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segunda-feira, agosto 10, 2009

Por Lisboa 28

Uma cidade com dois estuários

2 Estuarios-2030

Ampliar imagem Ver projecção no Google Earth.

Frente ribeirinha da Margem Sul – um projecto perigoso

O desprezo pela reabilitação urbana, é revelado pelos seguintes números extraídos de um trabalho de Rita Calvário: “Portugal é o país da Europa que menos reabilita e onde a nova construção tem mais peso (90,5% numa média europeia de 52,5%). O investimento em reabilitação urbana é de 5,66% do total dos investimentos em construção, enquanto a média europeia é de 33%”. — in Esquerda Desalinhada.


Xangai
18 distritos
220 cidades, vilas, aldeias e povoações
7 037 Km2
população: 18 884 600

Lisboa
18 concelhos
cidades, vilas, aldeias e povoações: alguém sabe?
2 802 Km2
população: 2 808 414

O ponto de partida é sempre o mesmo: nada de útil pode ser resolvido em Portugal sem avançarmos de vez com a regionalização. A Grande Lisboa e o Grande Porto precisam de libertar-se das perversas Comissões Coordenadoras Regionais (CCRs), que não passam de correias de transmissão da nomenclatura partidária, coladas a uma burguesia basicamente indolente — burocrática, clientelar, preguiçosa e ignorante. Sem verdadeiras regiões, com órgãos próprios eleitos democraticamente e poderes alargados, o que continuaremos a ter depois das próximas eleições será mais do mesmo, i.e., um Estado centralista, injusto, corrupto e incapaz de competir na Europa.

A discussão sobre o futuro da região de Lisboa, sobre o novo aeroporto, sobre os comboios de alta velocidade e velocidade elevada, sobre novas travessias do rio Tejo, ou sobre os portos que precisamos urgentemente de renovar, está encalhada no Bloco Central do Betão, que é também um monumental Bloco Central da Corrupção. Vai ser lindo observar mais um ex-maoista (Pacheco Pereira) a gesticular sobre este navio encalhado que é Portugal, no provável governo de Manuela Ferreira Leite.

Vou de férias amanhã e não tenciono escrever durante alguns dias, apesar de levar o Kanguru comigo. Deixo aos meus fieis leitores, até ao fim deste mês, uma pequena charada sobre Lisboa, com que acordei um dia destes.

Cenários:

  1. o porto de Roterdão poderá deixar de crescer antes de 2030;
  2. os portos de Londres, Roterdão, Havre e Hamburgo poderão colapsar perante a subida do nível dos mares e a instabilidade climática, antes de 2050;
  3. a desertificação ibérica (que já é um fenómeno gravíssimo!) poderá empurrar parte da população espanhola do Levante, Castela, Aragão e Catalunha para o litoral atlântico (Norte e Oeste) antes de 2050;
  4. um grande terramoto/ maremoto poderá destruir o centro de Lisboa antes de 2050;
  5. o controlo euro-americano do oceano Atlântico —nomeadamente por causa de África e da América do Sul— vai tornar-se uma questão diplomática e militar decisiva e a única resposta possível ao avanço imperial da nova China, que em breve terá hegemonia sobre toda a Ásia e boa parte do oceano Pacífico;
  6. as novas economias do mar e dos rios, a energia solar e a água farão de Portugal, dos seus estuários e portos, bem como da sua ZEE alargada, uma das mais apetecíveis regiões europeias, muito antes de 2030.
  7. os arquipélagos dos Açores e de Cabo Verde são decisivos para o controlo do Atlântico, e para manter abertas as rotas marítimas e aéreas entre o Golfo da Guiné e a América, nomeadamente a Latina, daqui decorrendo que Portugal dificilmente poderá continuar de costas voltadas para os temas da diplomacia, da defesa e da paz — sob pena de o estandarte da soberania passar de vez para as mãos da monarquia espanhola.

Se algum destes cenários, ou uma combinação dos mesmos, vier a ocorrer, Lisboa estará no centro de um furacão diplomático, económico e social sem precedentes.

Por isso, talvez fosse bom discutir a necessidade de proteger publicamente os aquíferos, as linhas de água e canais dos estuários do Tejo e do Sado.

O reforço da capacidade portuária dos estuários do Tejo e Sado é, por outro lado, uma prioridade económica e política que exige previamente a criação de uma autoridade portuária única para toda a região de Lisboa. Esta ideia veio de boas mãos, pelo que subscrevo-a sem reservas.

Um longo canal navegável (com propósitos variados) entre os dois estuários teria qualquer coisa como 40 Km de extensão, podendo facilmente chegar, com ramificações, aos 60Km. Para termos uma ideia do que isto significa, basta pensar que o porto de Roterdão mede uns 40 Km de extensão, e o Canal do Panamá (1), 80Km. Pergunta: para que serviria um tal canal? A minha intuição diz-me que poderia ser um projecto para duas ou três gerações, capaz de salvar e recuperar todo o potencial do maior aquífero da Europa, actualmente ameaçado, como muitos outros importantes estuários do planeta, pelo assoreamento urbano e suburbano. Se permitirmos que a cobiça humana prossiga a sua cega tarefa de destruição dos dois grandes estuários portugueses, toda a região de Lisboa sofrerá um colapso muito antes do final deste século.

Finalmente, a questão do dinheiro.

Quando a oportunidade chegar, se chegar, chegará com muita força. E nessa medida, será uma aventura à qual não faltarão grandes interessados!

O importante agora é lançar a discussão e vigiar as patifarias em curso, nomeadamente aquelas que nascem das cavidades cranianas inquinados dos ministros "socialistas" das obras públicas, transportes e comunicações, da agricultura e do dito ambiente.

O governo PS tem vindo, no entanto, ainda que de forma arrastada e trapalhona, a entender as motivações estratégicas que orientaram a reflexão que em 2005 promovi sobre o Grande Estuário do Tejo. O seu mais recente anúncio eleitoralista sobre a cidade das duas margens, e sobre a recuperação da frente ribeirinha entre a Trafaria e Alcochete, não são em si mesmas más notícias — desde que o assunto seja propriamente discutido em público. Para já, o que Grazia Tanta percebeu das intenções governamentais é suficiente para deixar qualquer um preocupado. Os políticos desta falida República não aprendem!


NOTAS
  1. Big Panama Canal plan to cost half Metro North contract
    By Brendan Keenan
    Saturday July 11 2009 (Independent)

    A construction team led by Spanish contractor Sacyr Vallehermoso is the preferred bidder to design and build a third set of locks on the Panama Canal, with a bid of $3.1bn (€2.2bn).

    The bid is the biggest ever contract on the 80km (50 mile) canal which links the Atlantic and Pacific oceans, but is around half the reported cost of Dublin's Metro North line from the city centre to the airport.

    The final cost of the canal work is put at $5bn, although other bids were significantly higher. Bechtel Group, whose partners included the Japanese Mitsubishi, bid $4.2bn; while another Spanish group, working with the German Hochtief, put a cost of $6bn on the work.

    Panama Canal Awards Locks Contract
    Peter T. Leach | Jul 16, 2009 1:43PM GMT
    The Journal of Commerce Online - News Story

    Consortium Grupo Unidos por el Canal bid comes in under canal authority's target price

    The Panama Canal Authority formally awarded the contract to design and build a third set of locks to the Consortium Grupo Unidos por el Canal, which had submitted the lowest bid.

    The multinational consortium, which is composed of Sacyr Vallehermoso of Spain, Impregilo of Italy, Jan De Nul of Luxembourg, and Constructora Urbana of Panama, was one of three global engineering consortia that competed for the largest and most important contract under the canal’s expansion.

    The base price of US$3.12 billion submitted by Grupo Unidos was lower than the canal authority’s target price of $3.48 billion. (...)

    When completed in 2014, the project will allow 12,600-TEU vessels –– nearly three times the size that can fit through existing locks –– to steam through the canal providing all-water trans-Pacific services to all three U.S. coasts.

    Expanding the Panama Canal: A Wider Canal or More Governmental Payola?

OAM 615 10-08-2009 20:43

terça-feira, maio 13, 2008

Por Lisboa 17

Independence of the Seas, Lisbon, 14-05-2008
Lisboa: terceiro destino mundial dos cruzeiros. Há que protegê-lo da voragem especulativa!

Independência dos Mares

Atraca amanhã ao meio-dia no Cais de Alcântara do Porto de Lisboa o maior navio de cruzeiros actualmente sulcando mares europeus. Chama-se Independence Of The Seas. É a sua viagem inaugural e foi antecipada duas semanas, para irritação e protesto de quem reservou bilhetes e teve depois que desistir sem poder reaver o dinheiro da reserva!

Ainda assim, a sua primeira vinda a Lisboa não deixa de ser um espectáculo! Eu, que vivo em Carcavelos, delicio-me há anos com os navios pequenos e grandes que cruzam a Barra de São Julião, entrando e saindo do Porto de Lisboa. Ando, porém, muito irritado com os power-points populistas do governo socratintas em volta de intoleráveis ilusões bancário-betoneiras. Os dromedários e dromedárias que prometem a pés juntos estar a governar este país, ainda não perceberam que o pico petrolífero é uma parede intransponível, e pior do que isso, uma actividade telúrica destrutiva de economias, cujos efeitos nas insustentáveis dívidas públicas e privadas portuguesas irão inevitavelmente colocar-nos diante de dilemas de dificílima resolução. O barril de petróleo chegará aos 150 dólares ainda este ano, se não mesmo aos 200!

O paradigma do progresso assente numa burguesia velha, parasitária, bronca e subsidio-dependente chegou ao fim. Confundir a economia com auto-estradas, aeroportos e apeadeiros de dívida pública, hipotecando por mais de um século as futuras gerações de portugueses, é a prova cabal de que o regime político actual se transformou numa verdadeira cleptocracia (deixemos os angolanos em paz!), ainda que disfarçada pelo manto diáfano da aparência democrática e aturdida pelos sound-bite do populismo mediático dominante (de esquerda em Lisboa, e de direita no Funchal.)

O navio que amanhã chega à capital foi construído nos estaleiros de Aker, na pequena cidade finlandesa de Turku (pouco mais de 175 mil habitantes), não em Setúbal, nem em Vila do Conde! Nós por cá preferimos destruir alegremente a nossa capacidade agrícola e industrial, em nome da modernidade aparvalhada do "turismo de qualidade" e das novas tecnologias - dois fenómenos cada vez mais contingentes face à natureza capitalista avarenta da globalização, face à crise energética e face às alterações climáticas que se aproximam como um gigantesco, contínuo e duradouro ciclone.

Enquanto houve e houver subsídios de Bruxelas, o sistema político democrático que temos comportou-se e comporta-se como uma cigarra palerma. Depois, ou seja, durante o ciclo de ruína iniciado no fim do século passado, o mesmo sistema democrático-clientelar comporta-se como uma barata tonta, disposta a vender pai e mãe por um prato de arroz. As viagens aflitas do nosso primeiro ministro por terras da promissora Venezuela, da blindada Angola, ou da gélida Rússia, mostram até que ponto a nossa aflição é séria e estamos cada vez mais prontinhos para cair nos braços acolhedores de Madrid. Os perigos que espreitam a independência de um país com mais de 800 anos de vida são evidentes e muitíssimo preocupantes.

