quinta-feira, julho 10, 2008

Portugal 32

Ave, ICE-3
Alta Velocidade gasta menos energia do que maioria das alternativas!

O Estado da Nação

De uma coisa Manuela Ferreira Leite pode gabar-se: levou o governo socialista a tomar uma série de medidas sociais que este nunca pensaria lançar, não fora o súbito agravamento da crise petrolífera, financeira e geo-estratégica mundial, e a ameaça de perder as próximas eleições face ao alarme populista vindo não apenas do PCP e do BE, mas também, pasme-se, do partido com quem partilha o poder deste país há mais de vinte anos. As medidas "corajosas" anunciadas por José Sócrates no debate de hoje têm certamente potencial para sustar a derrocada eleitoral que se anuncia no horizonte. Tudo vai depender da escalada petrolífera, dos juros bancários e da inflação. Se, como se prevê, o petróleo chegar aos 200 dólares por alturas das próximas eleições, e o casino dos derivados estourar com inimaginável estrondo planetário, então não vejo como possa José Sócrates sobreviver ao seu até agora sorridente destino. Ou seja, no fundo, continuo a suspeitar que o ciclo da tríade Macau se interromperá inexoravelmente em 2009.

Outra coisa é saber, depois deste deprimente debate parlamentar, se o PSD estará em condições de ganhar com maioria absoluta as próximas eleições. Diria que tudo vai depender da gravidade da crise mundial, da nossa peculiar crise doméstica e sobretudo do pouco tino de que padece a generalidade dos políticos galhofeiros que se sentam no hemiciclo de São Bento.

Se o PSD continuar a marcar a agenda política através de intervenções pontuais bem estudadas, bem medidas e com uma boa percepção dos tempos --coisa que Manuela Ferreira Leite já demonstrou ser capaz de fazer--, as probabilidades de êxito são reais. Se o novo chefe da bancada parlamentar do PSD, o auspicioso Paulo Rangel, conseguir consolidar os ataques da líder do seu partido, então o PS estará mesmo em maus lençóis. Mas para que a sorte sorria de novo ao PSD, Manuela Ferreira Leite precisa, por um lado, de praticar uma cirurgia urgente (i.e. despedir o "homem da mala", José Luís Arnaut) e, por outro, criar rapidamente um sólido governo sombra, com um decente tanque cognitivo, sem o que questões como a definição de uma política energética de emergência, a criação de uma rede de apoio às vítimas do endividamento, ou a definição de prioridades relativamente aos grandes investimentos ficarão sem a necessária resposta.

De cada vez que o preço do petróleo aumenta, sobem os preços do gás, dos transportes e da alimentação. Esta tendência é uma tendência de fundo, causada simultaneamente pelo decréscimo da oferta mundial derivada de uma escassez efectiva de recursos, bem como pela especulação racional dos compradores e investidores financeiros. Ou seja, a inflação é uma nuvem monstruosa que todos já viram no horizonte, que se aproxima a passos largos, e que irá desabar sobre todos nós de uma forma impiedosa. Perante esta fatalidade, o Estado não pode ser mais um especulador oportunista da tragédia alheia. Se tudo sobe e o IVA permanece na mesma, e se prossegue a dupla tributação ilegítima dos produtos petrolíferos, isso significará um aumento de receitas fiscais não apenas imoral, como completamente absurdo.

Mais cedo ou mais tarde, nem que seja por imposição de Bruxelas, o vampirismo fiscal terá que ser sustado. É sempre mais prudente assegurar que tais ajustamentos ocorram na tranquilidade dos gabinetes de estudo do que na rua. A dita "taxa Robin dos Bosques" não passa de uma panaceia precária e temporária. Melhor será começar urgente e seriamente a pensar desgravar a fiscalidade brutal que incide sobre os produtos petrolíferos, introduzindo ao mesmo tempo um esquema de racionamento dos consumos, inteligível, prático e justo. O argumento cínico do governo para manter a elevada carga fiscal sobre os produtos petrolíferos, i.e. invocar a baixa da receita bruta dos impostos por efeito da retracção do consumo, é de uma insensibilidade e estupidez completas. No fundo, é exactamente a mesma história do burro a quem um cretino tentou ensinar a não comer!

Sobre as "grandes obras", talvez valha a pena fazer algum trabalho de casa, em vez de nos perdermos na algazarra dos papeis. Qual papel? O papel! A isto se resumiu o folclore acéfalo de boa parte do debate parlamentar de hoje.

Quando me sentei ao computador para escrever este postal comecei, como invariavelmente faço, a procurar imagens e palavras-chave que me aproximassem de alguma boa descoberta. A primeira ideia que tive foi fazer uma simulação sobre os preços de uma viagem entre Madrid e Barcelona, optando pelos voos Low Cost, ou pela nova ligação de Alta Velocidade ferroviária que liga as duas mais populosas e dinâmicas cidades ibéricas. O resultado foi este:
  • Viagem em comboio de Alta Velocidade, ida e volta, entre 3 e 8 de Setembro de 2008, em Classe Turística: 168,50 EUR
  • Viagem de avião no fim de Agosto na Vueling: 100,00 EUR
Entretanto, resolvi comparar estes preços com os preços de uma viagem de comboio (ida-e-volta) entre Lisboa e Porto:
  • Alfa Pendular 2ª Cl. = 55,00 EUR
  • Intercidades 2ª Cl. = 39,00 EUR
Sabendo-se que o Alfa poderá fazer a ligação entre as duas principais cidades portuguesas em 1h55mn, desde que acabem o trabalho de renovação da Linha do Norte, iniciado há mais de uma década e nunca acabado (porque será?), quem estaria disposto a pagar 1,5x o preço do Alfa para ganhar 30 minutos na duração de uma viagem que já não deveria ultrapassar as duas horas? Alguns estariam. Mas quantos? A experiência actual mostra que o Inter-cidades tem retirado muitos passageiros ao Alfa. Por que será?

Este argumento é pesado, não acham?

Eu também penso que sim! No entanto, encontrei na Net (que hoje foi uma das meninas bonitas do "debate da nação" -- até que enfim!) uma análise curiosa. Segundo o artigo que li, publicado na Wikipedia, as taxas médias de ocupação efectiva dos diversos modos de transportes disponíveis são mais elevadas nos aviões e nos comboios de Alta Velocidade (65%-66%), do que nos demais sistemas de transportes, nomeadamente comboios regionais e suburbanos, metros e metros de superfície, autocarros (21%-30%) e automóveis particulares (34%). Daqui decorre, surpreendentemente, que o consumo de energia por passageiro transportado é mais alto nas ligações ferroviárias regionais e inter-cidades convencionais do que nos sistemas de Alta Velocidade tipo ICE-3 e TGV. Por outro lado, o balanço energético é claramente favorável à Alta Velocidade, quando comparado com o avião, gastando este 3x mais energia por passageiro do que os comboios de Alta Velocidade (ICE-3 e TGV), em distâncias acima dos 500Km (tipicamente a ligação Lisboa-Madrid), e 5x mais energia para distâncias na ordem dos 250-300Km (tipicamente as ligações Lisboa-Porto e Lisboa-Faro). Imaginem a diferença que fará quando o petróleo chegar aos 200, aos 300 e aos 500 dólares, antes de 2013!

Isto quer dizer que, numa situação economicamente saudável, e sobretudo no contexto da actual crise petrolífera (que vimos antecipando desde Maio de 2005...), a prioridade estratégica pelo transporte ferroviário de Alta Velocidade, seja para ligar Portugal à rede europeia de Alta Velocidade, seja para ligar as principais cidades do País, faria todo o sentido. Pelo contrário, a prioridade dada até agora ao programa aeroportuário deveria ser, pelas mesmas razões, imediatamente suspensa e substituída pela prioridade por um programa de investimento público na frente portuária marítima. O paradigma energético mudou para sempre, e com esta mudança, mudará também a própria ideologia do crescimento, da produção e do consumo. Vai ser um longo e doloroso período de adaptação, para o que, parece evidente, os actuais partidos políticos não só não servem, como são e serão cada vez mais um poderoso e potencialmente letal obstáculo. Precisamos de encontrar formas novas cooperação social e administração política.

