annual Growth Rate in Portugal to stand at 1.02 in 12 months time. In the long-term, the Portugal GDP Annual Growth Rate is projected to trend around 1.27 percent in 2020, according to our econometric models.

terça-feira, janeiro 12, 2016

Calote ou restruturação suave?

Christine Lagarde
Foto: AFP/ Getty images

Os principais credores institucionais levam Portugal ao colo


Bruxelas aprova por mais seis meses regime português de apoio à banca 
Correio da Manhã/Lusa, 12.01.2016  11:23 
A Comissão Europeia voltou hoje a prolongar, por mais seis meses e até 30 de junho, o regime excecional de apoio às instituições financeiras em Portugal, criado há quase oito anos devido à crise. Desde a sua criação, em outubro de 2008, a medida de ajuda à banca foi prolongada várias vezes, a última das quais a 22 de julho de 2015, tendo agora sido prorrogada até 30 de junho próximo, anunciou o executivo comunitário. Em comunicado, a Comissão Europeia considera que o regime se enquadra nas ajudas de Estado a instituições bancárias devido à crise e que a extensão da medida está bem dirigida, proporcionada e limitada no tempo e no seu raio de ação. 
FMI: dívida pública deveria ter sido reestruturada 
Observador, 20/12/2015, 11:03 
O Fundo Monetário Internacional (FMI) assumiu, num relatório divulgado durante esta semana, que os programas de ajustamento implementados pela troika nos últimos sete anos em países como Portugal, tiveram várias falhas. No caso português, a principal falha apontada é o facto de não se ter considerado a possibilidade de uma restruturação da dívida pública.
FMI admite que programa de ajustamento pode ter aumentado dívida acima do esperado  
LUSA, 16 de dezembro de 2015, às 21:20 
Num relatório de avaliação de programas de resgate financeiro em 27 países iniciados entre 2008 e 2013 divulgado hoje, o Fundo Monetário Internacional (FMI) afirma que “o efeito de contração da consolidação orçamental na procura pode ter contribuído, com outros fatores, para aumentar o rácio de dívida pública face ao PIB [Produto Interno Bruto] mais do que o esperado no curto prazo”. 
Esse é o caso de Portugal, um dos países analisados neste relatório, indicando o Fundo que “esta tendência foi exacerbada devido a custos de recapitalização da banca”, bem como “da reclassificação da dívida de empresas públicas que estavam anteriormente fora do perímetro das administrações públicas”. 
BCE anuncia programa alargado de aquisição de ativos
BCE, 22 de janeiro de 2015

O BCE alarga as aquisições a obrigações emitidas por administrações centrais da área do euro, organismos e instituições europeias. 
O valor combinado mensal das aquisições de ativos ascenderá a €60 mil milhões. 
As aquisições realizar-se-ão, pelo menos, até setembro de 2016. 
O programa foi concebido para cumprimento do mandato de manutenção da estabilidade de preços. 
O Conselho do Banco Central Europeu (BCE) anunciou hoje um programa de aquisição de ativos de âmbito alargado, o qual visa assegurar o cumprimento do mandato do BCE de manter a estabilidade de preços e implica a adição de um programa de aquisição de obrigações de dívida pública aos já existentes programas de aquisição de ativos do setor privado, com vista a fazer face aos riscos de um período demasiado prolongado de inflação baixa. 
O Conselho do BCE tomou esta decisão perante uma situação em que a maioria dos indicadores da inflação observada e esperada na área do euro apresentava uma tendência para mínimos históricos. Como potenciais efeitos de segunda ordem na fixação de salários e preços ameaçavam afetar negativamente a evolução dos preços no médio prazo, a situação exigia uma resposta vigorosa em termos de política monetária. 

A restruturação suave da dívida portuguesa soma e segue.

Desde 2012 que Christine Lagarde e Olivier Blanchard (1) (2) vêm reconhecendo erros na política de austeridade aplicada ao seus sócios, nomeadamente a Portugal. Talvez por isto o FMI acabou por aceitar sucessivas trocas de dívida cara por dívida barata e alongamentos nas maturidades, propostos pelos gestores da dívida portuguesa.