O transporte colectivo multi-modal e a partilha temporal do transporte automóvel individual serão muito provavelmente as únicas vias de saída para o esgotamento energético e económico das sociedades urbanizadas e suburbanizadas desenvolvidas ao longo do século 20 de acordo com o paradigma do transporte automóvel individual e respectivas redes viárias suburbanas, regionais e internacionais.

Estas saídas pressupõem a re-concentração das cidades e uma muito mais clara, ponderada e estruturada organização em rede das principais aglomerações urbanas. Teremos um número cada vez maior de cidades-região (em Portugal serão apenas três: Lisboa, Porto e Faro), quase sempre em volta de núcleos urbanos consolidados e antigos, cuja sustentabilidade económica, social e cultural dependerá sobretudo do grau de inteligência activa usada na sua modelação e governação futuras.

O principal cuidado a ter nesta fase de passagem, de que experiências de 14 mil milhões de euros, como Masdar City, a nova cidade sustentável de 6Kmq no Abu Dahbi (1), para 50 mil pessoas e 1500 empresas, ou o iminente desastre ecológico da expansão cosmopolita de Barcelona, são exemplos a seguir de perto, é a preservação das principais vantagens estratégicas de que cada grande cidade dispõe à partida e foi quase sempre a razão de ser da sua robustez e longevidade. No caso de Lisboa, a defesa intransigente do seu grande porto, tal como o cuidado a dedicar à rede ferroviária urbana, suburbana, interurbana e internacional, são prioridades absolutas, que nenhum governo imbecil, nem nenhum empreiteiro desmiolado, poderão ameaçar. Sob pena de eu deixar de poder gozar a vista dos navios que sulcam o Grande Estuário, e o país caminhar a pique para a indigência.


REFERÊNCIAS
  • Para termos uma ideia da importância do espaço livre no Porto de Lisboa, há que ter em conta duas coisas: a tendência para o regresso ao transporte marítimo de carga em navios de grandes dimensões e a dimensão igualmente imparável dos super-paquetes. O Independence Of The Seas, que transporta 5 730 pessoas, será superado já em 2009 por uma nova classe de navios de cruzeiro, a Classe Génesis, cujos navios transportarão 8400 pessoas. Por outro lado, perante a evidente deriva tectónica dos continentes geo-políticos, pontuada pela China, India, Brasil e Rússia, é de prever um verdadeiro renascimento da importância do Atlântico Sul e Norte no Grande Tabuleiro de Xadrez da política global do século 21. A orla costeira de Portugal e a respectiva Zona Económica Exclusiva (expandida), assim como as indústrias, eco-culturas e serviços que povoam a linha de costa e dão corpo às suas três maiores cidades, são pois domínios estratégicos de primeira importância. A sua sorte não pode ficar à mercê de uma burguesia retardatária e preguiçosa, nem de simples idiotas do poder.
  • Ver publicidade da Presstur sobre as 12 passagens anuais do Independence of The Seas por Lisboa.
  • Independence Of The Seas

    Classe Freedom
    Tonelagem: 154 407 toneladas
    Comprimento: 338,92 metros
    Largura: 38,6 metros
    Altura: aprox. 64 metros
    Capacidade: 5 730 passageiros, incluindo funcionários e tripulantes
    Custo: 590 milhões de USD
    Operador: Royal Caribbean International/
    Viagem inaugural: Maio, 2008
    Estaleiro: Turku, Finlândia (UE)
    Chegada inaugural a Lisboa: 14 de maio de 2008, às 12h00
    Programa 14 Tesouros Nocturnos do Mediterrâneo. Itinerário: Southampton (Londres), passando por Gibraltar (U.K.); Barcelona, spanha; Villefranche-Sur-Mer, França; Livorno (Florença e Pisa), Itália; Cagliari, Sardenha (França); Málaga, Espanha; Lisboa, Portugal; Vigo, Espanha.

    Classe Génesis
    Tonelagem: 220 000 toneladas
    Comprimento: aprox. 360 metros
    Largura: 47 metros
    Altura: 65 metros acima da linha de água
    Capacidade: 8400 passageiros, incluindo funcionários e tripulantes
    Estaleiro: Turku, Finlândia (UE)
    Viagem inaugural: 2009

OAM 359 13-05-2008, 19:17

quarta-feira, abril 30, 2008

Por Lisboa 16

Não matem o Grande Estuário!

Existem neste momento mais de 100 porta-contentores com capacidade de transporte variando entre 8 mil a 11 mil contentores. Cada um deles custa mais de 100 milhões de dólares, mas o negócio segue de vento em popa. Nos estaleiros navais há mais de 150 novas encomendas com prazo de entrega! Um dos maiores problemas colocados por estes mega-navios são as manobras de aproximação e acostagem nos portos actualmente disponíveis. O Canal do Panamá está neste momento a ser alargado para poder deixar passar os chamados Post Panamax container ships, do Pacífico para o Atlântico, e vice-versa. 30% dos porta-contentores actuais já pertencem a esta série. O maior deles, lançado à água em 2007, chama-se Emma Maersk: transporta 11 mil contentores TEU, mede 397m de comprimento, 56m de largura e tem um calado de 15,5m. Ler, a propósito, o artigo Global Logistics: Giant Cargo Ships Keep Coming.

Classe Genesis, uma série de gigantescos navios de cruzeiro, anunciados como verdadeiras cidades flutuantes de lazer, começarão a navegar em 2009 e 2010. O primeiro dos dois super-paquetes em construção nos estaleiros finlandeses de Aker, fará a sua primeira viagem inaugural no Outono de 2009, ligando a cidade de Turku a Miami. Passará por Lisboa? Se deixarmos destruir o Grande Estuário, não!

É preciso defender o Porto de Lisboa. Leia-se, a propósito, este manifesto esclarecido do Comandante Joaquim Ferreira da Silva, relatado pela Lusa.
Lisboa, 29 Abril (Lusa) - Deve-se "evitar a construção de quaisquer pontes" no estuário do Tejo, para preservar este grande potencial, quer turístico-paisagístico, quer técnico para o Porto de Lisboa, ou como grande hidro-aeródromo de mais de cinco quilómetros para "futuros hidroaviões de carga".

Quem o diz é o comandante da Marinha Mercante, Joaquim Ferreira da Silva, ex-professor e ex-director da Escola Náutica, que levanta sérias questões quanto à "precipitada decisão" de se construir a ponte Chelas-Barreiro, que irá "provocar entre outros danos, o assoreamento na margem sul, impedindo até a Base Naval do Alfeite".

Antigo alto funcionário das Nações Unidas, onde foi director de projectos das Escolas Náuticas financiadas pela ONU - tendo fundado as escolas de Casablanca, Maputo e Mindelo, o especialista considera que "não tem havido uma forte mobilização de pessoas conhecedoras dos problemas",e "nem mesmo têm sido consultadas".

"A decisão foi precipitada e não foram analisadas as consequências para os transportes marítimos nos próximos 50 anos", sustenta.

"Veja-se as enormes potencialidades do estuário, o maior da Europa, segundo um relatório da NATO,e que pode acolher, em caso de crise, um comboio de 30 a 50 navios de abastecimento, como na Segunda Guerra, ou uma ou duas grandes esquadras de marinha de guerra. E isto não é pensar à antiga, porque devemos acautelar o futuro, e neste futuro está a possibilidade de grandes hidro-aviões de carga poderem amarar numa pista com mais de cinco quilómetros de comprimento", defende.

Segundo Ferreira da Silva, o "Exército dos EUA está analisar alguns estudos" do célebre milionário Howard Hughes (proprietário da companhia TWA), com vista a grandes hidroaviões de transporte, com capacidade para 400 ou 500 homens.

"Como os aeroportos custam muito dinheiro, para os hidro-aviões basta um porto abrigado para amararem e, essa é outra razão para se poupar o estuário do Tejo", acrescenta, comparando à revitalização dos grandes paquetes "dados como mortos", e, "nunca houve como hoje tantos navios de cruzeiro".

O especialista "não pretende ser um Dom Quixote isolado", numa causa também partilhada por docentes do Técnico, entre os quais José Manuel Viegas, Fernando Nunes da Silva, Mário Lopes, Carvalho Rodrigues ou António Brotas.

Antigo professor de Navegação, Marinharia e Tecnologias de Navios, Ferreira da Silva sublinha a importância do Porto de Lisboa, "que tem de continuar liberto e, ter nos próximos 50 anos a competitividade necessária aos transportes marítimos subsequentes aos futuros grandes navios, como os Post-Panamax de 200 mil toneladas".

O especialista lembra a nova estratégia do Canal de Panamá, que em 2014 (comemora 100 anos) viabilizará navios de 200 a 300 mil toneladas, até 56 metros de largura e mais de 320 metros de comprimento e 24 metros de calado (profundidade), permitindo a circulação dos grandes navios vindos da China e do Japão.

"Perante esta estratégia, Lisboa não pode ficar no meio de um X, ou seja, entre as Américas, o Norte da Europa e o Mediterrâneo, a favor dos portos de Barcelona e Valência", sublinha.

Os grandes navios Post-Panamax levam mais de 10.000 contentores e, para tornar o Porto de Lisboa mais competitivo, tem de haver um terminal na margem sul (Trafaria), chamando a atenção para [o facto de] cerca [de] "90 por cento das infra-estruturas portuárias situarem-se entre as pontes Vasco da Gama e 25 de Abril".

Mas a situação agrava-se mais com a "destruição da chamada bacia de manobra do Porto de Lisboa, em que os grandes navios precisam de espaço... É necessário um quilómetro para a capacidade de manobra, implicando 300 metros de comprimento para um grande navio (dar espaço a outro semelhante), mais 300 metros para a amarra e outros 300 para a rotação ou deriva do navio, quando está fundeado".

Joaquim Silva diz que conheceu pessoalmente, aos 18 anos, o engenheiro Duarte Pacheco, então ministro das Obras Públicas, que só tomava decisões "baseadas em resultantes técnicas e que tivessem uma eficiência para 50 anos".

"Esta decisão é tão precipitada que não avalia o assoreamento da própria Base Naval do Alfeite e da margem sul, para onde se deve fazer a expansão do Porto de Lisboa, especialmente em termos de contentores".

"Com esta ponte para o Barreiro nunca mais irão navios com 9 ou 10 metros de calado (5.000 toneladas) para a zona da antiga CUF, como o terminal de Rosairinho (da Gascidla) entre o Montijo e o Seixal, e o cais da Siderurgia. O próprio relatório do LNEC sobre a nova ponte diz que o local fica assoreado", comenta Ferreira da Silva.

Todos os obstáculos colocados no Tejo travam a circulação dos detritos, provocando assoreamento, porque a ponte para o Barreiro "vai ser um autêntico pente que se enterra no estuário, originando também cheias nas zona de Alverca", a montante da Vasco da Gama, adverte.

Além disso, "os navios de cereais que, antes de aportarem ao cais do Beato, vão ao largo aliviar a carga para barcaças, nunca mais poderão fazer esta operação de transbordo, numa zona onde esteve fundeado em 1951 o "USA Missouri", o maior couraçado do mundo, a bordo do qual foi assinada a rendição do Japão com o general McArtur.