Voltando à xicana parlamentar de hoje, e dando resposta às perguntas de José Sócrates, direi que, em primeiro lugar, os célebres papeis da Net, produzidos pela corrupta indústria de pareceres que há muito alimenta o Bloco Central, não servem para nada, pelo mesmo motivo que o orçamento de estado feito para este ano não serve para nada. Isto é, todos estes papeis foram imaginados segundo um paradigma hoje inexistente. O petróleo que serve de base a todos os cálculos orçamentais valia menos de metade do que custa hoje, na data em que o governo escreveu o orçamento de 2008, e cerca de 1/4 do seu valor actual quando o PSD sonhava com aeroportos e TGVs! A pergunta do primeiro ministro é, por conseguinte, improcedente e demagógica.

Tem Manuela Ferreira Leite toda a razão para afirmar que as apostas nas grandes obras devem ser radicalmente revistas e radicalmente re-discutidas. Provavelmente até tem razão quando presume que todas as grandes obras terão que parar para pensar, devendo seguramente ser adiadas para melhor oportunidade. Quanto ao QREN, o que precisamos é de coragem política para enfrentar a Comissão Europeia e propor uma revisão radical de prioridades, bem fundamentada, que Bruxelas naturalmente compreenda e aceite. Mas para isso teremos que correr com a actual maioria do poleiro.

Resta apenas saber até que ponto Manuela Ferreira Leite saberá resistir aos tubarões aflitos que procuram comer o último atum! Se ceder, é mais um regime político que irá para o caixote do lixo a nossa história, felizmente longa.

OAM 390 10-07-2008, 2:35

quarta-feira, julho 09, 2008

Crise Iraniana 4

Mini nuke
Os EUA querem experimentar as suas mini-bombas nucleares no Irão!

Jogos de Guerra no Golfo Pérsico
Sionistas e Cowboys querem III Guerra Mundial

1:54 | Quinta-feira, 10 de Jul de 2008
Irão realiza novo lançamento de mísseis no Golfo Pérsico
Durante os exercícios, as forças armadas lançaram o torpedo Hoot, uma arma extremamente rápida com capacidade para atingir submarinos inimigos. -- Expresso.
L'Iran "mettra le feu" à Tel Aviv et à la flotte US en cas d'attaque
NOUVELOBS.COM | 08.07.2008 | 10:54

"Le régime sioniste fait actuellement pression sur les dirigeants de la Maison Blanche pour préparer une attaque contre l'Iran", déclare le représentant du guide suprême Ali Khamenei, "s'ils commettent une telle stupidité, la première réponse de l'Iran sera de mettre le feu à Tel Aviv".

... Armée parallèle

Crées au lendemain de la victoire de la révolution de 1979, les Gardiens de la révolution islamique sont une armée parallèle avec ses propres forces terrestres, navales et aériennes.
Armée idéologique du régime, ils disposent de nombreuses missiles, notamment les Shahab-3 capables d'atteindre le territoire israélien et les bases militaires américaines dans la région.
Samedi, le chef des Gardiens, le général Mohammad Ali Jafari, a menacé "les ennemis" de "frappes fatales" dans le Golfe.

Il a ajouté qu'en cas d'attaque contre l'Iran, "les tactiques (...) de guerre éclair des bateaux des Gardiens ne laisseront aucune chance de s'enfuir aux ennemis".

Téhéran pourrait fermer le détroit stratégique d'Ormuz, par où transite environ 40% du pétrole mondial, si les intérêts de l'Iran étaient en jeu, avait également averti samedi le chef d'état-major de l'armée iranienne. LINK

A verdade é que os Estados Unidos e o Reino Corrupto de Sua Majestade Britânica estão falidos, outra vez! Daí que lhes convenha muito estourar com a União Europeia (ver comportamentos da Irlanda, da República Checa, da Polónia e da França capturada) e provocar uma III Guerra Mundial, usando o Sionismo e Israel como espoletas dum ataque ao Irão.

Israel nunca foi um fim em si, mas um instrumento. Continua a sê-lo, apesar da ilusão de muitos judeus justos e razoáveis.

A contra-informação dirá que o Irão apenas quer petróleo mais caro. Mas não se iludam! O verdadeiro objectivo de Londres (que continua a mandar em Nova Iorque) é re-assegurar o controlo das reservas petrolíferas mundiais, operando, como sempre fez, uma partilha escandalosamente desigual dos recursos. Só que agora, recuperar uma tal supremacia energética, no momento em que o petróleo do Mar Norte está cada vez mais aguado, e está iminente a explosão do casino mundial de derivados --uns inimagináveis 675 BILIÕES DE US DÓLARES ($675 000 000 000 000), ou seja, o PIB do planeta multiplicado por dez! (1)-- parece uma missão desesperadamente impossível. A menos que, juram os falcões e os idiotas de serviço (entre os quais algumas plumas na nossa subserviente praça jornalística), se arranje um bom pretexto para invadir o Irão, desencadeando um Guerra Mundial Preventiva!!

Iranian missile test fire

Passo 1 da estratégia provocatória: levar os corruptos governos do Ocidente e a sua massa de eleitores mediaticamente hipnotizados a acreditar que o Irão não só não deve defender-se contra uma agressão em fase adiantada de preparação, como, qual novo Iraque, é uma ameaça nuclear à democracia e à civilização! Como escreve Elaine Meinel Supkis, é obrigação estrita dos dirigentes iranianos preparar o país para a iminência de um ataque israelita-americano contra a sua soberania, que a realizar-se será, como foi no Iraque e é na Palestina, uma carnificina contra a população civil daquele país. O verdadeiro terrorismo que hoje existe no mundo, não vem do Islão, mas do terrorismo de Estado praticado impunemente pelas grandes potências, com os Estados Unidos à cabeça!

Iranian missile range

Passo 2 da estratégia provocatória: desestabilizar a União Europeia, por forma a impedir consensos contra o ataque há muito decidido contra o Irão, desestabilizando ao mesmo tempo toda a região, por forma a criar pretextos para alastrar imediatamente o conflito à Síria, ao Líbano e ao próprio Paquistão. Para isso, tal como fez no Afeganistão, na Colômbia, na Nicarágua, na Venezuela, ou mais recentemente na Bolívia, a CIA e as Operações Especiais do Pentágono estão particularmente activas na criação de movimentos de oposição terrorista a Teerão, como acaba de ser revelado pelas declarações recentes de um general paquistanês.
'US backs Jundullah to destabilize Iran'
Press TV. Wed, 09 Jul 2008 03:42:04

Pakistan's former Army Chief, Retired General Mirza Aslam Baig, says the US is supporting the outlawed Jundullah group to destabilize Iran.

He said that the US is providing training facilities to Jundullah fighters--located in eastern areas of Iran--to create unrest in the area and affect the cordial ties between Iran and its neighbor Pakistan.

Baig added that Iran and Pakistan are under the siege of western conspiracies.

The intelligence agencies of the coalitional forces are very active in Afghanistan and work against the interests of Iran, Pakistan, China and Russia in the region, he said as quoted by Pakistan Daily newspaper.

The former Pakistani official hailed Islamabad's decision to hand over the captured Jundullah members to Iran, saying those working against the interests of Iran and Pakistan should be dealt with iron fist.

Jundullah is a terrorist group, headed by Abdolmalek Rigi, which operates in Iran's Sistan-Baluchistan and Pakistan's Baluchistan.

Last month Pakistan handed over Abdolhamid Rigi, brother of Abdolmalek, to Iran.

MGH/PA -- PressTV



NOTAS
  1. Sobre este ponto, recebi um comentário vindo do Brasil, de um blogue "económico" que recomendo vivamente, chamado Rumores da Crise. Aqui fica um extracto de um belo artigo dedicado ao casino dos "derivados" (ou "derivativos"):
    ... O ataque neoliberal ao trabalho improdutivo, segundo a lógica do capital, não foi suficiente para reverter a queda da rentabilidade na economia real que tem como fundamento a crise do valor, situação que se agravava com a revolução da informática. Não só a expansão do trabalho improdutivo necessário ao desenvolvimento do capital punha em xeque a acumulação, mas as novas formas de produção e gestão, movidas pela concorrência global, que incorporam tecnologia e ciência, aumentam vertiginosamente o capital fixo e a produtividade, expulsando homens de antigos empregos. É a crise do trabalho agravando a crise do valor.