De algum modo esta correção resulta do murro na mesa dado por Mario Draghi em 24 de julho de 2012 numa aparente declaração de guerra contra os grandes especuladores, sobretudo americanos, que têm atacado o euro:

‘Within our mandate, the ECB is ready to do whatever it takes to preserve the euro. And believe me, it will be enough.’/ ECB

Em 22 de janeiro de 2015 o BCE, depois de baixar sucessivamente a taxa de juro de referência, anunciou um programa alargado de aquisição de ativos, condição sine qua non para países como Portugal continuarem a aceder aos mercados da dívida soberana em condições sustentáveis. Já não bastavam os juros negativos introduzidos pelo BCE em 11 de junho de 2014!

O que não deixa de ser muito engraçado é o silêncio dos nossos macro-economistas. Ressaltam como especialmente patéticos os silêncios do PS, do PCP e do Bloco, nomeadamente os silêncios de Mário Centeno, de Eugénio Rosa, e de Mariana Mortágua. Engoliram mais um sapo, foi?

A verdade é que este enorme alívio dado pelo FMI, mas também pela Comissão Europeia e pelo BCE, ao governo de António Costa, um governo, recorde-se, suportado pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda sempre que for conveniente aumentar a despesa pública ou os impostos, e pelo PSD sempre que for preciso forçar os contribuintes a engolirem elefantes bancários, cria todas as condições para, talvez pela última vez, acertarmos o passo com as nossas capacidade produtivas e riqueza realmente acumulada.

Daqui ao Orçamento 2016, e deste até ao fim da legislatura, nenhum partido com assento parlamentar poderá queixar-se da União Europeia, nem do FMI para desculpar erros próprios, ou a mais do que provável prossecução aventureira de receitas neo-neo-keynesianas, de que mais um embuste —o da falsa arborização da Segunda Circular— é já exemplo do provável regresso fatal ao lugar do crime.

Uma restruturação plena implicaria a renúncia efetiva de uma parte da dívida, e um 'haircut' junto dos detentores de instrumentos de dívida soberana portuguesa.

Esta medida, sempre defendida pelo Bloco de Esquerda (o PCP vai mais longe: defende a saída do euro!) foi sucessivamente rejeitada pelo PS, PSD e CDS. Daí que possamos falar de uma restruturação suave da nossa dívida, obtida à custa da queda das taxas de juro, dos alongamentos das maturidades, e da troca de dívida cara por dívida barata, mas também sob a proteção permanente dos nossos principais credores institucionais: o BCE e o FMI.

Quanto à austeridade, duvido que uma restruturação da gigantesca dívida portuguesa a evitasse.

O resultado da ilusão populista é a desgraça que continua a desfazer a Grécia. Seguiu, como todos sabemos, a via das restruturações sanguíneas. Entre nós, o preço de mais uma rodada de centralismo burocrático e demagogia esquerdista será bem pior do que a austeridade.

Apesar de suave, a restruturação em curso daquela que é uma das maiores dívidas soberanas do planeta, não deixará de capturar uma parte decisiva da nossa soberania, como se tem visto na alienação acelerada do sistema financeiro e bancário e em vários setores estratégicos da economia: energia, água, transportes e o mais que veremos durante o governo de António Costa.


NOTAS

  1. IMF/ World Economic Outlook/ "Coping with High Debt and Sluggish Growth", October 2012 (pdf)
  2. IMF Working Paper, "Growth Forecast Errors and Fiscal Multipliers2, January 2013
    By Olivier Blanchard and Daniel Leigh (pdf)

domingo, janeiro 10, 2016

O sinaleiro presidencial

Américo Thomaz, presidente da república portuguesa de 1958 a 1974, conhecido como o 'corta-fitas'

A nossa democracia tem vindo a perder sucessivos graus de liberdade


Com o fim à vista da essência do regime saído da Constituição de 1975, o parlamento vai tornar-se o refúgio democrático de um país onde o poder essencial de decidir o que é importante emigrou para Bruxelas, Estrasburgo e Frankfurt.