Para o especialista "não se devem fazer mais pontes no estuário", mas optar-se pela travessia em túnel, como a prevista para Algés-Trafaria, questionando se alguém faz pontes nos lagos da Suíça, para os atravessar, aludindo ao capital paisagístico e à imagem de marca, que representa o estuário do Tejo para o Turismo. AV. Lusa/fim



REFERÊNCIAS

  1. Avaliação Comparativa das Alternativas Existentes de Travessia do Tejo na Área Metropolitana de Lisboa. MOPTC, Março 2008. (PDF CONFIDENCIAL)
    A solução Ponte Beato-Montijo, ainda em fase incipiente de desenvolvimento, desde que respeite os condicionamentos que a APL vier a definir para as zonas de atravessamento, revela-se também mais vantajosa do que a solução (em ponte) Chelas-Barreiro, dado que, por estar mais a montante desta, interferirá, em princípio, em muito menor grau com a navegação portuária e não obrigará à deslocalização de qualquer nas infra-estruturas portuárias actualmente existentes no Porto de Lisboa.

    "The analysis was based on the available information and the conclusion is that, in what regards the operation and safety of harbour navigation in the Port of Lisbon, the Beato-Montijo alternative (either tunnel or bridge) is more favorable than the Chelas-Barreiro alternative."
  2. An ocean of opportunity
    "Europe is surrounded by seas and oceans; the Atlantic and Arctic Oceans, the Baltic Sea, the North Sea, the Mediterranean and the Black Sea. The sea is our past, present and future. The European Union needs a comprehensive Integrated Maritime Policy to benefit from the full potential of our seas and oceans.
    On 10 October 2007, the European Commission presented its vision for a Integrated Maritime Policy for the European Union. The vision document - also called the Blue book - was accompanied by a detailed Action Plan and a report on the results of the broad stakeholder consultation." Videos. Paper (PDF).
  3. Reserva Natural do Estuário do Tejo
    "A Reserva Natural abrange extensa superfície de águas estuarinas, os mouchões da Póvoa, do Lombo do Tejo, das Garças e de Alhandra bem como o sapal de Pancas, este último sulcado por uma teia de calas e canais, atravessado pelo rio Sorraia e ladeado por pequenas áreas de montado e pinhal manso. O essencial do coberto vegetal é dominado pela mancha de sapal, traço de união entre as águas e a superfície emersa." -- in Portal ICNB.
  4. Política Marítima da UE, Factos & Números - Portugal (PDF).
  5. Maritime Transport Policy -- Improving the competitiveness, safety security of European shiping. (PDF).
  6. Association of National Estuary Programs (website).
  7. Working paper on guidelines on monitoring and assessment of transboundary estuaries (PDF).
  8. MARETEC (IST) -- Tagus Estuary (website).
  9. Tagus Estuary, on OPCOM Coastal Management Sites (website).
  10. An Operational Model For The Tagus Estuary (PDF).
  11. Dinâmica de sedimentos e metais pesados no estuário do Tejo; Influencia das plantas e dos peixes (MECTIS). Projecto financiado pela FCT (Link).
  12. Organotin in the Tagus estuary.
    "The tri(n-butyl)tin (TBT) moiety has been shown to have complex ecotoxicological effects on estuarine populations. In the Tagus the massive die-off of the Portuguese oyster (Crassostrea angulata Lmk), has been attributed to the introduction and use of this contaminant by shipyards. This paper reviews previous work by others and reassesses our results obtained in water and sediments of the Tagus estuary, as a contribution to the understanding of tin geochemistry and organotin speciation in this estuary. Contrary to earlier results, the latest surveys show that in the open waters of the Tagus measurable concentrations of all the three butyltin species occur, exhibiting peak concentrations at two locations that indicate two previously undetected sources of TBT. TBT also presents a peak concentration in sediments near the Lisnave shipyards, as previously suggested. The latest surveys still detected methylated forms of tin, particularly monomethyltin (Me Sn^3+), in Tagus sediments, with maximum concentrations in the vicinity of urban effluent discharges. The concentrations for TBT and its degradation products found in the Tagus are potentially harmful to the populations of gastropods and endemic bivalves." -- in Ingenta Connect.
  13. Masterplan de Richard Rogers para a Margueira-Almada (Forum).
  14. Tagus Estuary (a visiting guide)
    "Visit the Tagus Estuary nature reserve and go bird watching, with flamingos perfectly visible in the midst of a lush green landscape. Don’t forget to take your camera!" (website).


OAM 352 30-04-2008, 01:02 (actualização: 01-05-2008 03:19)

quarta-feira, abril 16, 2008

Por Lisboa 14

Assoreamento provocado pelos pilares da ponte e doca de lama da Expo
Assoreamento provocado pelos pilares da ponte e doca de lama da Expo

AVE de Madrid chega a Entrecampos, entrando pela Ponte 25 de Abril

Vamos lá a ver se o poder político tem juízo desta vez e aplica os últimos dinheiros comunitários na sustentabilidade do país, em vez de se permitir disparates caríssimos e inúteis. Para isso precisa, em primeiro lugar, de eliminar as principais causas da corrupção endémica que nos tolhe: demasiados centros de poder, burocracia e falta de transparência processual, lentidão da justiça, irresponsabilidade administrativa e impunidade política.

Fui hoje de propósito ao Barreiro para tentar perceber definitivamente se existem razões suficientemente fortes para a insistência na ponte rodo-ferroviária Chelas-Barreiro. Mal conhecia o lugar, essa é que essa! Neste caso foi uma vantagem, pois não tinha nenhum preconceito sobre o dito. Fiz o trajecto de Carcavelos para o Barreiro seguindo de carro pela A6 (vulgo auto-estrada do Estoril), cruzando depois a Ponte Vasco da Gama e desviando no seu final para a via rápida que liga a ponte à cidade. O tecido urbano é pobre, está degradado, mas tem personalidade que baste. Almocei um ensopado de borrego divinal, a um preço que há muito se não vê pelas bandas da Linha onde vivo! A mais importante observação que retirei do passeio é esta: o centro histórico do Barreiro não está mais longe do Cais do Sodré do que está Cascais, e encontra-se certamente mais perto de Lisboa do que Sintra, levando-se sensivelmente o mesmo tempo a percorrer quaisquer destas três distâncias, quer o façamos em automóvel, ou em comboio. Ou seja, o argumento sobre o isolamento da antiga vila operária, por causa da inexistência de uma ponte sobre o Mar da Palha, que a ligue mais depressa ao Terreiro do Paço, não colhe. O entusiasmo dos autarcas da Margem Sul não passa de inconsciência e leviandade demagógica.

O sub-desenvolvimento do Barreiro deriva única e exclusivamente da entropia lisboeta, da sub-urbanização da capital e da titubeante reconversão do antigo tecido industrial da Margem Sul. Nenhuma nova travessia resolverá qualquer destes problemas. Como não resolveu no Montijo, nem em Almada! Na realidade, as pontes entre as duas margens, se não formos capazes de pensar a Grande Lisboa como uma cidade-região, como uma verdadeira metrópole polinuclear político-administrativamente integrada, apenas se acentuará a actual inércia de sub-urbanização desqualificada, desconexa e a prazo implosiva. Pois quando o petróleo chegar aos 150, aos 200 e aos 300 dólares, o que certamente ocorrerá antes de 2020, os movimentos pendulares privados, em automóvel, serão drasticamente reduzidos. Nem com óleo Fula, depois de fritar as batatas e os carapaus, lá iremos!

O problema do desenvolvimento das duas margens do rio Tejo não passa prioritariamente pelas travessias do grande estuário, que aliás nem sequer foram exploradas até aos respectivos limites. A Ponte Vasco da Gama está longe de saturar e já não vai saturar; as travessias fluviais em barco estão muitíssimo longe de uma optimização decente; a actual pressão sobre o tabuleiro automóvel da Ponte 25 de Abril pode ser francamente aliviada desde que ponham comboios suficientes a circular entre Setúbal e Entrecampos (e entre Madrid e Entrecampos!), de 15 em 15 minutos, das 6:00 às 24:00, e de hora à hora durante a madrugada. Por fim, falta ainda medir o impacto da novíssima Ponte do Carregado no desvio dos tráfegos Norte-Sul e Leste-Oeste que não precisam de atravessar Lisboa, nem a Margem Sul. Se depois de aqui chegados, eu estiver completamente enganado, e o petróleo jorrar da Lua à razão de 120 milhões de barris por dia, então sim, teremos que construir, não uma, mas mais duas travessias entre as duas margens do grande estuário: uma ponte ferroviária entre o Beato e o Montijo, e um túnel multimodal entre Algés e a Trafaria. Mas para já, com o petróleo quase nos 114 dólares, o melhor mesmo é termos juízo!

A ponte Chelas-Barreiro não concita nenhum argumento sério a seu favor, e a ser construída, além do nulo impacto positivo sobre o desenvolvimento do Barreiro, produzirá gravíssimos prejuízos ao estratégico porto de Lisboa.

Primeiro, porque agravará ainda mais o assoreamento do Mar da Palha numa zona necessária às manobras de navios que tendem a ser cada vez maiores e com cascos mais profundos, além dos previsíveis efeitos catastróficos em caso de cheias, ou da anunciada subida do nível médio dos mares em cerca de 150 cm até ao fim deste século.

Segundo, porque a própria localização prevista para a ponte congeminada por alguns lunáticos do Técnico come uma parte fundamental do estuário, essencial às ditas manobras de navios.

Terceiro, porque terá sempre um impacto visual negativo sobre a escala da zona histórica da cidade de Lisboa.

Sacavém, cheias

Como se a destruição anunciada do porto de Lisboa não fosse em si mesmo um crime intolerável e motivo suficiente para um veto presidencial (pois o putativo responsável governamental pela Defesa do país não passa dum boy), acresce ainda que a ideia de financiar a nova ponte com portagens a espremer aos automobilistas que cruzariam então as três pontes do grande estuário é altamente improvável por causa da espiral imparável dos preços dos combustíveis, da gasolina ao gasóleo, passando pelo biodiesel, as pilhas de hidrogénio e os óleos de fritar carapaus.

As respostas dadas esta noite por João Salgueiro a Mário Crespo, no Jornal da Nove (SIC), a propósito do mau caminho da nossa economia e do nosso desenvolvimento, foram de uma clarividência notável e merecem ser revistas por todos. Não podemos continuar a ser enganados pelos políticos ignorantes, irresponsáveis, impunes e corruptos que dominam este país! Há um conjunto de coisas simples mas duras que teremos todos que assumir se quisermos vencer os enormes problemas que aí vêm. A primeira delas é que o nosso futuro colectivo vai mesmo depender do que soubermos fazer da democracia que ainda temos.



Post scriptum

I - Sobre os argumentos patetas do Ministério da Defesa, aqui vai a resposta.

Os argumentos do Ministério da Defesa não passam de um frete político, o que atesta bem da frágil personalidade do seu actual responsável.

Se não vejamos...

O que dizem eles:

"...considera-se que a sua concretização teria um impacto negativo nas redes de
serviços instaladas, por eliminação ou interrupção das mesmas, nomeadamente rede
eléctrica, combustíveis, águas e comunicações, bem como em infraestruturas
operacionais e de apoio, além de obrigar à relocalização dos meios aéreos ali sediados
durante um período significativo devido à impossibilidade de coexistência das operações
aéreas com os trabalhos decorrentes das eventuais fases de construção".