    As exportações de capitais dos países desenvolvidos para países em desenvolvimento como a China, Índia e outros, em busca de uma maior rentabilidade, aumentaram a disponibilidade de mercadorias no mundo que precisam de um mercado para se realizarem. É quando o crédito se expande de forma jamais vista e o pagamento dos produtos adquiridos no mercado é transferido para um trabalho futuro que nunca acontecerá, pois a tendência do capitalismo é racionalizar e dispensar trabalho de forma crescente. Aí está a base das bolhas, que injetam dinheiro fictício no mercado e na produção (fictício por ser vazio de substância, não representar valor, trabalho abstrato), e aprisiona a economia real aos seus movimentos já que esta não consegue por ‘meios normais’, ‘valorizar o valor’(Marx). -- 16.08.2007, Procura-se uma Nova Bolha, por Rall in Rumores da Crise.

OAM 389 08-07-2008, 23:09 (última actualização: 13-07-2008 00:15)

Tratado Europeu 6

Bush e Ahern
Duas caras de uma mesma moeda: a conspiração anti-europeia.

Primeiro ministro irlandês confessa não ter lido o Tratado de Lisboa!

02-07-2008. (EuroActiv). While the European institutions are trying to provide a good example in communicating with citizens, the main responsibility lies with national governments, who are failing in this task, Vice President of the European Parliament Alejo Vidal-Quadras told EurActiv in an interview.

"It seems that we have an endless communication problem. Because every time there is a public consultation on European reform in a member state, we are in trouble. It happened in Ireland with the Nice Treaty, we had also a problem in Denmark in the past, then we had this terrible failure in France and Holland for the European Constitution, and now the Irish 'no' for the Lisbon Treaty. There is a serious communication problem.

It is even more serious when we have seen how incompetently the Irish Prime Minister and the Irish Commissioner managed the communication campaign in Ireland. One cannot believe that a Prime Minister, on prime time TV, when asked "Have you read the Treaty," answered "no". One cannot believe it! And the Irish Commissioner did the same. If I had been told before that the Prime Minister would answer this, I would not believe it. But he did it!" -- LINK

COMENTÁRIO: Enquanto tivermos elites nacionais cujo único objectivo "europeísta" é chular os alemães e sabotar sempre que podem a União, não iremos a parte nenhuma. Defendo, perante comportamentos destes, uma Europa a duas velocidades. Os chineses têm um país, dois sistemas. Pois faça-se algo de semelhante na Europa! Os que querem mercado livre, moeda única e livre circulação de pessoas, terão que comprar o pacote completo, isto é, com governo federal, constituição (obviamente uma coisa mais simples do que a manta de retalhos esquizóide chamada Tratado de Lisboa), política de alargamento territorial e de segurança comuns, forças armadas conjuntas sob comando unificado, etc. Quem não quiser, fica numa espécie de limbo, sujeito às intempéries da pequenez e do oportunismo.


OAM 388 08-07-2008, 20:36

sábado, julho 05, 2008

TAP 2

Salvar a TAP!

Nenhum português deseja, quanto mais não seja por sentimento patriótico, ver a sua companhia aérea de sempre ir por água baixo. No entanto, o que aconteceu à Sabena, à Suiss Air e vai acontecer à Alitalia, demonstra que algo de profundamente drástico está a afectar o velho panorama das chamadas companhias de bandeira. Esse algo é o resultado inevitável de três tendências e dois constrangimentos muito fortes: por um lado, a globalização, o desenvolvimento da União Europeia e o crescimento económico acelerado dos BRIC (China, India, Rússia, Brasil, Emiratos Árabes Unidos, etc.); por outro, os efeitos do pico petrolífero, a par do colapso da moeda americana e da liquidez artificial nos mercados mundiais (1).

Os três primeiros fenómenos estão na origem do aumento exponencial e simultâneo da concorrência e da concentração capitalistas à escala global. O quarto factor, é sobretudo um constrangimento catastrófico cuja percepção empresarial e pública só agora começou a ter verdadeira importância psicológica e a afectar as decisões económicas. Finalmente, a queda do dólar e o rebentamento das bolhas financeiras estão a gerar inflação à escala global e uma vasta retracção do crédito disponível, apesar da chuva de dólares e euros com que a Reserva Federal e o Banco Central Europeu têm regado os aflitos bancos de ambos os lados do Atlântico. O colapso do mercado imobiliário dos Estados Unidos (Subprime) e da Europa foi apenas o prenúncio de algo muito mais grave para a economia mundial: o rebentamento iminente da bolha financeira, formada sobretudo no chamado mercado de derivados, através da congeminação dos mais variados estratagemas de criação de liquidez virtual e acumulação infinita de dívidas, com a interesseira ajuda do Japão, que através do chamado carry trade tem vindo a financiar as suas exportações com empréstimos a taxas de juro negativas ao resto do mundo, com especial destaque para os importadores americanos e europeus, ao mesmo tempo que estimulou toda a espécie de casinos especulativos em volta da compra e venda de divisas!

Todos estes factores, que são duradouros, podendo mesmo um deles --o pico petrolífero-- determinar a implosão geral das actuais filosofias de crescimento económico, conspiram, no que ao transporte aéreo diz respeito, na direcção da concentração e redução drástica do número de grandes operadores, com as consequentes falências e fusões. Por outro lado, haverá uma procura crescente de aeronaves cada vez maiores e mais eficientes do ponto de vista dos respectivos custos operacionais (nomeadamente energéticos). Nesta mesma lógica, as grandes cidades aeroportuárias darão progressivamente lugar a interfaces aeroportuárias muito mais leves e baratas (basicamente, duas pistas paralelas com 4,8Km de comprimento e 60 a 90 metros de largura, apoiadas por um aeroporto espartano mas bem servido por linhas férreas diversas (metropolitano e metro de superfície, comboios suburbanos) e autocarros eléctricos (trolleys ou movidos a motores eléctricos).

No caso português, a solução é óbvia: reformar inteligentemente a Portela (correndo previamente com as actuais administrações da TAP, ANA e NAER) e transformar, até 2010, a Base Aérea do Montijo, numa aerogare complementar da Portela, especializada nas companhias de baixo custo e no transporte de carga, devidamente servida por uma frota de autocarros e táxis eléctricos, além de novas e rápidas ligações fluviais ao Terreiro do Paço. É para isto que os fundos comunitários devem ser imediatamente reorientados (com aplauso seguro da Comissão Europeia e de todos nós!) Não precisamos de Alcochete! E não precisamos de uma nova travessia do rio Tejo a montante da actual Ponte 25 de Abril!

A anunciada aliança e possível fusão entre a American Airlines, a British Airways e a Ibéria é um sinal de alarme que soou com força. As causas de semelhante cenário foram já explicadas. Mas face ao timing da coisa, e sabendo-se como se sabe que os prejuízos da TAP não pararão de subir até ao fim deste ano e nos anos que se seguem, pois o petróleo poderá chegar aos 500 USD pb antes de 2013, ou mesmo em 2011 (ler artigo anterior), a crise da TAP entrou numa fase pré-comatosa. A anúncio de uma greve para o próximo dia 19 de Julho, a par do discurso errático de Fernando Pinto e da hesitação governamental, que tenderão a congelar os problemas até às próximas legislativas, prenunciam um fim súbito e feio para a TAP.