Desta circunstância ao embaciamento do cargo de presidente da república foi o passo de uma vigência: a do último mandato de Aníbal Cavaco Silva. Mesmo que Marcelo Rebelo de Sousa, o previsível próximo presidente, consiga promover uma grande coligação à portuguesa, a qual, na realidade, há muito existe e voltou a verificar-se no resgate público do Banif e na subsequente aprovação do orçamento retificativo (o PSD apoiou o PS, votando a favor ou abstendo-se, e depois deste passo garantido, o PCP e o Bloco puderam votar contra em nome das suas cada vez menos convincentes aparências), a abertura futura para acordos de regime orientados para a sobrevivência dos poucos graus de liberdade que ainda nos restam, ainda que necessária e urgente, já pouco poderá fazer pelo poder das elites nacionais. Daí a situação de impasse em que nos encontramos. O próximo presidente da república, mantendo embora os poderes da representação simbólica, da palavra, da chefia suprema das forças armadas, do veto constitucional e da dissolução do parlamento, será cada vez menos capaz de impor soluções às crises políticas que aí vêm. Estas, ou se resolvem no quadro parlamentar, ou terão que ser dirimidas em sucessivas eleições e referendos.

Nada impede, porém, num quadro extremo de degradação insanável da situação política, que os futuros presidentes da república, esgotada a capacidade de promover o diálogo institucional, e perante impasses perigosos, como aquele que poderia ter existido depois das últimas eleições legislativas, mas que acabou por se resolver matando uma convenção não escrita sobre quem deve governar depois de umas eleições legislativas, não use a palavra e a comunicação direta com o povo —i.e. as suas forças vivas— para promover governos de iniciativa presidencial. Seria sempre uma ultima ratio, mas o espaço para esta emergência existe, tem toda a legitimidade constitucional, e porque assim é, não se pode afirmar que o semi-presidencialismo tenha desaparecido. Serão mais os governos a depender do parlamento, do que o presidente a depender de ambos.

Se o próximo presidente vier a promover uma maior e mais isenta relação entre eleitos e eleitores, tornar-se-à então mais verosímil a emergência de uma nova balança institucional entre políticos, partidos políticos, parlamento, governo e presidência da república na sua relação democrática com o povo que a todos legitima direta ou indiretamente.

Profetizar que os próximos presidentes da república não passarão de sinaleiros do regime não chega para transformá-los em figuras decorativas do regime, como Américo Thomaz foi para Salazar e Marcello Caetano.

sábado, janeiro 09, 2016

A dívida crescerá em 2016, e o resto?


source: tradingeconomics.com

Em 2030 Portugal terá menos 529 mil residentes*. Vamos crescer como?


O Deutsche Bank tinha em dezembro de 2013 uma exposição ao buraco negro de derivados financeiros na ordem dos 54,7 biliões de euros (54,7x10E12), isto é, 19x o PIB da Alemanha! (1)

Só para termos uma ideia ainda mais dramática do problema, o PIB mundial em 2014 andou pelos 68 biliões de euros.

A fraude ambiental da Volkswagen pode ter sido o cisne negro que levou o sistema financeiro global dar mais um forte sinal de que caminha rapidamente em direção a um novo colapso.

Os sinais dados pela China desde o verão passado são evidentes.

Em suma, o ambiente externo favorece tudo menos a resolução dos nossos problemas.

O crescimento que António Costa, apoiado por Catarina Martins e Jerónimo de Sousa defendem, não existe, nem existirá tão cedo.

Haverá mais défice (ainda que parte dele seja ‘neutralizado’ com o apoio da CE e do BCE). E assim sendo pergunta-se: como iremos resolver o problema da nossa colossal dívida pública, quando em 2016 já se prevê (2) um novo endividamento junto dos mercados (garantidos pelo BCE, é preciso sublinhá-lo) na ordem dos 21,7 mil milhões de euros, 7 mil milhões dos quais destinados a financiar as necessidades líquidas do Estado, nomeadamente com o Novo Banco, o Banif, e a chamada “viragem da página da austeridade”?

É que com taxas médias crescimento 1,02% no final de 2016, e de 1,27% em 2020 [Trading Economics], e uma dívida a pagar taxas de juro médio acima dos 2%, estaremos cada vez mais entalados.

E entalados, neste caso, significa:

1) subordinação quase completa às exigências dos credores, a começar pelo BCE e Comissão Europeia;

2) insolvência crescente do nosso sistema financeiro e a consequente alienação do mesmo ao casino dos tubarões financeiros globais;

3) definhamento acelerado da grande burguesia nacional e dos seus grupos económicos;

4) novos apertos fiscais;

5) deterioração contínua do estado social apesar do aumento da despesa pública;

6) e o perigo de entrarmos num período de grande instabilidade política e social.