"Não obstante o anteriormente exposto, as vias rodoviárias e ferroviárias projectadas para
o interior da Base Aérea n.º 6, tornariam esta infraestrutura militar extremamente
vulnerável a qualquer ameaça, em virtude da livre circulação de veículos nas rodovias e
nas ferrovias a construir, independentemente de serem estrada, viaduto ou em túnel, pelo
que, sendo este um problema intransponível ao nível da segurança militar, não é
compatível com os interesses da Defesa Nacional".

"Nesta conformidade o Estado-Maior da Força Aérea manifesta a expectativa de serem
encontradas soluções para a TTT que salvaguardem a operacionalidade da Base Aérea
n.º 6, dentro dos parâmetros de segurança militar estabelecidos, e, nomeadamente, no
que se refere às superfícies de desobstrução de obstáculos, a área e servidão militar e
aeronáutica e, ainda, às servidões radioeléctricas."

Desmontagem de tão frágeis argumentos.

Cmdt. Joaquim Silva:
  1. Todas as bases portugueses estão "cercadas" e "marginalizadas" por vias de comunicação publica, incluso a da Sintra já teve uma estrada nacional que cruzava a sua pista e era cancelada quando os aviões nela operavam. Assim qualquer base aérea portuguesa está acessível a tentativas de intromissão a não ser que se encerrem as referidas vias.
  2. Quanto ao facto das perturbações que as obras trariam às redes de operacionalidade da base (águas ,esgotos, energia, comunicações , etc.) é mais que evidente que a engenharia moderna pode operar - construir túneis por exemplo - sem as afectar.
  3. O aeroporto de Lisboa tem sofrido ao longo dos anos grandes obras em volta da base do Figo Maduro e os militares nunca se queixaram das suas consequências.
  4. O aeroporto de Beja está a sofrer grandes obras e idem, idem.
    O que será preciso perguntar aos militares é se ficarão a operar com a pista Leste-Oeste do Montijo, com a ponte Chelas-Barreiro na frente a menos de 1000m e a de NE-OE a menos de 1500m e se abdicam de ter o estuário do Tejo como pista para hidroaviões (fiscalização, segurança e vigilância costeiras).
    Finalmente perguntar à Marinha se pensa abandonar a Base Naval e o Estaleiro do Alfeite quando toda a área sul dos pilares da ponte prevista, se assorear e impedir o acesso àquela base; a não ser que haja quem pague dragagens de custos gigantescos.

Rui Rodrigues:
  1. em 1994, o Montijo foi escolhido como o local mais adequado para um novo aeroporto.
  2. Numa entrevista do Jornal Expresso, dia 24 – 4 – 99, ao ex-ministro das Obras Públicas Ferreira do Amaral, foi dito que a Base Militar era perfeitamente adaptável ao tráfego civil e que tais projectos eram do conhecimento da Força Aérea.
  3. Se, por razões de defesa nacional, a 3ª travessia do Tejo não pudesse passar pelo Montijo, então (...) os militares poderiam ser transferidos para Beja, Ota ou outro local a definir, utilizando os mesmos critérios para os retirar de Alcochete ou da Ota (empregues sem qualquer objecção quando se decidiu construir o NAL na Ota, e depois no Campo de Tiro de Alcochete).
  4. Nas guerras mais recentes, os objectivos militares ou estratégicos são atacados por mísseis a longa distância ou através de aviões e nunca por acções de sabotagem. (Ler PDF do autor sobre esta controvérsia.)

António Maria:
  1. Se porventura alguma organização terrorista, ou qualquer decisão militar de desencadeamento de operações especiais de provocação e sabotagem, viesse a ter lugar no nosso país, não faltariam alvos civis --e militares!-- propícios e indefesos. A segurança interna portuguesa neste domínio é pura e simplesmente inexistente!
  2. Que se saiba a Base Aérea de Beja é uma instalação militar e o governo decidiu enterrar naquela infraestrutura 33 milhões de euros, ao que parece para fazer daquilo um aeromoscas comercial. Nenhuma empresa do ramo se mostrou até à data interessada em transportar incautos de e para aquele oásis turístico, pelo que à cautela a Base Aérea do Montijo já aproveitou a oportunidade para realojar, naquela que foi uma importante unidade de treino militar da Luftwaffe, os seus lobinhos de estimação, quer dizer, seis aviões Lockeed P-3P Orion, especializados no patrulhamento marítimo para detecção, localização, seguimento e ataque a submarinos e meios de superfície, execução de operações de minagem e sobretudo, em tempo de paz, detecção e dissuasão de actividades ilegais e realização de operações de busca e salvamento. A conclusão é óbvia senhor Yes Minister: a Base Aérea do Montijo pode e deve trasladar-se inteirinha para Beja.
  3. Haverá em território português alguma base aérea militar mais estratégica e mais bem guardada do que a das Lajes? Pois não há. E no entanto, convive com um aeroporto civil, onde aliás presenciei dois anos de obras de ampliação e renovação da respectiva gare civil, sem ter reparado que houvesse quaisquer medidas de segurança especiais.

II - TTT: Sobre a posição da Câmara Municipal de Lisboa (expressa num debate ocorrido ontem)

Como escrevi num post anterior, os partidos de "esquerda" sentados ao colo de António Costa apoiam a solução Chelas-Barreiro por meros reflexos eleitoralistas e demagogia piedosa. O comportamento é similar, na miopia e no oportunismo, à eternidade que levaram a perceber e finalmente criticar o embuste da Ota. É esta falta de conhecimento, do sentido das proporções e de responsabilidade política, que acabará por condenar mais cedo do que o previsto o actual regime democrático. Foi assim, por causa deste género de imbecilidade pacóvia, que a Primeira República finou. Será provavelmente pela mesma ordem de razões que a Terceira República verá o seu término. Só não sabemos ainda qual a forma que o próximo regime autoritário irá revestir. Mas que os tontos da "esquerda" tudo têm feito para provocar a sua chegada, disso já não tenho quaisquer dúvidas. O próximo ditador limpará o decadente regime actual num abrir e fechar de olhos eleitoral, rindo-se provavelmente às gargalhadas, como Sarkozy e Berlusconi. Estou prestes a ir-me embora!

III - Frente Ribeirinha - erro histórico. Helena Roseta demarca-se, e bem, do cozinhado entre o PS e o Bloco de "Esquerda"

16-04-2008. "Os vereadores Cidadãos por Lisboa votaram contra o 'documento estratégico' para a frente ribeirinha por não ser senão uma lista de obras, sem uma visão de conjunto e de futuro. Não é possível regenerar a frente ribeirinha sem vencer a barreira física e institucional entre o porto e a cidade.

Consideramos um erro histórico que a CML tenha prescindido de apreciar o modelo de gestão da intervenção pública, feita através de uma nova empresa que vai ser apenas “dona de obra”. Esta empresa não é necessária. Os 4 milhões que o seu funcionamento vai custar seriam melhor investidos directamente na melhoria da cidade.

Consideramos além disso um escândalo que, através de um mero pretexto formal, a maioria da vereação tenha decidido não se pronunciar sobre a nomeação do conselho de administração da nova sociedade, viabilizando assim a indigitação de José Miguel Júdice para a sua presidência. -- Cidadãos por Lisboa.

OAM 346 16-04-2008, 01:50

domingo, março 16, 2008

Por Lisboa 13

Torre VTS, Lisboa
Torre VTS, Algés, Lisboa. Centro de Coordenação e Controlo Marítimo do Porto de Lisboa,
projectado pelo arquitecto Gonçalo Byrne. Inaugurou em 2001 e demonstra cabalmente como
os assuntos portuários ultrapassam as competências municipais.

O apetite especulador da Câmara Municipal de Lisboa

O Presidente da República devolveu ao Governo o diploma que previa a transferência para a Câmara da zona ribeirinha que hoje pertence ao Porto de Lisboa. Se o processo avançasse, poderia ter amplas repercussões urbanísticas em todo o país.

... Com a não-promulgação, Cavaco acaba por dar razão aos pareceres negativos dados a esta legislação pelos Ministérios da Defesa Nacional (MDN) e do Ambiente. Nunes Correia, aliás, teve mesmo de assinar o diploma, apesar de o seu Ministério se ter oposto à solução encontrada. No Ambiente, e segundo soube o SOL, foi o Instituto Nacional da Água (INAG) que estudou o assunto e que elaborou o parecer negativo.

Formalmente, porém, tanto o Ambiente como a Defesa não produziram pareceres autónomos. As suas posições sobre a nova legislação foram incluídas no documento elaborado, a este propósito, pela Comissão do Direito Público Marítimo - um organismo consultivo do MDN que reúne representantes de áreas como a Protecção Civil, as Alfândegas e os Governos Regionais, além de organismos da Defesa e do Ambiente, como o INAG. -- SOL, 16-03-2008.

Começo por testemunhar a minha profunda desconfiança relativamente à administração do porto de Lisboa. O motivo é simples: Lisboa podia ter um dos mais importantes portos de mercadorias e passageiros da Europa, mas não tem! Se pensarmos no crescimento exponencial do transporte marítimo (e fluvial!) que se avizinha à medida que as penalizações do transporte rodoviário e aéreo -- demasiado sequiosos de petróleo e demasiado poluidores -- começam a triturar as respectivas margens de lucro, podemos sem grande desgaste mental imaginar a importância dos generosos estuários portugueses (sobretudo Mondego, Tejo e Sado) na futura economia do mar, num país que viu restringir dramaticamente o seu espaço vital após a perda do império colonial e se encontra hoje confrontado (de novo...) com a desmedida ambição ibérica (e atlântica!) de Madrid. Os portos portugueses e o de Lisboa em particular (tal como os nossos aeroportos) são caros, ineficientes, sem estratégia nem ambição, opacos e antros de uma corrupção antiga que urge corrigir, instaurando uma radical mudança de atribuições, responsabilidades e hábitos administrativos.

No entanto, só um idiota deixaria que os assuntos estratégicos do território nacional, de que a raia com Espanha, o mar, e desde logo toda a orla marítima e os rios, fossem parar às mãos ligeiras de vereações municipais ávidas de dinheiro fácil, sem qualquer visão de futuro e cada vez mais instáveis politicamente.

A improdutividade e subsidio-dependência das nossas arruinadas cidades é o fruto apodrecido de trinta e tal anos de uma espécie de perversão clientelar da democracia, a qual transformou o que parece ser uma democracia representativa numa burocracia parlamentar. O Bloco Central e os pequenos partidos com assento parlamentar são os principais responsáveis da decadência económica e sobretudo ideológica do Estado central, regional e municipal. Alfobre do clientelismo partidocrata dos últimos 30 anos e expediente simplório para o desemprego sistémico decorrente da incapacidade de definir uma visão de futuro, exigente, solidária e responsável, para o país, este Estado tentacular, despesista, improdutivo, ineficiente, corrupto, insustentável e insuportável tem que ser confrontado de uma vez por todas pela cidadania, sob pena de perdermos a independência e transformarmos Portugal numa colónia espanhola da Europa, administrada por patos-bravos disfarçados de administradores-delegados da Moncloa!

Felizmente, o nosso Presidente da República não é idiota. Cresce a sensação de que este homem, de quem muitos desconfiaram sempre, resta como a única válvula de segurança de um regime corrompido pela cupidez partidocrata dominante. Ainda bem, pois não vejo, face à cobardia ou simples desleixo mental de muitos de nós, como derrubar a muralha de oportunismo e criminosa irresponsabilidade que tomou há muito de assalto os partidos políticos com assento parlamentar. Não percebo o que leva a tanta hesitação no interior do PSD, do PS e mesmo do Bloco de Esquerda. Será que a gente honesta destes partidos não entendeu ainda que é inviável prosseguir qualquer ideal verdadeiro se não abandonarem o conforto medíocre da inércia partidária actual, partindo para novas aventuras?