A tríade de Macau persiste na sua inglória tentativa de arruinar o país, envolvendo-o em grandes obras inúteis, para as quais não tem dinheiro. A tríade pressiona assim o gaúcho da TAP para que continue a pôr no ar aviões vazios (i.e. com passenger load factors a roçar ou mesmo abaixo dos 50%), perdendo cada vez mais dinheiro, só para segurar alguns Landing Slots que as Low Cost estão mortinhas por comprar. Isto mostra até onde pode chegar a mentira, a contra-informação e o comportamento corrupto da tríade de Macau na sua tentativa canina de bem servir os tubarões para quem trabalha e de onde recebe as gratificações suficientes para não ter que andar de Metro. Só que a sua vã tentativa de demonstrar a saturação da Portela chegou ao fim, a partir do momento em que a blogosfera conseguiu levar o caso à janela televisiva. Conseguimos travar a Ota, e conseguiremos travar o fecho da Portela!

Mas conduzir os políticos profissionais até soluções ponderadas e sábias no que se refere ao sistema de transportes e mobilidade, não resolve por si só o problema sério da TAP.

A TAP não tem nenhuma possibilidade de sobreviver como está. Quer dizer, com tantos trabalhadores quanto a easyJet, a Ryanair e a Air Berlin juntas, mas prestando menos de um décimo do serviço que aquelas três companhias juntas prestam, a TAP é pura e simplesmente inviável. Por outro lado, na Europa não tem nenhuma possibilidade de competir com os preços das companhias de baixo custo, que já ocupam em força os mercados de Faro e Porto, e se preparam para tomar em breve conta das rotas de Lisboa e Funchal. Por fim, no que se refere às rotas de longo curso (África e Brasil), nada garante a sua sobrevivência, antes pelo contrário. A nova aliança entre a American Arlines, a British Airways e a Ibéria atacará mais cedo ou mais tarde estes nichos da TAP. Até as Low Cost, nomeadamente a Ryanair, já anunciaram que vão competir, com toda a agressividade de que são capazes, no mercado de longo curso, sobretudo nas rotas atlânticas -- Ryanair Long-haul flights have "blowjobs" included!



Uma parte da blogosfera, onde me incluo, acredita que só uma solução combinada entre uma boa decisão sobre a infraestrutura aeroportuária e uma boa decisão sobre o futuro da TAP poderá salvar a companhia portuguesa dum naufrágio vergonhoso.

Sobre o aeroporto, a solução defendida há muito, a que a actual crise petrolífera veio dar mais razão, passa por manter o Aeroporto da Portela (renovado e com novas administrações) e activar a Base Aérea do Montijo para as Low Cost e cargueiros aéreos.

Sobre a TAP, a solução não passa por segmentar internamente a oferta, de que o novo programa "Liberdade de Escolha -- Um Voo, Cinco Formas de Viajar" é exemplo condenado ao fracasso, mas sim por segmentar a companhia!

A TAP poderia subdividir-se em três companhias, abarcadas embora pelo mesmo grupo: TAP Eurásia, TAP África e TAP Américas. A primeira, seria uma companhia Low Cost típica, e as outras duas, companhias Low Cost intercontinentais com sofisticadas e generosas classes executivas. Esta solução exige porém decisões difíceis: por um lado, a busca de fortes parceiros financeiros nos três continentes referidos (Eurásia, África e Américas); por outro, uma reestruturação de alto a baixo do actual grupo, começando por dispensar todos os administradores que nada fazem a não ser cobrar ordenados escandalosos e mordomias indecorosas. Em vez de despedimentos de pessoal, o que terá que haver, para sermos justos, usando parte da necessária injecção de liquidez, são reformas antecipadas e reciclagem profissional exigente. Por fim, o que não faz parte do negócio principal deverá ser alienado.

Estará a TAP preparada para a metamorfose que a salvará da implosão à vista?

Receio bem que não. E apenas por uma única causa: a inexistência de um ambiente favorável à cooperação.

A democracia actual não passa de uma plutocracia assistida por mecanismos democráticos corrompidos, onde predominam burocratas representando minorias activas --corporações empresariais, profissionais, universitárias e sindicais-- e a burocracia de Estado. A democracia transformou-se há muito num teatro de sombras adversativas (adversariais), onde a análise e resolução dos problemas dão lugar invariavelmente às arenas políticas dos jogos de retórica. Ninguém olha ninguém nos olhos e diz ao que vem. Limitam-se, estas ridículas e infecciosas criaturas da democracia contemporânea, a repetir os seus terços e a comprar votos com dinheiro falso. Daí o bloqueio geral provocado pelo diálogo de surdos em que se transformaram os regimes democráticos em que votamos cada vez menos. Daí o meu receio sobre a capacidade de a TAP resolver o seu problema, que é em primeiro lugar um problema de todos aqueles que trabalham nesta empresa, da mais mal paga telefonista ao administrador-executivo. Na realidade, só depois vêm os governos, os políticos, os clientes e os eleitores. Mas serão eles capazes de perceber e aceitar esta verdade?

A primeira condição para chegar a uma verdadeira plataforma colaborativa para a resolução do impasse da TAP, é sentar, sem hierarquia, nem preconceitos, duas pessoas sorteadas entre cada um dos sectores e departamentos da empresa (incluindo os sindicatos, a administração e o departamento jurídico.) Nessa assembleia as pessoas, sentadas aleatoriamente à volta de uma grande mesa, deveriam usar da palavra --olhos nos olhos-- de forma rotativa e sequencial. Cada pessoa deveria começar por identificar-se, explicar o que faz na empresa, o que espera dela, e quais os prejuízos que um eventual fecho da mesma, ou o seu despedimento, causariam à sua pessoa e às pessoas que lhe são próximas. O essencial é que cada um falasse verdade, sem medo das consequências que as suas palavras, por mais duras que fossem, viessem a ter sobre qualquer um dos participantes. Se esta assembleia algum dia acontecesse, tenho a certeza que um grande e comovedor silêncio se seguiria ao fim da primeira rodada de intervenções. Passado o momento de comoção e o intervalo para café, seguir-se-ia uma segunda ronda de intervenções sequenciais, desta vez sobre o tipo de metamorfose por que a TAP teria que passar para se salvar como empresa, sem violentar irremediavelmente as expectativas e os direitos de quem nela trabalha. A agitação entre os presentes atingiria certamente aqui um dos seus mais elevados e dramáticos picos psicológicos. Tempo para novo intervalo. A terceira parte desta convenção seria dedicada a unificar os pontos de acordo numa declaração conjunta dirigida a todos os membros da empresa. De algum modo, esta iniciativa elevaria os patamares de análise dos problemas e de decisão para níveis nunca antes imaginados. Em vez de negociação e confronto, caminhar-se-ia então para uma solução razoável pela via de uma cooperação tendo em vista harmonizar os interesses de cada um e a sobrevivência da TAP. Parece utopia, mas não é! E mais: ninguém se atreveria a travar tal dinâmica, uma vez começada.

ÚLTIMA HORA
  • TAP anuncia suspensão de 61 frequências semanais de voos a partir de Outubro, i.e. depois da época alta (ver mapa dos cancelamentos). O inesperado da decisão é a mesma abranger, não apenas e como era esperado pela blogosfera, os voos internos e para o resto da União Europeia, por absoluta incapacidade de competir com as Low Cost (só nas pontes aéreas entre Lisboa e Madrid serão anuladas 7 frequências, o mesmo ocorrendo com a ligação Lisboa-Barcelona), mas já e também, os voos transatlânticos para o Brasil e os Estados Unidos!

    O crescimento anunciado de voos para África é uma fraca compensação para as perdas pesadas que se anunciam depois de iniciado o declive das prestações da TAP no médio curso. Como opina quem sabe, a diminuição das frequências de voo numa dada rota costuma ser o prelúdio do seu abandono a curto prazo. Muitos dos voos europeus da TAP servem sobretudo ligações entre o Brasil e a Europa. Logo, se abrandar o trânsito entre Portugal e o Brasil, e diminuir ao mesmo tempo o vai-e-vem dos brasileiros entre o seu país e a Europa, a principal mina de ouro da TAP secará inexoravelmente. Seja porque atingimos o limite do endividamento, porque os cartões de crédito vão começar a doer, ou porque os pacotes turísticos financiados sabe-se lá como, ou por quem, têm os dias contados, a verdade é que a recessão mundial será para todos! A ponte africana jamais poderá cobrir as perdas da ponte brasileira, até porque os controlos europeus sobre a imigração vão apertar e muito! A TAP caminha rapidamente, como temos vindo a alertar, para uma encruzilhada fatal! De nada vale, governo e sindicatos, meterem a cabeça na areia. Quanto mais tardarem a pensar seriamente na situação, e decidirem assumir uma estratégia para a crise, pior.