Convinha que a esquerda dissesse o que efetivamente quer, e como pretende atingir os seus objetivos estratégicos, se é que os tem.


* — Portugal, residentes

10.562.178 (INE, Censos 2011)
10.374.822 (INE, 2014)

United Nations
World Population Prospects; The 2015 Revision
Portugal

10.175.000 (UN, previsão elevada para 2030) | 2014 > 2030: -199 mil
  9.845.000 (UN, previsão média para 2030) | 2014 > 2030: -529 mil
  9.515.000 (UN, previsão baixa para 2030) | 2014 > 2030: -859 mil


NOTAS

  1. Notional amounts and gross market values of derivatives transaction, dec. 31, 2013. Zero Hedge.
  2. Estado prevê emitir até 20 mil milhões de euros em Obrigações do Tesouro este ano / 07 Jan 2016 Económico; IGCP quer até 20 mil milhões com obrigações em 2016 / 07 Janeiro 2016, 15:19 Jornal de Negócios.

Atualização: 18/01/2016 19:47 WET

sexta-feira, janeiro 08, 2016

Banca portuguesa por um fio

FOTO PAULO DUARTE / GLOBAL IMAGENS

António Costa diz que Fundo de Resolução não tem dinheiro


Agora percebe-se porque carga d'água Cavaco não viabilizou o governo de gestão do PàF, e deu posse a um governo do PS apoiado por comunistas de todas as cores. É que um governo de gestão não poderia ter tratado do caso Banif nas datas impostas pelo BCE. Faltava-lhe o apoio, ainda que implícito, de todo o parlamento. Ponto.

Foram as implicações da extrema debilidade do sistema bancário português e da insolvência do seu Fundo de Resolução que os banqueiros certamente explicaram a António Costa no célebre almoço do Ritz no dia 16 de novembro último. Não havendo bancos portugueses com recursos suficientes para comprar o Banif (o qual viria a ser saldado por 150 milhões de euros —ou até dado, se a este valor subtrairmos o crédito fiscal do Banif que o Santander herda), a menos que o Banif entrasse diretamente num processo de falência e liquidação, seria absolutamente necessário contar com um governo capaz de tomar decisões pesadas antes do fim do ano — ou seja, institucionalmente apto a resolver o banco, ainda que atirando o preço da operação para os bolsos dos contribuintes. Caso a resolução fosse empurrada até 2016, e uma vez que o Fundo de Resolução estava, e continua, nas lonas, o Banif seria muito provavelmente condenado à falência e liquidação.

Foi isto mesmo que os mesmos banqueiros que almoçaram com António Costa no dia 16 de novembro foram repetir a Cavaco Silva no dia seguinte, quando este os chamou a Belém.

Este cenário, já se si dramático, ficou ainda mais negro quando se soube no dia 8 de dezembro que o ECOFIN aprovara o chamado financiamento ponte no quadro do Fundo Único de Resolução.



08/12/2015 - Statement on Banking Union and bridge financing arrangements for the Single Resolution Fund. ECOFIN Ministers reaffirm the importance of deepening the Banking Union in the context of a well-functioning Economic and Monetary Union. Following the successful establishment of the Single Supervisory Mechanism (SSM), we welcome the forthcoming entry into force of the intergovernmental agreement on the transfer and mutualisation of contributions to the SRF (IGA), which will allow the Single Resolution Fund (SRF) to be fully operational on 1 January 2016. 
In line with the commitment taken in December 2013, Member States participating in the Banking Union agree to put in place a system of bridge financing arrangements in order to ensure sufficient funding to the SRF during the transitional period. As of 2016, each participating Member State will enter into a harmonised Loan Facility Agreement with the Single Resolution Board (SRB), providing a national individual credit line to the SRB to back its national compartment in the SRF in case of possible funding shortfalls following resolution cases of banks of the Member State concerned. With this agreement, participating Member States ensure a credible start of the SRF as of early 2016. 
The maximum aggregate amount of the credit lines of euro area Member States will amount to EUR 55bn, with a repartition key among Member States which follows the 2014 estimates of the Commission for contributions to the SRF. The aggregate amount and the repartition key will be reviewed by the end of 2017 or earlier, if a non-euro area Member State joins the Banking Union. The individual credit lines are to be drawn as a last resort, after having exhausted all other financing sources, including bail-in requirements under the BRRD as well as the steps foreseen under Article 5 of the IGA including the SRB's external borrowing capacity. Such system of national credit lines will ensure the protection of taxpayers and will be fiscally neutral over the medium term, as the banking sector of the Member State concerned will be liable for repayment of the amounts drawn under the credit line. It will ensure equivalent treatment across all Member States participating in the Banking Union in terms of rights and obligations, as well as incurring no costs for Member States not participating in the Banking Union.