Lisboa só pode ser pensada à escala da sua própria região, o mesmo sucedendo ao Porto. Isto é simples de entender, mas difícil de mudar. E sabem porquê? Porque as actuais administrações locais vivem no conforto do Orçamento de Estado, financiado por uma carga fiscal crescente que atrofia a economia e gera o desemprego estrutural de que hipocritamente se queixam os partidos de "esquerda". António Costa e o seu inefável vereador-arquitecto querem mais-valias, dê lá por onde der. Querem os terrenos da Portela, sem pesar por um segundo o valor do Aeroporto de Lisboa, localizado onde está, para a economia da cidade. Querem uma ponte rodo-ferroviária entre o Barreiro e Chelas sem se preocuparem com a bestialidade da decisão (se viesse a ser tomada). Querem tomar de assalto o lombo imobiliário de Lisboa, sem perceberem que há coisas que estão para além da sua aflita condição de autarcas. Que tem o trotskysta Francisco Louçã a dizer sobre o súbito apetite especulador do independente do Bloco de Esquerda que ajudou a eleger para sacristão de António Costa?

Os portos deste país não podem cair nas mãos despesistas e incompetentes dos autarcas. Em primeiro lugar, porque as autarquias têm uma visão curta dos problemas; em segundo, porque estão sobre-endividadas; e em terceiro, porque a orla marítima e fluvial, tal como a raia com Espanha, são zonas estratégicas do país, ou seja, domínios da competência partilhada entre o governo central e a presidência da república. Isto não significa que as autarquias não possam colaborar nas tarefas de ordenação e gestão das zonas portuárias, e até obter o justo rendimento que tais infraestruturas podem e devem pagar às comunidades onde estão sediadas. Mas isto é um cenário completamente diferente do assalto preparado por António Costa. O Miguel Sousa Tavares tem que rever o seu pensamento sobre esta questão -- eminentemente prática!

Post scriptum -- 18-03-2008. João Soares manifestou no Frente-a-Frente do Jornal das Nove (SIC) desta noite a sua discordância frontal com o cozinhado preparado por António Costa (o actual presidente do município lisboeta), José Miguel Júdice (advogado gourmet e cliente habitual dos corredores governamentais) e José Sá Fernandes (vereador eleito nas listas do Bloco de Esquerda), para estender o poder autárquico às zonas portuárias e orlas costeiras do país, começando, claro está, por Lisboa. Tal como na questão da Ota, o antigo edil da capital demonstrou ter opiniões próprias e sobretudo lúcidas.

OAM 337 16-03-2008, 18:12

sexta-feira, fevereiro 29, 2008

Por Lisboa 12

Unanimidades perigosas


19-02-2008. O Tribunal de Contas recusou o visto ao contrato celebrado entre a Câmara Municipal de Lisboa (CML) e a Caixa Geral de Depósitos para o empréstimo de 360 milhões de euros. -- RTP.

28-02-2008. Ontem, o executivo decidiu por unanimidade libertar 20,4 milhões de euros para pagar as dívidas a 1287 fornecedores. Destak/Lusa.

A recente aprovação partidária unânime do recurso ao orçamento de 2008 para fazer face às dívidas da Câmara Municipal de Lisboa, depois do acórdão do Tribunal de Contas ter chumbado o pedido de empréstimo bancário à Caixa Geral de Depósitos (teria um banco privado sequer considerado a hipótese de fazer semelhante contrato?), desenhado pelos consultores do socialista que hoje dirige os destinos da capital, António Costa, deve preocupar qualquer lisboeta, e mesmo qualquer português, dadas as ondas de choque que decisões desta envergadura, tomadas na maior cidade do país, sempre acabam por gerar.

Há obviamente um aperto muito grave nas contas da autarquia. Alguns dos fornecedores estarão à beira da falência por causa de atrasos de pagamento com mais de seis meses, e mesmo mais de um ano!

Pergunto: e teve tal aperto repercussões efectivas, visíveis e duradouras nas causas imediatas e antigas que levaram ao descalabro que agora se conhece? Isto é, no que se reporta à corrupção que envolve dirigentes políticos e técnicos camarários, sobretudo no sector da especulação imobiliária e obras públicas, foi feito ou está a ser feito o que é necessário fazer sem demora? Foi dado até agora algum sinal aos lisboetas de que o governo decidiu fazer uma dieta rigorosa de actividades não-essenciais? Se foi, então como explicar o relançamento duma iniciativa esgotada e dispensável como, por exemplo, o festival de design parvenu, a que chamam "Experimenta"? Outro problema, ainda mais bicudo, é o da macrocefalia burocrática da autarquia, isto é, gente a mais na folha de pagamentos e inúmeros serviços inúteis (1), em duplicado, ou simplesmente ineficazes, que 30 anos de democracia clientelar incharam a tal ponto que o abcesso actual não tem outra solução que não seja o seu lancetamento cirúrgico.

Sem atacar imediatamente estes dois cancros que corroem o edifício autárquico da capital, a actual unanimidade partidária aflita que autorizou António Costa a mexer nas verbas do orçamento de 2008 para fazer face a despesas de exercício passados não passará de um paliativo. Assim tomada, despida de outras decisões drásticas, esta opção desesperada faz-me lembrar o desgraçado pai de família heroinómano que estoura o ordenado no pó para as veias, deixando de acudir às despesas familiares. A cura da subsídio-dependência burocrática, do clientelismo, do nepotismo e do endividamento irresponsável, não é mais dívida. A América está neste preciso momento a pagar duramente a ilusão de que alguém, ou país, mesmo sendo o mais rico do mundo, possa viver eternamente acima das suas possibilidades e endividar-se até ao infinito. Não pode!

Lisboa tem problemas estruturais graves que deveria começar a resolver rapidamente, fazendo da actual crise o necessário estímulo para criar um novo desenvolvimento citadino e metropolitano. São eles:
  • ausência de uma visão partilhada de médio-longo prazo
  • a falta de adequado ordenamento jurídico e material do território
  • a ausência de uma estratégia metropolitana
  • o excesso de burocracia
  • a ineficiência, irresponsabilidade e arrogância dos serviços
  • a corrupção instalada
O quadro que se segue, e que compilei como pude para ver se percebia o que está a apodrecer a cidade de Lisboa, mostra claramente que o desperdício de recursos é escandaloso, e que uma cidade sofrendo duma tal hipertrofia burocrática jamais irá a parte alguma. Os paliativos tão alegremente saudados pela nomenclatura partidária, do Bloco de Esquerda ao CDS, passando pelo Bloco Central e pelo PCP, não resolverão coisa alguma, a não ser envenenar mais ainda o doente.

A culpa, neste caso, tem sido apenas dos políticos. E a questão que subsiste é a seguinte: serão eles capazes de sair da armadilha que montaram a si mesmos?

Duas capitaisLisboaMadrid
Superfície83,84 kmq607 kmq
Residentes556 797 (INE 2001)3 128 600 (INE 2006)
Densidade populacional6 518 hab./kmq5 154 hab./kmq
Nº Freguesias/ Distritos5321
Pessoal municipal (2006)12 00026 416
Pessoal municipal por 1000 Hab.228
Pessoal municipal por Kmq18844
Despesas com Pessoal (Orç. 2008)238 006 101 € (2)1 438 000 000 €
Despesa com Pessoal por Hab.427,45 € (3)459,63 €
Despesas correntes (Orç. 2008)107 247 666 € (4)2 151 000 000 €
Dívida municipal (2007)1 500 000 000 €5 936 000 000 €
Dívida municipal per capita (2007)2 694 €1 930 €
PIB per capita (2007/2006)19 400 €27 279 €



NOTAS
  1. A Agenda de Lisboa, entre centenas de outros, é um exemplo típico de coisa imprestável, que nem sequer compete ao município providenciar. À capital bastava que tivesse um sítio web decente, usável e amigo do cidadão e de quem nos visita.
  2. Não especifica se a despesa recai apenas sobre pessoal efectivamente contratado, ou se inclui também despesas com trabalhadores em regime de contrato a prazo, prestação de serviços, etc.
  3. Na realidade este valor, se reportado à diferença salarial média entre os dois países no ano de 2005 (24,8%), representa um gasto em pessoal por habitante de 533,458 euros. O que significa dizer que Lisboa gasta em média anual mais 73,8 euros em despesas de pessoal por cada um dos seus habitantes. Madrid é considerada uma cidade muito cara, embora também seja vista como uma das cidades europeias que melhores serviços presta aos seus cidadãos. Como classificar a esta luz o custo-benefício de ambas as cidades? E sobretudo o preço dos respectivos governos e burocracias municipais?
  4. Inclui aquisição de serviços sem especificar que parte destas aquisições corresponde a emprego precário (contratados a recibo verde, etc.)

REFERÊNCIAS
Lisboa com ordenados 10% mais altos que Porto
28.04.2006. A diferença entre os salários praticados entre as duas maiores cidades portuguesas e as três maiores espanholas mantém-se bastante elevada, tendo-se agravado durante o ano passado. Os trabalhadores de Lisboa e Porto ficam claramente a perder face aos de Madrid, Barcelona e Valência. De acordo com a Hay, a diferença salarial entre os dois países ibéricos situou-se em 2005 nos 24,8%, um agravamento face aos 22,3% registados em 2004.
DN online

Madrid: Las cuentas municipales para 2008
La ciudad más endeudada gasta aún más
Los presupuestos de 2008 de Gallardón crecen un 9,2%. La capital debe 5.936 millones de euros.
El País
OAM 324 01-03-2008 03:05

domingo, fevereiro 10, 2008

o Grande Estuário

Vista do estuário do Tejo e da ponte Vasco da Gama, de Alcochete
Vista do estuário do Tejo e da ponte Vasco da Gama, de Alcochete.

Do teimoso Cravinho à TTT

A corrupção.
A cruzada de João Cravinho contra a corrupção é admirável e revela um homem corajoso com princípios bem assentes. Apoio-o inteiramente nesta guerra, que não podemos adiar, sob pena de vermos o país transformado numa paisagem siciliana atravancada de Sopranos e governada por uma tríade de piratas! A indignação pública contra esta epidemia que nos definha tem vindo a crescer, o que não deixa de ser uma boa notícia. Mas como há muito escrevi, enquanto não virmos um empresário ou banqueiro dos grandes e meia dúzia de políticos na prisão, ou expulsos da política por indecência e má figura, tudo não passará de fogo de vista e intenção piedosa. Enquanto a polícia (ela própria corroída pela mesma doença), os tribunais (pejados de vícios burocráticos e corporativistas execráveis) e os advogados (onde assomam individualidades promiscuas, se não mesmo mafiosas, cujo mediatismo é por vezes proporcional à impunidade de que gozam) não remarem para o mesmo lado - isto é, para o lado da Justiça -, não haverá verdadeira mudança de atitude. Muito pelo contrário! Se os processos anti-corrupção não obtiverem resultados tranquilizadores em tempo razoável, prevalecerá a ideia de que o ilícito compensa, sobretudo se praticado pelos ricos e poderosos. Os crimes têm que ser punidos e sobretudo prevenidos. Se o tempo do castigo decorre ainda da proverbial lentidão dos processos judiciais, já o tempo da precaução e da prevenção, isto é da criação de leis, de regras e de consensos subjectivos assumidos socialmente, pode e deve ser encurtado drasticamente, em nome da absoluta necessidade de estancar a actual tendência aparentemente irreprimível para o cabotinismo, o nepotismo e a corrupção (1).