  • Rui Rodrigues revelou no Público de 08JUL2008 (ver PDF) mais um claro exemplo da má gestão praticadas pela ANA e pela TAP no uso (ir)racional da Portela. Desta vez, depois de ter sido demonstrado em trabalho anterior a mentira da falta de Slots, fica-se a saber que a TAP praticamente não usa as mangas do aeroporto de que é a principal companhia, obrigando passageiros e bagagens a viagens penosas, morosas e absurdas entre a nova placa de estacionamento dos aviões e a gare do aeroporto. Mais uma decisão que não será tola de todo, porque teve e tem um objectivo: demonstrar o indemonstrável esgotamento da Portela.

    A pressão do petróleo vai continuar alta até, pelo menos, 2013, segundo afirmou o director executivo da Agência Internacional de Energia (7-7-2008, IEA). Haverá milhares de despedimentos na indústria aeronáutica e algumas companhias irão falir até lá. A União Europeia irá impor novas restrições e taxas aos produtores de CO2, com especial destaque para a aviação comercial e respectivos passageiros. Ou seja, até 2013, haverá uma diminuição dos voos e do número de viajantes partindo e chegando à Portela. Nunca a tão apregoada saturação do aeroporto de Lisboa!

NOTAS
  1. Sobre a dimensão da crise financeira em curso vale a pena ler os dois artigos a seguir citados, publicados pela insuspeita Bloomberg:
    European Banks May Need EU90 Billion, Goldman Says

    By Alexis Xydias and Ambereen Choudhury

    July 4 (Bloomberg) -- European banks may need to raise as much as 90 billion euros ($141 billion) to restore their capital after the U.S. subprime mortgage collapse caused credit markets to seize up, according to Goldman Sachs Group Inc.

    ... The European banks Goldman tracks have lost $900 billion of their market value since the credit crisis began last year. Anshu Jain, head of global markets at Deutsche Bank AG, said this week that that contagion is "by no means over," and Europe's banks have lagged behind the U.S. in raising money from investors.

    ... Goldman's analysts said in their report that "access to liquidity, capital adequacy and post-crisis profitability are the key areas of near to medium-term uncertainty" for European banks.

    Global financial stocks have led declines that wiped about $11 trillion from equity markets worldwide this year. Credit-related losses, surging oil prices and rising inflation have also stoked concern policy makers will have to raise borrowing costs as the global economy slows.

    LBO Defaults May Rise as About $500 Billion Comes Due

    By Neil Unmack

    July 4 (Bloomberg) -- Leveraged-buyout loan defaults may be "significantly higher" than ratings companies' estimates as about $500 billion of debt used to fund the takeovers comes due, the Bank for International Settlements said.

    Companies bought by private-equity firms worldwide must repay the high-risk, high-yield loans and bonds by 2010, the Basel, Switzerland-based bank said in a report today, citing Fitch Ratings data. They may find it hard to raise the cash because of a slump in demand for collateralized debt obligations that pool the loans, BIS said.

OAM 387 05-07-2008, 17:17

sexta-feira, julho 04, 2008

Petroleo 19



Hirsch: US$500/barril dentro de três a cinco anos
por Jim Kunstler

O momento da verdade na semana passada foi o aparecimento de Robert Hirsh na CNBC, no programa financeiro matutino "Squawkbox", no qual sugeriu a probabilidade de US$500 por barril de petróleo dentro de "uns três a cinco anos". A apresentadora Becky Quick ficou claramente confusa diante do impassível Sr. Hirsch, autor de um (então) assustador relatório elaborado em 2005 para o Departamento de Energia (desde então mencionado como Relatório Hirsch e enterrado pelo secretário da Energia) que advertia quanto aos medonhos efeitos sobre o modo de vida americano quando a situação do Pico Petrolífero ganhasse velocidade.

Talvez o maior contestador da realidade tenha sido o absolutamente idiota Larry Kudlow no show da noite sobre dinheiro, o qual manteve-se a repetir a lenga-lenga "furem, furem, furem" quando lhe apresentaram sinais de que alguma outra coisa além dos "especuladores do petróleo" estava a conduzir os preços para cima e a criar escassez global. Estes idiotas retornam sempre ao amuleto de que "há muito petróleo fora daqui". O que eles não percebem é que mesmo no momento em que o mundo está a desfrutar o pico máximo da produção de todos os tempos (algo em torno dos 85 milhões de barris por dia), aquele mesmo mundo está a exigir pelo menos 86 milhões de barris -- assim mesmo que se pense que há mais petróleo do que nunca, não há bastante. E o fosso só pode ficar maior.

A diferença entre o que está disponível e o que é procurado está a ser sentida pelos países pobres e pessoas pobres nos países mais ricos. Os países do Terceiro Mundo que não têm petróleo estão simplesmente a retirar-se do mercado, e as classes mais baixas nos EUA estão a ter de escolher entre comprar gasolina e velveeta [1] . As inundações no cinturão do milho certamente agravarão o problema aqui nos EUA. Intervalos para almoço em breve podem ser uma coisa do passado para a WalMart Associates. Talvez eles se ponham apenas a jogar video games nos seus telemóveis no parqueamento de carros a fim de aliviar a fome.

Enquanto isso, a noção de que furar furar furar no offshore dos EUA e mais acima no Alasca resolverá este problema mostra quão incrivelmente desinformados estão os noticiários dos próprios media. A probabilidade de ser encontrada qualquer coisa ao largo da Califórnia ou da Florida é próxima de zero, mesmo que compensasse em parte o esgotamento em curso no punhado de velhos e estabelecidos campos super-gigantes dos quais o mundo obtém a maior parte do petróleo. A propósito, apoio a ideia de furar na Reserva Natural do Alasca porque penso que isto pode ser feito de um modo higiénico e, o mais importante, faria com que os cornucopianos idiotas, imbecis da extrema-direita, finalmente calassem a boca acerca disso -- antes de descobrirem que aquilo contem menos da metade do abastecimento anual de petróleo dos EUA às actuais taxas de utilização.

Também na frente do "enquanto isso", a reunião de domingo da OPEP, em Jeddah, Arábia Saudita, foi simplesmente uma evasão desesperada, uma fantochada, um teatro kabuki de impotência. Mais uma vez os sauditas estão a pretender que podem aumentar a sua produção -- em resumo, a pretender que realmente têm algum poder no jogo. Como destacou Jeffrey Brown em THEOILDRUM.COM , o reino ainda mostrará um firme declínio de três anos em relação às suas taxas de produção de 2005 mesmo se fossem capazes de aumentar a produção actual tanto quanto eles dizem que farão em 2008.

Toda esta realidade principia a penetrar a consciência colectiva nos EUA, mas o resultado é sobretudo pânico ou descrença paralisada ao invés de qualquer conjunto de respostas inteligentes. Exemplo: recebi um telefonema de um dos produtores do Katie Couric no noticiário da CBS de sexta-feira. De algum modo, eles perceberam que os preços do petróleo estavam a tornar-se um problema na América. Chamaram-me para um comentário. A parte assustadora era que eles estavam claramente a tratar tal questão como uma estória "estilo de vida". Será que eu pensava que mais suburbanitas mudar-se-iam para o centro das cidades? E seria isso uma boa coisa...? Eles não tinham a mais mínima pista sobre quão vastamente e profundamente estas dinâmicas afectarão a vida deste país, ou mesmo a nossa capacidade para permanecermos um país. Também, a propósito, isto demonstra como a rede dos noticiários nocturnos tornou-se o equivalente das antigas "páginas da mulher" dos jornais diários.