Finalmente, quanto ao facto de o Banif ter caído por dez reis de mel coado nos braços do Santander, além do mistério associado à corrida ao banco provocada pela TVI, que falta esclarecer, em vez de ter ido parar às garras do maior fundo abutre do planeta, a Apollo Global Management, LLC. (Link1, Link2), a explicação é simples: só se o BCE fosse doido é que permitira tal movimento em vez de defender um dos grupos financeiros sistémicos da Eurozona, o Grupo Santander (1). Um banco que precisa de reforçar os seus rácios de capital, que já é um dos maiores bancos em Portugal e na Europa, que conhece bem o nosso mercado, e que se dedica à atividade bancária e financeira, nomeadamente através de aquisições sucessivas e da dispersão do capital por inúmeros acionistas de peso, e não tanto à rapina de empresas em dificuldades através dos famosos LBO (Leverage Buyout) seria sempre um opção melhor do que o voo da águia especulativa americana. Além do mais, segundo afirmou António Costa no programa Quadratura do Círculo, e ao contrário do que publica o Expresso de hoje, não houve nenhuma outra proposta vinculativa além da do Santander.

É triste vermos o primeiro ministro de Portugal dar explicações aos portugueses sobre os meandros de uma operação tão complexa quanto dramática pelas repercussões que teve e terá, não numa conferência de imprensa, não numa declaração ao país, complementar da que proferiu aquando da resolução do Banif, mas regressando ao programa televisivo de onde saiu para tomar conta do PS. Um primeiro ministro que se esconde da realidade não oferece confiança (2). Que fará se a crise financeira e bancária continuar em 2016, 2017, 2018, 2019, atingindo, por exemplo, o BCP, o Montepio, e a Caixa? Ficámos a saber que o BCE deu um rebuçado a António Costa pela oferta do Banif ao Santander: um ano mais para vender o Novo Banco. Mas, e se este for um rebuçado envenenado? Ou seja, e se este adiamento da venda do Novo Banco significar tão só inscrever os custos da operação no Orçamento de Estado de 2017?

É triste percebermos até que ponto o grande capitalismo português e os seus bancos, mas também os seus políticos, caminham tão rapidamente para a insignificância e para o desastre. Os graus de liberdade da nossa soberania esfumam-se a cada dia que passa. Não sei porque gritam tanto as araras e os cagarros do Soviete Supremo de São Bento.


ÚLTIMA HORA

António Costa foi dizer à Quadratura do Círculo, em modo informal e pachorrento, o que não poderia ter anunciado de modo mais institucional, nem através do seu ministro das finanças, sob pena de lançar o pânico imediato no país e nos mercados. Mas o pânico acaba de chegar, via Reuters. Qualquer pessoa atenta perguntará: depois de setembro de 2016 (mês em que a janela de generosidade do BCE se fecha) quem estará disposto a financiar países que não respeitam contratos, seja na banca, seja noutros setores? O alerta de maremoto financeiro indígena está dado!