A leviandade sobre aeroportos e ferrovias.
Há porém outra doença na nossa democracia que pode ser tão ou mais letal: a leviandade. Trata-se de um mal que afecta uma franja crescente de altos responsáveis administrativos, técnicos e sobretudo políticos. Quase sempre ignorantes das coisas práticas da vida que não acontecem no regaço do Estado, adquiriram o péssimo hábito de dizer e fazer (ou tentar fazer) o que lhes vem à cabeça, ou é soprado do Além! É o caso da obsessão de João Cravinho pela Ota, e tem sido também o caso da telenovela produzida pelo MOPTC, protagonizada por Mário Lino e agora também pela sua tão ambiciosa quanto ignorante ajudante de campo, Ana Paula Vitorino.

Cravinho continua sem perceber que o fecho do aeroporto da Portela, em nome da construção dum Novo Aeroporto de Lisboa (NAL) na Ota, seria um desastre monumental, sob todos os pontos de vista! E continua sem perceber a essência escondida de toda esta polémica, ou seja, que no actual contexto ibérico, europeu e euro-atlântico, terá forçosamente que haver dois, e não apenas um, eixos estruturantes do futuro protagonismo de Portugal na nova geometria estratégica europeia. É pois tão decisivo fortalecer o eixo Lisboa-Porto-Corunha, como fortalecer o eixo Lisboa-Madrid-Barcelona. O protagonismo euro-atlântico cabe de novo aos países ibéricos, mas para lá chegarmos precisamos de fortalecer a aliança ibérica em todas as suas vertentes, sem confusões e sem complexos.

Ora, para fazermos a nossa parte, resulta evidente que, depois de quase concluída a rede de autoestradas e rodovias rápidas construída nos últimos trinta e quatro anos, a prioridade deve agora inflectir para a renovação e recuperação da nossa rede ferroviária (2), estabelecendo o Pi da Alta Velocidade e da Velocidade Elevada do país e da sua ligação a Espanha e ao resto da Europa, bem como um plano acelerado de substituição da bitola ibérica, das actuais linhas férreas nacionais, para a bitola standard europeia.

Por outro lado, no que refere ao transporte aéreo, a principal prioridade nem sequer é construir um novo aeroporto internacional, e muito menos a cidade aeroportuária defendida à toa por Augusto Mateus - o mesmo que estudou, cobrou e agora deveria ser responsabilizado pelo aeromoscas de Beja!

Atender às verdadeiras prioridades deste sector passa por decisões simples e muito menos caras de executar. Passa por despedir a actual e desastrosa administração da ANA e por fracturar esta instituição estatal em três entidades regionais (ANA-Sul, ANA-Norte e ANA-Ilhas). Passa por explorar imediatamente o potencial todavia existente no aeroporto da Portela. Passa por melhorar a operacionalidade das aeronaves no aeroporto Sá Carneiro, resolvendo o problema técnico gritante do respectivo Taxi way. Passa por desbloquear os entraves sucessiva e reiteradamente levantados às companhias de Low Cost que pretendem operar ou incrementar a sua presença nos aeroportos do continente e ilhas. Passa por manter o NAL de Alcochete em banho-maria, pronto a avançar caso se verifique que a recessão mundial que aí vem e o pico petrolífero não passam de uma invenção pérfida da Al-Qaeda! Passa por uma dolorosa mas inevitável racionalização da TAP, e pela busca de um solução de viabilidade para esta histórica companhia. E pode passar ainda, se for preciso, pela utilização complementar da Base Aérea do Montijo, oferecendo aí novas plataformas operacionais às companhias Low Cost.

A Terceira Travessia do Tejo (TTT)
A previsão do preço do petróleo para 10 de Fevereiro de 2009 era de US$119,22. Isto significa que, não apenas o petróleo e o gás natural deixaram de ser recursos baratos, mas também o ferro, o cimento, o PVC, tal como o pão e o leite, estarão dentro de um ano proporcionalmente mais caros. Seria aliás interessante as nossas universidades estudarem que parte desta inflação estrutural-global tem vindo a influenciar a sistemática derrapagem dos orçamentos das obras públicas, já que os preços das principais matérias-primas sobem diariamente! Ou seja, tal como no caso do NAL, a TTT terá que ser equacionada tendo bem presente o adverso contexto sistémico que aí vem.

Para já, precisamos de uma ponte ferroviária - apenas ferroviária - que permita ao AVE chegar à cidade de Lisboa. O corredor mais lógico e com menos impacte ambiental é o que se aproxima da actual ponte Vasco da Gama, ligando o Pinhal Novo à futura estação ferroviária central de Lisboa, algures no vale de Chelas (ver PDF de Rui Rodrigues). Por outro lado, precisamos de mais comboios a servirem a ligação, pela ponte 25 de Abril, entre Setúbal e Lisboa. Uma eventual ligação submarina entre Algés e a Trafaria, para carros e metropolitano, tem vindo a ser proposta como fecho duma CRIL alargada à Margem Esquerda do Tejo. Faz sentido, mas a sua real viabilidade depende, tal como a necessidade de avançar já para o NAL de Alcochete, de uma avaliação mais atenta dos efeitos das crises energética e sistémica em que o mundo parece ter entrado.

A hipótese de uma ponte entre Chelas e o Barreiro, submetida entretanto à consideração técnica do LNEC, seguir em frente, seria o verdadeiro hara-kiri do Grande Estuário. Se as mentes iluminadas que vão estudar o assunto nos próximos 45 dias (ler despacho governamental), não repararem no óbvio, teremos nova frente de luta contra o dromedário-mor do reino!



NOTAS
  1. 12-02-2008. Portugal tem elevados níveis de corrupção e má governança, mas não se encontra no topo da tabela, longe disso. Daí que seja importante, no debate em curso, fazer uma avaliação aprofundada e sobretudo bem documentada do problema. A breve comparação sumária que se segue serve apenas de mote a uma percepção mais aprofundada, que os documentos a seguir indicados ajudarão certamente a construir. Nos estudos abaixo sugeridos não constam, porém, os grandes jogos político-financeiros, de que a actual crise internacional é reflexo directo, e que, bem vistas as coisas, constituem um imenso continente de corrupção disfarçada sob as máscaras da política económica e da suposta idoneidade das instituições financeiras e bancárias mundiais.

    Índice de corrupção segundo o Banco Mundial
    Corporate Corruption / Ethics Indices (Theoretical range of indices 0-100%)

    Alemanha | Portugal | Espanha | Angola

    1 - Corporate Illegal Corruption Index -- 85,5 | 68,2 | 62,2 | 18,3
    2 - Corporate Legal Corruption Index -- 62,4 | 42,0 | 39,7 | 30,7
    3 - Corporate Ethics Index (1+2) -- 73,7 | 55,1 | 51,0 | 24,5
    4 - Public Sector Ethics Index -- 74,3 | 60,4 | 59,4 | 13,7
    5 - Judicial / Legal Effectiveness -- 85,5 | 65,0 | 53,0 | 15,5
    6 - Corporate Governance Index -- 90,8 | 49,5 | 52,4 | 15,4

    Referências

    -- Corporate Corruption / Ethics Indices: Country Averages
    -- World Bank Institute Governance & Anti-Corruption
    -- SSRN-Corruption, Governance and Security: Challenges for the Rich Countries and the World by Daniel Kaufmann
    -- SSRN-Governance Matters VI: Governance Indicators for 1996-2006 by Daniel Kaufmann, Aart Kraay, Massimo Mastruzzi

  2. 11-02-2008. A este propósito não poderia ser mais instrutivo comparar a política de transportes da Espanha com o cretinismo decisório das maiorias que nos têm governado ultimamente. A Espanha terá em 2010 a maior rede de Alta Velocidade e Velocidade Elevada do mundo! Esta ambiciosa decisão estratégica reduzirá drasticamente a pressão insustentável do transporte aéreo, fortalecendo de forma sábia e multiplicadora a sua ameaçada coesão territorial. As ligações AV entre Madrid e Sevilha, desde 23 de Dezembro passado, entre Madrid e Málaga, e a chegada técnica do primeiro AVE Siemens S-103 a Barcelona na passada Sexta-Feira, irão demonstrar o efeito previsto da competição crescente que a ferrovia fará ao transporte aéreo em distâncias até 800Km e sobretudo nas ligações regionais e interregionais. As actuais taxas de crescimento do tráfego aéreo cairão, só pelo efeito deste tipo de concorrência, para metade. O mesmo ocorrerá na Portela, seja por efeito da concorrência imparável das companhias de Low Cost no Porto, em Faro, no Funchal e em Ponta Delgada, seja por efeito das futuras ligações ferroviárias de AV/VE entre Lisboa e Madrid, e entre Lisboa e o Porto. Recomendo sobre este tema o mais recente artigo de Rui Rodrigues, Portela ultrapassa Málaga, publicado hoje no Público online. Especial atenção para o vídeo promocional do governo espanhol sobre a rede de Alta Velocidade, apontado na versão PDF do mesmo artigo.

    Os nossos levianos governantes têm que aprender de uma vez por todas que um atraso dramático relativamente à Espanha terá consequências dramáticas no país. Desde logo, pela drenagem inevitável de recursos humanos e económicos para o país vizinho. Por outro lado, têm que perceber que, sobretudo num país pobre como o nosso, a eficiência na energia, na mobilidade, na administração e na justiça, valem mais do que todos os Quadros Comunitários de Apoio desperdiçados e por vir.


OAM 308 10-02-2008, 04:56

sexta-feira, janeiro 11, 2008

Aeroportos 47


Alcochete, casario no centro da vila, 2007. Foto: OAM, 2007.
Alcochete, casario no centro da vila, 2007.

O Grande Estuário

"Nem um só deputado assistiu aos debates promovidos pela Sociedade de Geografia de Lisboa e pelo Instituto Superior Técnico"
-- António Brotas, 11-01-2008.

"Caro Guterres, Acho que lhe devo dizer que a construção do futuro aeroporto na Ota é uma decisão em absoluto errada, altamente gravosa para o país, o que com o tempo se tornará cada vez mais evidente." -- António Brotas, 26/6/1999.

Se continua por este caminho, José Sócrates ainda se arrisca a voltar a ter o meu voto! Para lá de toda a poeira e manobras de diversão, a verdade é que o governo PS, sobretudo na pessoa do seu primeiro ministro, desempenhou com brio a presidência portuguesa da União Europeia e tomou três decisões de grande importância estratégica: ratificar o Tratado de Lisboa na Assembleia da República, em vez de o levar a um absurdo referendo (1), travar a ofensiva bancária espanhola sobre o sistema financeiro português (2) e rejeitar definitivamente o embuste da Ota, a favor de uma solução que, se conseguir reunir um amplo e diversificado leque de investidores intercontinentais, acabará por ser a alternativa certa à alta probabilidade de o aeroporto da Portela deixar de ser em breve competitivo no panorama europeu do transporte aéreo.

Bem vistas as coisas, aquilo que o governo acabou por decidir foi mesmo a solução propugnada por muitos, e conhecida por "Portela+1". Só que o "1" não vai ser o Montijo, mas Alcochete!