O universo paralelo do mundo financeiro está a mostrar a tensão resultante de toda esta ansiedade com o petróleo -- uma vez que, afinal de contas, o petróleo é o recurso primário para movimentar economias industriais. Passou-se algum tempo desde que os rapazes ao serviço dos banqueiros embarcaram na sua aventura fatal de alquemizar uma nova estirpe mutante de instrumentos de investimento para substituir as velhas acções e títulos, os quais representavam a esperança para a produção do excedente de riqueza da actividade industrial -- agora posta em debate pela estória do petróleo. A ideia dos investimentos mutantes era produzir riqueza com nenhuma actividade real produtora de riqueza. Este velho truque, antigamente conhecido como finanças Ponzi ou um "esquema de pirâmide", era naturalmente auto-limitante, e de um modo que acabaria por se demonstrar muito destrutivo para sociedade como um todo. De facto, ele minou fatalmente a legitimidade de todo o sistema financeiro, e iniciou-se um estado de náusea abrangente quando testemunhamos todos a dissolução do fundamento da economia dos EUA sob um tsunami de dívidas que nunca serão reembolsadas.

Os mercados parecem saber isto, os actos mais interventivos estão a guinchar mais acerca disso, alguns bancos estão a emitir amedrontadoras advertências "duck-and-cover" [2] , utilizando frases de filme de horror tais como "...pior do que na Grande Depressão dos anos 30..." e o público geral está a afundar na areia movediça da bancarrota, devolução aos donos, e ruína. Não estive em quaisquer festas no relvado no Hamptons deste ano, mas imagino que borbulhas eczematosas de ansiedade estão a competir com queimaduras depois de acabado este ano. Realmente, estamos certos de voltar aonde estávamos por esta altura no ano passado, apenas pior. O petróleo duplicou, a comida está terrífica, as barragens romperam-se, as pessoas que dirigem as coisas estão a borrar as calças, e toda a gente está à espera da queda final. -- 23/Junho/2008.


Comentário: como temos vindo a escrever desde Maio de 2005, não há quaisquer condições nem propósito para grandes investimentos em novos aeroportos. Quando apresentámos, em Maio de 2005, a exposição d' o Grande Estuário, recolhemos previsões que apontavam para estimativas máximas do preço do petróleo na ordem dos 300 US dólares/barril em 2015-2016, intervalo então previsto para a inauguração do NAL da Ota. A perspectiva dos 500 dólares (já para 2011 ou 2013!) apontada agora pelo reconhecido especialista Robert Hirsch (autor dum famoso estudo para o Governo americano, datado de 2005, sobre as perspectivas da produção petrolífera), vem não só confirmar os avisos insistentes sobre o impacto necessariamente catastrófico do Pico Petrolífero nas economias mundiais, mas torná-los ainda mais dramáticos.

A greve anunciada pelos trabalhadores da TAP para este mês é infelizmente o início do canto do cisne de uma empresa com probabilidades mínimas de escapar à falência. O colapso da TAP deverá ocorrer já em 2010, após as eleições legislativas, a menos que seja objecto de uma operação de salvamento estratégico, drástica, rápida e sem precedentes. Segundo alguns patriotas atentos, a única hipótese de a TAP escapar a uma falência mais do que certa e à absorção dos respectivos cacos pela anunciada aliança entre a Ibéria, a British Airways e a American Airlines, seria dividir-se em três companhias distintas, porventura sob um mesmo chapeú: a TAP Europa (uma companhia Low Cost), a TAP América (especializada nos mercados americanos, do Canadá ao Chile) e a TAP África, de Marrocos até Moçambique, passando pelo Golfo da Guiné, Angola e África do Sul. Pode ser que esta ideia faça algum sentido. Mas duma coisa estou certo: nenhuma solução será viável sem a entrada de um forte parceiro financeiro no Grupo TAP, com liquidez efectiva para alavancar um projecto necessariamente ambicioso e arriscado. Seja como for, a TAP terá a muito curto prazo que concentrar-se estritamente no seu core business e proceder a uma dolorosa redução dos seus quadros de pessoal. -- OAM.

Post scriptum : segundo a BP, ao que parece, optimista, as reservas comprovadas de petróleo dão para mais 39,96 anos, se se mantiver o actual consumo mundial na ordem dos 85 milhões e barris/dia! No entanto, se o consumo chegar aos 100 milhões b/d até 2015, como seria necessário que chegasse para satisfazer a procura mundial previsível, as contas alteram-se e muito, não é senhores economistas da BP? Claro que há sempre a possibilidade de uma recessão mundial profunda e duradoura, ou uma guerra mundial, atrasar o relógio de Hubbert. Mas a que preço Senhores da Saudi Aramco (e demais NOCs), da BP, da Exxon Mobil, da Chevron e da Shell? Vale a pena ler o artigo da Times Online que se segue. -- OAM

Former President Bush energy adviser says oil is running out

June 30, 2008. The era of globalisation is over and rocketing energy prices mean the world is poised for the re-emergence of regional economies based on locally produced goods and services, according to a former energy adviser to President Bush and the pioneer of the "peak oil" theory.

Matt Simmons, chief executive of Simmons & Company, a Houston energy consultancy, said that global oil production had peaked in 2005 and was set for a steep decline from present levels of about 85 million barrels per day. "By 2015, I think we would be lucky to be producing 60 million barrels and we should worry about producing only 40 million," he told The Times.

His controversial views, rejected by many mainstream experts, suggest that some of the world's biggest oilfields, particularly in Kuwait and those of Saudi Arabia, the world's leading producer, are in decline. "It's just the law of numbers," he said. "A lot of these oilfields are 40 years old. Once they roll over, they roll over very fast."

Mr Simmons asserted that this, coupled with soaring global energy demand, meant that world oil prices were likely to continue rising. He said that even at present record highs of more than $140 a barrel, oil remained relatively inexpensive, especially in the US, the world's biggest market. "We are just spoiled rotten in the US," he said. "It's still cheap."

Rising prices will force a tectonic shift in the structure of the global economy by destroying the rationale for shipping many goods, such as food, over long distances, he said. "This is already happening. In the US, our local farms, ranches and dairies are booming. They are having a huge comeback."

Mr Simmons set out a radical vision of the future, envisaging a society in which food and many other essentials are sourced and consumed locally and increasing numbers of people work from home. He claimed that the alternative was increasing political instability and conflict over the planet's diminishing resources. "We are living in an unsustainable society," he said. "If we don't change we are just going to start fighting one another...So let's just start assuming the worst and plan for it."

However, only this month, BP disclosed figures which indicated that the world had 1.24 trillion proven barrels of oil left in the ground - more than 40 years' worth at current rates of production. BP said that known global reserves had actually increased by 168.5 billion barrels, or 14 per cent, over the past decade. Tony Hayward, the chief executive of BP, said: "The good news is the world is not running out of oil."

BP blamed a lack of investment and access to reserves, rather than geology, for why global oil production was sputtering.

Mr Simmons claimed that many countries had overstated their reserves for political purposes and that so-called flow rates were a better indicator of recoverable volumes. He said that the quality of oil produced by Saudi Arabia and other big exporters was declining. -- in Times Online.


NOTAS

[1] Tipo de queijo nos EUA.
[2] Duck and Cover era o método sugerido de protecção pessoal contra os efeitos de uma detonação nuclear que o governo dos Estados Unidos ensinou a gerações de escolares dos Estados Unidos desde o fim da década de 1940 até a década de 1980. Este método era suposto protegê-los no caso de um ataque nuclear inesperado o qual, diziam-lhes, podia acontecer a qualquer momento sem advertência. Imediatamente depois de verem um clarão de luz eles tinham de parar o que estavam a fazer e ficar sobre o chão sob alguma cobertura -- tal como uma mesa, ou pelo junto à parede -- e assumir a posição fetal, deitadas com a cabeça para baixo e cobrindo as cabeças com as mãos. Os críticos consideram que tal treino seria de pouca, se é que alguma, valia em caso de guerra termonuclear, e tinha pouco efeito além de promover um estado de desconforto e paranóia. A finalidade era criar no povo a aceitação da possibilidade da guerra nuclear.