La debacle de Novo Banco dificulta el acceso al mercado de la banca periférica
REUTERS, 9/01/2016 - 12:28 
Los bancos pequeños de la periferia en Europa tendrán dificultades para emitir nueva deuda por las pérdidas que asumirán previsiblemente los inversores con cinco emisiones de deuda senior en Portugal, según expertos que temen ahora un cierre temporal para nuevas emisiones de deuda por parte de entidades de menor tamaño. 
El Banco de Portugal conmocionó al mercado a finales de diciembre al transferir casi 2.000 millones de euros de deuda senior de Novo Banco al banco malo que aglutina los peores activos de Banco Espirito Santo desde su rescate en 2014. Tras el traspaso el valor de los títulos se acercó casi a cero, dejando a los inversores con escasas expectativas para recuperar su dinero. 
“Lo que ha pasado en Portugal dificultará el acceso al mercado de los bancos de segunda fila”, dijo un gestor de fondos. 
“Un inversor puede optar por invertir en un banco más débil o en un banco fuerte como HSBC o Citigroup. ¿Si creo que el año que viene un banco como HSBC no respetaría sus obligaciones de pago con los bonistas? No. ¿Pero un banco italiano de segunda fila?”.

E as notícias sobre a 'banca periférica' correm! Banif, qual foi a pressa? A realidade é como o azeite e os cadáveres: acaba sempre por vir ao de cima.

La banca española pierde 18.000 millones de valor en bolsa en cinco semanas 
El Economico/ EFE (10/01/2016 - 12:40): Los principales bancos españoles cotizados han perdido en poco más de un mes unos 18.000 millones de euros en capitalización bursátil, que se han esfumado, entre otras razones, por el descalabro de las bolsas chinas, la caída del precio del crudo y las tibias medidas anunciadas en diciembre por el BCE. 
Según datos del mercado, en sólo cinco semanas el valor bursátil conjunto de estas entidades -Santander, BBVA, CaixaBank, Bankia, Popular, Sabadell y Bankinter- ha pasado de 164.204 millones de euros a 146.293 millones 
La pérdida de capitalización ha sido muy desigual entre las entidades, siendo el Santander el que más se ha dejado en el camino con una reducción de su valor en bolsa de 14.671 millones de euros.  

NOTAS
  1. ¿Quiénes son los verdaderos dueños de Banco Santander? Francisco S. Jiménez - 16/01/2015, in Dirigentes_digital
    ¿Cómo es posible, que primero Emilio Botín, y luego Ana Patricia Botín, controlen con mano de hierro uno de los mayores bancos de Europa, cuando la familia apenas tienen un 0,77% de capital de la entidad? 
  2. Ouvido o programa da íntegra, há que reconhecer que as explicações dadas por António Costa clarificam a decisão tomada pelo Banco de Portugal, e pelo Governo in extremis. Só falta mesmo saber, e isso o Primeiro Ministro não explicou, porque não foi a resolução executada no dia 3 de janeiro de 2016. À luz do Mecanismo Único de Resolução e do chamado investimento ponte não se teria mitigado o novo rombo nas finanças públicas que todos teremos que pagar?
Atualização: 10 jan 2016 12:57

quarta-feira, janeiro 06, 2016

Aviões e comboios, o que está a mudar





As Low Cost fizeram mais por nós numa década, do que trinta anos de ronha e corrupção indígenas


Aeroporto do Porto prevê duplicar movimentos até 2022 
O aeroporto do Porto prevê continuar a aumentar o seu tráfego sustentadamente nos próximos anos. Em 2015 deverá ter um tráfego de 8 milhões de passageiros.
Se na última década o Aeroporto Francisco Sá Carneiro quadriplicou o número de passageiros, de cerca de dois milhões para os oitos milhões, os planos futuros são para duplicar os movimentos até 2022 bem como o volume de passageiros. 
Low Cost Portugal

As Low Cost fizeram mais pelo turismo do Porto em dez anos do que o ICEP em trinta. Deram ainda origem a uma actividade económica de 500 milhões de euros/ano. No aeroporto Sá Carneiro os passageiros em 2015 chegarão aos 8 milhões. Em 2022 deverão chegar aos 16 milhões. É obra!

Se houvesse um comboio de Alta Velocidade entre Vigo e Porto (já há 10 comboios/dia ligando Corunha, Santiago, Pontevedra e Vigo, em 01h23mn), então sim, o Sá Carneiro seria definitivamente o grande aeroporto do noroeste peninsular.

Quem andou e continua a sabotar o desenvolvimento do norte de Portugal?

Já agora, sobre o Aeroporto da Portela convém alertar para a besteira que a ANA-Vinci tem vindo a propagandear: destruir a Pista 17-35 em nome de mais espaço para estacionar a frota parada da TAP.