Lá para 2010-12, se tudo correr bem, começarão as obras no Campo de Tiro de Alcochete. Lá para 2017-20, se entretanto forem alcançadas as exigentes metas de eficiência energética global que permitirão o prolongamento da era petrolífera até meados, ou mesmo até ao fim deste século, teremos o NAL - Novo Aeroporto de Lisboa. Se este desiderato for alcançado, o aeroporto da Portela será então encerrado, dando lugar, muito provavelmente, ao surgimento de uma nova extensão da cidade. Não será, porém, apenas a Portela que será desactivada. Também a Base do Montijo (estou convicto) fechará, dando lugar a uma importante área residencial (3), ou de diversão. Se somarmos a estas duas gigantescas fontes de receitas, a própria privatização da ANA, constata-se que não faltam contrapartidas interessantes para o consórcio que vier a ganhar o concurso internacional de construção-exploração do NAL. Ou seja, tomada a decisão mais difícil, isto é a escolha do local, creio que as coisas vão andar muito depressa daqui em diante. Serão sete cães a um osso!

Falta rever porém outro erro enraizado nos miolos preguiçosos e kafkianos das araras que esvoaçam pela quinta do dromedário do MOPTC: a ponte Chelas-Barreiro. Uma calinada tão grave quanto a da Ota!

Primeiro, porque não há nenhum estudo técnico, nem financeiro, que recomende propriamente aquela solução.

Segundo, porque a localização papagueada pelo primeiro ministro na suposição que o dromedário fizera o trabalho de casa (mais uma vez, não fez!), é zarolha (onde fica o NAL, onde é?); leviana (já calcularam o custo dos pilares na zona profunda do rio?); amadora (então desembarca-se o grosso do tráfego rodoviário e ferroviário proveniente do NAL e de Espanha no meio dos engarrafamentos lisboetas?!) e estrategicamente desastrosa (então vão destruir a única zona de manobras para grandes navios e frotas existente entre a ponte 25 de Abril e a ponte Vasco da Gama?! onde pensam localizar a futura base dos famosos submarinos comprados pelo Paulo Portas?) Para fazer chegar a Alta Velocidade e os passageiros do NAL ao centro da capital, só há um corredor inteligente: aquele que segue parcialmente ao lado da actual ponte Vasco da Gama, porque é o mais curto entre a plataforma multi-modal do NAL e a cidade de Lisboa, o que tem menos impactes ambientais, o mais racional em matéria de mobilidade suburbana e o menos caro de todas as possíveis alternativas. Vale a pena ler a este propósito o alerta do Comandante Joaquim Silva (4).

Uma vez tomada a nova decisão política (5) sobre a localização do NAL, já não é preciso continuar com o discurso mistificador do esgotamento da Portela. E não sendo mais necessária esta lenga-lenga, também deixa de fazer falta prejudicar diariamente os passageiros que usam a Portela, com um sistema de gestão de bagagens insultuoso, com um terminal para voos domésticos vergonhoso e com o mais recente e deprimente sistema de bloqueio de movimentos humanos na zona de facturação de bagagens (Check-in), onde estive recentemente e que mais parece um beco sem saída em estado de sítio. Até que o NAL comece a ser construído é absolutamente necessário ampliar e reformar a Portela com pés, cabeça, arte e dignidade. A actual direcção do aeroporto da Portela já provou a sua falta de decoro e a sua incompetência até à exasperação. Rua com ela!

Finalmente, um aviso: o galináceo que hoje manda na França acaba de perceber que o futuro do transporte estratégico europeu está na ferrovia. Sócrates, tens que espevitar os sonâmbulos do teu governo. Eu sei que eles só pensam na reforma, mas caramba, tu é que queres andar por cá até 2012!

Post-scriptum -- Esta foi uma vitória "bloguista", no que foi o seu primeiro, desinteressado, meticuloso e sistemático desempenho cívico, por uma causa séria: impedir o embuste da Ota. Para aqui chegarmos foi necessário contrariar, com informação e argumentos, grupos poderosos, a teimosia governamental e a subserviência miserável da generalidade dos meios de comunicação de massas -- todos eles subsidio-dependentes da publicidade e da informação "privilegiada" governamental! Seria bom que alguns pessimistas de serviço e ao serviço (como Pacheco Pereira e António Barreto) aprendessem esta lição e passassem a estudar melhor os assuntos. Finalmente, creio que o resultado desta vitória deve ser endereçada, como homenagem à probidade profissional e à seriedade intelectual, ao falecido engenheiro Reis Borges e ao engenheiro António Brotas, dois socialistas que não se confundem com o oportunismo sem lei que grassa na nossa democracia. - OAM


NOTAS
  1. Pode votar-se a favor ou contra a eutanásia, a favor ou contra a discriminação na entrada de cães, chineses e pretos num restaurante, a favor ou contra o casamento entre homosessuais, a favor ou contra a liberalização do comércio e/ou consumo do haxixe, a favor ou contra o regresso da monarquia a Portugal, a favor ou contra a continuação de Portugal na União Europeia, a favor ou contra a construção de uma ponte entre o Barreiro e Chelas, e por aí adiante, desde que estejam em causa escolhas simples, alternativas e claras. Agora referendar o conteúdo de um Tratado, com 350 páginas, é algo que não lembra nem a um estudante de ciência política no primeiro ano de curso. A termos ido para o referendo, teria sido a maior fraude democrática praticada em Portugal desde o consulado de Marcello Caetano.
  2. A minha interpretação sobre os estados pré-comatosos do BCP e do BPI, que levariam à absorção pura e simples dos mesmos pelo sistema bancário espanhol, em menos de dois ou três anos, se nada fosse feito, ou se o governo português deixasse a resolução do problema à mão invisível do mercado, é que a resolução de tão graves crises não dispensa a mão visível do Estado, da mesma forma que a mitigação da actual crise financeira mundial (que fere com particular gravidade a América e a Europa) não dispensa as intervenções salvíficas enérgicas das Unidades de Cuidados Intensivos da Reserva Federal, no caso dos EUA, e do Banco Central Europeu, no caso da Europa. Às OPAs camufladas e sucessivas do Santander sobre o BCP-BPI, e do La Caixa sobre o BPI-BCP, tendo por outro lado em conta a incrível fragilidade de ambos os bancos portugueses face ao tsunami especulativo que lhes varreu boa parte da liquidez e muitos activos, a Caixa Geral de Depósitos opôs, em nome dos interesses estratégicos do país, uma complexa operação de salvamento dos dois bancos, de cujos meandros, por vezes indecorosos, agora se fala com escândalo. A verdade é que, depois de ter ouvido ontem à noite as soluções que Miguel Cadilhe diz ter na manga para salvar o BCP -- alguns despedimentos, venda de operações menos rentáveis, fora do core business do banco, ou com futuro incerto, além de muita poupança -- fiquei a cogitar sobre os méritos da solução Santos Ferreira, mesmo com o socialista de Mogadouro à pendura. Pesados todos os prós e contras, se eu fosse accionista do BCP e/ou do BPI, depois de ter conhecido as soluções de Cadilhe, e de presumir que a grande manobra estratégica do actual governo, para se safar à pata ibérica de Madrid, no quadro actual e previsível da União Europeia, passa pelo envolvimento activo da China, Angola, Médio Oriente, Estados Unidos, Brasil e Venezuela numa nova arquitectura da soberania portuguesa, votaria na lista da Caixa Geral de Depósitos! Disfarçar a pequenez e o isolamento geográfico do país, tal como diversificar as suas dependências, sempre foi a nossa maneira de evitar a completa presuntificação ibérica!
  3. Os terrenos da Base Aérea do Montijo dariam um excelente parque de atracções para a cidade-região de Lisboa. Não façam, porém, mais um Disney qualquer coisa. Aquele poderia ser o sítio ideal para um grande parque temático, a inaugurar em 2020, coincidindo com a entrada do NAL em velocidade de cruzeiro. Imaginem que a coisa se chamava Eurolândia! E que naquele lugar nascia uma réplica didáctica e divertida da Europa. Custa assim tanto sonhar?
  4. RAZÕES QUE IMPEDEM A CONSTRUÇÃO DA PONTE-CHELAS-BARREIRO (extracto)
    por Comandante Joaquim Silva

    1 - A ponte projectada pelo MOPTC no lado de Chelas aterra sobre as docas do Poço Bispo e Matinha. Contudo todos os cais entre Stª Apolónia e Matinha são afectados nas manobras dos navios. Vejamos:

    a) Paquetes de Cruzeiro: O Cais de Stª Apolónia previsto como futura gare de paquetes de cruzeiro - já foi cais dos paquetes da Nacional e da Colonial - obriga a que esses navios quando atraquem à enchente terão de dar volta pelo norte ( e um navio tem de ter para raio de rotação duas vezes o seu comprimento e que faz com que navios de 300 m necessitem de pelo menos 600 m ) e não devem ter os pilares duma ponte a poucas centenas de metros da sua popa. Quando se manobra nesta situação - com obstáculos atrás - tem que se ter em conta que um navio pode ter uma paragem brusca da sua máquina - por minutos largos - e necessitar de fundeaer o que aos comprimentos acima referidos se vai juntar o espaço em que foi arrastado pela corrente a encher e pelo comprimento da amarra que tiver que largar ( fundear de emergência) para se segurar ao fundo. E ninguém anda a manobrar navios deste tamanho sem margem de segurança na sua popa; isto é com pilares de ponte a poucas centenas de metros.

    b) Navios de carga. Os navios de carga que necessitam dos cais do Beato e do Poço de Bispo - por exemplo os de cereais - são por vezes navios da ordem dos 200 m - e a situação agrava-se em relação ao caso do paquetes porque têm que manobrar ainda mais encostados a norte junto aos pilares da ponte. Se largarem dos cais na vazante, terão que fazer a giração mais a norte do posto de acostagem o que a nova ponte impede de tal os navios atracados nestes cais.

    c) Navios que utilizam os Cais da Matinha. Não creio que alguém leve - após a ponte construida - navios a manobrarem a poucos metros dos pilares da ponte, quer atracando à vazante quer à enchente.

    2 - Assoreamento do Rio. Já pelo exemplo doutras implantações no Rio (bóias por exemplo) uma ponte com tão elevado número de pilares irá assorear velozmente o Rio o que fará afastar a navegação destes cais ou então não há dinheiro que chegue para as dragagens. Exemplo comprovativo, o que se passou com o Cais da Expo actualmente todo assoreado; custou milhões e não cabe lá nem um iate de recreio! E mais uma vez somos todos a pagar...

    3- Mar da Palha. O maior espelho de água portuário da Europa ficará inutilizado. Não só porque a ponte destruirá a área dos 16 pontos actuais de fundeadouro ( já lá estiveram 22 navios da VI esquadra americana, entre eles o famoso couraçado "Missouri", onde se assinou a rendição do Japão. Na época, o maior navio de guerra do mundo. )

    4 . Base do Montijo. As estruturas superiores da ponte (Luzes, etc) se ficarem a mais de 30 m do nível das águas impedem a utilização da pista W/E do MOntijo (A maior e mais usada)

    5- Cais do Rosairinho e da CUf. Os pilares da ponte não permiiram passgem de navos com galope (altura) de superestruras (mastros, chaminés, gruas, etc) acima dos trinta metros do nivel do mar.