A versão portuguesa deste artigo foi realizada e publicada originalmente pelo blogue Resistir. Cheguei aqui a partir do blogue Futuro Comprometido. Obrigado ;-)


OAM 386 04-07-2008, 00:08 (última actualização: 06-07-2008 01:28)

quinta-feira, julho 03, 2008

Transporte aéreo

Air France AF0129, Beijing-Paris
O tráfego aéreo cai com a subida do petróleo. Foto OAM.

A caminho do racionamento energético

American Airlines, British Airways e Iberia negoceiam parceria para dominar Atlântico.

03.07.2008 - 10h12 PÚBLICO. A American Airlines, a British Airways e a Iberia negoceiam uma parceria para criar um operador de grande dimensão no mercado transatlântico da aviação, noticia hoje o Financial Times.

Para concretizar o projecto, as companhias têm que chegar a acordo sobre a partilha de lucros e de receitas, situação que poderá acontecer ainda este mês, assegura o jornal, e passar pelo crivo das autoridades de Concorrência nos países de origem de cada uma das companhias.

O agravamento do preço dos combustíveis, o enfraquecimento das economias dos dois lados do Atlântico e a entrada em vigor do regime de céus abertos entre os EUA e a União Europeia são factores que têm vindo a acelerar a aproximação entre companhias aéreas dos dois espaços económicos.

Esta notícia deve ser compaginada com esta outra:
Airports Lose Passenger Flights As Peak Oil Starts To Bite

May 21, 2008 Futurepundit. In what is still the pretty early stages of the Peak Oil transition cities are losing passenger air service.

Financially strapped airlines are cutting service, and nearly 30 cities across the United States have seen their scheduled service disappear in the last year, according to the Bureau of Transportation Statistics. Others include New Haven, Conn.; Wilmington, Del.; Lake Havasu City, Ariz.; and Boulder City, Nev.

Over the same period, more than 400 airports, in cities large and small, have seen flight cuts. Over all, the number of scheduled flights in the United States dropped 3 percent in May, or 22,900 fewer flights than in May 2007, according to the Official Airline Guide.

For me the most surprising aspect of this trend is the level of traffic in January 2007 for airports that have now lost all commercial service. For example, Boulder City Nevada previously had 401 flights in January 2007 and now has none. Though big airports lost a much larger absolute number of flights. Chicago O'Hare lost 3,098 from 33,770 in January 2007 to 30,675 in January 2008.

A blogosfera, pelo teclado mordaz do RVS, já comentou:

"Nisto tudo, onde está a TAP!

Certamente já ninguém conta com a TAP para nada, a não ser como justificação para um novo aeroporto.

Coisa curiosa: daqui para a frente, a taxa de ocupação da TAP vai começar progressivamente a cair, apesar do aumento desmesurado de oferta, daqui sobressaindo um load factor cada vez mais reduzido, com rentabilidades cada vez mais negativas.

Ainda hoje de manhã deixei no Low Cost Portugal a "boa nova" de que quem se arriscar a comprar bilhetes com muita antecedência corre o risco de quando chegar à data não ter voo, devido ao seu cancelamento por parte da companhia.

Nesse cenário estão claramente os clientes da TAP discount para os quais a TAP deve ter reservado 10% da oferta de cada voo. Ou seja, o inteligente Fernando Pinto corre o risco de ter nos voos apenas a capacidade "discount" esgotada, com o resto do avião às moscas. No caso dos A319 da TAP, com capacidade para 140 e poucos lugares, são 14-15 lugares.

Por isso a blogosfera defende que a segmentação da TAP não deve ser feita dentro de cada voo, mas relativamente aos destinos para os quais a TAP voa. Assim, para a Europa, a TAP DEVIA VOAR QUASE EXCLUSIVAMENTE EM REGIME LOW COST, simplificando e poupando desta forma custos com toda a rede de vendas, marketing e gestão dos voos e das rotas.

Parece que não perceberam as palavras do De Neufville ditas no final da passada semana."

Há aqui mais um ponto a ter em conta:

O Atlântico passou a ser, depois de a China se ter transformado num actor global, a reserva territorial estratégica do Ocidente. A China, porém, pretende usar essa reserva para despejar mercadorias em sociedades que há muito deixaram de as produzir!

Perante este cenário, podemos talvez dizer que a Cimeira das Lajes serviu, afinal, para atar uma nova aliança entre os EUA, o Reino Unido e a Espanha, tendo Durão Barroso servido apenas de cicerone numa ilha que, a ver pelas notícias espanholas da época (de onde Barroso foi sistematicamente apagado!), mais parecia já um território conquistado pela descendência bourbónica que continua a pontificar em Madrid.

A notícia da aliança entre a British Airways, a Ibéria e a American Airlines é um passo obviamente político numa estratégia global que passa por isolar (ou vá lá, equilibrar) a influência da Alemanha.

Daqui decorre que Angela Merckel não irá ficar parada perante a união entre os três ex-grandes impérios coloniais. A StarAlliance, que é a maior aliança mundial entre empresas de transporte aéreo, irá certamente reagir.

Portugal tem neste contexto uma única alternativa: trabalhar rapidamente no reforço das suas alianças com Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe, na parte africana, e com o Brasil e a Venezuela, na parte americana.

Uma vez aqui chegado, deve oferecer os seus préstimos à Alemanha, à Rússia e à China! Não podemos retomar a fantasia catastrófica de querer isolar a Alemanha, ou impedir o alargamento do espaço vital europeu até Istambul e Moscovo.

Só após concluída semelhante estratégia, se poderá voltar a falar do NAL de Alcochete. Antes de aí chegarmos, muito antes, precisaremos de avançar por uma autêntica revolução no transporte ferroviário (sobretudo de mercadorias) e nos portos portugueses. O essencial é a renovação das linhas férreas e a sua progressiva substituição pela bitola europeia, bem como a produção própria de material circulante estritamente adaptado às necessidades. O essencial é preparar portos e navios para os trajectos transatlânticos, bem como para as viagens de médio curso entre os vários portos europeus e mediterrânicos.

No que se refere ao transporte rodoviário, mais cedo ou mais tarde, teremos que fazer duas coisas: eliminar o ISP e baixar o IVA sobre os combustíveis, ao mesmo tempo que introduzimos fórmulas inteligentes de racionamento dos consumos energéticos. Tal como se inventaram os cartões pré-pagos para os telemóveis, teremos um dia (mais cedo do que se pensa) que introduzir cartões pré-pagos e pós-pagos para a gasolina e o gasóleo, para os consumos de água, gás e electricidade, e ainda para os serviços de saúde. Trata-se de colocar as novas tecnologias ao serviço da eficiência energética e da sustentabilidade económica, social e política dos países, à medida que o paradigma das sociedades afluentes e consumistas der lugar a uma filosofia de vida mais justa e suportável pelo planeta a que pertencemos. Quem ultrapassar os consumos energéticos sustentáveis será obviamente penalizado, altamente penalizado. A pegada ecológica deverá passar a funcionar como base de tributação!

Uma parte minoritária do planeta irá muito provavelmente continuar a ter acesso privilegiado ao petróleo (cada vez mais caro) até 2050. Outra caminhará a passos largos para uma era pós-carbónica, cujos contornos se desconhecem. Por sua vez, nas sociedades de transição, que poderão beneficiar ainda, embora com restrições crescentes, do ouro negro, por mais algumas décadas, haverá uma divisão profunda e crítica entre os HAVE e os HAVE NOT. O sucesso das governanças medir-se-à então pela capacidade de distribuir equitativamente os custos e as responsabilidades da reconversão energética. Novos fascismos espreitam por aí!

A corrida já começou e é pública. Nós, portugueses, se nos deixarmos entreter pelo ruído das corruptas elites que actualmente controlam o sistema político, bye bye 800 e tal anos de independência!

OAM 385 03-07-2008, 16:28

Portugal 31

Titanic no fundo do mar
Titanic no fundo do mar

O iceberg está à frente do nosso nariz!