Esta pista permite ao aeroporto de Lisboa, onde são frequentes ventos cruzados, funcionar 365 dias por ano. Quando a ANA-Vinci afirma que 'no ano passado' (2014) apenas 0,89% dos movimentos utilizaram esta pista, ainda assim estamos a falar de pelo menos 160 mil passageiros que evitaram atrasos escusados (por haver precisamente a Pista 17-35) num aeroporto que é dos mais pontuais e mais seguros da Europa. Sempre quero ver até onde António Costa irá permitir esta liquidação apressada de um dos principais ativos do aeroporto da capital: a segurança.


Uma ilha ferroviária chamada Portugal

La alta velocidad llegará este jueves a Salamanca y Zamora 
Zamora y Salamanca contarán desde este jueves 17 de diciembre con Alta Velocidad. En plena cuenta atrás para la Navidad, la operadora Renfe ya ha puesto a la venta los billetes para los nuevos trenes Alvia que unirán a Salamanca con Madrid en 1 hora y 36 minutos -63 minutos menos que el trayecto habitual- y a Zamora con la capital den 1 hora y 33 minutos -22 menos que los actuales-. 
ABC, 16/12/2015 a las 09:29:49h. - Act. a las 19:03:07h.

Algumas centenas de milhar de portugueses ficarão mais perto de Madrid a partir deste mês de janeiro de 2016, sem precisar de passar pelo Porto ou Lisboa.

Os gabirus de Lisboa, como sempre, andaram a dormir, ou entretidos a sacar PPPs ao bruto indígena, com a colaboração prestimosa das araras e cagarros do Terreiro do Paço e São Bento.

Como se algo faltasse, o Santander-Totta, depois de meter o Banif no bolso por um pacote de amendoins (Obrigado Costa! Obrigado Pedro! Obrigado Jerónimo! Obrigado Catarina!), prepara-se para o próximo assalto, chamado... BES, ou melhor, Novo Banco.

Entretanto, o Soviete Supremo de São Bento deu ao novo ministério das infra-estruturas e do planeamento um ano (um ano, caramba!) para definir uma política de transporte ferroviário para Portugal. Pelos vistos, não existia. Fantástico, Mike!

Para mais tarde recordar...

Diário da República, 1.ª série — N.º 253 — 29 de dezembro de 2015  
ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA 
Resolução da Assembleia da República n.º 148/2015  
Plano Ferroviário Nacional  
A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, recomendar ao Governo a apresentação à Assembleia da República, no prazo de um ano, de um documento estratégico para o sistema ferroviário, que vise a promoção da mobilidade dos passageiros e das mercadorias, o qual servirá de base, num prazo breve e exequível, a um Plano Ferroviário Nacional, que tenha por orientação a requalificação e reabilitação da rede ferroviária e se traduza em princípios de sustentabilidade articulando os diversos sistemas de transportes e assente num modelo em rede, que inclua, defina e assegure: 
a) As linhas, ramais e trajetos interligados;
b) As linhas ferroviárias vocacionadas para abranger o território nacional;
c) As linhas ferroviárias vocacionadas para abranger os territórios regionais;
d) As linhas ferroviárias vocacionadas para assegurar as ligações transfronteiriças e ibéricas;
e) As linhas vocacionadas para assegurar a ligação transeuropeia;
f) As linhas ferroviárias vocacionadas para garantir os “hinterlands” portuários atlânticos e aeroportuários;
g) As linhas ferroviárias de vocação metropolitana e de vocação urbana;
h) As linhas ferroviárias e os ramais com elevado potencial de desenvolvimento territorial, incluindo turístico, no acesso a determinadas regiões;
i) A ligação progressiva a todas as capitais de distrito do território continental;
j) A conexão da rede ferroviária com outros meios de transportes, designadamente à escala local;
k) A ligação das áreas metropolitanas com os sistemas urbanos e o desenvolvimento de sistemas ferroviários ligeiros nas principais áreas urbanas;
l) Os subsistemas de ligação regional e urbana;
m) A intermodalidade entre os vários sistemas de transporte de passageiros e de mercadorias através de interligações entre os principais portos, aeroportos e fronteiras terrestres;
n) A interoperabilidade entre as redes ferroviárias, nomeadamente a articulação de linhas de bitola ibérica e da União Internacional de Caminhos -de -Ferro (UIC);
o) O planeamento, tendo em consideração o que acontece em Espanha, da construção de novas ligações ferroviárias internacionais, em bitola UIC, para o transporte misto de passageiros e mercadorias;
p) Um plano de investimentos plurianual que garanta a urgência do reforço da rede ferroviária nacional;
q) O desenvolvimento das componentes de manutenção e construção de veículos de transporte ferroviário, com base no reforço das competências e do know -how especí- fico existente na Empresa de Manutenção de Equipamento Ferroviário (EMEF), S. A., empresa pública.  
Aprovada em 27 de novembro de 2015.  
O Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues.