    6- Navegação à vela. Não só a navegação de recreio, mas também a das embarcações tipicas do Tejo, em especial do Seixal, Montijo e Alcochete são muito afectadas com uma ponte neste local pois a maior parte delas não possui motor.

    E por fim, a destruição do mais belo espelho de água europeu completa o golpe de morte ao porto de Lisboa. A nova ponte será:

    -- uma tragédia para a Navegação
    -- uma desgraça paisagística
    -- um atoleiro financeiro ( ... custos de construção, mas também custos de manutenção de uma ponte cinco vezes maior que a 25 Abril, sem uma frequência que o justifique)

    Por fim gostava de saber, não sendo impertinente, o seguinte: pode-se fazer uma ponte ferroviária com um tabuleiro tipo montanha russa? Para que serve uma ponte a inaugurar em 2013 ( se o prazo não derrapar ) com linhas de bitola ainda ibérica quando à data estas deviam estar extintas em Portugal?
  5. SOBRE O RELATÓRIO DO LNEC -- COMENTÁRIO E VOTOS PARA O FUTURO

    A decisão de não construir o novo aeroporto na Ota foi uma decisão técnica e não política.

    Posso prová-lo com a carta que a seguir transcrevo, enviada ao Eng. António Guterres e publicada no “Público” de 26/6/1999, em que todos os argumentos são técnicos ( e que convido a Imprensa agora a referir.)

    Política, foi a decisão de construir um aeroporto na Ota sem suporte em estudos técnicos que o justificassem e contra todas as evidências que o desaconselhavam.

    Política, foi a recusa em ouvir, e o modo como foram afastados todos os técnicos portugueses capazes de ter uma opinião crítica sobre o assunto. (Refiro aqui, em particular, o Engenheiro Reis Borges, militante e antigo deputado do PS, que na véspera de morrer me deu autorização para divulgar o texto que vem publicado na p. 159 do livro "O erro da Ota")

    Político, foi o modo como, com argumentos, alguns ao nível da indigência, se afastaram as hipóteses alternativas.

    Política, foi a ânsia em procurar dar passos irreversíveis antes do país se poder aperceber da sua gravidade.

    Político, foi o modo como se pôs de lado a competência, os conhecimentos, a capacidade e a experiência portuguesa, para a substituir por pareceres de organismos exteriores – nunca sujeitos à crítica nacional -, aceites como verdades absolutas quando convinham aos decisores políticos ( e ignorados quando não convinham).

    A decisão de ouvir o LNEC foi uma decisão acertada porque, pela primeira vez, foi encarregue um organismo técnico, de dar um parecer técnico, sobre um assunto técnico, antes de se tomar a decisão política.

    O LNEC nem sequer tinha experiência em assuntos aeronauticos. Mas bastou produzir um relatório, para que, um assunto que se arrastava há 10 anos, ser resolvido em 3 dias, num clima de grande concordância nacional.

    E agora?

    Agora há que aproveitar o ensinamento, e passar a ouvir melhor os técnicos.

    Há que pôr fim à situação de quase clandestinidade em que os técnicos portugueses foram mantidos por sucessivos poderes políticos e por uma classe política demasiado timorata e não particularmente competente.

    Nem um só deputado assistiu aos debates promovidos pela Sociedade de Geografia de Lisboa e pelo Instituto Superior Técnico, em 1998 e 1999, que reuniram mais de três dezenas de técnicos, o primeiro dos quais (que foi filmado) teve 200 participantes, no Salão Portugal da SGL. Nem a Imprensa se referiu a eles.

    O que mudou, e fez a diferença nos últimos dois anos, foi a blogoesfera, que vai certamente continuar .

    Nas grandes obras que influenciarão largamente o nosso futuro, há que pôr fim à prática das decisões políticas tomadas antes dos estudos técnicos, e não integradas em programas conjuntos.

    Neste momento, a decisão de construir uma ponte ferroviária ou rodo-ferroviária do Beato para o Barreiro, é uma decisão política, tomada sem suficientes estudos técnicos, não integrada num plano de conjunto, e com um impacto ainda não suficientemente avaliado.

    A proposta de uma ponte, ou túnel, para o Montijo, apresentada no estudo da CIP, é uma simples proposta igualmente não estudada ( o traçado, apresentado neste estudo para o TGV ir passar, com uma espécie de “bossa do camelo”, no novo aeroporto (ver jornais de hoje) é nitidamente errado e obedece a uma concepção errada.)

    Uma nova ponte (ou túnel) ferroviária sobre o Tejo é, em absoluto, necessária, daqui a alguns anos, mas há, pelo menos, uma outra hipótese a considerar: a da ponte (ou túnel) entre Alverca e Alhandra, provavelmente mais fácil de construir, mais barata, com menos impacto ambiental e que permite uma melhor exploração da rede.

    Em qualquer caso, a decisão sobre a nova travessia não é urgente. Temos, felizmente, tempo para a estudar e ponderar a sua prioridade face a outras obras do país.


    Agora que foi, finalmente, tomada a decisão sobre a localização do NAL, podemos fazer o estudo global da rede ferroviária na metade Sul do país, que inclui esta travessia, a localização da estação central de Lisboa e o traçado a Sul de Pombal do futuro TGV para o Porto.

    Todos estes elementos têm de ser integrados num projecto global que tem de ser seriamente pensado e avaliado. O que não podemos é decidir a construção do troço de Pombal a Alenquer da futura linha TGV de Lisboa para o Porto sem saber ainda como é que a linha vinda de Alenquer entrará em Lisboa. ( A última versão que ouvi foi a de que entrará pelo vale do Trancão.)

    A curto prazo, muito provavelmente, nesta próxima Cimeira Ibérica, que se realizará este mês ou em Fevereiro, Portugal e a Espanha decidirão a construção da linha de Badajoz ao Poceirão, onde está prevista uma plataforma logística. Tenho insistido em que esta linha venha até ao Pinhal Novo, onde há uma estação da FERTAGUS. Com este acrescento, o futuro TGV para Madrid poderá começar a funcionar a partir do Pinhal Novo.

    Mas, o verdadeiramente importante, é que esta linha será a nossa primeira ligação à rede ferroviária europeia de bitola "standard". Como tal, permitirá o trânsito das nossas mercadorias por via ferroviária até à Polónia.

    Temos assim, na nossa frente, o começo de um calendário ferroviário altamente benéfico para o país, que pode ser posto em marcha sem custos excessivos, e que, como tal, será aceite , certamente, de um modo consensual. (11/1/2008)

    António Brotas
    Professor Jubilado IST

    +++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++
    CARTA ABERTA AO PRIMEIRO MINISTRO SOBRE O AEROPORTO
    (Publicada no "Público em 26/6/1999)

    Caro Guterres,

    Acho que lhe devo dizer que a construção do futuro aeroporto na Ota é uma decisão em absoluto errada, altamente gravosa para o país, o que com o tempo se tornará cada vez mais evidente.

    Envio-lhe uma fotocópia da folha 30 D da Carta Geológica de Portugal com a indicação da implantação do aeroporto na Ota prevista pelos “Aeroport de Paris”. Esta implantação obriga a uma movimentação de terras da ordem dos 50.000.000 de metros cúbicos (cerca de 5 vezes a actual movimentação de terras anual em todo o país).

    Mas os ADP não notaram, ou não se importaram, com o facto da implantação indicada obrigar a canalizar, não unicamenter a Ribeira do Alvarinho, com uma bacia hidrográfica de 10 Km2, mas, também, a Ribeira da Ota, com uma bacia hidrográfica muito maior. Esta obra, altamente contra indicada, obriga, se se insistir em construir o aeroporto na Ota, a construi-lo mais para Oeste, o que obriga a fazer uma movimentação de terras francamente maior.

    Em qualquer caso, o aeroporto ficará um aeroporto acanhado, com duas pistas e sem qualquer possibilidades de expansão, o que é, de facto, confrangedor, quando se vê que está prevista a construção até uma 5ª pista do aeroporto de Barajas em Madrid, que poderá, assim, receber até 45 milhões de passageiros ano, estando já os espanhois a prever a sua duplicação ou a sua substituição por outro que permita receber 90 milhões.

    Grande parte dos acessos e do próprio aereoporto, que ficará a uma cota de cêrca de 30 m, terá de ser feita sobre lodos, argilas e areias argilosas do leito de ribeiras, com cotas de 5m, que terão de ser consolidadas, obra sempre delicada, antes de serem feitos os aterros. A autoestrada, por exemplo, ainda continua a ter assentamentos na zona em que passa sobre uma pequena ribeira antes do viaduto da Ota. Uma obra destas não deve ser construida sem sondagens muito cuidadas. Enquanto não são feitas, que se procure, ao menos, a informação existente, que mais não seja ao nível dos trabalhos da cadeira de Geologia dos alunos do 3º ano do Técnico.
    Os acessos, rodoviários e ferroviários, que terão de entrar pelo Sul, são de facto um problema complicado que poderá encarecer muito a obra.

    Note-se, que não foi ainda indicado, e não se vê facilmente onde poderão ser construidos, os parques de estacionamento de automóveis, em absoluto necessários ao lado de um aeroporto, aparentemente, neste caso, esquecidos. Entre os 5 e os 30 metros nem sequer sabemos a que cota ficarão.

    Não parece estar ainda quantificado o custo da duplicação da autoestrada, paralela e a oeste da actual, considerada necessária para assegurar o acesso ao aeroporto da Ota. Quem viajar para o Norte pela estrada actual e olhar para a esquerda e vir o relevo não poderá, no entanto, deixar de ficar impressionado com o que poderá custar.

    Não refiro aqui outras questões relacionadas com a localização do novo aeroporto. Umas, porque exigem uma discussão ampla e aberta, que gostaria que viesse a ser feita nos meios universitários, outras, porque exigem estudos técnicos que, depois de feitos, devem ser sujeitos à crítica dos especialistas ou, pelo menos, de quem os entenda. São exemplo, os estudos sobre segurança aérea que incluem as questões relacionadas com ventos, nevoeiros e choques com aves - é impressionante a ligeireza e superficialidade com que vejo referir esta última questão, e usá-la como argumento sem apoio em dados ou estudos minimamente suficientes.

    Limitei-me a apresentar elementos, que penso suficientes, para excluir, desde já, a localização na Ota. Quem não tiver esta opinião, o que tem a propor é a continuação dos estudos, da solução da Ota e da solução do Rio Frio. Se, porventura, os estudos aprofundados da solução do Rio Frio, que tem, aliás variantes, vierem a desaconselhar esta solução, o que há a fazer é estudar outras soluções que o país, felizmente, tem outras possiveis.

    O que não é admissível, é com estudos superficialmente referidos e mais do que insuficientes, eliminar desde já a solução Rio Frio e, deste modo, pretender fazer aceitar a solução da Ota, que tem os gravíssimos inconvenientes referidos no início desta carta, que ninguém rebateu.

    O Guterres, como eu, é engenheiro. É Primeiro Ministro, mas o país é tanto meu como seu. Escrevi esta carta procurando usar uma linguagem de engenheiro. Mas, pode crer, sinto-me triste e inquieto ao ver hoje no título de um jornal, uma notícia que, a ser verdade, não tenho dúvida, prejudica e inferioriza muito o meu país. (24/6/99)

    Com as melhores saudações subscrevo-me

    António Brotas



OAM 304 12-01-2008, 18:30