Uma das primeiras medidas de precaução que recomendo para os tempos que correm é deixarmos de ouvir 90% dos comentadores políticos e programas de televisão portugueses, sobretudo a Quadratura do Círculo! Não valem nada e transmitem intermitentemente, propaganda governamental e partidária, ruído informativo e entretenimento de péssima qualidade, de que o ordinário e idiota "humor português" é prova mais do que evidente. Escapam, na realidade, pouquíssimos exemplos que valham a pena ver e escutar. Entre os profissionais de informação, destacaria Mário Crespo e José Gomes Ferreira, entre os entrevistadores, Constança Cunha e Sá e a nova Manuela Moura Guedes, e entre os analistas e críticos, Medina Carreira (não deixem de ver e ouvir a sua última conversa com o José Gomes Ferreira), Silva Lopes e Vasco Pulido Valente. Cada um deles, à sua maneira e extravagância, tem a independência, acutilância e originalidade de raciocínio adequadas ao estímulo dos nossos cansados neurónios.

Constança Cunha e Sá levou Manuela Ferreira Leite a mostrar a garra de uma líder que, em meia dúzia de semanas, e apesar dos fracos colaboradores que puseram até agora a cabeça de fora, colocou José Sócrates e a tríade de Macau em sentido, obrigando-os a fazer marcha-atrás instintiva em zonas críticas da retórica e da prosápia que os tem caracterizado na sua triunfal marcha para o precipício. Já o frete encomendado pelo primeiro ministro à RTP1, foi mais uma inútil representação do seu irremediável teatro de mentiras. O truque de prestidigitação desta vez resumiu-se a colar a ideia de coragem (patética) a José Sócrates, contrapondo-a ao pessimismo negro e aparentemente impotente da líder da oposição.

E no entanto, Manuela Ferreira Leite desfez, com aquela metáfora assassina da dona de casa que não resiste às porcarias dos saldos (no caso, verbas comunitárias disponíveis), só porque são dadas, toda a política de obras públicas do actual governo. Uma política destinada a alimentar bancos e construtoras a caminho da falência, apoiada na mentira sistemática sobre estudos de custo-benefício que não existem, e ainda na persistente tentativa de esvaziar o património público e os bolsos dos contribuintes e utilizadores-pagadores para assim financiar infraestruturas supostamente imprescindíveis. A privatização da ANA, a entrega dos terrenos da Portela à especulação imobiliária, e as "parcerias público privadas", ruinosas, são a verdade escondida dos investimentos que José Sócrates afirmou e repetiu terem origem privada. Privada?! Quem? Como? Quando?

A Teixeira Duarte perdeu 64,36% do seu valor em bolsa em apenas seis meses. No mesmo período, a Altri perdeu 53,22%, a Mota-Engil, mais de 27%, o BCP e o BPI perderam cada um mais de 50% do seu valor, e a Brisa caiu quase 31%. A TAP poderá perder mais de 200 milhões de euros até ao fim de 2008, e outro tanto ou mais em 2009! Onde estão os privados dispostos a envolver-se nas Grandes Obras sem garantias prévias de que será o Zé Povinho a arcar com as despesas se algo correr mal. Por exemplo, se estas empresas forem à vida?

Basta olhar para os preços do petróleo, para a inflação e para o colapso financeiro mundial, a par do grau de endividamento do nosso país, sobretudo nas circunstâncias anunciadas de uma brutal contracção da liquidez global, para se perceber o que venho escrevendo há mais de dois anos: que não haverá recursos, nem interesse económico em projectos que perderam actualidade ideológica e se vão tornando obsoletos a cada dólar a mais no preço do barril de crude.

Muito em breve a União Europeia irá tomar medidas drásticas para mitigar a irreversível mudança do paradigma energético que alimentou o capitalismo liberal e consumista das sociedades ocidentais nos últimos 50 anos. Nós estamos a entrar numa grave crise mundial, provocada no essencial pela combinação entre três ocorrências: o naufrágio do império americano, a rápida expansão da China e o fim próximo de duas das principais fontes energéticas em que assenta o crescimento económico mundial: o petróleo e o gás natural.

A humanidade entrou numa situação de verdadeira emergência energética e alimentar. Para responder a tal emergência são necessárias medidas à altura do desafio, e não demagogia. A verdadeira coragem política passará inevitavelmente pela adopção de medidas drásticas de poupança e eficiência energéticas, a par da eliminação de duplas tributações ilegais e oportunistas (de que o escandaloso ISP é, entre nós, exemplo), bem como por uma inevitável diminuição da carga fiscal sobre os produtos petrolíferos. Não se pode impor impostos à sede. É ilegítimo e é criminoso!

A BP (1) acaba de publicar a sua Revista Estatística anual, na qual dá a conhecer números das reservas, produção e consumo de petróleo, gás natural e carvão à escala global. Os dados abrangem o intervalo 2003 a 2007. Destaco estes dados, pelo seu óbvio significado:

Dos 18 maiores produtores de petróleo, 4 são importadores líquidos, e grandes consumidores:

1. US
2. China
3. Brasil
4. UK (deixou de ser exportador de petróleo e de gás natural em 2005)

Sobre a Arábia Saudita, maior produtor mundial de petróleo:

1. A produção petrolífera atingiu o pico em 2005
2. A exportação de petróleo atingiu o pico em 2005
3. O consumo petrolífero cresce continuamente desde 2003
4. Todo o gás natural produzido é consumido no país

Exportação de petróleo Saudita (produção total - consumo interno = exportação)

1. 2005 = 9,223 milhões de barris por dia
2. 2006 = 8,848 milhões de barris por dia
3. 2007 = 8,259 milhões de barris por dia

Tendência de longo prazo: a Arábia Saudita deixará de exportar petróleo em 2025

Sobre a Rússia, maior produtor mundial de gás natural:

A produção de gás natural atingiu o pico em 2006
A exportação de gás natural atingiu o pico em 2005
O consumo doméstico tem vindo a crescer rapidamente
As exportações reduziram-se em 12,6% entre 2005 e 2007 e em 6,3% em 2007

Tendência de longo prazo: a Rússia deixará de exportar gás natural em 2020

Mar do Norte, petróleo de Brent (Reino Unido e Noruega): atingiu o pico de produção em 2005.

Post scriptum -- José Silva, um leitor crítico assíduo deste blogue, deixou um comentário que subscrevo inteiramente, sobre mais alguns opinadores pertinentes da nossa praça mediática, que me esqueci de mencionar: Daniel Deusdado e Rui Moreira (RTPN e Público), e Pedro Arroja (VidaEconómica.pt). Já agora, também gosto de ler a Luísa Bessa (Jornal de Negócios ;-)



NOTAS
  1. Sanders Research, Oil and Gas Net Exports, By John Busby, Jul/02/2008.

    BP has just published its annual Statistical Review which provides a comprehensive review of statistics encompassing oil, gas and coal reserves, production and consumption together with many other aspects of global energy vital facts and figures. It contains historical data up until 2007, allowing trends to be viewed.

    It does have certain caveats as to the source of the data and indeed the size of proven reserves is subject to much controversy as in spite of continuous production some national reserves fail to reduce in size without parallel statements of newly confirmed augmentations.

    (...)

    Comments
    It is too early to be sure that Saudi Arabian oil passed a production peak in 2005 and that Russian gas passed its production peak in 2006, but the rising domestic consumption in both the major players in oil and gas respectively indicates that supply problems will continue.

    The UK having been a major oil and gas exporter has with a combination of falling production and rising consumption become a net importer of both. Saudi Arabia and Russia have nowhere else to turn once this crossover occurs.

    Oil and gas importers have only 10 years or so to restrain oil and gas consumption, while investing in renewable alternatives. The drive for wind, tide and sea current generation will assist in the case of electricity, while the time scale for nuclear power is too long even if there was sufficient uranium production to fuel a "renaissance".

    There seems no other course of action other than "energy descent". A change of lifestyle is going to happen – it would be more appropriate for a government to catalyse its introduction, instead of promoting roads and runways. We all have to move about less.

    Artigo completo com gráficos
    .


OAM 384 03-07-2008, 02:01 (última actualização: 04-07-2008 19:36)