segunda-feira, janeiro 04, 2016

Dívidas soberanas já não pagam juros

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A falência do neo-keynesianismo soma e segue


Government bond yields remain in negative territory. As of December 14, over 50% of European government bonds maturing in less than five years had a negative yield, roughly the same as in the run-up to the launch of ECB QE in March. Two-year government bond yields were generally lower on the year, despite some rebound after aggressively pricing further ECB easing ahead of the December meeting. (The German two-year yield, for example, bottomed out at -0.44% on December 2.) Looking beyond Europe, roughly half of two-year government bonds in the developed world trades at a negative yield. 
Sovereigns have issued debt at record-low—or altogether negative—yields. In April, Switzerland became the first country to issue 10-year government bonds at a negative yield; other governments did the same at shorter maturities. 
“What Does The Future Hold For Negative Rates In Europe? Goldman Answers”
ZeroHedge. Submitted by Tyler Durden on 01/02/2016 20:00 -0500

Os depósitos são um custo para os bancos, o qual, se não fosse contrabalançado com empréstimos a clientes e outras operações de crédito, acabaria por levá-los à falência.

O sobre-endividamento das pessoas, das empresas e dos governos que continuaram a investir (e sobretudo a especular) e a consumir, sem ao mesmo tempo produzirem o contra-valor equivalente ao gasto e às responsabilidades contraídas, acabou por explodir numa crise económico-financeira generalizada, a qual curto-circuitou os binómios procura-oferta (a procura caiu e continua a cair), investimento-lucro (ambos foram sucessivamente caindo) e produção-consumo (a queda de ambos gerou deflação).

Daqui à situação paradoxal em que os bancos centrais e de retalho hoje se encontram —ambos cobram taxas de juro crescentes pelos depósitos à vista, e de curto prazo— foi um passo.

Um passo que, por sua vez, atinge criticamente a poupança, ferindo de modo cada vez mais preocupante os fundos de pensões públicos e privados, em especial se, imprudentemente, estes tentaram iludir a destruição das rendas e dos juros jogando no casino dos derivados especulativos e outros produtos financeiros de risco elevado.

75% da reserva do Fundo de Pensões português já foi aplicado em dívida pública portuguesa.

Uma vez que a rentabilidade (yield) da dívida soberana portuguesa tem vindo a cair, quem nela investiu para obter algum rendimento (nomeadamente fundos de pensões e bancos) será sucessivamente penalizado. No caso dos fundos de pensões e de alguns bancos portugueses esta exposição ao endividamento compulsivo de um estado social que deixou de gerar riqueza e poupança suficientes, e portanto à insolvência potencial de governos e municípios, transformou-se numa serpente que morde a própria cauda. A poupança é engolida pela dívida pública em nome da sustentação de um estado social que devora essa mesma poupança e, pior ainda, que extingue a própria capacidade de a gerar. O fascismo fiscal em curso é a foice que, se não for afastada, acabará por ceifar rente o estado social que as esquerdas diariamente e aos gritos afirmam defender.

A rentabilidade das dívidas soberanas já é negativa no caso de obrigações públicas de curto prazo em países como a Alemanha (-0.44% nas obrigações a dois anos emitidas a 2 dezembro de 2015).

Resumindo: os estímulos neo-keynesianos são cada vez menos eficazes. Nem a deflação passa, nem o crescimento saudável regressa. E assim sendo, a bolha monetária, ou seja, a destruição do dinheiro, prosseguirá em direção ao mais completo desastre se não formos capazes de achar alternativas construtivas. O buraco negro existe, e já começámos a ser sugados para o seu infinito âmago.